Traduções do podcast Ars Paradoxica para o português brasileiro.
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16: Estufa
[uma brisa; vento à distância; Sally cavando no jardim dela; seca a testa, dá um suspiro feliz e volta a cavar; rádio sintonizando]
ESTHER ROBERTS (ER): “Relatórios indicam que a Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos sofreu uma série de mudanças previamente inesperadas na equipe, que resultaram em um considerável declínio na produtividade. Com poucos candidatos qualificados para preencher as vagas disponíveis, seria sábio, na minha humilde opinião, reconsiderar a distribuição de recursos militares, caso o resultado não melhore no próximo trimestre. Faríamos bem em nos atentar às advertências que foram as saídas abruptas de Jack Wyatt, Sally Grissom, e a contratada extrajudicial Maggie Elbourne, para que não acabemos nos vendo no comando de um navio naufragando–”
CHET WHICKMAN (CW): Chega, é o bastante. Pensei que tinha dito que sua última reunião tinha corrido bem?
ER: Eu pensei que tinha. “Inesperadas”? Aquele nojento–
CW: Esther, o que aconteceu?
ER: Ele é um lacaio duas-caras, foi isso que aconteceu–
[Chet bate na mesa]
CW: A esta altura, você devia saber que as paredes têm ouvidos.
ER: Deixe que ouçam! Hank Cornish está tentando tomar as rédeas da ADRA. O que nos lembra de que ele está atrás apenas dos próprios interesses. Sempre esteve, e “faríamos bem em nos atentar” aos nossos. E, francamente, se quer minha opinião? Faríamos bem em lembrar que estamos dividindo detalhes de cada parte essencial dos nossos planos com ele.
[rádio sintonizando; Sally em sua oficina; novela de rádio tocando ao fundo; um grilo cantando]
SALLY GRISSOM (SG): Mas gente, como você veio parar aqui?
[Sally se agacha perto do grilo, derruba algo]
SG: Archie, você não ‘tá ajudando.
[rádio sintonizando]
CW: Então, que parte da sua conversa com Hank–
ER: Nenhuma conversa levou Hank Cornish a pegar um avião para Washington e recomendar que, na “humilde opinião” dele, deveríamos ser desmontados para venderem as peças.
CW: Eu realmente nunca desejei ele por perto, Esther. Ele meio que veio com o serviço.
ER: Mas você está na chefia agora, tome um pouco de controle, merda! Não pode fazer de conta, por um instante, que está tão investido nisto quanto eu?
CW: É claro que estou tão investido quanto você, Esther. E estou intimamente consciente do quanto disso tudo é minha responsabilidade. Mas você insistiu em solucionar o problema sozinha. O que quer que façamos?
ER: Você sabe do que eu preciso. Estamos nos atrasando, e–
CW: Sally Grissom está for a de questão. Por sua veemente recomendação, aliás. Então, o que mais você sugere?
ER: Não sei ainda.
[rádio sintonizando; Sally pega o telefone e disca; som de processamento e um bip]
SG: Ei, Anthony. Então, pelo jeito uma vida simples te dá um tipo estranho de... esperança? Sobre o mundo? Isso soa como últimas palavras famosas. Talvez eu esteja consumindo Vitamina D demais. Mas bom, acho que finalmente estabeleci um ritmo em que posso viver. Parece que sou uma dissidente nessa história de jardinagem. Bom, eu seria. Agora ‘tou batalhando contra o sol ruim e o solo árido do Colorado. Mas acho que ‘tou ganhando.
[barulhos de estufa tecnológica]
Não é pra me gabar, mas ‘tou desenvolvendo meio que um– biodome, poderia-se dizer? Teve um filme? Deixa pra lá. Eu devia ter só plantado um cactozinho e começado uma coleção de selos ou algo do tipo, mas queria um desafio. Bom, a ideia é construir um espaço onde eu possa manipular o clima hiperlocal usando energia solar e... OK, é uma estufa. Você sabe o que é isso. Mas, a longo prazo– e essa é a parte mais legal– acho que se eu conseguir acertar o relacionamento simbiótico certe entre a flora e tipo, conseguir descobrir como fabricar células fotovoltaicas, poderia me tornar completamente autossustentável. Sonhe alto, né? ... É.
Ah, além disso, lembra aquela vez em que falei de desenvolver meu próprio fertilizante? Bom, ‘tou fazendo isso também. Tudo que precisei foi um pouco de leitura básica e algumas viagens ao florista pra amolar ele com perguntas vagas sobre condições ideias pra procriação, comportamento das plantas e informações obscuras sobre o clima Coloradano... Colo... Coloradense? Informações sobre o clima do Colorado, esse tipo de coisa. Mas a parte mais enervante é a espera. Procurar num catálogo físico, encomendar sementes, e daí esperar meses até elas serem enviadas pra você por correio. Tem valor sim em se desenvolver um senso de.. paciência, mas Jesus, onde estão os drones da Amazon Prime quando se precisa deles? Então, dito isso, comprei peras, salsinha, petúnias, tulipas e, sim, um cacto crescendo do lado de fora... e umas sementes de pitaia devem chegar em uns... seis meses. Ugh.
Hoje? O primeiro teste da “Exilir Milagroso da Dra. Grissom”. Prometo que vou inventar um nome melhor pra isso– vou começar assim que tiver testado essa nova leva contra o controle– pelo menos a composição química já passou do ponto em que corroía vagarosamente a cerâmica. Se tiver sorte, o espécime um da Bellis Perennis deve se desenvolver da semeação à maturidade completa em... aproximadamente 3 a 5 dias. Então acho vou te dar notícias de novo por aí. Falo com você em breve.
[rádio sintonizando]
CW: Um explosivo disfarçado de cigarro?
ER: Efetivo, mas não inteiramente prático.
CW: Parece simples o bastante.
ER: Talvez simples demais, na verdade. Parece que há um impulso de acendê-los–
CW: Esther, o que estamos fazendo aqui?
ER: Estamos pegando relatórios da CIA sobre dispositivos de campo e usando a Sala Escura para gerar dados sobre resultados práticos. Fornecendo testes de campo ao resto da história. É notavelmente efetivo.
CW: Parece um notável desperdício de recursos para mim.
ER: Eu resolvi o problema, como sempre faço. É um Band-Aid, mas é o melhor que podemos fazer na hora da necessidade, pelo menos até os juros compostos serem efetivados.
CW: Mas somos melhores do que isto. Esther, fala sério, sabe que somos melhores que... isto.
ER: Na verdade, não, Chet. Não desde–
CW: Não. Não diga o nome dela.
[rádio sintonizando]
SG: Então, mantenho minhas mãos ocupadas. Faço jardinagem. Mas e quando preciso manter minha mente ocupada? Plantar flores é um passatempo divertido, Partridge, mas não apaga meu fogo. Então voltei a construir coisas. Teve o tanque de nitrogênio, o borrifador automático. Daí, comecei esse projeto quixótico do biodome– mas isso não vai ir pra frente até eu descobrir como construir painéis solares decentemente eficientes, então ainda ‘tá na fase “caixa de vidro no meu quintal”.
Mas bom, comecei a procurar peças sobressalentes no armário e... encontrei a mochila com todas as coisas que vieram comigo de 20█. Tomaram todos os meus pertences, mas peguei eles de volta quando nos mudamos pra Ponto de Exílio, porque, né, naquele ponto a ADRA era praticamente seis pessoas e uma van. Tinha meu jaleco– ainda manchado desde que pintei um teste Rorschach com meu almoço no convés do Eldridge– minhas canetas, em toda sua doce, doce glória de tinta gel, um cartão de visitas, um recibo de uma pizza que sinceramente não me lembro de consumir.
E achei meu celular.
[Esther bate à porta de Sally]
SG: Tenho que ir, tchau.
[desliga apressadamente; outra batida; Sally vai até a porta e a abre]
SG: Roberts.
ER: Sally.
SG: Oi.
ER: Oi. Isto é para você.
[sacola de papel sendo passada]
SG: Hm, valeu? Pensei que tinha desistido de abastecer minha despensa.
ER: É uma cidade pequena. Não tenho visto você por aí, então pensei... Estou interrompendo? Ouvi você conversando–
SG: Com meu diário.
ER: Seu diário.
SG: É. Bom… entre.
ER: Você esteve se ocupando, Sally. Isto são...
SG: Abóboras. Pequenas por hora, mas quando chegar outubro? É a Grande Abóbora, Charlie Brown, você vai ver–
ER: Charlie Brown, o cantor de jazz?
SG: Não? Não, o garotinho… com o cachorro? A criança! Esquece.
ER: Uou, Sally, isto é… impressionante. Quanto disto é–
SG: –Não tenho certeza.
[Sally e Esther se interrompem]
SG: Ei, escuta, desculpa se/Oh/Foi mal, eu só ‘tava/hm/talvez se–
ER: Sally, eu só vim aqui dizer que/Oh/ Não, você primeiro/ Bom, eu–
[elas riem]
SG: Vá em frente.
ER: Obrigada. Olha. Só passei para dizer que… sinto muito sobre como tudo aconteceu. Eu sei que isto não é exatamente o que nenhum de nós previu–
SG: A ironia das ironias–
ER: Estou falando sério, Sally. Estou tentando me desculpar aqui.
SG: Não é culpa sua, Roberts. É?
ER: Provavelmente. Parcialmente.
SG: Bom, bom saber. Acho.
[rádio sintonizando]
SG: Costumávamos ser bem melhores nisso.
ER: Costumava ter quatro de nós. Costumávamos ser um time. Costumávamos ser muita coisa.
SG: O que somos agora?
ER: Amigas, pelo menos... eu esperava que sim.
SG: É difícil ser amiga de gente em quem não se pode confiar.
ER: Uma observação bastante astuta essa, de fato.
SG: A ADRA matou meu amigo. O Whickman em pessoa.
ER: Eu sei.
SG: E você ainda trabalha pra ele.
ER: Eu sei. Olha, eu já perdi Jack. Só porque tem esta toda nova série de coisas confidencias que não tenho a liberdade de dividir com você mais, não significa que estou interessada em perder a única outra– a única outra pessoa com quem não tenho que ficar pisando em ovos.
SG: Whickman sabe que você ‘tá aqui?
ER: Não, Sally.
SG: É uma pergunta válida.
ER: É, acho que mereço isso.
[rádio sintonizando]
ER: Então, o que a Dra. Sally Grissom anda fazendo?
SG: Comecei a acompanhar novelas de rádio e, apesar do que pode parecer, as plantas são uma ótima companhia. É meu pequeno “Victory Garden” – apesar de provavelmente ser meio exagerado dizer isso. É bom fazer algo com minhas mãos, mas não sei se gosto da razão por que todo mundo pensa que eu faço isso– mais de uma pessoa já me perguntou quando meu marido vai voltar da guerra. E tem um gato de rua que aparece de vez em quando– Nunca fui muito boa com animais, mas ele se apegou a mim na hora– ‘Tou começando a pensar que tem erva de gato em algum lugar no jardim. Mas ele é um completo... mimado? Ou pelo menos um pouco sobressalente na carência. Não sei se é de alguém, mas tenho chamado ele de Archimedes. Archie, pra simplificar. ‘Tou vivendo igual em A Vida em Preto e Branco mesmo... Mas bom, o jardim.
ER: O jardim.
SG: É… tranquilo. Pela primeira vez em muito tempo, sinto que tenho algo que posso chamar de meu. Tenho controle sobre algo que acontece na minha vida. Um lugar em que posso descansar e, bom, ‘tou desenvolvendo essa tecnologia–
[rádio sintonizando; cartas]
ER:[rindo] Sinceramente, não acho que o pobre garoto acreditou quando o contratamos. De repente, ele fica com medo de cada luz piscando e porta fechando no prédio inteiro. Ele é um doce, só não é... a pessoa mais brilhante do mundo.
SG: Como você ‘tá… fazendo isso?
[miado, derruba cartas da mesa]
SG: Que merda, Archie!
[rádio sintonizando]
SG: Ter Roberts por perto tem sido… bom. Mas agora fico com ciência na cabeça e ficar mexendo com terra e chuva falsa não ‘tá sendo mais o suficiente.
DR. FITZGERALD (DR.F): Hm. E o que está?
SG: Decidi ligar meu celular de novo. Não sei nem se ainda funciona. Espero que só precise da fonte de energia certa. Comecei a desmontar ele. Construí minhas próprias chaves de fenda especiais também. A bateria ‘tá... acho que o termo técnico é “ferrada”, mas a alimentação em si parece OK. Talvez um pouco empoeirada. Quebrei a tela no dia que voltei no tempo, na verdade. Não no Eldridge, como seria de se imaginar… Ele escorregou da minha mão quando eu ‘tava pegando um café.
DR.F: [ri] Um telefone portátil? Isso parece um passatempo digno. Você já me disse que ele é importante para você.
SG: O problema é que eu só tenho uma chance. Se errar, frito ele. Quer dizer, a coisa não aguentou nem ficar uns minutinhos no sol do lado de fora, no concreto... e não tenho exatamente condições de construir uma placa-mãe aqui, mas preciso replicar a energia da bateria de algum jeito...
[rádio sintonizando; cartas]
ER: Você está pegando o jeito... mas vai ter que pensar mais rápido se quer ganhar.
SG: Hm... Sete!
ER: Merda! A meio caminho de El Dorado. Vamos lá, pode mostrar.
SG: Espia e chora, Roberts.
[rádio sintonizando]
SG: E tenho meus projetos, é claro. Você pode tirar a Grissom do laboratório de ciência, mas não pode tirar o laborá– a ciência... da... Você me entendeu.
ER: Você poderia ter seu laboratório de volta se quisesse, sabe.
SG: Não. Já conversamos sobre isso–
ER: Eu só tinha que fazer minha diligência prévia... É por minha causa?
SG: Não, Esther, não é por sua causa. É...
ER: É tudo em que eu me jogo, o quão longe estou disposta a ir. Estão sou sim a causa, de certa forma. Porque é tudo minha escolha.
SG: … Bom, é, acho que sim. Mas não é só você, eu juro. Fora a coisa toda da ADRA, gosto muito de te ver. E adoraria ter você de volta comigo num laboratório, só... não um da ADRA. Então, enquanto as coisas forem assim, vou ter que recusar, por hora.
ER: Um ex me disse a mesma coisa recentemente.
SG: Ai, sério? Quando?
ER: Quando estávamos em Nova York, nos encontramos para tomar uns drinks, e uma coisa levou a outra… mas, quando acabou, ela me disse que é por isso que não continuamos juntas. Tenho pensado muito no assunto, e não tenho vergonha de querer coisas para mim. E, se isso significa que perderei amigos... Bom, é triste. É lamentável. Espero... Espero que possamos nos manter em contato assim.
SG: Ela, hein?
ER: … O quê?
SG: Você disse “ela”.
ER: Não– não disse não!
SG: Disse.
ER: Eu disse “ele”, eu–
SG: Isso explica… um monte de coisas.
ER: Você não pode contar para ninguém, Sally. Por favor, POR FAVOR, não conte a ninguém.
SG: Relaxa! Não precisa se preocupar sobre isso comigo. Eu sou assexual, eu entendo.
ER: Você é o quê?
SG: OK. Sabe como a maioria das mulheres gostam pra caramba de homem? Mas você, obviamente, gosta de mulher. Eu não gosto de ninguém.
ER: … Sério? Então, sexo–
SG: Nunca teve muito efeito pra mim. Tipo, é agradável, ou sei lá, mas... tenho coisas mais importantes no que pensar, sabe? Mas isso significa que também ‘tou na margem. Fora do sistema tradicional. Então entendo como é. O que também significa que não ligo com quem você...bate a bolacha? Como se diz atualmente? Dar um tapa na periquita? Fazer... nheco-nheco?
ER: Por favor, chega. Meu Deus.
SG: [ri] Tudo bem, eu paro. Mas feito.
ER: Feito.
[cartas]
ER: … A resposta é “bingo no banco de trás”, aliás.
SG: Uou.
[rádio sintonizando; cartas]
SG: Cinco a quatro. Mais uma antes de ir?
ER: Tenho que ir. Estou… feliz por você, Sally. Eu– … O que é isso?
SG: O que, o rádio?
[desliga o rádio]
ER: Não, a placa preta na sua mesa. Isso é algum tipo de... gravador? Parece... Não sei o que parece, para falar a verdade. Algo saído de um livro do Huxley.
SG: Meu telefone.
ER: Telefone?!
SG: É, você– bom, se funcionasse, você apertaria esse botão aqui, e apareceria uma... uma tela de TV, acho? Ela aparece e os números ficam aqui...
ER: Como você os discaria se– deixa para lá, não importa. Sharma lhe deu isso?
SG: Eu trouxe comigo. Pode… me devolver?
ER: Oh, claro. É só que… Desculpa. Eu não quis–
SG: Tudo bem, Roberts.
ER: Quer… falar sobre isso?
SG: Pensei que você tinha que ir.
ER: Quer dizer, eu devia, mas… mais uma partida?
SG: Claro.
[rádio sintonizando]
ER: Amelia disse que você queria falar comigo?
CW: Você a levou em uma viagem à trabalho, contou todos os nossos segredos para ela. E, agora, depois de informar a todos que o melhor curso de ação era deixá-la viver uma vida sem nós– citando suas exatas palavras– você vai visitá-la? Esther, o que diabos pensa que está fazendo?
ER: Dá um tempo, Chet. Ela já sabe de todos os nossos segredos. Já é metade deles, para começar.
CW: Não acredito que sequer estou tendo esta discussão com você.
ER: Por quê? Porque Hank Cornish não está aqui para apoiar sua lógica militar ridícula e paranoica?
CW: Isto não é uma competição de chilique. Não tenho a intenção de me envolver em um debate caloroso com você sobre cada uma das minhas decisões. Não sou Jack Wyatt. Sally Grissom escolheu deixar a ADRA. Quando eu lhe disse que entendia e simpatizava com ela– sobre não pertencer a este lugar e não conseguir voltar, sobre o que quer que tenha acontecido com ela quando ninguém estava olhando– fui sincero. Só não achei que ficaríamos mais dois anos bancando as babás dela.
ER: Ela passou um deles em coma!
CW: Estou tão cansado de ela não ter culpa de nada! A Timepiece é propriedade do governo dos Estados Unidos–
ER: Ela a inventou!
CW: E o Tio Sam pagou por ela. E então, Sally trouxe um estrangeiro, um agente desconhecido para esta base, munida de falsa autoridade e perseguida a tiros por combatentes inimigos. Não sou eu quem não refletiu sobre a situação.
ER: Chet, o mínimo que você pode fazer–
CW: Ela traiu nossa confiança! Repetidamente! Pensei que era uma aliada à nossa causa, mas nos atrasou por anos por razões mesquinhas e egoístas. Confiou em um homem que conhecia por minutos mais do que em nós, Esther. E ela nos conhece mais do que ninguém! Quero tomar as decisões certas e... se ela tivesse simplesmente vindo até mim, talvez eu tivesse a ouvido, talvez...
ER: Sally tem uma coisa que podemos usar. É... um telefone. Mas é mais que isso. Ela diz que é um gravador de voz compacto, uma câmera, um... árbitro de transmissão sem fio automática– telegrafia sem fio digital. Telecomunicação instantânea. De unidade para unidade, de qualquer lugar no mundo, usando satélites artificias. É um sonho de ficção científica. Você tem ideia do que poderíamos conquistar com uma tecnologia como essa? Isso poderia nos salvar.
CW: Se funcionasse. O que não é o caso. Já o vi antes.
ER: Ela vai consertá-lo. Você sabe que vai. Está determinada e não tem nada além de tempo nas mãos...
CW: E se, dadas as circunstâncias, Sally não estiver disposta a nos entregar essa “tecnologia revolucionária”?
ER: Então encontraremos um jeito.
CW: Isso não muda minha opinião sobre o seu envolvimento.
ER: Está sugerindo que sou incapaz de fazer isso?
CW: Estou dizendo que você sempre teve um carinho especial por ela. Considerou-a uma amiga. Achou adequado mentir para os seus superiores por ela quando teve que escolher.
ER: Isso foi antes.
CW: Estou lhe informando que, apesar do quão capaz é de realizar quaisquer tarefas que lhe passamos aqui, fico desconfortável com a ideia de se envolver pessoalmente. Nenhum comandante digno deixa os homens dele se jogarem em missões que exporiam as vulnerabilidades deles. Se não pode se confiar em você para conhecer os seus, então devia ficar agradecida que eu conheço.
ER: Você está sendo irracional.
CW: Essa é minha decisão final, Esther. Chega. É uma questão de segurança.
ER: Não, Chet, isso não é uma questão de segurança. É uma questão de sobrevivência. E sobreviver é algo que não faremos se ela não fizer. Não como uma organização, e não individualmente. Se tem uma ideia melhor, estou disposta a ouvi-la. Caso contrário, isso mais que cabe na jurisdição do departamento do qual você me colocou no comando. Não preciso da sua permissão. Preciso que não entre no meu caminho.
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom. 8 de agosto de 1950. É real. ‘Tou carregando meu celular com a bateria do meu carro, e cruzando os dedos pra não fritar o carro ou o único smartphone em toda a existência. Queria muito fazer uma bateria de batata, mas fiz as contas e precisaria de batatas o bastante pra sobreviver a um inverno em Marte, então não.
Você não acreditaria no trabalho que tive pra fazer a entrada de USB… [suspira] Senti saudade dessa coisa. Esqueci como é o peso na minha mão, a luz da tela. Uma extensão do meu corpo. Enfim, meu braço direito está completo de novo.
Parte de mim sente que eu devia ter ido com Sharma quando tive a chance. Fiquei indecisa, e isso custou a vida dele– e agora parte de mim sente que perdi a minha também. ‘Tou presa aqui. Desperdicei minha chance.
O grande motivo de eu ter querido ficar aqui foi porque não queria me sentir tão sozinha e... olha só onde ‘tou agora. Cercada por um bando de plantas exóticas, um celular que não funciona direito, um ótimo hobby e uma vida General Mills perfeitamente genérica– em uma cidade com pessoas amigáveis, “bom dias”, e um café da manhã que leva quinze minutos pra percolar no fogão, e nunca me senti tão entediada na minha vida inteira.
“Viva o sonho pastoral”, eu disse a mim mesma. “Esqueça tudo sobre viagem no tempo”, eu insisti. Valeu mesmo, eu passada. ‘Tá funcionando super bem.
Tenho uma vizinha que traz café da manhã pra mim às vezes. Ela não faz perguntas. Dividimos uma cerca. Dá pra ver a cozinha dela da janela da minha. Só aparece com a cabeça na porta de trás de vez em quando e pergunta se eu ‘tou com fome– igual a um animal perdido.
Tem um velhinho que fica sentado na parada de ônibus na minha esquina. Todo dia, na mesma hora. Ele ajeita a gravata, lê o jornal. Se passo por ele, tira o chapéu, coloca ele de lado. Lê as piadas das tirinhas pra mim, como se fossem a coisa mais engraçada do mundo. Ele é... gentil. Ri demais, e as piadas são estúpidas. Mas é gentil.
Sempre olha pra mim pra ver se ‘tou rindo, também. E penso muito sobre isso, qual seria o equivalente disso no meu tempo– e daí me lembro que nunca vou descobrir.
[celular liga]
Ai meu Deus. ‘Tá ligado. O único verdadeiro remanescente de 20█, a única prova do mundo de onde eu vim. ‘Tá do jeitinho que deixei ele! Menu entulhado, mensagens de pessoas com quem eu já não falava há uma década ANTES de voltar no tempo. Oh, olha essas fotos! Teve uma festa da casa da Beth, a fantasia de Dia das Bruxas que o Jamie ‘tava fazendo, não... acredito que ‘tá tudo aqui. [sobressalto] Minhas mensagens de voz. Minhas mensagens de voz de verdade...
[rádio sintonizando]
MV1: Ei, Doutora Grissom. É a Kayla. Hm, Rogers. Do pessoal? Você disse pra eu ligar se um dia– bom, liguei pra dizer que ‘tou parada na 35. O GPS diz que teve uma batida e que devo ficar aqui por uns 21 minutos, então vou chegar no trabalho um pouco atrasada. Ah! E, hm, sei que você normalmente não vai a essas coisas, mas Jamie, eu e alguns outros vamos sair pra beber na sexta. Você devia ir, se quiser. Sair com a gente. Tenho que ir. Te vejo em breve!
[rádio sintonizando]
MV2: Olá, olá, Cabeção! Não sei por que esperei que você atendesse o telefone. Escuta aqui, ‘tou na cidade! Indo pro sul. Me manda uma mensagem. Podemos nos encontrar e botar a conversa em dia. Saudades da sua cara. Pode me contar o que anda te isolando do mundo ultimamente.
[rádio sintonizando]
MV3: Boa tarde, SALLY GRISSOM. Estamos lingando sobre sua assinatura da Popular Mechanics. Estamos ligando para perguntar se está desfrutando de sua assinatura digital–
[rádio sintonizando]
Grupo de Pessoas: FELIZ ANIVERSÁRIO, SALLY!
Mãe de Sally: Ei, amor, é sua mãe. Sei que não conversamos tanto quanto gostaríamos, mas–Sally, quero que saiba que amo você, e que acho que seu futuro será brilhante. Estou tão orgulhosa de você, querida. Me ligue quando puder. Sentimos saudade.
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom. Mesmo dia de antes. Consegui o que queria, mas vou–vou me livrar do telefone. Definitivamente não quero ele, e Roberts nunca vai parar de pedir, porque, puta merda, taí uma coisa útil pra ADRA ter.
[Sally esmaga o celular]
‘Tá feito. Agora ninguém fica com ele. É parte do passado. Ou seria, se não fosse literalmente parte do futuro. Parte do meu passado. E ‘tou colocando ele pra trás. E já até sei o que vou plantar em cima dele: crisântemos chineses. As sementes chegaram hoje. Vai ser ótimo. Vai ser ótimo.
