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Conto de Natal
Por Angel
Meus pais sempre me falaram que Papai Noel não existe, e como ele é tratado em outras culturas. Mas mesmo que eles não acreditem, eu preciso acreditar, sempre dou o meu melhor pra ser uma criança boa, tinha medo do que ele poderia fazer comigo, já que eu nunca gostei do que recebia por ser uma boa criança, imagina se eu fosse uma criança má. Tive muitas oportunidades de fazer maldades, mas nunca cedi, mesmo que pudessem ser muito engraçadas. Não posso vacilar, o Papai Noel é assustador. Mesmo quando não é natal ele me visita, e faz frio no meu quarto, tão frio que congelou meu aquário de peixinhos dourados. Mas ele só vem pra ver como eu estou, nunca toca em mim, mas gosta de mover, roubar e quebrar minhas coisas. Às vezes me deixa presentes como lençóis e roupas ensanguentadas e rasgadas. Não sei de onde ele tira aquelas roupas tão pequenas… No último Natal acordei no hospital depois da visita dele. Ele me arranhou os braços, as pernas e as costas.
-Por que congelou seus peixinhos?
Minha mãe me abraça e diz pra eu contar a verdade, a voz dela antes do Papai Noel passar a me visitar era tão calma, e agora carrega um tom de desespero. E eu não sei porque eles não acreditam em mim. Por que eu mataria meus peixinhos? Como explicar o inexplicável? Como fazer com que ela entendesse que não fui eu? O Papai Noel fez isso. Ele sempre faz.
-Como é esse “Papai Noel”? - Perguntou um moço com roupa de policial, fazendo aspas com os dedos.
Ele é alto - muito alto, tão alto que tem que curvar as costas pra falar comigo -, usa sapatos engraçados, roupa vermelha com vários rasgos, e uma barba que vai até a barriga que é bem redonda. Ele está sempre sorrindo, um sorriso grotesco, com dentes amarelados e pontudos. O hálito dele é bem desagradável e ele gosta de falar bem pertinho de mim. Tem as mãos enrugadas e unhas compridas e sujas, eu sempre tento fugir mas meus membros parecem de chumbo. Ele sempre me marca, como se eu pertencesse a ele.
Em sua primeira visita - que eu me lembre - ele rasgou meus desenhos e disse que eu fui uma criança até boa, mas que não era bom o bastante, então teria que levar nosso cachorro embora. Seus olhos brilhavam de uma maneira estranha enquanto ele me tocava, eu me sentia enojado e sujo. Eu não pude fazer nada, nem gritar. Quando acordei, meu quarto estava inteiro com paredes ensanguentadas… E se eu tivesse sido mais obediente? Talvez Tutu ainda estivesse aqui e eu não teria que suportar aquele toque frio.
Eles acham que sou quem faço essas coisas e coloco a culpa no Papai Noel. Mas como eu faria isso? A alguns anos, antes de mais uma visita dele, me trancaram em um quarto branco cheio de almofadas. Acordei num hospital de novo. Ninguém viu o que aconteceu, pois as luzes se apagaram. Mas eu vi. Papai Noel tocou meu rosto e me arranhou com suas unhas nojentas, como sempre fez, abriu a porta pra mim, e arrancou os olhos e um dos braços do guarda que estava vigiando meu quarto. Como eu conseguiria fazer isso?
-Como você abriu a porta? Como arrancou os olhos e o braço do guarda? Por que você fez isso?
As perguntas do policial ecoam em meus ouvidos. Como explicar o inexplicável? Como provar minha inocência? Será que eu sou mesmo inocente? Talvez tudo isso tenha sido eu mesmo. Quando acordei, estava em um hospital, bandagens cobrindo meus ferimentos. Os médicos me olham sempre com estranheza e evitam chegar perto de mim, como se eu fosse um monstro.
Todos os anos ele me visita. A cada visita, a recompensa por ser bom se torna mais cruel, e eu nem tenho mais a liberdade de ser ao menos criança. Mas eu estou tentando. Eles não acreditam no Papai Noel, e ele tá cada vez mais bravo. Me trancaram de novo no quarto de almofadas, mas isso não impede nada. Ouço seus passos se aproximando, lentos e deliberados, como a contagem regressiva para minha execução. Eu tenho medo do que ele vai fazer amanhã.
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