É melhor eternizar as minhas palavras enquanto há tempo, a escuridão pode vir a qualquer momento e não quero ser surpreendido. Espero ter uma lanterna quando tal coisa acontecer.
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A Sociedade do Adeus
A maioria das pessoas odeia despedidas e isso é indiscutível! Os que não odeiam tal ato – ressalto que esta opinião é estritamente minha e pode ser a sua também – ainda não tiveram a oportunidade de amar de verdade alguém ou algo. Logo, se não gostamos de dizer adeus, qual é o porquê de insistirmos em deixar algo para trás? Ou algo maior, porque nos deixam sem quaisquer motivos plausíveis?
Desde já é bom relacionar o tipo de despedida a qual me refiro. Não estou tratando de deixar para trás alguém ou algo extremamente nocivo a você, só refletirei acerca de casos incomuns – sem interferências necessárias – onde há um hiato aparentemente inexplicável.
Você já teve que deixar alguém muito importante para trás? Eu já e foi um dos piores momentos da minha vida! Todo o sentimento começou sem muitas pretensões, no fundo sabia que doeria no início, porém eu insistia em dizer que tudo ficaria melhor com o tempo. As coisas até melhoraram, mas essa sensação de vazio no peito – algo tão intenso, profundo e avassalador – parecia me consumir até demais. Percebendo a minha condição mental nada favorável e preocupante, alguns amigos me recomendaram esquecer esta pessoa. Exatamente esta palavra: E-S-Q-U-E-C-E-R!
Por que esquecer?
Sempre odiei quando um amigo falava algo, eu perguntava o que era pois não havia entendido e ele dizia: “Deixa pra lá”. Por que deixamos as coisas para lá? Quando não queremos mais algo é simplesmente chutar o balde e tudo ficará resolvido?
Agora precisarei de toda a sua atenção, não respire, não pisque e evite pensar em qualquer coisa! Complicado, né? Pois bem, esquecer algo importante é exatamente como executar estas ações. Uma tarefa, para os que de fato tem boas lembranças de algo, torna-se quase como um desafio intransponível.
Um conceito que pode ser encaixado perfeitamente nessa dissertação: obsolescência programada. Calma, antes que você pegue uma pedra e me apedreje! Deixe explicar melhor o motivo de eu estar utilizando um termo mais tecnológico que social. Se você tem um raciocínio lógico mais apurado, com toda a certeza já deve ter compreendido onde quero chegar. De fato, precisarei recorrer a área da tecnologia para conseguir alcançar o cerne da questão.
Primeiramente, precisamos discorrer sobre o que é a obsolescência programada. É um bicho de 7 cabeças sedento por sangue virginal? NÃO! É algo bem mais simples e que se você compreender sua vida fará até mais sentido, acredite se quiser.
Sabe aquele seu primeiro celular, que sua mãe te deu e disse que seria a primeira e última aquisição tecnológica. Bom, todo mundo sabe que após alguns meses este celular começará a travar um pouco, talvez começará a esquentar e você começará a ficar irritado com o gadget (em alguns casos só queremos trocar porque lançaram um mais novo mesmo). Obs: Se ele fosse um Nokia tijolão isso não aconteceria. Acredite se quiser, este processo de degradação do seu aparelho foi programado, não houve uma preocupação especial em relação à sua validade e é do interesse da empresa que você continue consumindo ainda mais outros produtos deles. Consegue compreender este ciclo quase que infinito, uma frustração em busca de algo que nunca será durável? Estamos fazendo isso com as pessoas!
Não quero culpar ninguém especificamente, estou analisando a sociedade como um todo. Há muito tempo deixamos de ver pessoas como apenas indivíduos como quaisquer outros, viramos manequins numa imensa vitrine. Selecionamos e descartamos aqueles do nosso interesse, quando não estamos mais interessados é simples deixar para trás. Não sei onde o mundo pretende parar, mas precisamos parar de quantificar o valor de seres humanos, vidas com valores inestimáveis, ninguém é um mero smartphone que quando não queremos mais é só jogar fora.
Os relacionamentos viraram um gatilho da obsolescência programada e isso é preocupante demais. Não deveríamos estar progredindo? Não é isso que é pregado em praças, televisionado para milhões? Estamos caminhando em prol da liberdade ou estamos atrelado a um ciclo vicioso de desilusões?
É estranho fazer esta analogia entre pessoas e celulares num primeiro momento. Contudo, se você refletir um pouco acerca disso perceberá este tipo de comportamento muito presente no cotidiano. Esquecer pessoas é como deixar para trás aquelas lembranças do lançamento do iPhone 3G ou apenas dizer o clássico: “deixa pra lá”. Os valores foram deturpados e emoções foram deliberadamente ignoradas.
Eu sou um cidadão dessa sociedade!
Diante dessa torrente de informações pessimistas é impossível não conseguir enxergar um retrato que mostra a minha e a sua face. Mas não entre em desespero, não precisamos compactuar com este pensamento mais retrógrado que inovador, não há a necessidade de seguir uma linha de raciocínio deste tipo.
Rosseau afirmava categoricamente que “o homem nasce bom, mas a sociedade o corrompe”. Então como posso afirmar que não precisamos fazer parte da sociedade do adeus? Simples, você pode abraçar a ideia do suíço e viver uma vida completamente pessimista e sem muitas pretensões quanto a este tema ou pode tentar mudar essa sociedade corruptível.
Sei que muitas vezes pensamos na nossa finitude em transformar pessoas, mas pode ter certeza que temos poder para isso. Olha só como Rosseau, um suíço filósofo, teórico político e escritor, conseguiu incrustar uma ideia em nosso meio. Com persistência conseguimos valorizar as pessoas novamente, em algum tempo a mentalidade do seu meio começa a ser alterada e enfim alcançaremos a almejada ruptura com essa “obsolescência programada das pessoas”. Nunca fomos e não será por conta de uma ideia extremamente negativa que iremos objetificar os outros.
A sociedade da valorização
Eis aqui a sociedade onde quero morar e espero que você sinta-se à vontade para fazer parte da minha vizinhança. Não há a necessidade de um diploma do ensino superior, riquezas infindáveis, mas há uma obrigação: buscar compreender o próximo.
A problemática não estar em dizer adeus, quando há a necessidade de o fazer, por conta das adversidades inesperadas da vida, é a coisa mais dolorosa do mundo, contudo, não fazemos por mal. Não há como prevenir uma pessoa dos efeitos da despedida, isso é completamente pessoal e afeta cada um de uma forma única e o que cabe a nós e respeitar.
O convite que faço é para pararmos com esta comparação de “pessoas = objetos”. Acabamos banalizando os sentimentos humanos, pensamentos tão profundos que por conta de uma má atitude sofrem com sequelas para o resto da vida. Se analisarmos com um olhar minucioso, tais despedidas desnecessárias estão ligadas ao orgulho, ego exacerbado e a total falta de sensibilidade. Tais visões são criadas ao longo da vida pela sociedade e acabam sendo perpetuadas por gerações.
O mundo já sofreu revoluções memoráveis: revolução francesa, industrial, chinesa, russa e etc. Que tal lutarmos em prol da revolução da empatia, onde cada um buscará tratar o outro com total humanidade? O mundo clama por pessoas dispostas a deixar o “adeus” de lado em troca de um abraço, uma palavra amiga e uma troca de sorrisos.
Não precisamos de muito para uma felicidade plena, talvez deixar de lado o nosso eu seja o mais complicado. Só espero que reconheçamos nosso potencial antes do crepúsculo, antes que seja tarde demais.
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