[rádio sintonizando]
CW: Então, conseguiu o aparelho?
ER: Mandei meu pessoal revistar a casa dela quando saiu. Nenhum sinal dele.
CW: Mande um agente para pegá-lo de lá enquanto ela estiver em coma. Agora que sabemos onde está. Coloque de volta se um dia ela procurar.
[interfone tocando]
ER: Sim?
AMELIA: Senhorita Roberts, você está sendo requisitada no átrio. As crianças estão aqui.
CW: … Crianças?
ER: Também não sei.
[campainha]
ER: Já estou indo.
[gravador de fita desliga]
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15: Borboleta
[gravador de fita liga]
SALLY GRISSOM (SG): Diário de Sally Grissom. 18 de novembro de 1949. Primeira gravação no novo gravador. Não falo com ninguém fora esse diário há… há um bom tempo. Hm... Ainda não consigo me forçar a, hm, sair de casa. Não... Não quero estragar nada. De novo.
Às vezes eu acho que o universo tem algo contra mim, sabe? É como se o passado ‘tivesse se vingando, com raiva de todas as coisas que eu fiz desde que deixei meu lugar certo no tempo. Fico pensando em tudo que deu errado, e como tudo acaba se voltando contra mim. Aí, me lembro que o passado não pode se vingar, e que a grande merda em chamas da vida e a tragédia da física só meio que são uma bosta mesmo! Pelo menos o universo não ‘tá nem aí pra mim!
Deus do céu, até quando eu acho que finalmente posso fazer as coisas pelas razões certas, vai tudo à merda! Eu tento fazer um pouco de bem, trazer algo de bom a um mundo com tanto de ruim, e eu...
Não foi só o Sharma. Quer dizer, quem sabe onde Partridge, ou Barlowe, ou Wyatt, ou Whickman, ou qualquer um deles estaria, o quão melhor poderiam estar, sem mim. Uou, eu sou depressiva assim em público? Cara.
Roberts veio me ver algumas vezes. Apesar do que eu disse sobre ela, apesar de quaisquer planos de Esther que ela possa ter, é bom quando vem ver como eu ‘tou. Mas ultimamente ela tem me pressionado pra ir a esse médico, um psicólogo de quem ela tem o contato. E, eu sei, sei que saúde mental é coisa séria, sei que procurar ajuda não é vergonha nenhuma, e é, OK, talvez eu esteja meio... desgastada nas pontas. Mas não posso, simplesmente não posso assumir a responsabilidade de tocar a vida de mais uma pessoa. Não posso ficar jogando pedras no laguinho quando as ondulações se transformam em tsunamis! Tenho que fazer tudo que puder, daqui pra frente, pra conter meu impacto. Pra minimizar o dano. Pra não trazer ninguém novo pra minha vida.
[rádio sintonizando]
MAGGIE ELBOURNE (ME): Aqui é Maggie Elbourne, sou assistente de pesquisa do Dr. Aldous Carling, e estas são as minhas anotações sobre a nova análise comportamental comissionada pela Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos dos Estados Unidos. Fui instruída a gravar observações detalhadas sobre o estudo, assim como meus pensamentos sobre o processo. Então, aqui está a Fita 1: Descrição e Plano de Fundo.
A ADRA nos contratou para desenvolver e realizar uma série de testes para examinar os efeitos de um novo... equipamento, na psique humana. Essa máquina, de codinome Timepiece, eu... até agora hesito em acreditar totalmente nos documentos, mas suponho que é necessário se queremos chegar a algum lugar. Mandaram pedaços de uma máquina que, quando ativada, transportará objetos de volta no tempo. Expressei minha descrença de que tal coisa seja possível ao Dr. Carling. Prefiro ser enfiada de novo nos Relatórios e Arquivos do que desperdiçar meu tempo sendo feita de boba. No entanto, o Dr. Carling me garante que a máquina faz mesmo o que diz na caixa. E, além disso, não posso desenvolver um experimento com ela direito sem primeiro aceitar a premissa como verdade. Então é o que farei.
Quero deixar claro de novo que este estudo foi comissionado por uma agência governamental, para fins de examinar a eficácia desta máquina para uso em guerra. Eu gostaria... que não fosse esse o caso. Mas a ciência são as velas, não o leme, e somente posso pesquisar aquilo que me foi requerido. Pelo menos... por hora.
Os documentos da agência se referem a, e aqui os cito, “efeitos adversos no estado mental do operador frente a uso prolongado ou intenso”. E é aqui que começo. Preciso observar esses efeitos adversos se tenho que apresentar um relatório detalhado.
[rádio sintonizando; escrevendo; levanta, abre a porta, “Primavera”]
SG: Não, eu devia ir–
DR. FITZGERALD (DR.F): Senhorita Sally Grissom?
SG: Doutora– aah, merda…
DR.F: É claro, perdoe-me, Dra. Grissom. Sou o Dr. Fitzgerald. Entre.
SG: Na verdade, Dr. Fitzgerald, eu ‘tava justamente pensando que… eu não preciso me consultar de verdade.
DR.F: Sally, normalmente não temos consciência da ajuda que precisamos até ela nos ser oferecida...
SG: Não, não. Eu já disse demais. Eu não devia nem ‘tar aqui. Tenho certeza–
DR.F: Sally. Você já está no meu consultório. Tem uma consulta marcada. Não tenho nada senão tempo para você.
[Sally entra no consultório]
SG: Você não faz ideia do quão certo ‘tá, Doutor.
DR.F: Como assim?
SG: … Não quero falar sobre isso. Desculpa ter tocado no assunto.
DR.F: OK. Sem problemas. Podemos falar do que quer que você queira. Tudo bem eu lhe chamar de Sally?
SG: Claro, eu acho.
DR.F: Sally, o que lhe trouxe aqui hoje?
SG: Bom, hm… Eu…
DR.F: Tome um tempo para compor seus pensamentos.
SG: … ‘Tou com medo de sair de casa ultimamente. Ou melhor, minha casa, o quintal e a garagem, até a caixa de correio...
DR.F: E ainda assim, aqui está você.
SG: Eu sei. Eu sei! Aqui estou eu. Esse é o primeiro dia em… um tempo. Dias.
DR.F: Quantos?
SG: Não sei ao certo…
DR.F: Sally. Aprecio que você tenha seus próprios segredos. Coisas que não quer dividir comigo. Por que o faria? Acabamos de nos conhecer. Mas, se vai mentir para mim, então isto aqui não vai funcionar. Lembre-se, tudo que acontece aqui fica entre nós.
SG: … Três semanas.
DR.F: Isso é… isso é bastante tempo. O que lhe fez mudar de ideia hoje?
SG: Roberts ameaçou parar de me trazer comida.
DR.F: Lembro de conversar com a Srta. Roberts. Ela é... bem meticulosa. Acha que ela o faria?
SG: É. Acho sim. Roberts é um doce, mas ela... é implacável.
DR.F: Acredito em você.
SG: E, pra falar a verdade, eu posso ser um pouco teimosa.
DR.F: Você não seria a primeira pessoa a hesitar procurar psicoterapia.
SG: É, mas pelo menos admito que preciso de um pouco de ajuda. Então aqui estou. Mas queria não ‘tar.
DR.F: Por quê?
SG: Queria não ‘tar tomando o seu tempo. Deslocando o seu tempo.
DR.F: Isso se chama “agendar”.
SG: Não, não fui clara. O que você estaria fazendo agora, se eu não tivesse marcado minha consulta pra hoje?
DR.F: Bom, imagino que estaria trabalhando nas minhas anotações sobre os outros pacientes na minha escrivaninha.
SG: OK. Então você teria feito suas anotações e seu dia teria terminado uma hora mais cedo. Digamos, às seis em vez das sete.
DR.F: Tudo bem, Sally, eu tenho bastante tempo–
SG: Você sairia do trabalho às seis, chegaria em casa em torno das 6:20 e faria o seu jantar. O calor subindo do seu forno se mistura com o ar e cria uma bolha de temperatura. Um gavião voando sobre a sua casa passa pela bolha, sobe até o topo das árvores e de lá vê o jantar dele: um rato-do-campo. O gavião caça o rato, o rato morre. O gavião come o jantar dele, e você o seu. ‘Tá tudo bem. Mas: você ‘tá aqui comigo. Suas anotações vão demorar mais uma hora. Você não vai fazer o jantar até às 7:20. O gavião não passa pela bolha, o rato sobrevive pra correr pra dentro de uma casa, uma dona de casa de classe média usando xadrezinho pula na mesa, escorrega e quebra o pescoço. Bang, minha presença no seu consultório matou mais uma pessoa inocente!
DR.F: … Mais uma?
SG: Já tenho sangue o suficiente nas minhas mãos. O suficiente pra uma vida inteira. Não preciso de mais.
DR.F: … Quero voltar na coisa do sangue depois, mas primeiro, uma pergunta: E se eu, durante minha volta atrasada para casa, atropelar o mesmo rato com meu carro?
SG: Hã?
DR.F: Talvez, se eu fosse mais cedo para casa, um caminhão atravessasse o sinal vermelho e me acertasse no caminho. E se a barriga cheia do gavião devastar a população de ratos daqui? E se a dona de casa fosse terrível, e merecesse uma morte rápida?
SG: [risada] Ela teria que merecer mesmo.
DR.F: O que estou dizendo, Sally, é que tem muita coisa que está fora do seu controle aqui. Você não simplesmente apareceu no mundo hoje, do nada. Esteve afetando as pessoas ao seu redor sua vida inteira. Não pode ter controle sobre tudo, e não deveria se deixar preocupar sobre o que não pode controlar.
SG: Ha! Sabe o que aconteceu com a última pessoa que disse isso pra mim? Ele acabou preso em uma CELA pro resto da vida.
[rádio sintonizando]
ME: Maggie Elbourne, experimento #1. 4 de dezembro de 1949. Tenho aqui comigo minha primeira cobaia: Cronos. Diga oi, Cronos.
[camundongo na gaiola]
ME: Para começar, condicionei o comportamento de Cronos na última semana para apertar um botão quando ele tiver fome. Ao longo da semana, ele simplesmente recebeu a comida quando apertou o botão. Hoje, vou modificar o mecanismo. Em vez de liberá-la, o botão agora vai acionar um cronômetro, programado para uma hora. Assim que a contagem chegar a zero, a Timepiece vai ativar e emitir radiação de volta no tempo, se entendo bem, com uma assinatura radioativa única. Conectei um sensor ao dispensador de comida, e ela só será liberada quando o sensor receber a assinatura. O objetivo é criar uma versão dos eventos em que Cronos não é alimentado e continua com fome, e uma versão reescrita dos eventos em que, pelas estimativas da nossa pequena pioneira aqui, tudo se dará como sempre. Espero que isso seja suficiente para induzir os efeitos adversos da viagem no tempo, e que eu possa prosseguir a partir daí.
[camundongo na gaiola]
ME: Vamos lá, já tem quase uma hora. Esta coisa sequer está fun–
[Timepiece ativa; rádio sintonizando]
ME: Resultados do experimento: Depois de uma semana de atividade da Timepiece ativada pelo botão, Cronos continua o mesmo. O humor dele está estável; ele continua cheio de energia. O peso continua igual. Todos os dados indicam que Cronos está tão saudável quanto quando chegou. Cheguei à conclusão de que é necessário mais que uma simples mudança no ambiente temporal de um indivíduo para induzir malefícios. Agora, com o básico fora do caminho, vou precisar tentar uma técnica diferente.
[rádio sintonizando]
DR.F: Como foi sua semana, Sally?
SG: Foi OK. Acho.
DR.F: Você fez aquilo que conversamos sobre?
SG: Sim. Fiz.
DR.F: E?
SG: Meio que… deu errado.
DR.F: Como assim?
SG: Bom, eu ‘tava tentando sair mais e falar com mais gente, como você sugeriu. Só jogar conversa fora. Ouvir as pessoas. Aprender sobre a vida delas, observar que podem interagir comigo e não acabar... descarrilhadas. Mas fui fazer compras, e o caixa... Bom, ele costumava me ligar.
DR.F: Hm. E como foi a interação de vocês?
SG: Ele disse que me ligava, e que sentia falta de ouvir a minha voz.
DR.F: E como você se sente sobre isso? Encontrar um ex-namorado pode ser estressante.
SG: … Quê?
DR.F: Bom, você disse que ele era um dos seus pretendentes...
SG: Oh, ha, não, não, não. Esse tipo de coisa não é bem a minha.
DR.F: O que não é a sua, amor? Ou relacionamentos românticos?
SG: A coisa toda nunca foi a minha praia.
DR.F: Sally, todos nós merecemos–
SG: Vou ter que te parar aí mesmo, Doutor. Sou perfeitamente feliz sem alguém na minha vida. Não sou “incompleta” só porque não quero um homem me dizendo o que fazer. Ele não era um “pretendente”.
DR.F: Então o que você quis dizer?
SG: Até algumas semanas atrás eu tinha essa máquina, a Secretáriatron. Eu gravava mensagens nela pra quando não podia atender o telefone. E era a maior sensação na cidade. As pessoas ligavam só pra ouvir ela. Aparentemente, o caixa era uma dessas pessoas.
DR.F: OK. Então ele costumava ligar para a sua Secretáriamagi–
SG: Secretáriatron. Sim. Durante o coma, pelo jeito ele ligava bastante. Conheceu a esposa dela quando ouviu ela falando sobre o assunto por acaso. Enquanto eu ‘tava em coma, eles se casaram.
DR.F: ...Oh.
SG: Pois é. Acho que eu… apresentei eles, de certa forma. Nunca teriam se conhecido se eu não ‘tivesse aqui no...
DR.F: No passado?
SG: … Roberts te contou.
DR.F: Ela levou em consideração a última vez que você foi a um psicólogo que não sabia sobre sua, hm, “posição singular”, e como no fim ele quis lhe mandar para o hospício. Eu estava esperando você mesma me contar. Espero que não se importe.
SG: É o meu fardo. Estou aqui já faz seis anos. Já ‘tou bem acostumada. Como você se sente sobre isso?
DR.F: Vou admitir, pensei que ela estava louca, ou que você estava. Mas nossa amiga em comum tinha como comprovar sua história, então, ou é verdade, ou isto é um episódio de The Candid Microphone e, se for o caso, eu gostaria que o Sr. Funt se revelasse.
SG: Se isso é uma pegadinha elaborada, é novidade pra mim, e bem possivelmente a pior coisa que já fizeram comigo. Devo ser uma esquisita no meio dos seus pacientes, né?
DR.F: Na verdade, Sally, o que está passando me parece mais normal que imaginaria. Você foi exilada da sua terra natal–
SG: Ponto de Exilada–
DR.F: –E separada da sua cultura, dos seus velhos amigos e família. Sua língua é diferente, seus ideais e valores são estranhos para nós. Pode ter uma história mais complicada que um estrangeiro que cruze com você na rua, mas sua narrativa não é menos familiar.
SG: Então ‘tá dizendo que eu sou entediante?
DR.F: Não sei. Talvez você possa me contar a história de como veio parar no passado?
[rádio sintonizando]
ME: Maggie Elbourne, experimento #2, 3 de janeiro de 1950. Comigo hoje, tenho minha última cobaia: Hermes. Hermes foi treinado para completar este labirinto. No centro do labirinto, há um botão que ativa a Timepiece. A Timepiece está programada para mandar radiação para quinze minutos antes de o botão ser apertado. Assim que o sensor detectar isso, sincronizado, é claro, com a assinatura radioativa específica, ele abrirá a porta da gaiola e Hermes começará o percurso. Nos testes preparatórios, o tempo médio de Hermes nele foi dois minutos e sete segundos.
Este experimento vai acompanhar o tempo de Hermes para completar o labirinto quando exposto a pequenas flutuações na história pessoal, especificamente, ao tempo variável de abertura da porta do labirinto. O intervalo de transmissão fixo da Timepiece permitirá que eu grave o tempo gasto pela cobaia independentemente da iteração em que o teste está acontecendo, uma vez que eu mesma não serei capaz de distinguir entre as iterações. Esses experimentos ficaram complicados rapidinho, nossa.
Iniciarei o ciclo manualmente às 16:30.
[fita acelera; som de cronômetro]
ME: OK, está quase na hora… 5… 4… 3… 2… 1…
[campainha]
ME: 16:30 em ponto. E lá vai ele!
[rádio sintonizando; campainha]
ME: Oh, e começou! Horário de finalização: 16:17:10. Isso dá dois minutos e dez segundos para a primeira volta.
[rádio sintonizando; campainha]
ME: Oh, e lá foi ele! Horário de finalização: 16:04:28. Isso faz desta a segunda volta. Média de dois minutos e catorze segundos.
[rádio sintonizando]
ME: –Terceira volta, média de dois minutos e 21 segundos–
[rádio sintonizando; distorção estática]
ME: –Quarta volta, eu acho? Média de... dois minutos e trinta segundos.
[rádio sintonizando; distorção estática]
ME: –seria a quinta volta… Ele… Hm. Hermes está trombando muito nas paredes. Ele...
[Hermes tromba nas paredes]
ME: Nossa, essa foi bem forte, eu... Oh, Hermes!
[rádio sintonizando]
ME: Esta é a quinta volta… Não, não pode ser a quinta, com só cinco minutos de acréscimo. Ele não pode ter solucionado o labirinto cinco vezes em menos de cinco minutos... Esta deve ser... Nossa senhora, Hermes!
[rádio sintonizando]
ME: Oh, e lá vai ele! Horário de finalização: 15:13:25. Isso faz dessa a... Hermes? Ele… Ele não está se mexendo.
[rádio sintonizando]
ME: Resultados do experimento: Pelos meus cálculos, Hermes foi capaz de completar o labirinto sete vezes antes de ficar incapacitado, com uma média de quatro minutos e três segundos. Mesmo essa média está bem além dos dados de controle, e tenho que assumir que o decaimento ficou pior com o tempo, ou melhor, com cada iteração do labirinto, até que Hermes ficou sobrecarregado. Bom, estou tentando achar resultados tangíveis dos efeitos adversos da Timepiece... acho que encontrar Hermes morto na linha de partida foi exatamente o que eu pedi.
[rádio sintonizando]
SG: –E ele olha pra mão dele, e ela ‘tá tipo, desaparecendo aos poucos. E ninguém entende o que ele ‘tá tocando, exceto o guitarrista, que liga pro primo Chuck dele, que é o Chuck Berry, e você–
DR.F: Sally, Sally, eu sei quão importantes filmes são para você, mas poderia responder minha pergunta?
SG: Que foi?
DR.F: Por que você acha que sua presença no passado tornou o mundo objetivamente pior?
SG: O que sequer é “pior’, hein? Veja bem, um otimista espera que esse seja o melhor de todos os mundos possíveis. Um pessimista sabe que é. E, por mais que eu tente pensar que minha máquina do tempo vai fazer do mundo um lugar melhor, eu sei que ela não trouxe nada além de dor pras pessoa. Incluindo eu! Especialmente eu!
DR.F: Você disse “sua” máquina do tempo. Ainda sente uma noção de propriedade pela Timepiece?
SG: É claro que sinto! Tudo isso aconteceu por minha causa. Eu construí a merda da coisa em 20█, e aí construí ela de novo em 1945. Eu me debrucei sobre mecânicas orbitacionais obscuras por hor– … Ai meu Deus!
DR.F: O quê?
SG: Quando eu ‘tava construindo a Timepiece, nunca fatorei na expansão do universo!
DR.F: Não sei o que você está dizendo... Cometeu um erro enquanto construía a Timepiece?
SG: Sim! É claro! Como eu não percebi isso? Como a Roberts não percebeu? Uou, não acredito que funcionou mesmo assim. Desculpa, me distraí. Onde eu ‘tava?
DR.F: Estava falando sobre sentir que a Timepiece é sua. Ela é um fardo para você?
SG: Tantas pessoas se machucaram por minha causa. Algumas morreram. Bill Donovan estaria vivo hoje se não fosse por mim. Então é, é um fardo.
DR.F: Pelo que você me disse, parece que o conflito entre Bill e Anthony não tinha nada a ver com você. Eles trabalhavam juntos antes de vir para cá. Não é possível que eventos similares tivessem acontecido sem você aqui?
SG: Sim, mas eu piorei a situação. Minha presença pode não causar dano, mas certamente catalisa.
[rádio sintonizando]
ME: Maggie Elbourne. Experimento #3 com a Timepiece, 8 de fevereiro de 1950. Com provas definitivas de que viagem no tempo tem um efeito diferente de zero no comportamento de camundongos, estive tendo dificuldades de desenvolver um experimento que me permita explorar as causas e consequências (se é que podem ser chamadas assim) dos sintomas sem causar dano a um número assombroso de camundongos. Fico... desconfortável com a ideia de machucar um ser vivo, se isso pode ser evitado. Levei minhas aflições ao Dr. Carling, mas pareceu imperturbado. Ele me “aconselhou” a continuar com o trabalho. Ele me disse bem sucintamente que não vou chegar a lugar nenhum neste mundo se não estiver disposta a sujar um pouco minhas mãos. Pode acreditar, Dr. Carling, a ameaça velada não passou despercebida.
Não sei se ele espera que eu não fale sobre isso nas gravações. Mas não sou amedrontada tão facilmente. Então, qualquer que seja a autoridade para que isso é enviado: Se eu não continuar estes experimentos, minha carreira será arruinada. Não sei se tem alguém ouvindo que ligue para isso. Mas não vou abaixar a cabeça e deixar que me mandem abandonar o trabalho da minha vida. Então... espero que isso sirva de justificativa para o que estou prestes a fazer
Este experimento foi instituído em três fases, em três cobaias: Cloto, Láquesis e Átropos, as três Moiras, e mais três outros camundongos.
Fase 1: Treinei cada um dos camundongos para receber comida depois de pressionar o botão.
Fase 2: Para cada cobaia, um parceiro foi introduzido em uma gaiola adjunta. O botão localizado na gaiola do parceiro o recompensará com comida, mas a cobaia receberá um pequeno choque elétrico.
E agora, na Fase 3, vou remover os parceiros e substituí-los por versões futuras das cobaias, mandadas de volta no tempo. Planejo observar o comportamento dessas novas cobaias, as “Segundas Moiras”, quando virem suas eus passadas receberem os choques que se lembram de receber.
[Timepiece acelerando; colocando camundongos na gaiola]
ME: OK, meninas, aqui vamos nós.
[Timepiece ativa; rádio sintonizando]
ME: Maggie Elbourne, experimento #3 com a Timepiece, 1º de fevereiro de 1950. Estou começando a Fase 2 hoje. Estou prestes a introduzir os parceiros nas gaiolas... O mecanismo de choque foi testado, e não gosto dele, mas–
Oh. Já… Já tem camundongos nas gaiolas. Esta é, suponho, a Fase 3.
[rádio sintonizando]
ME: Resultados da Fase 3. A Cobaia Cloto passou esta semana como passou a primeira: apertando o botão e recebendo comida e, portanto, dando choques na Cloto mais nova. Ela parecia indiferente à dor da sua eu passada, mas se isso era inerente à personalidade de Cloto ou se foi induzido pelo deslocamento temporal, é difícil dizer.
A Cobaia Láquesis definitivamente reconheceu sua eu passada. Ela se recusou completamente a pressionar o botão, apesar da fome. Havia momentos em que olhava para fora da gaiola, como... como se estivesse pedindo ajuda. Contudo, teve sucesso em alterar a experiência dela: a Láquesis mais nova passou a nunca ter recebido nenhum choque. Eu me pergunto se, quando eu a mandar de volta no tempo desta vez, ainda vai saber que não deve apertar o botão. Pode muito bem ter salvado a si mesma.
Mas a Cobaia Átropos… fez jus ao nome dela. Acredito que também conseguiu reconhecer o efeito do botão nela mesma. Em vez de parar de apertá-lo, no entanto... Átropos começou a apertar o botão rapidamente, ignorando a comida que recebia a fim de pressioná-lo de novo e de novo e de novo. Tive que desconectar o mecanismo do botão da gaiola dela. Ela teria... Mas preciso manter a integridade do experimento, então não podia deixá-la chegar tão longe. Basta dizer que acho que Átropos continuará se lembrando dos efeitos do botão. Eu sei que eu vou.
[rádio sintonizando]
SG: ‘Brigada por aceitar me receber tão em cima da hora.
DR.F: Sem problemas, Sally. Está tudo bem?
SG: ‘Tá, só estou com… Anda difícil dormir.
DR.F: Há quanto tempo está com problemas para dormir?
SG: A última semana. Hm, duas semanas… Mês… O tempo inteiro que estive vindo aqui… Desde Sharma.
DR.F: Por que não disse nada antes? Você foi tão direta quanto à sua agorafobia!
SG: Pensei que pudesse lidar com isso sozinha. Noites insones não são novidade pra mim. Mas, em sete dias, dormi nove horas, e não posso continuar assim.
DR.F: O que está mantendo você acordada?
SG: O que você acha? Alguém já morreu na sua frente alguma vez?
DR.F: Não, e certamente não de um jeito tão violento quanto o Sr. Sharma–
SG: Dr. Sharma. Assisti ele ser brutalmente morto à queima-roupa e à sangue frio por um dos meus mais queridos amigos. Senti os últimos suspiros de vida deixarem o corpo dele sufocando.
DR.F: Isso deve ser profundamente estressante. O que acontece quando você tenta dormir?
SG: Não sei, o que você acha que acontece? Eu não durmo. Eu só...Pode me receitar um Zolpidem, ou algo do tipo? Espera, acho que vocês não têm Zolpidem. Heh, têm metaqualona? Existe hoje em dia? Não dá pra me descolar uma meta?
DR.F: Não receito medicamentos, Sally. Tento lhe ajudar a entender por si própria por que está com dificuldade de dormir. Talvez sugerir algumas técnicas para você experimentar.
SG: Não, não quero me fazer dormir, preciso de algo que me desacorde, que eu não tenha escolha. Tipo, ‘cês têm NyQuil? NyQuil serviria.
