Tumgik
#menino RUIM demais expulsa ele merlin
tigerwxrrior · 4 years
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task 004; interrogatório
O olhar para os seres mágicos de grande poder à sua frente vinha por baixo, o queixo de Qi Liang quase encostando no pescoço em sua desconfiança. Quem mais encararia os grandes Merlin e Fada Azul com uma desconfiança tão desvelada, se não um bicho do mato turrão como ele? Alguém mais sensato procuraria sua distração em outro lugar da sala que não os rostos de seus acusadores mas, apesar da placidez da superfície que apresentava, o chinês era abrasivo e tinha o sangue quente demais para seu próprio bem. Era um ralieno, afinal.
— Parece descontente, senhor Fa. Está nervoso? — A pergunta de Merlin veio em tom paternal ao invés de acusatório, mas na posição em que estava, o aluno sentia que era apenas uma isca para fazê-lo cair em uma armadilha. Endireitou-se na cadeira com a postura reta de sempre, mas fez questão de cruzar os braços na frente do peito antes de responder. 
— O que estou é impaciente, senhor. Com todo respeito, acha mesmo que sou o tipo de fazer isso? — O mero fato de estar ali era ridículo para Qi Liang. Ele sequer tinha magia; será que Merlin realmente pensava que ele era tão forte à ponto de sequestrar doze pessoas e cavar covas para cada uma delas em apenas uma tarde?
— Sabemos que seu histórico era pristino, até pouco tempo. Até seu incidente com o senhor Alizayd que, por ventura, calhou de ser um dos desaparecidos. — Os lábios do chinês crisparam-se com a menção do evento, lembram-se das palavras duras que recebera do pai durante as férias por sua suspensão. Perto da reprovação de Shang, o olhar claro que não esperava esse tipo de coisa de você que Merlin lançava-o agora não era nada. — De qualquer forma, a conversa que estamos tendo ocorrerá com todos os aprendizes. Já conversamos com alguns de seus colegas, vê? — Um gesto vago com a mão do diretor indicou uma pilha de papéis preenchidos, presumidamente de outros interrogatórios. Qili respondeu-o com um suspiro descontente ao perceber que realmente teria que fazer aquela besteira, mesmo sabendo não ter feito nada.
— Pois bem, então. Pergunte o que tem pra perguntar, senhor. 
— Primeiramente, identifique-se: nome, idade, filiação, raça. — Com o olhar incrédulo de Qili em reação tal pergunta (ele já estava estudando lá há nove anos, pelo Narrador, Merlin sabia seu nome), Merlin emendou um rápido. — Faz parte do protocolo, senhor Fa.
— Fa Qi Liang, do clã Fa de Yucheng. Vinte e quatro anos, primogênito de Fa Mulan e do general Li Shang. Humano.
— Qual foi a primeira coisa que fez assim que chegou à Ilha dos Prazeres?
— Comprei tickets pra minha irmã, Meili. Eu não sou muito disso, de parques de diversão, mas ela gosta. Achei que poderia ser um dia divertido pra ela. — Engoliu em seco a última frase a sair da própria boca; tinha sido um dia divertido, até que não foi mais. Ter que passar a viagem de volta consolando à irmãzinha por que um imbecil a tinha magoado e uma de suas amigas tinha sumido realmente o colocou em um humor ruim o suficiente para dar um soco na boca de alguém. Teria que meditar um monte para resolver-se com seus instintos violentos. — Depois disso, sentei em um banco pra ler. Estou sabendo tudo de Gestão de Reinos, e nem tenho essa aula; mas os livros não eram meus, então não posso reclamar da seleção.
— E de quem eram, então?
— ... Hugo. Meu colega de quarto. — A pergunta foi respondida um pouco a contragosto; Qili não queria ter que incluir nomes em seu relato, ainda mais o de um amigo. Algo sobre isso o deixava nervoso, mesmo que sentar e ler seja a coisa mais inofensiva e tosca a se fazer num parque de diversões levemente assombrado.