DR.F: Quanto remédio para dormir tem no futuro?
SG: Muito. Se você fosse de onde eu sou, ia querer ‘tar dormindo também.
DR.F: Você está dizendo que não “quer” dormir, apesar de saber que precisa?
SG: Tipo, eu quero dormir. Sei lá. Mas a ideia de ‘tar dormindo... só não quero ir embora de novo.
DR.F: Como assim “ir embora”?
SG: Eu sei que é idiota, mas, desde que acordei do meu coma, sinto que vou perder as coisas.
DR.F: Não é idiota. É perfeitamente normal temer que um evento traumático se repita.
SG: Perdi tanta coisa no tempo que fiquei ausente. Toda vez que fecho meus olhos, me pergunto se vou acordar de novo.
DR.F: Entendo essa ansiedade. Um tema recorrente das nossas sessões é um sentimento de que você foi injustiçada pelo próprio tempo. Dormir deve dar a sensação de que está sendo roubada.
SG: OK, é loucura, eu ‘tou louca, eu sei, mas… ‘tou sempre com medo do que vai me passar desapercebido.
DR.F: De novo, Sally, apesar de a sua existência certamente ser atípica, suas esperanças e medos são divididos por várias outras pessoas. Você não está louca.
[rádio sintonizando; distorção estática; camundongo na gaiola]
ME: Aqui é Maggie Elbourne. Faz quatro meses desde que comecei esta linha de estudo para lá de apavorante. Nesse período, minha área de trabalho se transformou em uma pilha de camundongos enlouquecidos ou mortos pelo que fiz com eles. Tenho pedido repetidamente ao Dr. Carling que entregue o projeto a outro pesquisador. Ele recusou todas as vezes.
E ele sabe. Sabe que farei o que quer que mande porque não posso perder minha posição aqui. Porque, se eu recusar fazer o que ele me diz, vai sujar meu nome, e nunca mais poderei trabalhar em um laboratório de novo.
Então. Agora que sabe por que não posso parar com esses experimentos abomináveis, vamos ao número quatro. Hoje nós... Deus, hesito até em dar nomes, eu só...
Hoje, tenho duas cobaias: A Mãe e... e o Filho.
O plano é deixar que a mãe crie o filho em isolamento até que ele tenha cerca de um mês. Então, eu o mandarei de volta, para que o Filho maduro exista enquanto o imaturo é criado. Baseado na reação de Átropos à sua antiga eu, espero que, com os dois Filhos vivendo juntos na mesma gaiola, o mais velho faça tudo o que puder para proteger o mais novo. Espero.
Planejo mandar o Filho maduro para 3 de março de 1950, precisamente às 11 horas. 3, 2, 1, já.
O Filho não apareceu, o que faz desta a Iteração 1.
[rádio sintonizando]
ME: 3, 2, 1, já. E… aqui está ele. Parece bem calmo, por hora… O que…
[distorção estática; camundongos estressados]
ME: Não, não, não, para!
[rádio sintonizando]
SG: Só não consigo acreditar que ele… que ele não me contou!
DR.F: Que Whickman não lhe contou por que matou o Dr. Sharma?
SG: Ele veio com os… capangas dele, e olha, eu sei que ele era meio que um traidor ou algo do tipo, e eu sei que ele tinha tipo, outras coisas de espião pra fazer e tal, mas não sou qualquer uma! Sou eu, a Sally! A Sally que todo mundo ama porque ela ama ciência e fala estranho! Eu não devia ficar no escuro assim. Só... pensei que tinha controle sobre a minha vida. Por cerca de 45 segundos, eu tinha feito uma Coisa e tinha Dado Certo, e aí Nikhil Sharma tinha que cair aqui do futuro e trazer uma montanha de perguntas com ele. Perguntas que nunca vão ser respondidas. Perguntas que vão me incomodar pra sempre.
DR.F: Perguntas nem sempre importam, Sally. A vida real não é uma novela de rádio. As coisas não são todas amarradinhas e fazem sentido! Eu entendo que passou por muita coisa nos últimos meses, mas esse tipo de obsessão não é saudável. E acho que você sabe disso.
SG: Você não entende nada do que ‘tou falando de verdade! Dediquei minha vida ao conhecimento, à Timepiece. Você não conseguiria nem começar a compreender a merda cosmicamente inescrutável com que tenho que viver todo santo dia!
DR.F: Você não precisa viver com isso, Sally! Não é mais uma parte daquilo. Não sei o quão clemente o Sr. Whickman é, mas parece que você feriu seriamente confiança dele. Já pensou no estresse que ele deve estar sentindo? Se seus amigos são quem dizem ser, então têm que tomar decisões incrivelmente estressantes, sem resposta certa, todo dia. E você para lá e para cá, dizendo que é injusto que não é mais parte do clube!
SG: Eu sei que deve ser difícil, mas eles precisam de mim. Eu sei disso. E eu preciso deles. Mas essa merda de um ano e meio de distância fica me atrapalhando. Não faz diferença com Partridge. Porra, ele sempre vai ‘tar a uma mensagem de voz de distância. Mas isso por causa de uma merda de acidente que até hoje não sei nada sobre. Quem sabe? Talvez tenha sido minha culpa! Talvez eu tenha sido gananciosa demais, ido longe demais, e paguei o preço! Sinceramente, isso meio que combina comigo sim.
DR.F: Não vê o padrão? Não acho que tenha tido necessariamente algo a ver com o que lhe aconteceu, mas a sua compulsão por conhecimento lhe levou a caminhos perigosos. Eu sei o tipo de pessoa que você é, Sally, então sei que isso deve ser difícil de escutar, mas acho que pode ser a hora de mudar seu foco para algo mais simples. Já experimentou jardinagem?
[rádio sintonizando]
ME: Para quem quer que se importe, aqui é Maggie Elbourne. Ex-assistente de pesquisa do Dr. Aldous Carling. Sob a coerção dele, e contratada pela Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos dos Estados Unidos,realizei recentemente uma série de experimentos tendo como objeto a viagem temporal e os efeitos dela no comportamento de vários camundongos. Os efeitos variaram de mínimos a intensos a... extremos. Pouquíssimas das cobaias sobreviveram.
Ao longo do processo, fiquei cada vez mais desconfortável com a quantidade de violência que os experimentos continham. Insatisfeito com os resultados desses experimentos e se recusando completamente a ouvir os conselhos da própria pesquisadora escolhida por ele para a tarefa, Dr. Aldous Carling–C-A-R-L-I-N-G– ameaçou minha carreira e minha vida na comunidade científica, caso eu não continuasse a seguir as ordens dele. Então, continuei, até que testemunhar alguns... eventos verdadeiramente horripilantes... Vou ficar enjoada só de me lembrar. Confusão. Comportamento violento. Suicídio. Sangue, muito sangue…
Então, Dr. Carling me trouxe um último experimento. Até aquele ponto, eu ao menos tivera a liberdade de desenvolver meus próprios experimentos. Para tentar minimizar os danos! Mas esse… Queriam que eu pegasse doze camundongos e criasse cópias temporais. Uma quantidade enorme delas. Cópias sobre cópias, todas vivendo juntas em uma colônia gigante. Incluíram um projeto da colônia nos materiais e era... era uma prisão. Uma prisão para os camundongos reverberarem de suas duplicatas, até que, sem sombra de dúvida, acabassem destruindo uns aos outros. Nenhuma colônia desenvolvida de tal forma poderia ser sustável.
Era demais para mim. Eu… Eu fugi. Não podia, em plena consciência, ficar lá e ser complacente a essa matança. E isso foi só nos camundongos! Imagine só se pudessem deixar pessoas operaram aquela coisa?!
[???]
ME: Deixei minhas anotações para trás, mas consegui trazer Pandora comigo. Diga oi, Pandora.
[camundongo na gaiola]
ME: Espero que, quando encontrarem isto, acreditaram em mim. Acreditar... [tosse]
[distorção estática]
ME: Espero que acreditem em mim. Quanto ao que está por vir... desde que possa deixar aquele mundo indiferente para trás, não ligo.
[rádio sintonizando]
DR.F: [na gravação] Já experimentou jardinagem?
SG: [na gravação] [suspiro] Capaz de você ‘tar certo. Talvez eu venha sendo dura demais comigo mesma. Talvez Sharma tenha sido um sinal de que não fui feita pra esse tipo de trabalho. Eu acho... Eu acho que vou tentar ter uma vida. Fora da ADRA. Fora dessa confusão.
[gravação para]
HC: Fico feliz que finalmente está lendo minha apostila, Esther. Tomou nota do capítulo sobre “desrespeitar a confidencialidade médico-paciente”?
ER: Não vou nem dignificar isso com uma resposta, Hank.
HC: [ri] Então, o que o psicólogo disse?
ER: Ela não está estável. Tudo pelo que passou está exercendo um efeito profundo no modo como interage com as pessoas. Mas, se podemos ou não atribuir isso aos efeitos da exposição a paradoxos—
HC: —Ou se ela é uma sociopata irresponsável.
ER: —Não sabemos por que ela está instável.
HC: Não foi por isso que você pediu aquele estudo? Qual era o nome dela, Elbourne? Foi em cima do que: em animais ou humanos?
ER: Estou de olho nela também. Fora a... “crise” da Dra. Elbourne, ela não está significantemente pior que Sally. Parece que delegar a exposição aos nós górdios lógicos leva bem longe na diminuição dos sintomas.
HC: Ela me pareceu sensível demais. Não sei nem se abandonar o projeto foi atípico da parte da Rainha dos Ratos.
ER: Eram camundongos. Não consegue dar conta de uma ponta solta?
HC: Não começa, Roberts. Eu não ficaria dando informações a elementos tão instáveis por aí, se dependesse de mim. Pare de fazer mais Sally Grissoms. Você e Whickman não param de deixar suas vidas pessoais guiarem as grandes decisões.
ER: Vamos mesmo precisar ter essa discussão de novo?
HC: O preciso fazer para lhe convencer de que ela é uma ameaça? Já colocou nossa operação em risco antes. E então, trouxe uma raposa até o galinheiro. Disseram que Sharma disse a ela que iam “democratizar” a viagem no tempo! Ela não tinha ideia do que ele estava tentando fazer.
ER: Eu entendo. Você acha que não, Hank, mas entendo. Precisamos dela. Ainda é a maior especialista em física de campo âncora que jamais teremos, mas está instável demais para ser útil agora.
HC: Então?
ER: Então… veja os resultados do estudo de Elbourne. Distanciar-se pode ajudar Sally a se estabilizar. Dê a ela algum tempo para colocar a cabeça no lugar. Deixe-a começar uma fazenda ou algo do tipo, e se afastar. Deixe-a encontrar a vida mais recompensadora que puder sem nós. E, eventualmente... tédio e curiosidade a trarão de volta. Pronta e disposta.
HC: … Isso é meio pesado para você.
ER: Talvez. Talvez não.
[gravador de fita desliga]
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14: Âncora
[gravador de fita liga; gravador cai na água; Sally arrasta Nikhil até a margem]
SALLY GRISSOM (SG): Mas o quê?!
NIKHIL SHARMA (NS): Sally Grissom? Você é Sally Grissom!
SG: Que merda é essa? Como você sabe quem eu sou?
NS: Meu Deus… não vai nem me perguntar se estou bem?
SG: Acabei de te ver aparecer do nada. Se sabe quem eu sou, então sabe que tenho todo o direito de estar tão paranoica quanto quiser. O que você ‘tá fazendo aqui?
NS: Que rude… Eu sou da… Um momento–
[Nikhil vomita em Sally]
SG: Pelo menos… vira a cabeça pro outro lado!
NS: Desculpa, vou tentar–
[Nikhil vomita em Sally de novo]
SG: Ugh…
NS: OK, pronto. Heh. Sinto muito pelo–
[mais vômito]
SG: AI MEU DEUS. Não é possível que ainda tenha algo dentro de você, a essa altura! ‘Pera aí...
[Sally pega o gravador de Nikhil]
NS: Ei, isso é meu!
SG: Que merda é essa?
NS: É meu gravador!
SG: Isso eu sei, mas é bom demais... novo demais.
NS: Sim, bom, eu estava tentando explicar–
SG: De onde você é? Ou melhor, de quando você é?
NS: OK, se você pudesse se ver agora, estaria encarando os olhos mais loucos que já viu. Pode ficar quieta e me deixar explicar, fazendo o favor?
SG: Certo. Desculpa. Eu só… Eu só sempre quis dizer isso. Quando vim parar aqui pela primeira vez, também fiquei vomitando pra todo lado, e Whickman foi bem mais legal comigo.
NS: Whickman?
SG: OK, vou precisar de algumas respostas agora, a menos que você queira voltar pra debaixo d’água.
NS: Dr. Nikhil Sharma, a sua disposição. E a sua mercê também. Obrigado por não me deixar me afogar. E hm, estou aqui porque... Desculpa, me deu um branco de repente...
SG: Viagem no tempo é uma merda. Doutor, esse gravador, suas roupas... você é de 20█?!
NS: Sim!
SG: E veio parar aqui… Ninguém nunca veio de tão longe no futuro…
NS: E você é… Sally Grissom. Lembro das fotos.
SG: Hm, por favor, dá pra não tocar meu rosto?
NS: Aqui é Ponto de Exílio?
SG: Estamos na Filadélfia. Por que você ‘tá aqui? Como sabe quem eu sou?
NS: Escuta, ficarei feliz em responder todas essas perguntas na hora certa, mas, primeiro, pode me arrumar–
[Nikhil vomita mais uma vez, e então desmaia]
SG: Doutor? Dr. Sharma? … Acontece com todo mundo na primeira vez.
[rádio sintonizando]
SG: Partridge! Partridge, você não vai acreditar, mas encontrei alguém agora! Ele acabou de chegar aqui do futuro. Como eu. ‘Tava carregando um gravador. Acho que a água estragou ele, não dá pra saber se ainda ‘tá gravando. Talvez você possa tentar ver como fazer ele funcionar de novo? Quero ver o que tem gravado. Preciso saber o que esse cara quer antes dele acordar de novo. Te ligo de volta quando souber mais.
[Sally desliga, põe mais dinheiro no telefone e disca]
Concierge: Obrigado por ligar para o Âncora de Ouro, aqui é–
SG: Oi, quarto 222, por favor.
Concierge: … Um “olá” igualmente agradável para você também, senhorita. Por favor, aguarde só... um... momento...
SG: [suspira]
[telefone toca]
ER: Esther Roberts falando.
SG: Roberts! Que bom que consegui falar com você!
ER: Sally? Onde você está?
SG: É, essa é a questão, Roberts. Sinto muito. Fico grata que me trouxe pra cá com você e tudo, mas, hm... Não posso voltar ainda. Hm, bom, veja bem, é só que, hm, quero passar mais uns dias em Nova York!
ER: Hã?
SG: É, sabe. Assistir a umas peças. Ir ver a Times Square antes de ficar coberta de–
ER: Você já não fez isso? Sally, por onde esteve andando?
SG: Não importa, escuta, por favor, só vá. Logo, logo estou de volta no Colorado.
ER: OK, Sally.
SG: … Roberts? Você parece… ‘cê ‘tá bem? Aconteceu alguma coisa?
ER: [suspira] Está tudo bem. Não é nada. Não posso lhe obrigar a fazer nada que não queira. Tchau, Sally.
[Esther desliga; Sally também; Nikhil se aproxima]
SG: OK, isso foi estranho…
NS: Então, você está livre!
SG: Você se recupera rápido, hein.
[Nikhil tira um panfleto do bolso]
NS: Sally, olha isso! Bobby Castellini no Library Bar, no Tittenhouse Hotel. Você gosta de jazz?
SG: Escuta, não temos muito tempo–
NS: Olha, vou te dizer tudo que precisa saber, mas vou desmaiar– de novo– se não comer algo. Além do mais, estamos em 1949! Podemos ouvir os maiores músicos da história ao vivo! Podíamos até ir atrás do jovem Sinatra!
SG: Não, não acho que ele é famoso ainda. Mas precisamos de um lugar pra ficar, e eu gostaria de limpar tudo... isso... de mim.
NS: Desculpa.
SG: Todo mundo passa por isso na primeira vez... mas acho que você bateu o recorde. Um hotel pode não ser má ideia.
[rádio sintonizando; bar do hotel]
NS: Pelo que parece, o alvo geoespacial falhou, então o sistema recorreu ao destino padrão e me mandou pras coordenadas espaciais do ponto âncora.
SG: Que elaborado. Você teve sorte de que não ser mandado pra atmosfera superior. Ou pior, pro meio do espaço.
NS: Oh, isso não acontece mais. A Timepiece se beneficiou das sete décadas extras de trabalho.
SG: Então você é um agente da ADRA. Hm, pelo jeito vieram pra ficar mesmo. Por que te mandaram de volta?
NS: Essa parte… é um pouco mais difícil de lembrar. Sabe, tentar me lembrar é como tentar segurar névoa. A gente é treinado pra esse tipo de coisa, mas uou! Não faço ideia de como conseguem se lembrar! Tenho certeza que uma hora vai voltar.
SG: ... Não se lembra mesmo?
NS: Posso te contar do cereal que comi hoje de manhã. Além disso... nada.
SG: Sei como é. A Timepiece é como um liquidificador mental. Mas você vai estar morrendo de saudade do futuro já, já.
NS: Não vou sentir saudade. Não deixei muito pra trás em 20█.
SG: Foi o que eu pensei também. Mas vai. Confie em mim.
NS: Você está aqui há, o que, seis anos? Não parece tão mal. Ainda.
SG: Você se acostuma com o dia a dia, mas, sei lá, às vezes só, se lembra das coisas, das pequenas coisas. Trabalhando na Timepiece, eu procurava um bloquinho de notas pra escrever algo... e é claro que não temos isso ainda. Não dá pra simplesmente colocar pra tocar a música que quiser, quando quiser. Sinto falta de poder fazer isso. E é tão silencioso...
NS: Não sei. Se este bar aqui em 1949 pode servir de base, a música é bem melhor. Além disso, não fazem os drinks nem perto de tão fortes no nosso tempo. Escolho o aqui e agora.
SG: Ao aqui e agora.
[fita acelera]
SG: –Calculadoras portáteis! Quem imaginaria que eu sentiria tanta falta delas. Não dava pra ter trazido umas com você?
NS: Tenho umas pastilhas de limão, se quiser doce... [ri]
SG: [ri] … Qual é o problema com aquela garçonete?
NS: Como assim?
SG: Ela não para de torcer o nariz pra você.
NS: Oh. Muitas pessoas olham pra mim assim. Acho que sou o único por aqui que, bom…
SG: Se parece com você?
NS: Esse é um modo de dizê-lo.
SG: Então. Dr. Nikhil Sharma. De onde é esse sotaque? Meio britânico, meio indiano?
NS: Nasci em Lahore, estudei em Oxford. Mas o sotaque? É meio que uma grande mistura de todos os lugares em que já morei, sabe?
SG: A ADRA vira internacional, huh?
NS: Você não para de falar de trabalho, para?
[fita acelera]
NS: [bêbado] –Sinceramente? Sinceramente, se o único legado da minha viagem no tempo fosse apagar quem quer que decidiu inventar a sessão de comentários na internet, eu poderia viver com isso!
SG: [ri]
[Nikhil cai]
NS: … ‘Cê ‘tá bebendo todas!
SG: … Dá licença, ‘cê ‘tá bem pior que eu!
[fita acelera]
SG: [imitando] Oh, minha querida, você nunca foi a Chichen Itza? Querida, você simplesmente precisa ir a Chichen Itza!
NS: Ela estava tentando tanto soar [imitando] europeia. Estudei retrosaria com Deveraux em Milão! [ri]
SG: [ri] Bom, hm… Esse é o meu quarto.
NS: Oh, e este aqui é o meu.
SG: Olha só! Devíamos dormir um pouco, temos que voltar de carro amanhã.
NS: De carro? Por que não voar?
SG: Você tem ideia do quão caras passagens de avião são hoje em dia? Dinheiro não cresce em árvore, e não acho que você trouxe um almanaque de esportes.
NS: Haha, boa. Sabe, pensando melhor, acho que ir de carro pode ser preferível a de avião, no final das contas. Uma viagenzinha pela estrada me daria um tempo pra recuperar minha memória antes de encontrar os chefes.
SG: Você ‘tá é inventando desculpas!
NS: Não, mas você está certa. Não vai levar mais que dois dias. Vamos ter a oportunidade de ver o grande Centro-oeste americano! E, além do mais, estamos nos divertindo, não é?
SG: Que saber? ‘Cê ‘tá certo. Não me lembro de relaxar assim desde… Vegas!
NS: Mais um motivo ainda.
SG: É!
NS: Por que você não sai mais?
SG: Não sei, as pessoas só... Não acredito que ‘tou te contando isso, definitivamente é a bebida falando, mas... Não sei, às vezes sinto que todo mundo sempre lida comigo como se... se eu tivesse que ser cuidadosamente vigiada. Não consigo distinguir se alguém ‘tá sendo legal comigo só porque é legal, ou se ‘tá tentando extrair o que quer que eu tenha na cabeça pra usar na Timepiece. Me tratam como se eu tivesse... pontas cortantes.
NS: Sério? Não acredito! Bom, acontece que eu, se minha opinião conta, gosto bastante das suas pontas.
SG: Isso foi… estranhamente gentil.
NS: Aliás, talvez precisem de ser um pouco lixadas?
SG: Idiota.
NS: Ei! Eu vou viajar com você!
SG: Porque não tem escolha!
NS: Vai ser igualzinho àqueles filmes de viagem!
SG: Ugh, odeio esse gênero. Música brega, histórias clichê...
NS: Eu adoro filmes de viagem! Os personagens sempre acabam em casa, onde começaram, mas, como pessoas, estão mudados pra sempre! Pra mim nunca basta deles. Gostei até de “Crossroads- Amigas para sempre”.
SG: Com a Britney Spears?
NS: Uh–Crossroads foi com a Mandy Moore.
SG: Não na minha linha do tempo… Quem quer que tenha sido! Goste deles o quanto quiser, só ‘tou dizendo que fazer uma viagem pode acabar sendo agradável, apesar de ser a nossa única escolha.
NS: Ei, o que é isso?
SG: Oh. Meu gravador. Não é tão chique quanto o seu.
NS: Parece que ainda ‘tá ligado.
SG: É. Ops, devo ter apertado algum botão sem querer ou algo do tipo. Acho–
NS: Talvez pudéssemos, hm… talvez pudéssemos dar uma folguinha pra esse gravador.
[Nikhil se aproxima de Sally]
SG: Hm. Não, por que eu faria isso?
NS: Oh. Desculpa, eu–
SG: Oh, hm… Não. Valeu, mas… Não. Eu vou… Eu vou só dar uma olhada no mapa e começar a traçar nossa rota!
NS: Claro. Vou te deixar trabalhar nisso. Te vejo no café da manhã?
SG: Sim, até. Durma um pouco.
NS: Vou dormir. Você devia fazer o mesmo, quando acabar o hm, mapeamento todo. E obrigado de novo por salvar a minha vida, aliás. Então. Bons sonhos, Sally Grissom.
SG: Boa noite, Doutor Sharma.
[rádio sintonizando; rádio do carro toca “Will the Circle be Unbroken”]
SG: Hoje é dia 30 de outubro de 1949. O Dr. Nikhil Sharma e eu estamos no segundo dia da nossa viagem da Filadélfia a Ponto de Exílio, no Colorado. Tenho que admitir, essa não foi uma ideia nada má. ‘Tou tendo a oportunidade de ver todo esse lado dos Estados Unidos que nunca conheci antes. Desde que fui parar no Eldridge, fiquei meio que só sendo mandada de uma prisão pra outra. É mes’ um mundo completamente diferente aqui, sô.
A estrada fica bem vazia. Na maior parte do tempo somos só nós, nenhum outro motorista à vista. E árvores, colinas e planícies por quilômetros e quilômetros. É... lindo, de verdade. É estranho dizer isso, mas é o único modo que dá pra descrever.
Mas isso não quer dizer que tem sido tudo às mil maravilhas. Choveu bem forte ontem e, francamente, meu parceiro de viagem não é o melhor dos navegadores.
NS: Ei!
SG: Acabamos fazendo a curva errada e, em vez de atravessarmos o grande estado da Indiana, nos vimos acidentalmente atravessando o... adequado estado do Kentucky.
NS: Se não tivéssemos feito isso, não teríamos tido a oportunidade de experimentar o velho frango frito do Kentucky! O de verdade! Antes de adicionarem todos aqueles hormônios.
SG: Pessoalmente, ‘tou suspeitando que o Doutor Sharma aqui ‘tá é tentando desviar nosso caminho pra pararmos em cada armadilha pra turista que ele vê anunciada em um outdoor.
NS: Dá licença, não são armadilhas pra turistas; o termo correto é “atrações de beira de estrada”
SG: Até agora, tem sido muita visitação a pontos turísticos e refeições rápidas em paradas pra caminhoneiros e lanchonetes bregas.
NS: [ri] A última…
SG: OK, aquela foi definitivamente a pior!
NS: –Minha favorita!
SG: ‘Pera, ‘pera, faz a voz de novo!
NS: Qual, a do garoto que nos abordou ou a da mãe dele?
SG: Do garoto!
NS: [imitando] Nussa senhora, moço. Sei dos homem branco e dos homem preto, mas um marrom? Agora vi de tudo mes’! [ri]
SG: [ri] Você foi tão tranquilo sobre a coisa toda! Eu não teria ideia de como responder àquilo.
NS: Eu não tinha ideia de como responder à mãe dele!
SG: Oh, ‘tá falando de quando ela te viu? [imitando] Mas não é que ‘ocê é um prato quente de curry mes’!
[algo bate no para-brisas; Sally vira o carro abruptamente]
SG: Mas o que–
NS: O que diabos foi isso?
SG: Alguma coisa acertou o para-brisas. Não consegui ver a tempo.
NS: Conseguiu ver de onde veio?
SG: Deve ter sido uma coisa bem grande, olha essa rachadura.
NS: ‘Pera aí, acho que ‘tá vindo do carro na nossa frente. Cuidado!
[outro impacto; Sally vira o carro]
SG: Uma garrafa de cerveja? ‘Tão tentando nos matar ou o quê?
NS: … Essa é uma possibilidade a ser considerada.
SG: … Ah, FALA SÉRIO, Sharma.
NS: Então, essa não é a melhor hora pra te contar isso, mas talvez eu não venha sendo lá muito franco com você, Sally?
SG: Foi literalmente a primeira coisa que eu te perguntei! Fala sério, cara!
NS: Lembra como eu não conseguia me lembrar da minha missão da ADRA? Bom, minha missão era te matar.
SG: Você ‘tá aqui pra me matar?
[Sally freia, soca Nikhil]
NS: Ei! Ei! Calma! Não vou te matar!
SG: Como espera que eu acredite em você?
NS: Não sei! Eles me querem morto também! Não deixei 20█ em termos muito bons, pra te falar da verdade.
SG: Do que você ‘tá falando?
NS: Escuta. Vou explicar tudo, mas agora não é hora pra exposição!
SG: Você tem alguma coisa que podemos usar?
NS: Hm, só uns pacotes de batata e uma grande abundância de pastilhas de limão!
SG: Sharma! De todas as coisas de que você podia encher seus bolsos antes de voltar no tempo—
NS: Desculpa, eu não esperava me envolver em uma batalha automobilística!
[Sally passa a marcha; acelera]
NS: Sally, o que você ‘tá fazendo?! Vira!
SG: Se querem me matar, melhor não errarem!
NS: Você ‘tá querendo morrer ou algo do tipo?!
SG: Não sei, vamos descobrir!
[Sally acelera em direção ao carro vindo na direção deles, o outro carro sai da estrada; Sally continua dirigindo]
SG: É isso aí! Chupa, ADRA! Eu te fiz! Você não estaria aqui se não fosse por mim! Literalmente! Por causa da física! Ufa! Que loucura. Mas e aí, e essa história de tentar me matar?
NS: Uhhh.... uhh...
[fita acelera]
SG: Como assim, não mais?
NS: Bom. Não sei agora, mas no meu tempo, a ADRA não é mais ética das agências governamentais.
SG: Hah! Deixa eu adivinhar. É como se a NSA e o FBI tivessem se fundido e se espalhado pelo tempo como manteiga em uma torrada?
NS: O que é NSA? Não temos isso.
SG: É, faz sentido.
NS: Descobri algumas coisas que estavam fazendo, e por que, e só... não podia continuar mais.
SG: É a ADRA. Com o que que você achava que ‘tava se metendo?
NS: Proteção! Achei que era uma questão de correção de curso, de consertar desastres. Um último recurso. Não...
SG: Melhor nem me contar. Pensei que era pra Roberts consertar isso!
NS: Quem?
SG: Esther Roberts, ela ‘tá no comando da Pesquisa e Desenvolvimento agora? Assessora-chefe do Diretor Whickman?
NS: Chet Whickman está morto.
SG: Oh… É, acho ele que estaria.
NS: Eu ‘tava planejando sair cerca de um ano antes da partida, mas… fui abordado por um grupo. Escuta, Sally... a ADRA me mandou de volta pra te matar, mas... estou aqui pra te levar de volta comigo.
SG: Não. Bobagem. Completamente impossível, na verdade. Não tente me vir com–
NS: Escuta, só escuta. Só precisamos de um segundo ponto âncora como o Eldridge. Acredite em mim, isso pode mesmo dar certo!
SG: … Desculpa, não dá pra simplesmente acreditar na sua palavra. Vai ter que me explicar a física por trás disso se quer a minha ajuda.
[rádio sintonizando]
NS: Aqui é o Dr. Nikhil Sharma. Hoje é dia 2 de novembro de 1949. Estamos aqui. Bem no fim da estrada. E esta pode ser minha última gravação, se eu acabar morrendo. Contanto que o nosso plano funcione, posso viver com isso. Quer que eu repita o plano?
SG: Não, já entendi. A parte mais difícil vão ser os guardas na entrada. Assim que chegarmos nos Geradores Arco-íris, posso nos trancar lá dentro.
NS: Ok, só dirija rapidamente até lá, saia do carro e fale com confiança.
SG: Relaxa, eu consigo.
NS: Tudo bem, tudo bem! É só que...
SG: Só que o quê?
NS: Você não é uma boa mentirosa, só isso.
SG: Você não sabe! Nunca me viu mentir!
NS: Não mesmo?
[Sally estaciona]
SG: … Estamos quase lá.
NS: Sally, você está aqui há seis anos. O fato de que conseguiu durar tanto tempo sem enlouquecer totalmente é uma prova da sua resiliência. Não posso dizer que vai ser fácil, mas de uma coisa eu tenho certeza: quando voltar a 20█, você vai se adaptar. Vai fazer amizades de novo. Imagina só! Amigos que entendem suas piadas! E suas referências! E podem se equiparar de verdade ao tamanho do seu conhecimento científico!
SG: Às vezes, quando penso na minha vida antes, trabalhando na minha pesquisa no MIT… tudo parece só um sonho. Como se esse fosse o mundo real agora.
NS: Este é o sonho. Nosso mundo está esperando você. Quando chegar a hora, só esteja pronta pra deixar pra trás o que quer que tiver aqui.
SG: Não consigo acreditar. Vou voltar de verdade. Se eu quiser voltar pra 1949, por que não podemos fazer um ponto âncora aqui pra voltarmos sempre que quisermos?
NS: Foi comprovado que viagens no tempo matam, se realizadas vezes demais. Só estamos fazendo este ponto âncora pra que agentes do futuro possam usar ele, um de cada vez, pra fazer novos.
SG: OK… Pronto?
NS: Sim. Não quero te apressar, mas de jeito nenhum aqueles agentes não saberiam que estamos vindo pra cá. Podem estar vindo atrás da gente neste exato momento.
SG: Tudo bem. Eu consigo. Lá vamos nós!
[Sally dirige até a estação, freia com força; sai do carro e vai até os guardas]
SG: Não tenho tempo pra explicar. O gerador vai explodir a qualquer momento. Traga Chet Whickman aqui, agora! ... AGORA! Que parte de “explodir a qualquer momento” vocês não entenderam, seus grandalhões imbecis?! Doutor! Comigo!
[Nikhil sai do carro enquanto os guardas passam correndo]
NS: Você foi muito bem!
SG: Espero que a ADRA nunca fique mais esperta que isso.
NS: Ela fica. Bem mais.
SG: Ali, na janela.
NS: Uou, olha só essa velharia. Ei, encrenqueiro!
[Sally começa a arrombar a fechadura]
SG: Deixa eu só abrir essa porta… Acha mesmo que consegue fazer isso funcionar?
NS: Tive anos de prática, Sally. Não se preocupe.
[tiros à distância]
SG: Não é possível. Já ‘tão aqui?! Ainda ‘tou trabalhando nessa porta! Merda.
NS: Estão felizes em fazer o que for preciso com Ponto de Exílio pra nos pegar.
SG: Pensei que não queriam matar ninguém além de mim?
NS: Estão claramente dispostos a matar muita gente agora! O plano mudou. Não estive exatamente recebendo relatórios de atualização!
[Sally arromba a porta]
SG: OK, pronto! Entra, entra, rápido!
NS: Corre, aquela mesa ali. Bloqueie a porta.
[Sally e Nikhil empurram a mesa até a porta]
SG: O gerador! Vai!
NS: ‘Tou indo!
[Nikhil começa a trabalhar; batidas na porta; tiros]
SG: Dr. Sharma, eles chegaram. Precisa acabar em dez segundos porque vão–
NS: Vai ‘tar pronto em cinco…
[Nikhil liga um interruptor; gerador solta faíscas]
NS: Pronto! OK, Sally, preciso que você feche este circuito do outro lado.
SG: Não posso, ‘tou tentando manter a porta fechada!
NS: Só vai levar um segundo. Só corra até aqui, você consegue!
CHET WHICKMAN (CW): [atrás da porta] Sally? É o Chet. O que, por Deus, Maria e José, está acontecendo? Abra essa porta!
NS: Sally. AGORA!
SG: OK, OK, OK!
NS: Aquele cabo ali!
SG: OK.
NS: Sally, feche o circuito.
[Chet bate forte na porta]
NS: Sally!
SG: Não consigo! Não posso ir embora. Ainda não ‘tou pronta.
NS: Sally, agora não é a hora para hesitação! Feche o circuito! Agora!
SG: Desculpa! Mas ainda tem trabalho a ser feito no passado. Essa é minha casa agora! Roberts e Whickman... o que que quer a ADRA se torne, tenho que me assegurar de que não deixem ela se transformar naquilo!
NS: Sally, este é o jeito! Você faz um ponto âncora e bam: a ADRA perde o controle sobre a história. Não vão vai mais ter um único ponto na história pra visitar toda vez que quiserem fazer uma mudança! Outras pessoas vão poder mudá-la, de qualquer lugar na linha do tempo onde há uma âncora! Vamos libertar o mundo das garras da ADRA! Por favor, Sally, feche o circuito. Volte pra casa.
[Chet arromba a porta; atira em Nikhil]
SG: [grita]
CW: Sally, você me deve algumas explicações!
SG: Sharma!
NS: Me chame de… Nikhil.
CW: Sai de perto dele agora.
NS: Que… belo tiro…
SG: Desculpa, desculpa, desculpa, eu só... a culpa é minha e eu...
NS: A-A âncora….
SG: Por favor, podemos fechar essa ferida, podemos tentar de novo.
NS: … Não ‘tá pronta.
SG: Você tem razão. Ainda posso fechar o cir–
[Chet dá três tiros no gerador, que para de funcionar]
SG: Que merda foi essa, Whickman?!
CW: Sally, você precisa se afastar agora.
NS: Encontre…
CW: Sally, eu disse: afaste-se!
SG: Dá pra calar a boca, Whickman?! Não consigo escutar ele. Você venceu. Plano estragado! Só quero escutar ele. Nikhil, encontrar o quê?
NS: [gorgoleja]... Barlowe...
SG: O quê?
NS: [gorgoleja]... Barlowe...
CW: Barlowe? Quentin Barlowe está para lá de morto.
NS: Vejo os faróis… pontilhando o arco do tempo… iluminando o caminho para o amanhecer.
SG: Faróis, arco do tempo, caminho pro amanhecer. Entendi. E você pode me dizer o que isso significa amanhã. Vamos lá, Nikhil, vamos lá, não morra...
NS: Sally...?
SG: Nikhil, só aguenta firme, OK?
NS: … Quando eu cai na água…
SG: S-sim?
NS: … Eu sabia… que tinha que te matar….
SG: Polpe seu fôlego.
NS: … Mas quando você me salvou… e lá estava você...
SG: Whickman, chame um médico aqui!
NS: … toda sol, e sal, e areia…
SG: Nikhil, só para de falar, por favor.
NS: … que sorte. [lutando parar respirar] Sally?
SG: Whickman, por favor!
NS: Foi uma… bela viagem, hein…?
SG: Nikhil…? Nikhil! Fica comigo. Não adormeça...
NS: Pelo menos... você está em casa.
SG: Whickman, por que você ‘tá parado aí? Se mexe! Vamos! Nikhil, Nikhil, fica comigo, não cai no sono. Fica comigo. Nikhil! Vamos!
[rádio sintonizado]
SG: [no telefone] … Te ligo quando souber mais.
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Você encontrou alguém? Que é do futuro? Qual é o nome dele? Posso procurá-lo aqui.
[fita acelera]
AP: Ei, Sally. Só ligando para checar, você deve receber isso no dia seguinte ao que nos falamos. Oh! Feliz “reversário” atrasado, suponho. Se puder me falar o nome do cara que tinha uma Timepiece, tenho quase certeza de que posso lhe dar alguma informação relevante. Fora isso, só vou ficar sentado aqui. Pelo resto da minha vida. Tipo... para sempre. Mas bom, ligue-me de volta quando puder.
[fita acelera]
AP: Então, você não morreu ou desapareceu, senão eu saberia, mas não faço ideia de onde você deve estar nos próximos dias. Bom, estou aqui. Só lembrando.
[Anthony digita]
AP: O que está a atrasando?
[bip de alerta]
SG: [no telefone] [funga] Hm, ei. Voltei pro Colorado. ‘Tá tudo... ‘tá tudo terrível. ‘Tou muito mal. Acho que vou falar com a Roberts sobre aquele psicólogo. Te ligo depois.
AP: … É, merda. Agora preciso saber sobre nosso homem misterioso de 20█. De onde ele veio. Além de 20█, quer dizer.
[fita acelera]
AP: Então, vasculhei toda a correspondência, todo pedaço de tecnologia aqui, toda anotação e rótulo presos na mobília. Sabe o que encontrei? Nada, nem um único item de 20█. Achei um dossiê datado de 96... mas...
Por que ninguém da ADRA se comunica comigo depois dos anos noventa? É como se o tempo de Sally fosse o mais longe que eu pudesse ver, mesmo com minhas melhores previsões e palpites. Nenhum pio de ninguém de lá. É um pouco assustador.
O que acontece nos anos 2000 que bloqueia até mesmo minha visão deles? Algo grande. Algo tem que ter acontecido na ADRA para calá-la completamente assim. Não sei o que foi.
Adicione mais isso à pilha de mistérios.
[gravador de fita desliga]
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13: Sinal
[gravador de fita liga]
JOHN BEVERLY (JB): Olá, aqui é John Beverly, ligando do Serviço de Mensagens Rapidinho, Inc. Tenho uma mensagem para você de um… Anthony Partridge.
[mensagem de voz rebobina]
SALLY GRISSOM (SG): Não pode ser…
JB: Olá, aqui é John Beverly, ligando do Serviço de Mensagens Rapidinho, Inc. Tenho uma mensagem para você de um… Anthony Partridge–
[mensagem de voz rebobina]
SG: Mas eles disseram…
JB: –do Serviço de Mensagens Rapidinho, Inc. Tenho uma mensagem para você de um… Anthony Partridge–
[mensagem de voz rebobina; gravação distorce]
JB: –uma mensagem para você de um… Anthony Partridge–
[mensagem de voz rebobina; gravação distorce]
JB: –uma mensagem para você de um… Anthony Partridge–
[rádio sintonizando]
SG: –Eu não conseguia acreditar! Pensei que nunca mais ouviria a voz de Partridge, mas... aqui está a mensagem. Foi um truque? Uma pegadinha? ‘Tou ficando louca? Provavelmente a última, mas, se podia me comunicar com Partridge de novo, precisava ir até o fundo.
[rádio sintonizando]
SG: Oi, meu nome é Sally Grissom, e acho que recebi uma mensagem de vocês mais cedo? ... Não, não “acho”. Recebi uma mensagem de vocês. Bom, preciso saber quem enviou ela… É a única mensagem mandada pra esse número. Bom, se não for um incômodo muito grande, eu... Alô? Você desligou na minha cara?
[Sally bate o telefone]
SG: Merda!
[telefone toca; Sally atende]
SG: Alô? Oi, eu… acabei de ligar pra você– você tem?
[Sally pega caneta e papel]
SG: Posso mandar uma mensagem pra ele? Pode me dar o... número do telégrafo dele? Endereço telegráfico? Hm... o troço… de código… Morse? Deixa… eu… só…escrever… isso. OK, pronto. Obrigada!
[rádio sintonizando]
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Graças a Deus, ela recebeu a mensagem. Demorou dezoito meses para recebê-la. É claro, na minha agenda, mandei cerca de onze minutos atrás, mas estava ficando preocupado. Metade de mim esperava que ficasse definhando na Secretáriatron dela sem ser ouvida para sempre. A outra metade sabe que sou um gênio, e que ela eventualmente a descobriria. É bem difícil programar um sinal para fora da Sala Escura em código Morse, como algum tipo de piada cósmica distorcida, e infiltrá-lo naquele serviço, mas a pôs onde precisa estar. Vamos ver se conseguimos tirar algo disso.
SG: E então, pela primeira vez em dezoito meses, Partridge e eu pudemos trocar pequenos cumprimentos. Por telegrama. Eu mandei “OLÁ MUNDO” e ele–
AP: Então, ela me manda “OLÁ MUNDO”, e não faço ideia do que quer dizer, então mando de volta–
SG: –E ele me manda “Oi mundo, é o Anthony” de volta.
AP: E ela diz “Eu sei, seu idiota”. Isso me deu uma esperança que não sentia desde cheguei aqui.
SG: –E progredimos indo e voltando desse jeito. Temos que trabalhar nesse receptor, fazer com que Partridge possa mandar mais do que pontos e traços daquela bolha fodida em que está... mas é difícil nos comunicar direito assim.
AP: Já trabalhou com alguém que está a vários fusos horários de distância? Meio que parece com o que eu e Sally temos que lidar, só que com uma pessoa no Fuso das Montanhas Rochosas e a outra em um vácuo sem tempo e sem sentido. É um pouco difícil conversar. Especialmente considerando–
SG: Sempre que recebo algo dele, não tenho ideia de quanto tempo faz. Recebi uma resposta que dizia “DESCULPA PELO ATRASO DE DUAS SEMANAS” menos de dez segundos depois de mandar a mensagem original. É tudo tão delicado, comigo estando no tempo real e ele... quando quer que esteja.
AP/SG: É tão bom ter algo para fazer de novo....
SG: Desde que parei de trabalhar pra ADRA, depois do meu acidente, sentia que tinha perdido uma parte de mim.
AP: Quando se está em um lugar como este, é como se você fosse uma garrafa enrolhada esperando para explodir.
SG: Eu ‘tava perdida. Incapaz de fazer o trabalho que tem definido minha vida por quase uma década.
AP: Falar com Sally de novo, trabalhar juntos neste transceptor, apesar de eu estar tão total e completamente distante... está me lembrando do porquê concordei em fazer isso em primeiro lugar.
SG: Não fosse a Timepiece, não fosse essa física estranha, eu só estaria presa num século com mais reprises e calças menos confortáveis.
AP/SG: Quer dizer, ela/ele ainda está melhor que eu...
AP: Ela pode viver! Como todas as pessoas!
SG: Ele pode assistir ao resto do século XX se desenrolar de uma vez só, e eu tenho que esperar enquanto os jornais gotejam da torneira com vazamento da história.
AP: Sei que esta é a sentença para o meu crime. E erros eu cometi de sobra, Deus sabe, mas...
SG: Não tenho nenhuma família aqui! E meus todos os amigos se foram...
AP/SG: Só sinto tanta solidão.
AP: Fazer isso me deu fé de novo, deu a força de vontade para completar a missão.
SG: Minha cabeça ‘tá tão confusa desde que acordei... mas sinto que esse pequeno desafio ajudou meu cérebro a se reerguer. Nos pezinhos de cérebro dele.
AP: Trabalhamos por semanas, o que é muito para mim.
SG: Levou um mês, por aí, pra construirmos a coisa, e eu tive que canibalizar minha secretária eletrônica pra conseguir. Sinto muito, Secretáriatron, vou te reconstruir em breve!
AP: Sally teve uma ideia sobre um telefone sem fio, mas suspeito que não foi ideia dela.
SG: Então, basicamente peguei um pouco do que sei sobre como celulares funcionam, juntei com minha secretária eletrônica e usei o mesmo tipo de design de retransmissão que usam na Sala Escura pra transmitir mensagens. Agora Partridge tem sua própria secretária eletrônica temporal!
AP: Não entendi 100% da explicação dela, mas acho que me permitirá gravar mensagens telefônicas que ela poderá atender. Tenho confiança de que ela acertou os cálculos.
SG: Não tenho ideia se meus cálculos estão certos, mas deve funcionar. Só preciso de uma antena que exista agora e em 1943. O que quer dizer que preciso de um atlas, um catálogo e uma viagem pra Filadélfia. Todas coisas que eram obsoletas no meu tempo. Exceto a Filadélfia. Não tenho nada contra você.
[rádio sintonizando; sons de um avião em voo]
SG: Então, como você provavelmente pode ouvir, encontrei minha rota pra Filadélfia. Eu ‘tava conversando com a Roberts, quando ela me contou sobre um problema...
[rádio sintonizando; jantar]
ER: –Então recebo uma ligação deles, e a falha era na verdade uma parte intencional no processo de produção!
SG: ‘Cê ‘tá de brincadeira.
ER: Minha equipe passou dias procurando erros para baixo e para cima– você devia ver os cortes de papel cobrindo as mãos de Pitt– e eles são os culpados. Agora, por causa do erro deles, tenho que ir a Nova York para inspecionar a linha de produção inteira, porque não quero ver outro computador de 100.000 dólares ir parar no lixo. E certamente não confio neles para consertarem a coisa sozinhos.
SG: Posso ir?
ER: … Para inspecionar a linha de produção?
SG: Não, não ligo pra isso. ‘Tou falando, tipo, ir pra Nova York. Com você.
ER: Comigo?
SG: Ai meu Deus, eu preciso sair dessa cidade, é tão entediante!
ER: … Tem certeza? Não vou fazer um passeio extravagante pela Broadway. Vou ficar lá por 72 horas, no máximo, e você vai ficar sozinha. Passeios turísticos podem ser bem cansativos, tem certeza de que aguenta?
SG: Posso ir?!
[rádio sintonizando; avião]
SG: –E foi assim que eu convenci a Roberts a me deixar vir com ela numa viagem à trabalho. A Filadélfia é a cerca de duas horas de Nova York, pelas minhas contas. Tenho que escapar dela (não deve ser difícil), alugar um carro, dirigir até lá, invadir uma estação de rádio, prender esse transmissor no topo da antena... mamão com açúcar, né? Mas bom, agora ‘tou num banheiro de avião fumando um cigarro e segurando um rádio-celular temporal confidencial feito em casa. Chupa, TSA!
[Sally dá um trago desafiador]
SG: Acho que essa folga vai ser boa pra clarear a minha mente. A última vez que tive férias, tinha cinco de nós, e eu não ‘tava escondendo o meu diário da provavelmente única pessoa em um raio de mil quilômetros que poderia chamar de amiga. Bom, tem Whickman, mas... as coisas eram tão mais fáceis naquela época, antes de eu passar um ano e meio em coma e todo mundo ou ir embora ou morrer...
Estou com medo, sabe? Não sei se conheço a Roberts mais. Não sei se posso confiar nela mais. Ela é parte dessa máquina secreta enorme, e não consigo dizer onde a lealdade dela está. Isso foi sempre verdade? ‘Tou deixando alguma coisa passar? Nunca consigo dizer o que passa pela cabeça dela. Tipo, não acho que ela me deixaria pra morrer numa sarjeta, mas, quando teve que escolher entre o trabalho e o melhor amigo, escolheu o trabalho. Como ela se sentiu sobre isso? Sobre não ir com Wyatt? Posso perguntar, certo? Posso perguntar pra ela como se sentiu? Não gosto dessa coisa toda de lidar com as emoções dos outros...
Roberts é um enigma. Quer dizer, sempre foi. Provavelmente é por isso que é perfeita pra esse tipo de trabalho. Mas, sabe, isso torna difícil ser amiga dela de vez em quando. Você conversa com ela, e vivencia uma Interação Normal Agradável e Genuína de Esther Roberts, mas nunca sabe se ela é agradável naturalmente de verdade, ou se só sabe fingir bem.
Sequer importa, no fim das contas? Não sei, mas por que ‘tou escondendo esse receptor dela? Você acha que ela sabe sobre o meu plano? Sinto que não posso mais confiar nela como confiava dois anos atrás–
[batida na porta]
Passageiro: Com licença, senhorita?
SG: Só um minuto.
Passageiro: Você está aí há–
SG: Só um minuto! [rápido] ... Confiar nela como confiava dois anos atrás, mas não sei se isso é verdade mesmo ou só estou projetando minhas aflições numa pessoa que cresceu e mudou sem mim. OK, tchau.
[rádio sintonizando; Sally e Esther entram no quarto do hotel]
SG: Ugh, deixa eu tirar essa… coisa!
[Sally tira a roupa]
ER: Gosto de me arrumar para viajar de avião. Tenho a oportunidade de me sentir chique.
SG: Você diz isso agora. Só espere algumas décadas, e vai estar implorando pra usar suéter e jeans.
ER: Jeans?
SG: … Calças de denim. Tanto faz.
[Sally senta na cama]
SG: Então, quando vai dar uma bronca naquele povo?
ER: Tenho uma reunião preliminar com eles daqui algumas horas. Tem certeza de que consegue se virar sozinha enquanto estou fora?
SG: Sério, Roberts? Sou uma adulta, não um cachorrinho.
ER: Eu me preocupo com você, Sally. Ainda estou com medo de lhe perder de novo.
SG: Porque posso acabar batendo as botas? Ou porque não seria mais um recurso valioso?
ER: Você ficou mal, Sally. Ninguém tinha certeza, no primeiro mês, se você ia sobreviver! E aí... aí pensamos que talvez nunca acordasse.
SG: Eu não–
ER: Eu sei que não foi sua culpa. Quer dizer, não foi, certo?
SG: [dar de ombros ambíguo]
ER: Não quero passar por isso de novo. Não quero que você passe por isso de novo.
SG: Obrigada.
ER: Agora, tem certeza que não tem...
SG: Não! Quero ir à Times Square antes de ficar coberta de propagandas.
ER: Bom, meio que já está...
SG: Eu vou ficar bem! Pode ir lá acabar com um gerente incompetente ou cinco. Nem vai perceber que não estou aqui.
ER: OK, se você tem certeza. Cuide-se.
[Esther sai; Sally pega o telefone e disca]
SG: Olá, sim. Eu gostaria de alugar um carro? ... Sim, se puder.