— Viu algum dos aprendizes desaparecidos? Era próximo de algum deles? Tinha inimizade com algum deles? — Podia jurar que Merlin inclinou o corpo um pouco mais em sua direção, como se a resposta da pergunta anterior o encorajasse a pressioná-lo.
— Eu mal sabia que a maioria dessas pessoas existia; acho que uma delas era amiga da minha irmãzinha… Mas eu não me dava bem com o Ali. O senhor sabe disso. Já tivemos essa conversa.
— Fez algo inusitado no passeio, senhor Fa? 
— Inusitado? Não. Só fui arrastado para alguns brinquedos, me falaram que eu ia me divertir por bem ou por mal, basicamente. Se bem que a roda gigante enguiçou enquanto eu estava bem no alto, vocês deveriam ver esse tipo de coisa antes de trazer todo mundo pra um parque caindo aos pedaços. — A declaração veio em um tom de reclamação, e ele poderia jurar que viu os olhos da Fada Azul se estreitando de maneira reprovadora ao fundo. Não que estivesse prestando muita atenção nela, ocupado como estava tendo um staring contest com Merlin.
— Você se lembra de ter visto algo estranho no passeio ou uma presença estranha? 
— Dessa vez não, por incrível que pareça. Estava todo mundo amigável e festivo pelo que eu vi, o que honestamente é bem esquisito pra esse lugar, com todo mundo tentando acabar um com o outro o tempo todo.
— Tem inimizade com alguém em Aether? 
— Inimizade é uma palavra muito forte. Tem pessoas que eu não vou muito com a cara, e eles não vão com a minha, mas é uma troca de antipatias civilizada. Draco, Vincent, Aurae, Soren, essa gente toda, apenas os acho uns mimados insuportáveis. O que aconteceu com o Ali foi um ponto fora da curva.
— E o que aconteceu entre você e o senhor Alizayd, exatamente? É de suma importância que tenhamos todas as informações possíveis. — A explicação veio antes que Qili tivesse a chance de reclamar, por que ele iria reclamar de ter que repetir a mesma história dez vezes para Merlin. Já a sabia de cabo a rabo, e perguntar sobre era apenas esfregar na cara do guerreiro a única mancha em seu histórico.
— Pela vigésima quinta vez, excelentíssimo diretor Merlin: enquanto você e todos os funcionários estavam amaldiçoados, maldição essa que eu ajudei minha irmã a quebrar, que fique bem claro-
— Atenha-se ao ponto, senho-
— Não me interrompa. Não queria que eu respondesse? Então me deixe responder, que falta de educação. — A insolência não passou despercebida, mas o mago só teve tempo de lançar-lhe um olhar fulminante antes que ele continuasse. — Enfim. Enquanto todos vocês dormiam, o senhor Alizayd estava tocando o terror pelos corredores, intimidando e agredindo outros alunos à torto e a direita. Quando ele tentou fazer isso comigo, eu me defendi.
— Segundo os relatos dos seus colegas que viram a cena, foi você a desferir o primeiro golpe contra ele, senhor Fa.
— Depois de ele me infernizar, sim. Dei um soco nele, e depois mais alguns. Não foi como se eu estivesse chutando um cãozinho indefeso. — Fez questão de levantar a manga do moletom que usava e levantar a esquerda, ainda marcada por uma cicatriz na forma de uma mão queimada na carne, apesar do esforço das fadas curandeiras. Para o crédito delas, estava bem pior antes. — Todo mundo já sabe disso e já fui até suspenso, então não sei como isso é relevante pra sua investigação.
— Já cogitou prejudicar ou fazer mal a um colega aprendiz? 
— Eu me irrito às vezes, e desejo poder dar uns chutes na boca de algumas pessoas. Coisa que jamais faria sem o intuito de me defender, no entanto. — Apesar do olhar estreito da Fada Azul ao fundo, o nariz de Qili permaneceu perfeitamente proporcional ao resto das feições. Existia uma doutrina nas artes marciais que ditava que o objetivo destas era o melhoramento pessoal, e não merendar todo mundo que o irritasse na porrada, e Qili seguia suas doutrinas à ferro e fogo.