[rádio sintonizando; à beira de uma estrada movimentada]
SG: 27 de outubro de 1949, parte dois. ‘Tou a quinze quilômetros da cidade, aprontando tudo pra... o que quer que eu esteja planejando. O transceptor ‘tá no porta-malas, e vou levar ele pra uma estação que encontrei no catálogo a alguns quilômetros do Estaleiro Naval. O indicativo de chamada é “W.H.A.T’, o que me deixa feliz pra caramba.
Ah! Ah! Comprei uma coisa antes de sair de Nova York! Isso! … É mesmo, não dá pra você ver. São ferramentas pra abrir fechaduras. Comprei um kit abridor de fechaduras na cidade. Agora, posso estar um pouco enferrujada, mas fiquei muito boa em arrombar portas quando era uma adolescente dramática que pensava que isso me tornaria misteriosa e descolada... mas na verdade só reafirmou que eu era uma nerd gigante. Tinha um daqueles cadeados de prática, feitos de acrílico pra dar pra ver tudo por dentro! Uma viva pra um pouco de arrombar e invadir! Quer dizer, hm... Não vou cometer um crime, isso seria…
Eu devia ser um pouco mais cuidadosa com o que digo nessas coisas.
Mas vou ser? Provavelmente não.
[rádio sintonizando]
ER: Como eu disse, a gravação é uma formalidade. Só a quero para as minhas anotações.
Gerente de Planta (GP): Claro, Senhorita Roberts!
ER: Vamos começar, então?
GP: Claro!
[fita acelera]
GP: O oleoduto passa por aqui. E aqui é onde o zinco adicional de que você falou estava sendo adicionado ao lote.
ER: E vocês fazem isso intencionalmente?
GP: Bom, sim! Com isso, podemos substituir um terço do alumínio por zinco e devolver essa economia a vocês com uma redução de apenas seis porcento na resistência geral.
ER: Não estou pagando vocês para entregarem menos seis porcento dos meus pedidos. Vão substituir essa parte do oleoduto.
GP: Claro, claro. Estamos comprometidos a fornecer ao Sr. Whickman tudo que ele precisar. Pode falar com o seu chefe que ele pode ficar tranquilo sobre os pedidos futuros, Senhorita Roberts–
ER: –Você não está trabalhando para o Sr. Whickman, Sr. Maharis, está trabalhando para mim. Não se esqueça.
GP: Hm… sim, senhora.
ER: Eu poderia ter contratado outra empresa, e escolhi vocês em vez da concorrência. Não me faça me arrepender. Não tolerarei incompetência como essa questão do oleoduto de novo– está claro?
GP: Sim, senhora! Hm, obrigado, senhora. Sinto muito pela inconveniência.
ER: Obrigada. Agora, você poderia me dizer onde uma garota pode encontrar um coquetel forte por aqui?
[rádio sintonizando; no topo da torre de rádio]
SG: Então, aqui estamos nós. Na miríade das vezes em que fiquei em perigo durante essa coisa toda, nunca fui desafiada por algo tão mundano quanto uma queda. Mas, já que estou em falta de tanto equipamento de segurança como paciência, vou fazer o que posso com o que tenho.
Essa torre é… alta. Tipo, alta nível arranha-céu. Eu devia reconsiderar, provavelmente, mas, quando Sally Grissom bola um plano, ela vai até o fim com ele. Vou escalar essa torre, ligar o transceptor, e aí... vem a crucial descida. Assumindo que não serei um montinho de ossos quebrados no chão nessa hora, ainda vou estar viva! E, no evento desse milagre, devo ser capaz de ligar pra 215-████ e mandar uma mensagem de voz pro Partridge. E ei, é isso: Acabei de trazer um homem em contato com o mundo real de novo. Toma essa, insignificância do universo!
Caso contrário, essa gravação serve como minhas últimas palavras, ou algo do tipo... Vou sentir saudades de vocês. Quer dizer, não vou. Vou estar morta, e não vou ter a capacidade de sentir saudade das coisas, mas sabem o que quero dizer. Whickman, sinto muito pela bagunça de que você ter que cuidar. Se bem que vai ficar com minhas fitas e invenções, então talvez não seja tão mal, no fim. E Esther, vou te deixar meu... quer saber? Já que provavelmente vou morrer aqui, vou pular esse testamento esquisito todo e deixar vocês lutarem pelas minhas coisas, poucas como são. Partridge, se eu não ligar o transceptor antes de... [pop] sinto muito, não vai poder contatar o lado de fora. Se bem que o mais provável é que vocês nunca ouçam isso, então essa mensagem é basicamente inútil em todos os sentidos. Bom saber que os meus últimos desejos não importam. Toma essa, insignificância do universo...
Vou deixar o gravador no chão. Vejo vocês depois.
[Sally coloca gravador no chão]
SG: Ooook. OK, OK, OK. ‘Tá tudo bem.
[Sally escala a antena, escorrega, quase caí, volta a escalar, prende o aparelho, volta ao chão]
SG: Ha! Mamão com açúcar!
[rádio sintonizando; Esther faz uma ligação em uma cabine telefônica]
ER: Hm, alô, posso falar com Bridget Dreyfuss? ... Bridge? Ei, é... é a Ettie Roberts. É, sou eu. Eu sei, faz muito tempo. Eu estava na cidade, e ouvi que você está trabalhando na Biblioteca Pública de Nova York. Quer colocar a conversa em dia? Devo um drink a você. Encontre-me no ██████ às oito. Vejo você lá, Bridget.
[Esther desliga; rádio sintonizando]
ER: Uma gin tônica, por favor.
Bartender: É para já.
ER: Bridget! Você veio!
BRIDGET CHAMBERS (BC): Meu Deus, deve ter…
ER: Não faça as contas, vão deprimir você.
BC: Não faço, é por isso que fiquei nas artes liberais.
ER: Eu estava vindo para Nova York, e o boletim informativo estudantil disse que você ainda estava por aqui! Não podia perder a chance de me encontrar com a incomparável Bridget Dreyfuss.
BC: Chambers, na verdade. Eu casei.
ER: Eu sei, eu ouvi, isso é tão... Como isso funciona?
BC: Ted e eu encaramos os problemas da vida juntos– dos quais há muitos– mas nós, sabe... temos nossos próprios interesses. Ajuda que temos uma mentalidade parecida.
ER: Isso foi uma metáfora para…?
BC: Sim, foi uma metáfora.
ER: Deus, nós duas fomos tão longe. Você se casou, eu terminei a pós-graduação...
BC: Sim, sobre isso! O que traz você aqui?
ER: Trabalho. Tive que ir a algumas reuniões.
BC: O que você faz, aliás? Ouvi que depois de terminar a pós, você foi para o oeste.
ER: Oh, suponho que a verdade está por aí.
BC: Então não vai dizer...
ER: O governo. Trabalho para o governo.
BC: Com ciência? Espera, você era uma das pessoas trabalhando na bomba?
ER: [ri] Não, não era!
BC: Sim, era sim! Você trabalhou na bomba!
ER: Não é isso!
BC: Seu segredo está seguro comigo. Eu sempre soube que sua genialidade levaria você a grandes alturas.
ER: OK, você me pegou. Não conte para ninguém.
[fita acelera]
ER: [ri] E a Cynthia nunca soube!
BC: Ela nunca descobriu?
ER: Sempre que ela me perguntava aonde estava indo, eu só falava que ia para a biblioteca.
BC: Você ficava na biblioteca por dias!
ER: Você lembra o quanto eu estudava?
BC: Só não consigo acreditar que você ficou falida fazendo apostas em Atlantic City e sua própria colega de quarto nunca soube!
ER: Era mais fácil do que trabalhar em um bar como este.
BC: Olha só, trabalhar n’O Sidecar pagava as contas. E, além disso, eu não teria conhecido você.
ER: Você podia ter me conhecido na aula do Professor Simpson.
BC: Ah, eu tinha medo. Mas, quando entrou no bar, estava no meu domínio.
ER: Fico feliz que entrei. Tudo era diferente na faculdade. Era Bridget e Ettie contra O Mundo. Tudo parecia mais... brilhante, sabe?
BC: … Era o delírio de trabalhar setenta horas por dia.
ER: Então, está trabalhando na biblioteca da cidade agora? É o que dizia no boletim estudantil.
BC: Trabalho de arquivista para eles. O acervo de Lenox descobriu uma grande coleção de livros raros que deveria estar conosco, mas ninguém sabe o que tem nela–
ER: Então chamaram a melhor biblio-antropologista americana deste lado do Mississippi?
BC: Sempre fazendo charme, Ettie…
ER: Culpada, culpada.
BC: Então, abriram uma casa no Queens e a encheram de pilha sobre pilha de textos desorganizados. Vai levar séculos para adicioná-los devidamente à coleção principal.
ER: Anda bem ocupada, então.
BC: Mantém minha atenção.
ER: Esse costumava ser o meu trabalho.
[rádio sintonizando; Bridget recuperando o fôlego]
BC: … Uou, isso foi bastante. Preciso de um...
[Bridget pega um cigarro e um isqueiro; acende o cigarro]
BC: Cigarro?
ER: A-hã.
[Bridget acende um para Esther]
ER: Oh, muito obrigada.
BC: Então não se importaria se eu começasse a chamar você de “a HG Wells feminina”?
ER: Eu me importaria muito se você começasse a me chamar de “a HG Wells feminina”.
BC: Sabe, eu me senti tão esclarecida quando me disse que eu tinha descoberto o que você faz, Ettie.
ER: Mesmo? E agora, o que acha?
BC: Que o buraco é mais fundo do que jamais imaginei. Pensei que a bomba era loucura...
ER: Uma curiosidade, Bridget: Eu sou uma das mulheres mais ponderosas no governo dos Estados Unidos.
BG: Fala sério! Eu sempre soube que você era destinada a grandes coisas.
ER: O que aconteceu conosco, hein? Pensei que tínhamos algo especial.
BC: Não, Ettie. Poupe-me, OK? Isso é bom, só deixe estar.
ER: Sinto que depois que fui para a pós-graduação, você nunca ligou ou escreveu. Nós só... nos afastamos.
BC: É assim que você se lembra?
ER: Quer dizer, lembro que as coisas ficaram um pouco feias, mas foi há mais de dez anos.
BC: Eu fiquei magoada, e você não ligou.
ER: Eu liguei! O que nós tínhamos importava muito para mim!
BC: Você está… Você disse que eu era um “fardo” para você!
ER: Meu Deus, Bridget, eu nunca pensei isso de você. Eu... Eu disse muitas coisas terríveis naquela época!
BC: Tudo bem, eu aceitei o que aconteceu. Fiquei aliviada em ouvi-lo.
ER: Como assim?
BC: Você não ia desistir da sua vida só para viver uma fantasia juvenil. O que íamos fazer, comprar um apartamento e dizer a todo mundo que éramos simplesmente “sem sorte no amor”? Esther, fiquei aliviada porque você estava livre para não se importar comigo, e eu finalmente estava fora da sua sombra.
ER: É a primeira vez que estou ouvindo isso.
BC: Você estava lá! Ettie, você é um amor, mas só porque sente que precisa ser.
ER: Não sei que tipo de pessoa você pensa que eu sou, mas–
BC: Eu sei do que me lembro. Você gosta de pensar que é sempre a boa garota, mas... não acho que vê como machuca as pessoas.
ER: Eu dediquei minha vida a ajudar as pessoas. Meu trabalho–
BC: Seu trabalho presta serviço a mesma tautologia belicista que vai empurrar nós e os soviéticos à aniquilação nuclear.
ER: Que progressivo da sua parte. Talvez você possa convencer o senador de Wisconsin a mudar de decisão.
BC: Ettie, não é que você seja má pessoa. É que sua ambição lhe impede de estar emocionalmente disponível.
ER: Bridget, não acredito que você pensa tão mal de mim!
BC: Eu não penso mal de você! Só sou realista. Sei quem você é, e que não vai mudar, e tudo bem. Mas isso significa que nunca terei você.
ER: Sabe, esta não era só uma visita social. Precisamos de alguém na minha organização. Alguém com suas habilidades–
BC: Está falando sério?
ER: Bridget, seu conhecimento sobre o inconsciente coletivo americano é incomparável. Precisamos de alguém como você, que pode acompanhar e planejar possíveis resultados para quando alteramos as coisas.
BC: Não.
ER: É isso, só “não”? A oportunidade de uma vida, e só “não”?
BC: Sim! Não! Quer dizer– Ettie, não vou trabalhar para você!
ER: Mas por quê?
BC: Porque– Fala sério, que merda foi tudo isso? Você me liga do nada, age como se tudo estivesse tudo bem e então, de algum jeito, acabamos na minha cama? E aí você me diz que era tudo por causa de um emprego? Por que não para de fazer isso comigo?! Pensei que estava livre dos seus malditos joguinhos.
ER: Bridget, eu...
BC: Pegue suas roupas e saia, Ettie.
[Esther recolhe as roupas dela]
ER: Foi… Foi muito bom ver você, Bridget.
BC: Só vá embora.
[Esther sai]
BC:[suspiro] Certo, ela foi embora. Vou editar fora a primeira parte para fins de preservação da decência... mas você estava certo. Ela queria me recrutar. Quando recolher as fitas amanhã, deixe um sinal se quiser que eu siga a acompanhante dela também. Sinto muito ter duvidado de você █████. Conversamos em breve.
[rádio sintonizando; o estaleiro; Sally disca em um telefone público; ele toca]
SG: Aqui vamos nós… Oi. Sou eu. Funcionou, acho. Caso contrário, você não vai ouvir isso. Talvez o som esteja ruim. Não sei. O número desse telefone é 215-█████. Me liga de volta.
[Sally desliga; o telefone toca; estática na linha]
AP: Funcionou, Sally. Tudo bem.[funga] Estou bem. Obrigado. É só que… sua voz é a primeira voz que ouço sem ser a minha em tanto, tanto tempo. Acabei de ouvir sua mensagem três vezes seguidas! Obrigado mesmo.
[gravação termina; Sally desliga]
SG: Consegui! Consegui! Tem tanto tempo que algo não dá certo. Tanto tempo que não faço algo que não termina em desastre!
Dá pra ver a doca onde o Eldridge ficava daqui. ‘Tá com a mesma aparência de sempre. Não daria pra saber que foi onde comecei minha nova vida aqui. É onde tudo começou. Bom, começou no meu laboratório, mas tanto faz. Nossa língua não foi feita pra isso! A última vez que estive na doca 47, estava quebrada, delirante e tinha 273 e-mails não lidos. Agora não tenho nenhuma dessas coisas.
Você acha que alguém se lembra? Acha que alguém sabe que hoje é o sexto aniversário de tudo isso? Faz seis anos desde que renasci na Filadélfia, e ninguém liga! Cadê meu bolo? Cadê minha festa?
[splash]
SG: Mas o que… alguém acabou de cair na água!
[gravador de fita desliga]
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12: Recurso
[gravador de fita liga; um parque; Lou e David jogando xadrez]
LOU GAINES (LG): Xeque! Sabe, dizem que estratégia é sua própria vontade projetada no mundo real e, de onde estou, está parecendo que sua estratégia é me deixar ganhar.
DAVID MARIAN (DM): Parece que sim.
LG: O que está lhe incomodando hoje? Você aparece com cara de quem comeu e não gostou, não fala nada sobre e, de repente, seu jogo cai aos pedaços.
DM: Só não estou no clima para jogar hoje, Lou, OK?
LG: No clima ou não, filho, você precisa de todo o treinamento que puder se não quer se envergonhar no torneio. Não falta nem uma semana, e você ainda tem aulas, a concessionária... Se essa cara sua é porque alguma mocinha lhe deu um fora, eu digo “bom”. Não precisa de mais distrações.
DM: Não é– Não vou participar do torneio.
LG: O quê? David, por que diabos estou aqui senão para ajudar você a ficar bom o bastante para jogar?
DM: Fui até o centro comunitário hoje de manhã para fazer minha inscrição. Entro e vou para a mesa, sem problema. O bobo alegre com a prancheta dá uma olhada para mim, e vejo o sorriso escorregar para fora da cara dele como um pedaço de gema mole. Eu digo que quero me inscrever, ele me fala que não tem mais vagas. As pessoas já estão começando a fazer fila atrás de mim, então sei exatamente o que ele está fazendo, e sei que eu não devia me incomodar, mas não. Não, eu sigo em frente, insisto que deve ter algum erro e que não tinha nenhuma placa dizendo que alguém como eu não era bem-vindo. Ele insiste de volta que não, não tem nenhum erro, e que eu devia parar de segurar a fila. Consigo enxergar nos olhinhos de porco dele o que quer dizer, mas não vai se rebaixar o bastante para fazê-lo. E fico com aquela sensação de leveza que sei que significa que tenho que sair dali antes de dar uma surra nele e ter que ligar para você depois, pedindo dinheiro para a fiança. Então aqui estou.
LG: Bom, fico feliz que nenhum sangue foi derramado desta vez. Não iríamos querer um bis daquele garoto branco no Monte Cassino.
DM: É, estão tão orgulhoso de mim mesmo.
[David derruba o rei dele]
DM: Então podemos só adiar isto por um tempo? Não tem nem sentido mais, de qualquer forma.
LG: O sentido é pegar o que sei que você tem e polir até brilhar. Se você quer vencer, é melhor ser consistente. Além disso, tenho o período sabático inteiro para passar encarando a parede, então prefiro não começar tão cedo.
DM: O que você– Espera, foi isso que aconteceu naquela reunião de que você estava falando?
LG: Bom… Bom, o Diretor Meadows tinha que fazer algo quando os pais começaram a bombardear o escritório dele com ligações sobre os “filhos e filhas sendo submetidos a influências soviéticas”.
DM: E isso é linguagem acadêmica para o quê?
LG: Parece que alguns dos meus estudantes se incomodaram com o conceito de investigar as diferenças entre a imprensa soviética e a nossa. Alguns estudantes entregaram trabalhos muito bem escritos e pesquisados, e o resto deu um ataque agudo de “patriotismo” e ligaram para casa para contar para a mamãe e para o papai. “Período sabático compulsório” é do que estão chamando, por hora. Assim que conseguirem reunir o bastante para levantar uma dúvida verdadeira sobre minha ideologia política, pode apostar que encontrão uma solução mais permanente.
DM: Mas você é um herói! E tenho certeza absoluta de que você não é um maldito comuna!
LG: David, vamos só jogar de novo, não quero envolver você nisso.
DM: Alguém sequer mencionou sua dispensa honrosa? Sabem o que isso vai parecer para as pessoas?
LG: O ponto do comunismo é que ele se espalha, certo? Como um germe teimoso. Quem sabe o que trouxemos de volta conosco da guerra? E todo mundo– incluindo você, meu amigo– está perdendo a cabeça agora que os comunas estão testando as próprias ogivas. Somos o único país na história a usar A Bomba como uma arma ofensiva, então talvez os soviéticos tenham o direito de estarem um pouco assustados.
DM: Você está falando sério? Lou, você sabe o que Joe Stalin faz com o povo dele! Nós dois ficamos sabendo de soldados que estavam no meio daquela confusão toda. E os pobres bobos ainda veneram o sujeito como se nada tivesse acontecido!
LG: Você se preocupa com o que não pode controlar, filho, e esse é seu problema. Concentre-se na sua melhor linha de ação e verá as coisas se acertando. Agora, arrume o tabuleiro de novo, quero ver se está prestando atenção.
[rádio sintonizando; Lou acende um cigarro]
LG: Misericórdia, Senhor, esse garoto…
HANK CORNISH (HC): Um dia eles aprendem, não é mesmo?
LG: [tosse, surpreso] Uh, com licença, senhor?
HC: Asseguro-lhe que isso não é necessário, senhor. Só queria uma palavrinha, se tem um instante. Espero que estar certo: você é mesmo o Capitão Louis Abbot Gaines?
LG: Isso mesmo, Senhor…?
HC: Beck, senhor, Francis Beck. Estou aqui em Dover em um serviço para um dos meus chefes no Departamento de Estado, como costuma acontecer, e queria me assegurar de que lhe fazer uma visita.
LG: Com que objetivo?
HC: Posso sentar no banco de passageiro? Preferiria que fizéssemos isso discretamente.
[Hank contorna o carro, entra]
HC: Assumo que deve estar ciente de pelo menos parte da ameaça que nosso país está sofrendo atualmente, Capitão.
LG: Veja bem, Senhor Beck, fui dispensado. “Professor Gaines” serve, por hora.
HC: Professor, nós na comunidade de inteligência temos motivos para acreditar que– e espero que mantenha a boca fechada sobre isso– há espiões soviéticos alocados aqui já faz alguns anos. Temos todas as razões para acreditar que os comunas tentarão enviar mais, e é por isso que nosso mais novo programa se foca nas raízes das iniciativas de defesa: contraespionagem plantada em casa para preservar a paz, por se dizer. Acreditados que homens como você– militares veteranos, homens de muitas habilidades– são candidatos ideias para nosso programa e, pelo que entendi, parece que você estará disponível no mercado em breve.
LG: Não está facilitando confiar em você, Senhor Beck. Se eu fosse outra pessoa, poderia considerar vasculhar meus negócios para me preparar para essa reunião um pouco rude.
HC: Temos nosso processo de recrutamento, assim como todo mundo. Nosso alcance apenas é maior.
LG: Certo, vou ouvir sua proposta, mas tenho uma condição. Tenho um amigo que pode merecer isso mais que eu.
[rádio sintonizando]
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Relatório 22 da Sala Escura: as inspeções rotineiras em todos os sistemas não revelaram problemas mecânicos ou defeitos em nenhum lugar. Sinceramente, dada a natureza questionável de tudo isso, tenho uma chance decente de nunca me deparar com um único probleminha no sistema. Talvez a partes móveis nem estejam se movendo, e a coisa toda tenha se fundido em um grande diapasão para radiação taquiônica. E se for uma máquina de movimento perpétuo? A menos que alguém me tire aqui, provavelmente nunca terei certeza, e essa é quase a pior parte. Quase. A pior parte ainda é ficar preso em uma sala escura como o breu por um período interminável e difícil de definir. Mas é libertador, de certa forma, não ter que me preocupar com compras, contas, parecer apresentável para o trabalho, nada do tipo. Whickman provavelmente poderia tirar um tempo em um lugar como este, com todas as responsabilidades que tem. Um teste nuclear soviético em 1969 e ele começa a contratar a torto e a direito. Qualquer um, até. Nunca vi Whickman entrar em pânico, mas essa parece ser a versão dele de não aceitar bem as notícias. No fim, a ADRA agora tem uma razão para fazer o que sempre quis: espalhar-se como cogumelos no escuro. BT50, HM48, LG49, DM50, KS49... Estou começando a soar como um anunciador de bingo.
[rádio sintonizando]
HC: Seu nome completo, para a gravação, por favor?
LG: Louis Abbot Gaines.
[rádio sintonizando]
DM: David Marian.
[rádio sintonizando]
HC: Senhor Gaines, segundo o meu entendimento, você e o Senhor Marian serviram na mesma unidade.
LG: Isso mesmo. Infantaria Móvel Três-Oitenta-Oitava.
HC: Enviados para a Alemanha?
LG: Itália. 130 quilômetros a sudeste de Roma, no Monte Cassino.
HC: Ouvi dizer que as tropas terrestres passaram por um inferno lá.
LG: Nunca vi nada parecido, antes ou desde então.
[rádio sintonizando]
DM: Eu era o engenheiro da unidade, então não fui exatamente recrutado para combate. Mas ajudei a assegurar que cada jeep e tanque com que cruzássemos fosse parar na guarnição fora do Cassino.
HC: Mas você atirava. Lutava, também. Fez sua parte dos dois, pelo que ouvi.
DM: Eu preferiria não entrar em detalhes sobre isso, se não se importa, senhor.
HC: Se você vai trabalhar para mim, tenho que saber. Já passou, só preciso ouvir os detalhes.
DM: OK. Então, estávamos no Monte Cassino há um bom mês, ouvindo granadas destruírem o maravilhoso campo italiano, e Lou me manda uma mensagem dizendo que temos que ir à cidade para ajudar uma pobre e covarde unidade que foi isolada. Então lutávamos com unhas e dentes contra aqueles Krauts filhos da puta e, quando chegamos até onde precisávamos ir, a divisão está derrotada, sem membros em condições de lutar. Estou tão agitado do caminho até esses garotos que mal me lembro de pular os destroços ou derrubar mais soldados alemães. Pode checar os relatórios pós-combate para conferir. Tudo de que me lembro é uma confusão de barulho, movimento e retirada, até voltarmos para o topo colina com vista para cidade. De repente, ouço um garoto de Oklahoma berrando sobre como Jimmy ainda estaria vivo se os macacos não tivessem demorado tanto. Eu ainda devia estar meio louco com a adrenalina... Não me lembro de estar batendo nele até alguém me puxar para trás com um full-nelson. E esse alguém era o Capitão Gaines.
HC: E ele assumiu a culpa por tudo, fiquei sabendo. Defendeu você quando todo o resto teria deixado lhe levarem para a corte marcial.
DM: Sim. Ele meio que me tomou como protegido, pode-se dizer. Ficou de olho em mim o bastante para me impedir de desacordar mais dos nossos garotos, pelo menos. Foi ele quem sugeriu que eu entrasse para a Delaware State.
HC: Onde o Senhor Gaines era professor até recentemente, pelo que entendi.
[rádio sintonizando]
LG: Isso mesmo.
HC: Então o seu período sabático não foi, na verdade, voluntário? O diretor da faculdade mencionou algo sobre mandar os alunos pesquisarem a boa e velha indústria de publicidade do Uncle Joe ou algo do tipo.
LG: A tarefa era analisar os efeitos do controle extremamente rígido sobre a imprensa que Stalin impôs, e dar uma opinião crítica sobre os efeitos dessa mesma tendência aqui. Um trabalho assustador demais para alguns, vejo agora.
HC: Então lhe despedirem por, o quê, fazer proselitismo para os russos? Levamos acusações como essa muito a sério, Senhor Gaines. Os tempos demandam que tomemos certas medidas, então as tomamos. Você adere à ideologia comunista, “todos os homens são iguais perante o Estado”, e coisas do tipo?
LG: Não, senhor, adiro à ideologia de “conhece o teu inimigo”.
HC: Ah, você soa como um homem que leu “A Arte da Guerra”.
LG: Correndo risco de soar melodramático, Sr. Beck, estar vivo em si é uma batalha para homens como eu. Matei homens. Não homens muito bons, mas homens. Eles tinham cor de pele diferente, linguagem diferente, motivações diferentes, até mesmo repulsivas, mas ainda eram homens. Às vezes você ouve pessoas perguntarem umas às outras do que elas abririam mão para manter seu país seguro. Nunca pensam no que temos que tomar para isso.
[rádio sintonizando]
HC: Você faria tudo pelo seu país, David?
DM: Sim, senhor, eu faria. Lou deixou difícil de superar nesse sentido, quando estávamos na Itália. Eu daria o meu máximo. Sr. Beck, amo o meu país.
HC: Obrigado, David. Nós–
[rádio sintonizando]
HC: Obrigado, Sr. Gaines. Nós entraremos em contato.
[rádio sintonizando; jogando xadrez no parque]
DM: Recebi a resposta de Beck hoje, exatamente como ele disse. Estou dentro. Querem que eu vá até um lugar no Colorado para treinamento.
LG: Você vai entrar, então? Combater o bom combate, como ele disse?
DM: Bom, faz sentido, não é? Eu ganho o bastante para me sustentar na Calvin’s, mas não dá para viver tranquilamente com aquele salário, e ainda tem meu débito estudantil... Além disso, ficaria bem ter trabalho para o governo no currículo, não é?
LG: Depende a quem você pergunta, imagino.
DM: Você acha que é a decisão errada?
LG: Bom, eles nunca contam mais do que acham que você deva saber, não é? Caso contrário, não teriam tantos voluntários. É uma questão de a coisa certa a se fazer, não de decisão errada. Xeque.
DM: Lou… Sei que nos tratavam como vermes lá, não importa o que fizéssemos. Mas pude ver o mundo, e tive que encarar o que um homem pode fazer a outro homem. Fizemos a coisa certa lá, independente de se nos agradeceram ou não. Se tenho que colocar minha vida em espera para salvar algumas outras, acho que poderia dormir tranquilo à noite, sabe?
LG: Heh. Sabe, você está começando a fazer sentido.
DM: Não...
LG: É, parece mesmo um xeque-mate, não é? Vamos, acho que acabei de ver Pete entregando a correspondência.
[rádio sintonizando; Lou abre a caixa de correio]
DM: Está aí? Espera, acho que é isso!
LG: Creio que sim.
DM: Então abre!
LG: Quer abrir? E saia de cima de mim, preciso encontrar minhas chaves.
DM: Haha! Ele é um bom companheiro…
[rádio sintonizando; em um ônibus]
LG: David. David, acorda, estamos aqui.
DM: [acordando] Hmm? Oh, OK, ótimo, isso é ótimo, eu... Meus Deus, é ainda pior que o folheto fez parecer.
LG: Mas eu estava certo sobre as montanhas.
DM: Dá para parar, por favor?
LG: O jantar parece bem gostoso.
DM: Acho que mudei de ideia sobre tudo isso, Capitão.
LG: Não funcionou antes, filho, não vai funcionar agora. E não tem nenhum Kraut tentando explodir você até o Reino do Amanhã desta vez, e tem um vista melhor.
DM: Vou dar essa dica de graça: seus discursos motivacionais não melhoraram desde aquela época.
[rádio sintonizando; recrutas murmurando]
RAY VICO (RV): Como é bom vê-los, cavalheiros. Meu nome é Raymond Vico. Estarei encarregado de transformá-los em agentes de valor da ADRA, de livrá-los da gordura, de corpo e alma. Não tomem isso como uma crítica ao Senhor. O que fazemos, fazemos fora de vista de nossos concidadãos, para que possam prosseguir com suas vidas sem medo. Se cumprirem seu dever da maneira correta, nossas melhores esperanças são de que ninguém nunca fique sabendo, nem mesmo os outros agentes. Se sentirem que uma vida sob os holofotes faz mais o seu estilo, estão livres para sair a qualquer momento e perseguir a vida de showgirl, para mim dá no mesmo. Tagarele para qualquer em seu camarim sobre este lugar, sobre nós, e veja se acreditam em uma palavra. Isso é porque fazemos as coisas como fazemos, e este país é mais seguro por isso. A natureza da nossa existência é a prova do nosso poder e, se alguém fala de nós, fala de sombras que não pode tocar. Digam adeus a suas antigas vidas, cavalheiros, e boas-vindas a talvez a maior tarefa já exercida por homens livres. Comecemos.
[rádio sintonizando; recrutas lutando]
RV: Pés no chão, Hollis. Isso! Vamos lá, Sugimura, Gaines é manco e tem mais flexibilidade! Swift, fique debaixo do ombro dele e ele lhe fará pagar por isso, pode apostar. Marian, venha aqui. Todos, observem, essa postura depende de força nas pernas. Colocando-se atrás de seu oponente, você tem meios simples de incapacitá-lo, mesmo se ele tiver a sua altura. Preparado? Vai.
[Ray derruba David]
RV: Ótimo! Da próxima vez, troque de pé para o direito.
DM: Nunca vi ninguém se mover assim, senhor.
RV: Aprendi com um dos meus comandantes em Laos, só que ele me apagou de verdade.
DM: Enviamos tropas para Laos?
RV: Cale a boca e treine.
[rádio sintonizando]
RV: Este aparelho é conhecido como Kit de Campo da Timepiece. Vocês receberam explicações sobre a teoria por trás dela, uma vez que é o que nos permite operar como fazemos. É nossa ferramenta mais poderosa, e o uso dela é uma questão da mais severa necessidade. Programando-a para a data desejada– vejam aqui– e ativando-a, vocês viajarão até a mesma posição geográfica, na data inserida. E, como deveriam ter martelado em suas cabeças como uma oração de antes de dormir, qual é a data limite para as viagens? Sugimura?
KENZO SUGIMURA (KS): 29 de outubro, 1943.
RV: Bom garoto. E o motivo é, Gaines?
LG: Uma anomalia no tempo e espaço causada por um experimento do exército dos EUA. A Timepiece usa as energias focadas naquele lugar como um ponto âncora.
RV: Correto, e isso é precisamente tudo que estão autorizados a saber sobreo assunto.
[rádio sintonizando]
DM: –não conseguiria jogar uma pedra no chão sem errar! Ele joga todo arremesso que vem na direção dele para fora, como se estivesse rebatendo pela lei das médias.
KS: Acho que ele ainda está– Hm, bom dia, Agente Vico!
RV: Sim?
KS: Eu estava só, hm, desejando-lhe um bom dia, senhor.
RV: Para você também, Sugimura. Espero que estejam bem descansados, hoje começa o treino de privação de sono de vocês bobos alegres. E quem sabe? Talvez encontremos um jeito de deixar as coisas mais empolgantes.
KS: Ah. Mal posso esperar, senhor.
RV: Saboreiem sua aveia, cavalheiros.
DM: Boa tentativa. E, à propósito, os Cubs ainda não tem a menor chance sem o Cavaretta.
KS: Vá para o inferno.
[rádio sintonizando]
RV: Bom, senhor Sugimura, como se sente? Faz três dias que você não dorme, descreva-me seus sintomas físicos.
KS: [privado de sono; embolando as palavras] É como se... minha cabeça fosse de algodão. As coisas tão meio embaçadas nos cantos. Meio… meio enjoado.
RV: Agora quero testar sua memória. Três dias atrás, você me desejou um bom dia e, antes de sair, eu disse quatro palavras. Pode me dizer que palavras eram essas?
KS: Ai meu Deus… “Tenha um…” Não. “Mal posso esperar, senhor”?
RV: Não, isso foi o que você disse. Quais foram as quatro palavras que eu–
KS: Não sei, merda, não sei! Não consigo me lembrar, não consigo pensar...
[Ken cai; os recrutas riem]
RV: Vocês podem ter que ficar ativos por longos períodos, cavalheiros. Cumprir um objetivo em uma pequena janela de tempo que não permitirá descansos. Lembrem-se do nosso amigo Sugimura quando atingirem o terceiro dia e vão com calma. Tomem cuidado em seus movimentos. Controlem suas emoções. Agora, alguém pode pegar uma cadeira para ele para que eu possa continuar?
[rádio sintonizando]
RV: Cavalheiros, hoje é o dia. Neste momento, vocês seis se tornam membros do nosso pequeno círculo. Sua bravura e serviço a este país pode nunca ser reconhecido pelo mundo exterior, mas será por nós. Nós, que entendemos a importância do nosso dever saberemos, e lhes consideraremos acima de todos. Como deve ser. Quando eu ler nome de vocês, por favor deem um passo à frente para receber as últimas identificações verdadeiras que jamais terão. Verão que foram impressas com a data de hoje, 30 de outubro de 1949 e, com esses documentos, a ADRA de qualquer era lhe reconhecerá. Quando viajarem para o passado para cumprirem seu dever, sei que o mundo ao qual retornarão será melhor por sua causa. Deus abençoe a América e todos vocês. Agente Ethan Avery.
[aplauso]
RV: Agente Brian Edmonds. Agente Louis Gaines. Agente Frank Hollis. Agente David Marian. Agente Kenzo Sugimura. Bem-vindos, todos. Se me acompanharem, encontraremos suas companheiras agentes do sexo frágil para uma pequena recepção. Eu diria que todos vocês têm direito a um drink depois de seis semanas vivendo como monges.
[comemorações; rádio sintonizando]
AP: –parecendo um anunciador de bingo.
[bip de alerta; digitando]
AP: OK, OK, aqui vamos nós. Oh. Oh. Oh não. Ai meu Jesus Cristinho. Isso não pode estar certo. De jeito nenhum o Cornish estragaria tudo tão completamente. E, ainda assim... esse é o ponto, certo? Direto da fonte, despojado de quaisquer dúvidas ou perguntas quanto à credibilidade. Sentar em silêncio, no escuro, para receber e transmitir revelações, como um anacoreta com um rádio amador. Oh, e caso esteja se perguntando, um dos nossos agentes, um tal de Louis Abbot Gaines, traiu a agência, obteve e forneceu fotografias do Kit de Campo da Timepiece aos soviéticos, porque aparentemente nosso processo de alistamento é feito pelos estagiários. Agora tenho que salvar o traje em forma de agente secreto que contém o traseiro incompetente de Cornish. Precisamos de uma agência rival tanto quanto eu preciso de um chute nas bolas.
[rádio sintonizando; uma festa]
DM: Sabe, na verdade estou meio surpreso que você continuou até agora.
LG: Como assim?
DM: Só pensei que você sentiria falta de, sei lá, toda a coisa acadêmica.
KS: Você era professor?
LG: Professor de jornalismo, por todo bem que isso me fez. A escola não tinha fibra para um currículo mais... desafiador.
KS: É, bom, a verdade pode ser uma coisa assustadora.
HC: Você trabalha na inteligência agora, filho, melhor deixar toda essa conversa de “verdade” de lado. É indecente e não vou aceitá-la na minha casa.
LG: Boa tarde, Senhor Beck. Não estava esperando você por aqui.
KS: Aceita um copo, senhor?
DM: Devia aceitar, Senhor Beck, apesar de eu ainda não ter certeza do que é “shochu”.
HC: Não estou tão ocupado que não posso tirar um momento para parabenizar nossos mais novos agentes, mas vou ter que recusar a bebida. Na verdade, estava querendo uma palavrinha com o Agente Marian por um instante.
DM: Huh– Claro, senhor. Mostre o caminho.
HC: Não vou segurá-lo por muito tempo, garotos, eu prometo.
[rádio sintonizando]
HC: Sinto muito lhe roubar assim, David, mas isso não pode esperar. O tempo é, digamos, um fator decisivo.
DM: O que está havendo, Senhor Beck?
HC: David, temo que recebi inteligência de um dos nossos agentes dizendo que Louis Gaines passará documentos delicados e confidenciais para os nossos “estimados colegas” em Moscou. David, eu–
DM: Não, senhor. Não acredito que ele seria capaz de algo assim. E o que você quer dizer com “passará”? Como poderia ter tanta certeza do que ele está pensando...
HC: Porque eu sei, David. Nós. Sabemos. A pergunta que fazemos não é “por que” um homem faz algo, David, apenas “como”.
DM: Senhor Beck, por que estou aqui? Por que está me contando isso?
HC: Porque você vai impedi-lo, filho. Essa será sua primeira missão.
DM: Eu me graduei há uma hora, senhor! Por que você me escolheria para isso?
HC: É o único que sabe os movimentos e localizações de vocês dois no dia em questão.
DM: Que dia?
HC: O dia em que vocês dois foram admitidos à ADRA.
[rádio sintonizando; Lou e David jogando xadrez]
LG: Você está terrivelmente quieto.
DM: Bom, gosto de pensar que estou aprendendo. Ouvir quando os outros falam é um sinal de inteligência, não é?
LG: Aqueles jogadores de xadrez estão conversando com você? Xeque.
DM: Mais do que antes, pelo menos.
LC: Você melhorou.
DM: Ou isso, ou você está piorando.
LG: Bom, acho que nunca saberemos. Você é o único com quem eu jogo. Isso é um xeque-mate. Mais uma?
DM: Não posso. Já está na hora.
LG: Não se esqueça de me avisar quando cansar de contar aquelas piadas.
DM: Pode deixar. Adeus, Lou.
LG: Boa sorte, David. Sabe, você me deixa muito orgulhoso.
[rádio sintonizando; terminal de ônibus]
HC: Até a próxima, Senhor Marian. Vá com cuidado e as coisas acabarão bem, você verá.
DM: Eu não poderia pedir instruções de missão mais simples, senhor.
HC: Nunca houve nada simples sobre esta vida, filho. Você irá bem.
DM: Só uma coisa antes de eu ir, Senhor Beck.
HC: Pode falar.
DM: É bom você estar certo sobre isso mesmo.
[rádio sintonizando; Timepiece ativa; distorção estática]
DM: Ai… Ai meu Deus–
[David vomita; rádio sintonizando; David assiste o carteiro sair; chega perto da caixa de correio; pega uma carta; rádio sintonizando; uma fogueira; David amassa a carta e a joga no fogo]
DM: Adeus, Lou.
[rádio sintonizando]
AP: Precisamos de uma agência rival tanto quanto eu preciso de um chute nas bolas.
[alerta]
AP: Oh. “DM49 reporta que a missão Gaines fui cumprida, nenhuma irregularidade, nenhuma tangente adicional designada para regulação. DM49 voltou ao grupo para reciclagem. Missão Gaines cumprida, repetindo, nenhum ajuste adicional necessário. ” O sistema funciona. Mãe de Deus, ele funciona! Ele funciona.
[rádio sintonizando]
HC: Bom, senhor Marian, o que eu posso dizer? Você foi muito bem, um trabalho muito limpo, ouvi dizer. O Agente Vico pareceu muito satisfeito... mas eu nunca fui muito bom em lê-lo.
DM: Eu não poderia ter pedido instruções de missão mais simples. Quem quer que seja o escavador que organizou toda essa sequência de eventos, com certeza sabe o que está fazendo.
HC: Passarei seus elogios à Sala Escura. Agora, se não precisa de mais nada, eu não devia deixar a Senhorita Roberts esperando–
DM: Senhor Beck, tenho algo a adicionar, se puder.
HC: Certamente, filho, pode falar.
DM: Eu recomendo uma reunião com o comitê do Sr. McCarthy sobre Atividades Antiamericanas o mais rápido possível.
HC: Mesmo? Por quê?
DM: … Para apontar a eles a direção de Louis Abbot Gaines.
HC: Não estou acompanhado. Os eventos que geraram a missão Gaines já foram reconciliados, e não posso deixar de ficar surpreso com você jogando seu pai emprestado para os lobos que McCarthy tem no canil dele.
DM: Não conheço o seu Louis Gaines, senhor. Nunca conheci. Reconciliei um possível futuro para ele, mas você sabe tão bem quanto eu que este não é o fim. Eu aconselharia ficar de olho nele por hora, só por precaução.
HC: Muito bem, Agente Marian, muito bem. Bem-vindo a sua nova vida.
[gravador de fita desliga]
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11: Sala Escura
[gravador de fita liga]
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Alô? Testando, testando… Os níveis parecem OK. Acho que esta coisa consegue me ouvir. Ah, olá, meu nome é Anthony Partridge... Não imagino que você esteja ouvindo isto sem já saber disso. A data de hoje é... Merda, o que isso importa? É 28 de outubro de 1943, o que é, para mim, todo dia. Então, quando quer que for para você.
Quanto a onde estou, é difícil para caramba descrever. Por onde eu começo? Tem um chão. Uma plataforma de metal frio e escuro, do tipo que usam para fazer navios de guerra. Mas, além disso, não tem nada. Uma cortina preta como o breu me separando do resto do mundo e do próprio tempo. Nenhuma parede de verdade, nenhum teto de verdade, e uma força de repulsão quando coloco minha mão na fronteira.
É aqui que moro agora. Onde vou viver, respirar, comer e morrer. Esta sala é minha prisão. Minha cela. E não estou sendo dramático, chama-se CELA mesmo. Campo Extrínseco alguma coisa. Uma pequena bolha no tempo isolada a um único momento, presa ao convés do USS Eldridge no Estaleiro Naval da Filadélfia, na tarde de 28 de outubro de 1943. Este lugar, aqui e agora, é o nexo que torna viagem no tempo possível, e estou aqui para assegurar que o governo dos Estados Unidos aproveite ao máximo este serviço da ADRA, a Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos.
As instruções que encontrei quando cheguei aqui chamam este lugar de “a Sala Escura”. Assumo o nome venha do lugar em que os subordinados de Napoleão liam as cartas de todo mundo, mas pode ser porque é literalmente uma grande sala escura! Minha missão é facilitar as comunicações entre várias iterações da ADRA através do tempo e do espaço. Mensagens, planos, inteligência, os resultados da liga de beisebol do ano que vem... Sim, um carteiro temporal. Que glamoroso.
Cheguei até a Sala Escura com a ajuda de uma versão da máquina do tempo da ADRA, que nós, não lá muito espertamente, chamamos de Timepiece. Fui mandado junto com todas as ferramentas e equipamento que jamais precisarei, rações de combate o bastante para me alimentar para sempre, e um computador especializado que inventei que se aproveita das propriedades da Timepiece para meio que “trapacear” e resolver problemas arbitrariamente complexos instantaneamente – o que é necessário para coordenar todos os futuros alternativos e linhas do tempo paralelos, e etc. e tal.
Mas não foi só isso que encontrei quando cheguei aqui. Havia uma enormidade de outras caixas e equipamento que foi mandado junto comigo. E é do futuro. Tem tanta coisa aqui que é meio difícil me locomover.
Adicionaram um monte de modificações ao APU, todo tipo de tubo e cabo e aparelho. Tem um grande fio saindo dele, conectado a algum tipo de aparelho de televisão e um teclado de máquina de escrever, provavelmente um terminal para os dados do computador. Tem uma grande estante com livros e jornais e documentos técnicos. Parece que tenho rações melhores também. Fico feliz de não ter que comer ensopado de carne todo dia até morrer.
Achei um ditafone eletrônico entre as caixas. De acordo com as informações no manual, ele tem capacidade de armazenamento de mais de 1000 horas de gravação, apesar de ser menor que a palma da minha mão. Já que o tenho, pensei que deveria gravar meus pensamentos. Não sei se alguém os ouvirá um dia, mas Sally jura que sim. Acho que ajuda ela a ter algo para que falar. Para conversar. Para ajudar a organizar os pensamentos. Talvez ajude a organizar os meus.
Há de ser tudo das versões futuras da ADRA, que tem melhorado o sistema através dos anos! O planejamento do meu trabalho continuou por décadas depois de eu ir embora. Não acredito que Whickman fez mesmo tudo isso.
[rádio sintonizando; quarto de hospital]
CHET WHICKMAN (CW): É difícil vê-la assim… Não sei se aguento perder as duas maiores mentes que já conheci na mesma semana.
HANK CORNISH (HC): Ela vai sobreviver. Esther a colocou em uma rotina incrivelmente rigorosa para se assegurar que ela não acabe uma idiota babona. Mas parece que o quer que aconteceu deu um tremendo choque no sistema dela.
CW: Chegamos a algum lugar na investigação da causa? Ela estava bem alguns dias atrás, e agora... isso?
HC: Não, mas o médico diz que deve ter sido totalmente repentino. Mesmo considerando de onde ela vem, a baixa exposição dela a paradoxos não teria causado sintomas tão ruins, tão rápido. Está estável, mas... ela tem um longo caminho pela frente.
CW: Os resultados iniciais parecem promissores. E Sally é uma lutadora.
HC: Não creio que chamaria os raios-x dela de “promissores”. Se tivessem a socorrido um pouco mais tarde, duvido que teriam sido capazes de ajudá-la.
CW: Ela teve a crise às 6:12, a notícia chegou às 6:13, e já estavam levando-a de maca às 6:14. Esses sujeitos da Timepiece são um milagre. Perdoe o trocadilho, mas parecem reloginhos.
HC: Mas só os usamos para as coisas erradas! Sério, Chet, aquela mulher não tem o menor respeito por este trabalho. Quantas vezes já não a salvamos?
CW: Não se pode colocar um preço em uma mente como a de Sally Grissom. Ela é única.
HC: Nunca entendi por que você e Esther gostam tanto dela. O que ela tem? Por acaso dá um sumiço no seu bom senso fazendo referência a cenas de filmes que nem sequer existem ainda sem parar?
CW: Você não a conhece como nós. Há mais em Sally que apenas ser do futuro. Já lhe contei sobre como ela inventou o PAT?
HC: Conte-me.
CW: Ela assumiu erroneamente que eu a estava acusando de assassinato. Inventou o PAT para provar a inocência dela. Construiu a coisa em apenas três dias, movida a nada além de café e força de vontade. E funcionou perfeitamente! Mal fizemos mudanças no design desde aquele primeiro dia.
HC: Não estou duvidando de que o que ela tem na cabeça é valoroso, mas Grissom é uma subversiva. Será problemático se ela cruzar com algo que não devia e fizer como Anthony Partridge.
CW: O que você sugere, então? Não é como se desse para extrair o conhecimento do cérebro dela. Não podemos simplesmente algemá-la a um radiador e pedir educadamente que pesquise divisão também. E já gastamos a carta de “prender o gênio na Sala Escura”. Precisamos dela, Hank. Gostando ou não, é a melhor candidata para o trabalho. E, se ela pode ser útil para nós, temos que mantê-la por perto.
HC: Como? Quer dizer, a mulher é praticamente uma comunista, pelo amor de Deus!
CW: Ela vai cooperar. Assim que vir o que estamos fazendo, vai entender.
[rádio sintonizando; ECG]
SALLY GRISSOM (SG): [incompreensível]
MÉDICO (M): Bom dia, Senhorita Grissom.
SG: (Doutora.)
M: Você sabe onde está, Senhorita Grissom?
SG: (DOUTORA Grissom.)
M: A-hã. Certo. Você está em um hospital, Senhorita Grissom. Sofreu uma lesão traumática no cérebro, e isso pode estar afetando sua habilidade de falar.
SG: Guhh–
M: Não precisa se exaltar. Na mesa perto de você, tem uma caneta e um papel. Consegue pegá-los?
[Sally derruba a caneta da mesa]
SG: (Merda!)
M: Não precisa se estressar, Senhorita Grissom. Você está em boas mãos. Vamos ajudá-la a superar isso.
[interfone]
M: Podem mandar alguém até o 1-16? Sally Grissom está acordada.
[rádio sintonizando]
M: OK, leia a palavra no cartão.
SG: Mahh.
M: Não, Sally. Isso é um trem. [devagar] Trem.
SG: Mow-mah.
M: Trem.
SG: Turmpeh.
M: Muito bem. Estamos progredindo.
[Médico troca o cartão]
M: O que é este?
SG: (Você é um cuzão.)
M: Novelo.
SG: (Vai se foder.)
[rádio sintonizando]
M: Você está indo bem, agora leia a frase na sua frente.
SG: [gaguejando] O rato... vai roer… a roupa do rei de Roma.
M: De novo.
SG: O rato… roendo… roupa. Rato. Roeu. Roupa.
M: Você consegue.
SG: Rato roía roupa. Rei de Roma.
M: [suspiro] Estamos progredindo.
[rádio sintonizando; muletas]
SG: Eu odeio isso.
M: Estamos treinando seu corpo de novo para fazer uma série de tarefas simples às quais você não dava valor.
SG: Me sinto como uma criança!
M: Você está indo bem. Só precisa cruzar este corredor.
[rádio sintonizando]
M: Certo, quero descobrir a verdadeira origem desses delírios.
SG: Não são… hm… sonhos malucos, sou trouxa! Não era pra eu estar aqui!
M: Sim, você acredita ser do ano 20█. O que lhe levou a essa conclusão?
SG: O que te levou à contrária?
M: Bom, para começar, é 1949. Aqui, dê uma olhada no meu calendário. 20█ simplesmente não faz sentido, entende?
SG: Mas sou de lá! Tinha essa coisa, a caixa do tempo e… Eu ‘tava no Texas, e depois na Filadélfia, e no Novo México, e no Colorado, e aí... Aí... Não consigo lembrar das palavras. Não sei as palavras.
M: Senhorita Grissom, por favor—
SG: Doutora. É doutora. DOUTORA Grissom.
M: Quando se sofre uma lesão cerebral como a sua, é possível que ficar confuso. Irritável. Pode-se recordar de acontecimentos que nunca ocorreram, de tempos que não existem. O futuro, essa máquina do tempo absurda... Nada disso é real, Senhorita Grissom. Você tem que aceitar isso se quer se curar. É perfeitamente natural ficar frustrada quando a realidade não bate com suas fantasias—
SG: Não são fantasias! Se isso fosse verdade, como eu poderia saber o nome de todo... presidente americano, pelos próximos oitenta anos?