— Recebemos a informação de que você foi visto em atitude suspeita perto do Trem Fantasma e que já disse ter interesse em “acabar com a raça de Alizayd de Agrabah”. Por que disse isso? 
— Suas informações estão erradas, por que eu nem sequer estive no Trem Fantasma; no meu reino nós não brincamos com espíritos como vocês, brancos. — Podia jurar ter ouvido um suspiro exausto escapando pelos lábios de Merlin, mas não se deteve. — Em relação ao Ali... Isso está tudo fora de contexto. Alguns aprendizes brincaram falando que eu deveria ter cuidado, pois Ali era vingativo e viria atrás de mim pelo que fiz. E para isso eu respondi que, se ele viesse, acabaria com a raça dele igual fiz da última vez.
— Fomos informados de que se meteu em um desentendimento no final do passeio. Se importaria de explicar o motivo?
— Justamente o contrário. Eu evitei de entrar em um desentendimento, apesar de querer bastante.
— Reparamos que foi um dos últimos a chegar no ponto de encontro. Qual o motivo para ter demorado? 
— Bom, pra começo de conversa, fiquei preso na roda gigante com a Autumn. Pode perguntar pra ela. E depois, bem... De cima da roda gigante eu pude ver minha irmã, Meili, conversando com o namoradinho dela. Draco. Quando descemos, ela procurou a Autumn, aos prantos. Então eu tive que contar até dez, talvez até mil, pra não ir tirar satisfações com o palhaço. Não sou dono da vida da minha irmã pra fazer esse tipo de coisa.
— É verdade que passou quinze minutos sozinho antes de se encontrar com o grupo? — A última palavra de Merlin foi seguida de um audível “pfft” de Qili. Era a piada do ano.
— Quinze minutos sozinho? Seria um sonho, meu senhor. Não consigo passar mais do que meio minuto sem que brote alguém do chão pra me atazanar.
— Existe alguma razão para que algum de seus colegas possa querer te comprometer com respostas falsas? 
— Honestamente, senhor, você acha mesmo que precisaria de uma razão? Metade dos estudantes aqui tem sérios problemas psicológicos, e eu seria um alvo fácil pra alguém mal intencionado usar de bode expiatório. Meus pais não são realeza, eu já tive um desentendimento com um dos desaparecidos...
— Garantimos que ninguém será acusado injustamente ou será prejudicado por sua hereditariedade, seja ela qual for. Tem alguma coisa que queira nos contar? Essa é a única vez que vamos te dar essa oportunidade. 
— Contar? O que eu tenho são reclamações! — Jurava ter ouvido um essa não foi a pergunta na voz de Merlin ao fundo, mas deveria ser apenas uma alucinação. — Já estou no último ano e só temos festas, reuniões, maldições, excursões…. Será que o senhor poderia, pelo amor do Narrador, me providenciar uma aula? 
— Levaremos isso em conta, senhor Fa. — A expressão no rosto de Merlin traía algo próximo de divertimento, mesmo que tentasse manter-se neutro. Um aprendiz pedindo por aulas era algo semi-inédito em Aether, afinal. No entanto, toda a satisfação dissipou-se do rosto do mago quando percebeu que o chinês ainda não tinha terminado.
— Sem falar que vocês enfiam a escola inteira sem supervisão alguma em um parque que é claramente assombrado e, cá entre nós, tem uma cara de fachada pra tráfico infantil, e agora a culpa é dos aprendizes? Aposto que foi por isso que suspenderam as eleições para o grêmio, para poderem apontar o dedo pros aprendizes sempre que algo der errado e não ter ninguém para defendê-los!
— Basta! — Enfim o mago se fez ouvir, a pena parando abruptamente suas anotações com o rompante. — Já terminamos aqui, senhor Fa. Se retire antes que ganhe uma punição por sua insolência. 
— Com prazer, senhor diretor. — Tinha que responder com uma última insolência, como bom boca dura que era, antes de sair da sala do mago com os passos decididos de sempre.
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