M: OK, vá em frente.
SG: Truman, e depois… Hm… O próximo foi… Ok, tudo bem! Péssimo... exemplo! Mas é tudo verdade! Pergunte ao Whickman. Whickman vai te contar!
M: Sally, sinto muito, não posso continuar a incentivar suas ilusões. Quer dizer, que tipo de nome é Whickman? Vamos lá, vamos tentar mais alguns exercícios.
[rádio sintonizando]
AP: Então agora já expliquei o que, como, onde e quando… Eu… eu estive evitando falar sobre o porquê. Ainda é difícil pensar sobre. Minha esposa, Helen… Ela me deixou. Ela era… Pensei que fosse meu mundo, podia jurar que era. Mas acabei perdido no... no trabalho, acho. Perdido na minha própria cabeça. E ela me deixou.
Nunca a culpei. Nenhuma vez a culpei por me deixar. Eu me culpei, pode ter certeza. E então culpei Bill Donovan. Eu tinha prova em fita que ele tinha conspirado para tirar Helen da minha vida, e pensei... pensei que se pudesse só... Não sei. Não sei o que estava pensando. É como se estivesse tudo envolvido por um nevoeiro de raiva. E, quando saí dele, minhas mãos estavam na garganta de Donovan e ele...
Mas é tudo culpa minha. Quer dizer, claro, ele pode ter dado o último empurrão, mas ela não teria estado tão perto da beirada se eu não a tivesse colocado lá. Não a apreciei o bastante. O apoio, a lealdade dela. Os sacrifícios que ela fez por nós. Por mim. Sinceramente, como eu poderia culpá-la? Helen nasceu para o palco, e eu a tirei dele. Roubei anos dela. Arrastei-a nessa busca quixotesca por reconhecimento como “o homem que podia prever o futuro”. E olha onde eu acabei! [ri]
Aqui. Esse era o plano dele desde o começo, não era? Fazer com que eu acabasse aqui. Ele sabia. Não sabia como eu reagiria, mas... conseguiu mesmo me trazer para cá. Excelente trabalho, seu pedaço de lixo conspiratório!
Eu me pergunto o que ela está fazendo agora. Estará fazendo. Depois de ela ir embora. Depois de eu ir embora. Pelo menos ela pode tirar um final feliz de tudo isso. Espero que esteja feliz. Gosto de imaginar que está, estilo fim de filme. Finalmente pode fazer as coisas que sempre quis. Ela merece todo o sucesso no mundo.
Helen, se um dia você ouvir isso: Sinto muito. Sinto muito, muito mesmo. Nada disso devia ter acontecido. O que eu não daria para ouvir a voz dela mais uma vez.
[rádio sintonizando; escutando à fita]
SG: [na gravação] Mas é tudo verdade! Pergunte ao Whickman. Whickman vai te contar!
M: [na gravação] Sally, sinto muito, não posso continuar a incentivar suas ilusões. Quer dizer, que tipo de nome é Whickman? Vamos lá, vamos tentar mais uns outros exercícios.
ESTHER ROBERTS (ER): Que tipo de nome é Whickman, aliás?
[fita pausa]
CW: É inglês. Mas as pessoas sempre escrevem errado. Todo mundo sempre escreve sem o “h”.
ER: Nem me fale. Meu pai só mudou o nosso para Roberts porque ninguém conseguia escrever “Rubashkin.”
CW: Este psicólogo não está funcionando. Não podemos continuar escondendo o passado dela assim.
HC: Pensei que isolá-la do conceito de viagem no tempo era a única coisa que a traria de volta à realidade. Como podemos dizer a ela de onde vem sem expô-la a esse risco?
ER: Como quer que reconstrua a psique dela quando não paramos de mentir para ela? Concordamos que só a isolaríamos da ADRA até chegar o momento em que a mente fraturada dela pudesse lidar com a verdade, e ela está claramente mais que pronta!
HC: E quanto aos técnicos de laboratório? Não estão a estudando ainda? Fora testemunho, pensei que era o melhor jeito de determinar o que houve com ela lá.
ER: Não vamos conseguir respostas enterrando as memórias ainda mais fundo na mente dela.
HC: E o PAT?
ER: Os operadores relataram interferência cercando o evento. Tem atividade taquiônica demais na área para ter uma boa noção.
HC: Táquions?! Estou tão cansado de ouvir sobre táquions. Transformam-se em um oráculo pessoal, mas só se não cegarem você primeiro. Pés-no-saco mais rápidos que a luz.
ER: São fótons taquiônicos…
HC: Não dá para ver nada se não tem o bastante deles. Agora não conseguimos enxergar porque têm demais! Estou começando a achar que você só culpa os táquions por tudo de errado que acontece aqui.
ER: Hank, é desnecessariamente cruel manter Sally nesse estado, e você sabe.
CW: Esther tem razão. Não precisamos brincar com a cabeça dela mais.
HC: Meus garotos desenvolvem um plano infalível para reconciliação, e vocês nem o consideram. Assumo que vão prosseguir com seus planos de realistá-la?
ER: Sim, a menos que você tenha outro especialista em física de partículas quatro-dimensionais na sua agenda! É mais que uma questão de encontrar alguém tão capaz quanto ela, também temos que encontrar uma pessoa talentosa assim que se especialize nos campos esotéricos de estudo de que a Timepiece precisa, que seja forte o bastante para resistir à doença, e que não se importe de desistir de sua vida pessoal. Não é como se fizéssemos publicações, ou pudéssemos colocar um anúncio. Tudo isso fora o fato de que ela sabe mais sobre a Timepiece que qualquer pessoa no mundo, inclusive eu. Encare a verdade, ela é a única pessoa para o serviço.
HC: OK. Tudo bem, mas você sabe que tem outro grupo de pessoas que são tão capazes quanto ela de resistir à “doença”, como você chama. Sempre podemos trazer alguém de volta de 77.
CW: Esses agentes fazem uma confusão danada no nosso ponto de partida. Nunca leu os relatórios? É como importá-los de outro país. Pior, já que também têm que abandonar as famílias, os amigos e as vidas inteiras deles para voltar ao agora. E você já ouviu Sally reclamando sobre sentir falta dos deliveries de pizza e dos telefones portáteis dela. Deus, só o bônus de assinatura...
HC: Então é a Grissom mesmo.
CW: De acordo. Esther, você devia ir visitá-la. Está recuperada o bastante. Melhor tirá-la daquele hospital Potemkin antes tarde do que nunca.
ER: Claro, mas, antes, tem mais um assunto a ser resolvido.
CW: Vá em frente.
ER: O abastecimento da Sala Escura está se mostrando uma tarefa mais substancial que tínhamos antecipado. Mesmo se tratando de apenas uma atualização a cada dez anos, vai requerer uma quantidade de planejamento e pesquisa inacreditável para funcionar.
HC: O quão difícil pode ser mandar um pacote com comida e suprimentos de volta?
ER: Você tem que se dar conta do quão instável a Sala Escura é. Lembre-se, tudo chega lá ao mesmo tempo em que Anthony chega. Do ponto de vista dele, na hora que chega, terá todo pacote que enviamos para ele, de dez, vinte, trinta, cinquenta, quem sabe quantos anos na frente. E, uma vez que mandamos um pacote, não podemos desmandá-lo depois. É cumulativo. O que quer que mandemos daqui a dez anos tem que se encaixar bem na configuração original dele, assim como ser compatível com atualizações futuras. E só achar espaço para tudo isso, levando em conta o tamanho fixo da CELA dele... Você não iria querer teleportar um computador para o meio do peito dele.
CW: Não, obrigado.
HC: Oh, se me dão licença, tenho um voo a pegar.
CW: Recrutamento?
HC: Vou para Seaboard. Estou de olho em um professor da Universidade de Delaware que pode se encaixar nos nossos requisitos. Desejem-me sorte.
[Hank sai]
CW: Esther? Quando você vir Sally, descubra o que aconteceu. E diga a ela…
ER: Sim?
CW: Diga a ela que estou feliz que está bem.
[rádio sintonizando]
AP: Tenho uma confissão a fazer. O único motivo de eu estar aqui é para usar este terminal para mandar mensagens, mas... não tenho feito isso. Nada. Já faz uma semana... ou pelo menos dormi sete vezes desde que cheguei aqui. Do jeito que o sistema funciona, novas mensagens não podem chegar até eu mandar a antiga, então tudo que tenho aqui é a primeira mensagem mandada pela rede. Então pensei “Ei, tenho todo o tempo do mundo, posso começar quando eu quiser!”.
Passei meu tempo examinando as coisas que mandaram de volta para mim. Tem livros, revistas, jornais científicos. Acho que música também, mas não consigo descobrir como essas gravações de vidro funcionam. Fico lendo uns livros de loja de 1,99 de um sujeito chamado Stephen King o tempo todo. O cara sabe exatamente do que está falando. Ele sabe como é ter medo do escuro.
É estranho ver como as coisas mudarão nos próximos trinta anos. Ou, na verdade, o quanto não mudarão. Ainda estamos sofrendo com espólios de guerra. Ainda fazemos a festa ganhando guerras em que provavelmente não devíamos ter nos metido. E a Ameaça Vermelha parece se infiltrar em todos os aspectos da vida em que já estava se enraizando quando eu fui embora. Pulei em um novo mundo de cabeça, e no fim não era tão diferente daquele que eu deixei.
Na verdade… acho que este é meu mundo agora. Uma única sala cheia de tecnologia e estantes de livros. Mas todas as distrações do mundo não se comparam a ter um propósito, uma razão de ser. Acho que posso fazer disto aqui minha aposentaria e mandar meus chefes na ADRA todos tomarem naquele lugar, mas isso parece quebrar o acordo que fiz. Farei. Terei fei– Hmm. Isso é difícil.
E, é claro, se eu nunca fizer o serviço, então o plano de Whickman nunca funcionará em 1947, e não faria sentido que continuassem a adicionar coisas à Sala Escura durante os anos 80. Isso significa que estou destinado a fazê-lo de qualquer jeito? Que não tenho uma escolha?
Sabe, Heidegger diz que a presença é uma função no tempo, que definimos nossa consciência, nós mesmos, como a marcha incessante em direção à morte, ao não-ser. Não podemos ser se não experienciarmos o tempo. E, de certa forma, ainda o faço. Meu cérebro parará de funcionar eventualmente. Mas, por outro lado, o tempo– não acredito que estou prestes a dizer isso– o tempo não me experiencia. Nesse sentido, sequer existo? Minha mente atual sequer importa se só posso experienciar o mundo por meio de um não-lugar que, em si, não tem nenhum conceito de tempo?
Espera aí. Do que estou falando?! Preciso parar de ler essa bobajada filosófica! É depressiva e não faz sentido. Vou me limitar a pulp fiction a partir de agora.
rádio sintonizando]
ER: Sally?
SG: Esser?
ER: Oh, não queria acordar você.
SG: ‘Pera aí, Esther?
ER: Desculpa, posso voltar depois, se você quis—
SG: Estou sonhando?
ER: Bom… Quer dizer, se você estivesse, em que minha resposta ajudaria?
SG: Ah, graças a Deus, é você! Você... Você tem que me tirar daqui agora. Eles se recusam a acreditar em mim sobre a Timepiece—
ER: Shh, shh, shh, eu sei. Vou fazer o que puder para tirar você aqui. Nós ouvimos sobre o que está acontecendo.
SG: … Quem são “nós”?
ER: Bom, Whickman e eu.
SG: E…
ER: E Hank Cornish.
SG: Cornish? A víbora da CIA? Fico fora por alguns meses e vocês começam a trabalhar com aquele idiota?
ER: Não… Sally, tem seis meses que você acordou. E ficou em coma por um ano, antes disso.
SG: Um ano?!
ER: Você não faz ideia do que aconteceu com você, faz?
SG: Não consigo lembrar, me disseram que eu tive um-um AVC por estresse...
ER: Você sofreu um… um ataque. Uma doença violenta. Está relacionada à Timepiece. Algo relacionado à exposição a estruturas não-causais. Gerou algum tipo de crise cerebral. É o pior caso que vimos até agora.
SG: Borbeleta.
ER: O que foi isso?
SG: Eu… Hm. Não sei. Só me lembro de algo sobre uma borboleta. Você disse que fiquei em coma por um ano?
ER: Bom…
SG: O quê?
ER: Bom, a única forma que conhecemos de tratar sua condição é...
SG: Ficar dentro da CELA.
ER: Sim, isso mesmo.
SG: … Como eu sabia disso?
ER: Para o seu tratamento, você passou dois segundos dentro da CELA para cada segundo que passava fora dela. Até que tivéssemos certeza que era seguro reacordar você.
SG: Hm- Eu perdi três anos?!
ER: Você teve sorte. Da última vez que isso aconteceu com alguém, demorou três décadas para poder sair.
SG: Então… O que eu perdi?
ER: As apostas de Donovan se tornaram realidade. Somos uma parte da CIA plenamente realizada, mesmo que em total sigilo. Jack foi embora. Helen foi realizar o sonho dela, e...
SG: Anthony se foi. E nunca o veremos de novo.
ER: Sim. Ele se foi.
SG: Eu sabia que você ia dizer isso.
ER: Sally, do que você se lembra?
SG: Não sei. ‘Tá tudo só nadando na minha cabeça. Coisas vagas. Borboletas. Nuvens. O som de trovão. Lembro de olhar nos olhos da minha mãe, e aí... ‘tou comendo torta de abóbora na cozinha dela? Memórias da minha infância, acho. Talvez eu tenha ouvido sobre Anthony enquanto dormia.
ER: Tem um lugar pra você, Sally. Na ADRA.
SG: Como assim?
ER: Precisamos desesperadamente de pessoas que entendam a Timepiece. Estou tentando juntar alguns cientistas antigos para liderar equipes.
SG: Então a ADRA é, tipo, uma coisa de verdade de novo?
ER: Ainda mais que antes. É um animal completamente diferente. O que estamos fazendo deixaria você tonta. Hm... Desculpa aí.
SG: Vocês são espiões agora.
ER: Simplificando assim, sim.
SG: Você disse que tem um lugar pra mim?
ER: Tem, mas você tem que melhorar primeiro, Sally. Precisa clarear sua mente... Acho que será melhor se procurar um especialista.
SG: Hã-hã. De jeito nenhum. Não vou voltar naquele cara!
ER: Não, é claro que não. Aquele idiota já fez estrago o bastante. Temos outra pessoa em mente. Ele não vai tentar convencer você que Whickman não é real, eu prometo.
SG: E ele é? Porque nunca tenho certeza. Não tenho certeza de nada mais. Acha que não percebi que aqui não é um hospital de verdade?
ER: … Tem médicos de verdade que tratam de você de verdade...
SG: Não tem mais nenhum paciente. Só tive que descer um corredor pra chegar a qualquer outra parte desse lugar, independentemente de onde seria num hospital de verdade. É um set barato.
ER: É uma área de teste.
ER: Então é um set!
ER: Se mais pessoas ficarem doentes como você, queremos ter algo preparado para elas. E, quer saber? Ter um lugar com a aparência familiar de hospital de cidadezinha ajudou bastante a tratar sua loucura de viagem no tempo ou sei lá o quê. Não é como se houvesse realmente um Hospital Geral de Ponto de Exílio. E, isso já entra um pouco em minúcias, mas temos um orçamento limitado, afinal. Especialmente quando se trata de coisas que não são máquinas do tempo. Portanto, construir um hospital de tamanho real não é realizável.
SG: É disso que eu ‘tou falando! Todas essas mentiras e jogos e... Eu sei que vocês ‘tão no lugar certo, mas não ‘tou pronta pra isso ainda. A Timepiece roubou anos de mim. Preciso me recuperar. Vou tirar um período sabático. Não vou voltar. Isso é demais pra mim. Tudo isso, é demais.
ER: Acho que você está tomando a decisão errada, mas a escolha é sua. Vou lhe deixar o cartão do especialista, de qualquer forma. Avise-me se mudar de ideia.
SG: Eu diria que você vai ser a primeira a saber depois de mim… mas, pra falar a verdade, provavelmente vai saber antes de mim, né?
ER: Provavelmente.
[Esther sai; rádio sintonizando]
AP: Ainda não tentei mexer no computador, mas tenho examinado a documentação deste lugar e... as chances são mínimas, mas acho que dá para contatar o mundo lá fora. Quando os dados são transmitidos para fora da Sala Escura, imitam um sinal de alta frequência, usado por navios ao se comunicar com a terra firme, que coleta as mensagens e as segura até estarem prontas para serem transmitidas. Mas tem um pacote de informações que é enviado com todas as mensagens. É pequeno, mas tem o espaço certinho para enfiar mais alguns bits nele.
Ainda tenho algumas coisas a resolver. Primeiro, equipar o pacote de controle para incluir os dados que quero, o que não deve ser muito difícil. Mais difícil é descobrir como programar um sistema com tão poucas instruções de cada vez. O maior problema de longe é que só posso mandar algo para momentos para que outra mensagem da Sala Escura foi mandada. Então, se quero contatar, digamos, 1952, e todas as mensagens vão para todo ano menos esse, estou sem sorte. Isso também significa que tenho que começar a operar a Sala Escura de verdade, se quiser fazer qualquer contato com o mundo exterior.
E então eu volto ao dilema moral de ser cúmplice de atos que senti que traíam tanto meu senso de humanidade que matei um homem com minhas próprias mãos. Se eu ajudar, então Donovan vence, e eles transformam viagem temporal em uma arma. Mas, se não ajudar, enlouqueço de solidão. Queria poder só perguntar a alguém. Qualquer um que pudesse apenas responder. O que eu não daria.
É a hora da verdade, acho. Tenho a primeira mensagem. Eu devia lê-la de uma vez, acho. Vai me ajudar a decidir.
[Anthony abre um envelope]
Oh. É, isso definitivamente decide a questão. Sally está em apuros. Minhas mãos estão atadas. Tenho que mandar esta mensagem. Alguma coisa aconteceu com ela. Deve ter encontrado com um viajante temporal ou algo relaciono à Timepiece. O que quer que seja, é grande.
[digitando]
Choramingos existenciais são insignificantes quando as pessoas com quem você se importa estão em perigo mortal. Vou iniciar a Sala Escura, e Chet terá o que quer, e Sally não precisará morrer. Que merda, Bill, você ganhou de novo.
[rádio sintonzando]
SG: É só… é como se tivessem seguido em frente sem mim. Na verdade, não é como se tivessem seguido em frente sem mim. Seguiram em frente sem mim. Quer dizer, não sei por que esperava que ficarem, mas... Não sei. Não escolhi ficar em coma por um ano, mas quem escolhe?
Eu só queria saber. Queria saber o que aconteceu comigo, como acabei lá. Mas ‘tou com medo. E se eu não gostar do que encontrar? E se só piorar minha condição?
Sinto falta dos meus amigos. E sinto falta do meu trabalho. Mas esse é o único caminho que posso seguir. Tenho que me recuperar. É tudo que tenho. Estou completamente sozinha aqui, no meio do exílio. Não tenho ninguém, não tenho nada aqui! Sem o trabalho, não tenho rumo. Não só se tratando da minha carreira, tipo... em tudo! Não é como se tivesse uma família pra qual eu pudesse voltar, ou velhos amigos de faculdade pra incomodar. Sou só eu. Podia tentar ir pra fazenda da família, ver se tem algo lá com que eu possa me ocupar. Ainda me lembro como carregar feno. Poderia limpar celeiros. Viver o sonho pastoral. Esquecer da minha antiga vida. E da minha mais que antiga vida. Vejo o apelo disso.
Talvez essa seja simplesmente minha parada. Talvez isso seja tudo que tenho. Tudo que jamais terei. Só eu, a garota sem nome, vagando pela terra vazia. Há sempre a opção de desaparecer. Wyatt fez isso, de algum jeito. Talvez eu possa encontrar ele. O que você acha?
[sons de uma lanchonete]
Garçonete (G): Hm, sinto muito, mas tenho outras mesas…
SG: Oh, é claro. Você, hm, você é nova, certo?
G: Estou trabalhando aqui tem um ano e meio. Não tão nova.
SG: Deixe-me adivinhar, a última garota que trabalhava aqui fugiu com um cara.
G: Você já esteve aqui antes, ou algo do tipo?
SG: Algo do tipo.
[rádio sintonizando]
AP: Eu vi algo da primeira vez que desliguei as luzes para dormir. Uma luz na escuridão. Tentei fingir que não estava lá, mas estava. Finalmente percebi o que é.
É você, Sally. É você, apenas nanosegundos antes de chegar aqui. Antes de eu lhe conhecer. Antes de tudo acontecer. Ainda era uma parte de 20█. Não tinha a menor ideia do que estava acontecendo. E agora estou no mesmo barco que você. Jogado fora do tempo, isolado de todos que já conheci. Sinto muito por isso ter acontecido com você Sally. Nada disso teria acontecido se sua máquina e o Gerador Arco-íris de Lambert não tivessem funcionado tão perfeitamente juntos, de um jeito tão inesperado. Eu não estaria aqui, Bill estaria vivo, você ainda estaria feliz no futuro.
Você era feliz lá? Acho que nunca perguntei. Você não gosta de falar muito no assunto, isso dá para dizer. Mas tirou o melhor que podia de uma situação terrível nos anos 40. Você não ganha crédito o bastante pelo meu otimismo. Em retrospecto, estou surpreso que você sobreviverá os primeiros dias aqui. Mas, agora, não precisa. Agora, na minha eternidade, você é uma estrela brilhante em um oceano de escuridão.
[rádio sintonizando; Sally abre a porta dela, entra, joga as chaves na mesa; aperta play na Secretáriatron]
SG: [na gravação] Oi, eu, sou eu! A menos que não seja eu, nesse caso NÃO OUÇA ISSO, essas são as minhas mensagens particulares da Secretáriatron. Você tem– SEIS. OITO. – mensagens, e vou tocá-las pra você agora! Te sou depois, eu do futuro!
SG: Ugh. Eu sou terrível.
[bip]
Mensagem de Voz 1: Eu hm… estou tentando entrar em contato com Sally Grissom sobre a assinatura dela da Popular Mechanics. Parece que o pagamento está atrasado seis me–
[Sally deleta a mensagem; bip]
Mensagem de Voz 2: Gente, mas que interessante! Olá, aqui é Carol Ludgate ligando em nome da Primeira Igreja Episcopal–
[deleta; bip]
Mensagem de Voz 3: Olá, aqui é John Beverly, ligando do Serviço de Mensagens Rapidinho, Inc. Tenho uma mensagem para você de um... Anthony Partridge.
SG: Hã?
Mensagem de Voz 3: A mensagem é a seguinte: Trabalhando de DJ na Filadélfia no momento VÍRGULA por favor visite VÍRGULA traga seus melhores relógios VÍRGULA adoraria ouvir sua voz de novo PONTO FINAL. Muito obrigado, tenha um bom dia.
SG: … ‘Pera aí, o quê?!
[gravador de fita para]
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Devido a um problema nas mãos que me impossibilita de digitar o necessário para traduzir, as traduções estão pausadas por hora, sem previsão imediata de volta.
Sinto muito pelo inconveniente.
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10: Consequência, Ato II
[gravador de fita liga]
[Bill e Chet no gravador; Bill tosse, cai]
CHET WHICKMAN (CW): Não se preocupe, senhor. Estou chegando. Não vou decepcionar você.
[fita vazia toca no gravador]
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Só pode ser brincadeira… Donovan! Donovan, onde DIABOS você está?!...
[Anthony sai andando; bate a porta; rádio sintonizando]
SALLY GRISSOM (SG): Diário de Sally Grissom, 25 de dezembro de 1946. Sabe, ontem à noite eu ‘tava mesmo no espírito natalino, descobrindo o decaimento de sinal do APU e tudo, mas, depois de falar com Helen Partridge, não sei. O Natal é pra ser esse dia maravilhoso pra se reunir com a família e trocar bolas de enfeite brilhantes. Mas, olhando essas tradições de fora, não é difícil se sentir abandonado no frio. Quer dizer, não literalmente, mas é, claro. Literalmente. Tem um vazio no feriado que–
[CELA ativa]
SG: Hm… não era para ter uma CELA aqui. Meu deus, que que ‘tá acontecendo? EI—
SALLY GRISSOM DO FUTURO (SGF): Calma, Sally. Vai ficar tudo bem.
SG: Oh… Você…
SGF: Sim.
SG: Mas você—
SGF: Sim.
SG: Você sou eu! Do futuro!
SGF: [suspira] Ok, vamos resolver isso logo. Sim, ei, eu sou você. Do futuro. Você ‘tá pensando no número 86, vai mostrar o dedo do meio atrás das costas, e a senha é Borra Nítrica de Caimão.
SG: … Por que 86?
FSG: É o que sempre escolhemos.
SG: Uou, que... magia.
SGF: Chega de jogar tempo fora. Precisamos conversar.
[rádio sintonizando]
[aparelhos de hospital; Anthony invade o quarto]
AP: Bill Donovan, seu pedaço de… O que… O que é tudo isso?
BILL DONOVAN (BD): Anthony, há quanto... tempo. Tanto tempo.
AP: O que é tudo isso? O que está acontecendo?
BD: Este é meu tratamento. A CELA de Sally... dá à mente tempo para parar e processar as coisas. Estou me curando.
AP: Então… Está ficando na CELA?
BD: Terapia de exposição controlada. Está funcionando... aos poucos. Pelo que entendi, tenho que lhe agradecer.
AP: Só tive a ideia para tudo isso uma hora atrás.
BD: E, em outra versão das coisas, chegou tarde demais para salvar minha vida.
AP: Bom, acho que “tarde demais” não é mais um obstáculo para você. Ficou lá dentro por quanto por quanto tempo?
BD: Um bom tempo. Não estou muito certo sobre os números. A duração sequer importa sem um relógio para medi-la?
AP: … Acho que não.
BD: A última vez que falei com você foi... cerca de trinta anos atrás.
AP: E está funcionando?
BD: Minha mente está mais clara do que já esteve desde que Sally Grissom apareceu na minha vida.
AP: Desde que começou a brincar com viagem no tempo e mandou seus capangas manipularem minha mulher para me deixar.
BD: [suspira] Então isto não é uma visita social.
[rádio sintonizando]
SG: Isso não ‘tá acontecendo. Isso não era pra ‘tá acontecendo. Não acredito que isso ‘tá acontecendo—
SGF: Puta merda, Grissom, se controle!
SG: [ri]
[Sally do Futuro dá um tapa em Sally]
SGF: Sally Virginia Grissom, concentre-se!
SG: … Mamãe só usava nosso nome do meio quando estava furiosa.
SGF: É, eu sei. Não importa. Não temos tempo pra nostalgia. Haha, é, viajar no tempo é complicado e divertido pra caramba, não é mesmo? Sei que tem um milhão de perguntas, anda logo.
SG: De quando você é?
SGF: De daqui a 20 anos. 1967.
SG: Conseguimos ir de volta para o futuro algum dia?
SGF: [resmunga]
SG: O futuro de verdade. Nosso futuro.
SGF: Aquele lugar se foi. Deixou de existir no momento em que pisamos nos anos 40... Mas eu dei uns bailes de “Encantamento do Fundo-do-Mar" quando os anos 50 chegaram, então...
SG: Chegou a tocar “Johnny B Goode” alguma vez—
SGF: Fala sério. Não somos tão toscas, somos?
SG: Não sei. ‘Tou começando a entender por que algumas pessoas não gostam da gente.
[rádio sintonizando]
AP: Você arruinou a minha vida! Chantageou o diretor do FBI e o Presidente!
BD: Bom, Anthony, todos nós já fizemos coisas de que nos arrependemos.
AP: Você “se arrepende” de virar minha esposa contra mim?
BD: Eu precisava que você se focasse. Aquela mulher estava lhe arrastando para baixo.
AP: Oh, eu não estava focado o bastante?! Agora você liga para o que eu faço? Agora sou importante?
BD: Sabe o que dizem sobre fazer omeletes. Progresso exige sacrifício, Anthony. É por isso que você nunca chegou a lugar nenhum. Nunca sacrificou nada. Nunca lutou por nada.
AP: Lutei por ela.
BD: Lutou mesmo? Pelo que eu vi, parece que você deixou Helen definhando sozinha. Ela bancou a dona de casa apaixonada por anos, esperando e rezando para que, um dia, o amor dela voltasse da guerra.
AP: Fiz tudo aquilo por você!
BD: Em parte, tenho certeza que sim. Mas não engane a si mesmo: você fez o que fez por si próprio. Pelo seu ego. Para se sentir importante. E quando a negligenciou, Helen decidiu ir embora. Você a perdeu sozinho.
AP: O que tem de errado dentro de você que lhe deixa manipular a vida das pessoas assim?
BD: Você é uma engrenagem em uma máquina, Anthony. Uma engrenagem importante, mas ainda assim uma engrenagem. Uma engrenagem em uma máquina gloriosa que faz o mundo girar mais rápido em torno do eixo do Tio Sam. Você não tem nenhum amor por Deus e este país?
AP: Você não está fazendo isso pelos Estados Unidos, está fazendo isso por si mesmo. Pela sua ascensão distorcida ao poder.
BD: Que mentira. Tudo que eu fiz, fiz pela nossa nação.
AP: Pode parar de mentir, Bill. Eu ouvi as fitas. Você nunca se preocupou com ninguém além de si mesmo.
BD: Eu dei minha vida…! A única razão de você não estar definhando pouco a pouco, ensinando cálculo para adolescentes, sou eu. Se ouviu minhas fitas– e, se ouviu, alguém definitivamente está despedido– então sabe que do que abri mão por este projeto.
AP: O projeto de Sally. Sou só a engrenagem. Você se lembra? Lembra de antes da Filadélfia, antes de tudo acontecer? Nós íamos mudar o mundo.
BD: Planos mudam. Recursos tem que ser redistribuídos. Nem todo mundo pode ser o herói. Você era um empregado extremamente útil, Anthony. Sinto muito que sua esposa lhe deixou. Espero que essas ratificações lhe deem a validação de que você tão desesperadamente deseja.
AP: Isso é tudo que você tem a dizer?
BD: Acho que sim. E, se pudermos encerrar isto agora, eu tenho que ir
[Anthony enforca Bill. Chet entra.]
CHET WHICKMAN (CW): Diretor Donov—… Oh… Oh, Anthony. Anthony! O que você fez?
[rádio sintonizando]
SG: Como e por que estamos nessa CELA?
SGF: Eu comprei o Kit de Campo de Luxo da Timepiece.
SG: … Isso? Isso é Timepiece?
SGF: Isso aí.
SG: É tão pequena!
SGF: Os milagres da ciência moderna. Diminuem o tamanho dela. Faça as perguntas importantes.
SG: OK, OK! Por que estamos conversando em uma CELA em vez de, tipo, numa sala normal?
SGF: Temos que estar numa CELA pra impedir nossos cérebros de virar mingau.
SG: … Repete isso pra mim, por favor?
SGF: Timepiece Para Leigos: Paradoxos de viagem no tempo são ruins pra cabeça. Te deixam louco. Ainda não colocaram no papel pra você ainda, mas vai se chamar “Síndrome Borboleta”.
SG: Usaram mesmo o nome da história de Heinlein?
SGF: Na verdade é uma metáfora da teoria do caos, mas claro, também encaixa.
SG: ‘Tou definitivamente começando a entender a animosidade.
SGF: Escuta, filha, precisa me ouvir. Quando essa CELA desligar e você voltar ao tempo real? Vai ser bem ruim pra você.
SG: Por quê?
SGF: Qual é a situação de viagem no tempo mais estranha que você consegue imaginar?
SG: Baseada no contexto, assumo que seja conversar cara a cara com seu futuro eu sobre eventos que não aconteceram ainda.
SGF: Muito bem, ganhou o prêmio. Sim. A pura impossibilidade da coisa toda te dá a maior enxaqueca da sua vida.
SG: ‘Cê ‘tá dizendo que a Timepiece causa danos pro cérebro?
SGF: Pensou que era seguro? Nem a pau, ela... acaba contigo.
SG: E estamos na CELA porque…?
SGF: Trata os efeitos, ou algo do tipo, acho. Não sei, merda. Sou física, não neurocirurgiã. A teoria vigente nos anos 60 é que, já que aqui é seguro e isolado, seu cérebro meio que consegue se ancorar. A CELA te mantém estável. Mais ou menos estável- e é por isso que temos que correr. Donovan deve estar usando ela também nesse momento.
SG: Donovan?
SGF: Oh, isso é… Spoiler alert: Donovan tem abusado da Timepeice pra benefício próprio.
SG: Ah, fala sério! Mesmo?! Eu avisei! Várias vezes!
SGF: Sim, e ele não escutou. Meu ponto é, quando acabarmos nossa conversa, a CELA vai se dissolver, você vai ter tipo, três segundos pra processar o que aconteceu, e aí... provavelmente não vai morrer.
SG: Provavelmente?
SGF: E depois de você… definitivamente provavelmente não morrer, nunca mais vai me ver.
SG: Aaah, o quê?! Fala sério, estávamos só começando a–
SGF: Vou desaparecer depois disso, Sally. Não desperdice a chance.
[rádio sintonizando; microfone escondido no estofamento de uma mala; porta de um motel se abre; Jack e Penny entram; Jack fecha a porta, tranca-a, abre a mala]
PENNY WISE (PW): –acha que estamos seguros aqui?
JACK WYATT (JW): Por tempo o bastante para tomar um banho e dormir, pelo menos.
PW: Até onde a gente precisa ir?
[Jack tira um mapa da mala]
JW: Estamos a cerca de 35 quilômetros de ████. Podemos sair de ████ e passar por ████ e ████ amanhã.
PW: ‘Cê acha que eles sabem que a gente foi embora?
JW: Não sei. Vão saber de manhã com certeza, mas agora eu–
[telefone toca]
PW: A gente atende?
JW: Quem poderia estar ligando para cá?
PW: Quem ‘cê acha? ‘Tou com medo, Jack.
JW: Vai…
PW: O quê?
JW: Eu estava prestes a dizer “vai ficar tudo bem”, mas não vai, Penny. Não vai mesmo.
[Jack atende o telefone]
JW: Sim?
ESTHER ROBERTS (ER): [no telefone] Jack.
JW: Esther.
ER: Eu queria—
JW: Como você nos encontrou?
ER: Você… Você sabe do que eles são capazes.
JW: Do que você é capaz? Se acham que podem lhe usar para me levar de volta, estão para lá de errados.
ER: Eu não deixaria.
JW: Então… então por que está ligando?
ER: Porque lhe devo isso. Eu disse a eles que vocês estavam indo para leste. Para as Carolinas. Disse que sabia que você sempre quis morar lá.
JW: Obrigado pelo aviso.
ER: Tudo está prestes a mudar por aqui.
JW: Nunca devíamos ter trabalhado para um homem como Bill Donovan.
ER: Não importa mais. Fizemos nossas escolhas.
JW: E você decidiu ficar do lado das cobras preparando o bote.
ER: Você transformou o ótimo em inimigo do bom e decidiu fugir de uma chance de colocá-los no caminho menos destrutivo. Não se engane pensando que tudo é tão preto e branco.
JW: Não me venha com essa merda de “os fins justificam os meios” Você queria poder, e conseguiu. Então espero que esteja feliz. Espero que alguém esteja feliz.
ER: Não dá para dizer que você está completamente errado.
JW: Você está ficando cada dia melhor na ambiguidade deles.
ER: Quero que você e Penny fiquem livres disso. Vocês, de todas as pessoas, merecem.
JW: É… Obrigado.
ER: Isto é o máximo que posso fazer por você: depois que eu desligar, abra sua mala. Cheque debaixo do forro do lado esquerdo.
JW: Deseje meu melhor para Sally. E Anthony. Diga a eles... diga a eles para nunca deixarem de ser os mocinhos.
ER: Vou dizer. Eu amo você, Jack.
JW: Também amo você, Esther.
[Jack desliga]
PW: O que ela disse? Jack, o que ela disse?
[Jack abre a mala; mexe do forro de náilon, arranca um pequeno gravador de lá e o esmaga; rádio sintonizando]
SG: Por que você veio até aqui? Que tipo de coisa terrível poderia justificar voltar vinte anos na sua própria linha do tempo?
SGF: Eu adoraria responder todas as perguntas que você tem e, puta merda, como sei o quanto isso vai ser frustrante...
[distorção estática]
SGF: … ‘tá… merda, ‘tá começando a processar. Só tenho tempo pra falar do geral. A CELA só consegue aguentar a gente– isso– por um tempo.
SG: Clássico. A única pessoa em que confio pra me dar uma resposta direta, e ela tem um limite de tempo.
FSG: OK. Então. Você nunca mais vai ver Anthony Partridge.
SG: O quê?
SGF: Eles desaparecem com ele. Eu diria que ‘tá morto, mas nunca se sabe com esse povo. Ouvi rumores sobre... deixa pra lá.
SG: E se eu pudesse–
SGF: Não pode. Salvar ele. Acredite em mim, Sally. Eu tentei. Nós tentamos. Precisa confiar em mim. Não vale a pena. Meu ponto é, depois dele desaparecer, eu fugi, mas nunca por muito tempo. Eles sabem pra onde você vai– só perguntam pro futuro. Sabem por onde você passou– olham o passado. Passei anos nadando contra a corrente deles, sem chegar lugar nenhum. Provavelmente tornei eles ainda mais fortes no processo.
SG: Então ‘cê ‘tá desistindo?
SGF: Não exatamente. Eles– Whickman– nunca quiseram me prender, só... queriam nosso cérebro.
SG: Todos os garotos querem.
SGF: E, pode ter me custado muito tempo pra perceber, e realmente não quero te dar a impressão errada, mas... eles não são más pessoas. Mal orientados, certamente, mas... você conhece Whickman. Ele se importa. Quer ajudar as pessoas. Sempre quis.
SG: Whickman? E Donovan?
SGF: A partir de hoje, você não precisa se preocupar com Bill Donovan. Whickman está assumindo o comando.
SG: Você quer que eu… coopere com eles?
SGF: Sally, você tem uma coisa que ninguém mais tem: você viu o futuro. Viu a inteligência estatal de 20█. Pode impedir eles de se tornarem aquilo. Confiam em você. Mais do que ninguém.
SG: Eu consigo? Nós conseguimos?
SGF: Passei décadas fugindo da Agência de Desenvolvimento de Sei Lá o que Anômalos, e, no fim, não sabia por que continuava seguindo em frente. Estou cansada de ser uma fugitiva.
[distorção estática]
FSG: Seu nariz ‘tá sangrando. Precisamos acabar essa conversa logo, antes de morrermos aqui. Coisas ruins estão pra chegar, Grissom. A história de que nos lembramos é diferente. Tudo que aconteceu desde 1934... criou rugas. Divergências. Se eu tivesse acesso aos recursos deles, talvez teria sido capaz de fazer algo. Mas teve... não importa o que aconteceu. Você pode ajudá-los onde eu não pude. Mas precisa entrar no relacionamento de cabeça aberta, não punho fechado.
SG: Que coisas ruins aconteceram?
SGF: Vai ter… teve… tem…
[distorção estática]
SGF: Não consigo continuar. Não consigo formular as palavras. Precisa terminar isso antes que acabe com a gente.
SG: Que coisas? Que palavras? Como você foi é– uou, o que vai ter... acontecer comigo?
SGF: Ache os papéis abóbora, Grissom! Os papéis abóbora!
[efeito da CELA acaba; Sally do Futuro corre]
SG: Espera, papéis abó–
[Sally desmaia; rádio sintonizando]
AP: Eu não sou uma pessoa má. Eu não sou uma pessoa má. Eu não sou uma pessoa má.
CW: Anthony, você se lembra por que ligou para Bill Donovan, todos aqueles anos atrás?
AP: Eu tinha evidências matemáticas concretas prevendo Pearl Harbor.
CW: Agora, por que você ligou? Não seria melhor extorquir um salário do Tio Sam? Manter informações como reféns? Mas você não fez isso, fez? Foi direto ao escritório de Bill e entregou a ele. Por quê?
AP: Bom, era a coisa certa a se fazer. Vidas dependiam disso.
CW: Tem razão. Se tivéssemos apenas sabido, poderíamos ter salvado vidas. Agora podemos saber de tudo. Consciência total sobre qualquer evento. Notícias chegando na velocidade de impressão do teletipo. Podemos salvar todo mundo.
AP: OK?
CW: Então, pode me explicar por que, em nome de Deus, você decidiu assassinar a única pessoa que podia ter feito isso realidade?!
AP: Eu não sei…
CW: Você não sabe?! Por que estrangulou um senhor em um leito de hospital?
AP: Vocês tiraram tudo de mim! Meu lar, minha carreira... Helen! Tudo pela ideologia distorcida dele. Ele só… Eu só… não sei o que deu em mim. Bill tem esse jeito de tirar você do sério. Toca bem na ferida.
CW: E por isso ele merecia morrer?
AP: Ele precisava ter detido.
CW: E você era quem podia detê-lo?
AP: Eu não sabia o que ia fazer. Depois de ouvir o que ele tinha feito, tive que fazer algo! Não é justo! Não é justo, o que ele fez!
CW: Sabe o que eu acho que “não é justo”? Você matar um homem com suas próprias mãos porque não gosta de como se faz a salsicha!
AP: Escuta, foi como… foi como se ele estivesse me provocando! Como se quisesse que acontecesse!
CW: Não importa o que ele estava pensando! Não está nessas algemas porque Bill não foi tão educado quanto você gostaria.
AP: Não paro de reviver o momento na minha cabeça. A expressão dele... não consigo esquecê-la. O sorriso fixo enquanto a cara ficava roxa. Vejo aquela expressão toda vez que fecho os olhos. Traço as veias do rosto e o contorno da boca dele para despersonalizá-los. Focando tão minuciosamente que roubo a humanidade do rosto dele. Mas não consigo. Toda vez é sempre o mesmo sorriso, olhando direto para mim. Através de mim. Pensei que ele ficaria com medo. Eu estava com medo. Com medo e raiva. Mas ele estava só... empolgado? Excitado? Até na morte, Bill Donovan permanece comigo. Não me importo mais. Só quero que isso acabe. Minha vida acabou, Helen se foi, não restou nada para mim. Não pode só me dar um tipo, ou algo do tipo?
CW: Engraçado você pedir isso.
[interfone]
CW: Hank, estamos prontos para você agora
[porta abre, Hank entra]
CW: Hank, nosso amigo mútuo aqui estava falando agora mesmo sobre como gostaria de ser morto também. O que podemos fazer por ele?
HANK CORNISH (HC): Bom, Dr. Partridge, parece que seu desejo será realizado, até onde o resto do mundo sabe.
AP: Do que você está falando?
CW: Estamos nos livrando de você. Você será... chamemos de “oficialmente aposentado” de todo trabalho e obrigações familiares.
AP: Então… vão me dar um novo nome ou algo do tipo? Como June Barlowe?
HC: Quando pediu para ser morto, tenho certeza de que quis dizer o fim de seus processos biológicos por meio de um de uma série de métodos: cadeira elétrica, fuzilamento, envenenamento. Mas não, vamos matá-lo de um jeito mais abstrato. Seu endereço será mudado para uma localização falsa. Suas assinaturas e prestação de serviços cancelados, suas contas fechadas. Vamos recusar solicitações e cartas para você. Dentro de alguns dias, você não estará vivo em nenhuma empresa ou registro governamental. Em alguns meses, deixará de receber toda comunicação de gente que não conhece pessoalmente. E, então, sua presença aos poucos desaparecerá até das memórias daqueles que você conhecia e amava.
AP: Bom, isso foi pesado.
CW: Mas você tem uma escolha sobre o que acontece a seguir.
AP: Além da minha morte?
HC: Bom, é tudo uma questão do que você deixa para trás, não é? Sua primeira escolha é simples. “Viver” em um quarto como este até morrer. Na verdade, menor que ele. Estreita demais para deitar, baixa demais para ficar em pé. Comer uma vez por dia, defecar em um balde.
CW: A vantagem é que você pode ficar com o balde.
AP: Suponho que querem que eu escolha a segunda opção.
CW: Lembra quando eu disse que você assassinou a única pessoa com a capacidade de salvar todo mundo?
AP: Sim. Eu estava lá. Foi há três minutos.
CW: Você pode fazer algo para mudar isso.
AP: … Oh, claro! Usar a Timepiece para me deter. Que ideia brilhante! Não vai dar, chefe.
CW: Não, você fez sua escolha. E, com as escolhas, vêm as consequências.
HC: V ai se tornar o alicerce para tudo para que trabalhou na ADRA. Você pode ser o gênio que salvará o mundo.
AP: … Estou ouvindo.
[rádio sintonizando]
ER: Vou dizer. Eu te amo, Jack.
[Hank e Chet surgem]
ER: Ele aceitou?
CW: É a única chance que o Dr. Partridge tem de se redimir. A única chance dele de se perdoar. Acho que vai aceitar.
HC: Funcionou melhor do que eu poderia esperar. Tínhamos planejado simplesmente convencê-lo com a abordagem de abandono, mas aí ele se afogou na própria culpa. Souers vai ficar contente.
CW: Hank, um homem está morto. Um grande homem.
HC: E a vida segue. Tudo a sua frente é seu para administrar, de acordo com sua vontade. Assim que Partridge estiver na Sala Escura, não haverá como nos deter.
CW: Não acredito que estamos mesmo fazendo isso.
HC: Lembre-se, estamos mudando o mundo. Nada que vale a pena jamais foi fácil
CW: Esta é a coisa certa a se fazer.. Esther? Diz para mim que essa é a coisa certa a se fazer.
ER: Foi ele quem causou isso. Sabe, eu poderia lidar com Jack desistindo. Poderia lidar com Sally dizendo não. Mas Anthony? Pensei que ele faria melhor do que colocar as próprias vendetas em primeiro lugar. A ADRA é maior do que todos nós. É maior do que Bill Donovan jamais foi. Foi imprudente e desapontante. Sinto por ele, sinto mesmo, mas não somos mais crianças.
HC: Pare de refletir sobre certo e errado. Whickman. Foque-se nos resultados. Quer manter este país seguro? Faça isso, e não se distraia com méritos de moralidade insignificante.
CW: É, sim… É. Quando tempo temos até ter que Anthony ir?
ER: Estamos no cronograma. O pacote de implementação deve ficar pronto em breve.
CW: Está tudo em ordem, então. Assim que a Sala Escura estiver operacional, tudo muda. Somos a vanguarda da nova ordem. Informe o Grupo Central de Inteligência que estamos prontos.
HC: Sim, senhor.
[gravador de fita para]
#ars paradoxica#ars paradoxica translation#tradução pt-br#PRIMEIRA TEMPORADA TRADUZIDA#... só mais uma agora
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10: Consequência, Ato I
[gravador de fita liga]
BILL DONOVAN (BD): 28 de outubro de 1943. Daqui a anos e anos, as pessoas ainda se recordarão deste dia. Como o Dia da Independência. O dia em que damos nosso primeiro passo. O dia em que iniciamos nossa reconquista da Europa e vitória sobre os nazistas, mudando a corrente no Pacífico e acabando com esta guerra de uma vez por todas. Hoje é o dia em que testamos o Projeto Arco-íris.
Quando o Presidente Roosevelt me nomeou Coordenador da Inteligência, ele esperava que eu que fosse assertivo. Queria que eu fosse o valentão no parquinho. Ele queria o Bill Selvagem Donovan. Mas acho que o velho FDR não estava por dentro ainda. Esta é a última guerra que lutaremos com bombas, armas e espadas. A guerra está se movendo para as sombras. Pensaram que era louco quando instalei microfones na cidade de Polvo inteira, mas não rirão quando eu tiver sujeira sobre cada pessoa que esteve dentro de raio de cinco quilômetros daquele lugar. Você não atira até que o tiro perfeito chegue, quando o alvo está exatamente onde o quer e, então, tudo desmorona. [dá um tiro com arma imaginária]
E como eu sei disso? Um professor de Ensino Médio de Boston... Anthony Partridge. Eu o chamei de tolo quando ouvi que tinha invadido meu escritório em Nova York, gritando como um louco alarmista a qualquer um que parasse para ouvi-lo. “Os japas estão vindo! Os japas vão nos atacar! O céu está caindo, o céu está caindo!” Nós o levamos para interrogatório, mas no fim o sujeito não sabia de nada! Disse que tinha passado os eventos mundiais por algum tipo de fórmula... Que piada! Enfiei o relatório no fim da pilha e o mandei de volta para casa.
É, bom, isso foi em outubro de 1941 e, em dezembro, eu já não estava rindo. Acontece que o Dr. Partridge estava revolucionando a matemática e a análise de eventos, e mais toda uma verborreia. Chama-se Mecânica de Previsão. Ele me disse que o único jeito de sobrevivermos seria desenvolver nossa tecnologia, nossa inteligência, e rápido. Disse que os alemães estavam desenvolvendo foguetes e máquinas pensantes, supersoldados e bombas atômicas. Eu preferiria ir para inferno a deixar que me pegassem com as calças na mão assim.
Então dei a ele acesso a todos os recursos ao meu alcance. Eu disse “encontre todo cientista trabalhando em algo novo– algo novo e grande, e daremos espaço a todos para desenvolverem o trabalho deles para nós. Peguei todos que pude alcançar. Matemáticos, químicos, físicos. Engenheiros. Qualquer um trabalhando no limite, na fronteira. E chamei de Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos: ADRA.
Levou dois anos jogando ciência na parede, para ver o que colava. Investimos dinheiro– bastante dinheiro– em uma cidadezinha no meio de lugar nenhum, no sudoeste. Mas finalmente encontramos o que estávamos procurando: O Projeto Arco-íris.
Estou na Filadélfia agora. O teste está marcado para acontecer em algumas horas. Leslie Groves, Robert Oppenheimer, Eisenhower, Harry Truman... Edgar Hoover. Aquele cretino arrogante. Ele está no pé de Roosevelt há meses, dizendo a ele para fechar meu projeto. Chamou o trabalho de Partridge de farsa, chamou os garotos no comando do Projeto Arco-íris de “barris de pólvora descontrolados”. Toda vez que tento subir um degrau na escada, os pés dele pisam nos meus dedos. Bom, ele vai ver. Vai ver do que sou capaz hoje. Mal posso esperar para esfregar na cara dele.
[rádio sintonizando; sons de um porto]
BD: Victor Lambert, Ivan Maraczek, este é o Sr. J. Egdar Hoover, diretor do FBI.
IVAN MARACZEK (IM): Prazer em conhecê-lo.
VICTOR LAMBERT (VL): É uma grande honra, senhor.
J. EDGAR HOOVER (JEH): Aposto que é.
BD: Esses dois são as mentes por trás do que estamos demonstrando hoje.
JEH: Tornar os navios invisíveis aos radares, certo?
VL: Sim, senhor, isso mesmo. Será possível emboscar alvos, observar o inimigo sem ser visto.
IM: O gerador manipula ondas eletromagnéticas em volta de um objeto por meio da catalização—
JEH: Qual é seu nome mesmo, filho?
IM: Ivan Maraczek, senhor.
JEH: De onde você é, Ivan Maraczek?
VL: Escuta aqui, colega, se você tem algo a dizer—
IM: Victor, acalme-se.
JEH: Tenho sim, na verdade. Sei que o seu lado e p nosso fizeram um acordo, mas não estou muito certo sobre quanto do futuro desta nação devíamos entregar à um “gênio recluso” vira-página do Eixo! Como podemos saber que isso não é algum tipo de truque? Pode muito bem ter uma bomba naquele navio.
VL: OK, presta atenção, seu idiota pomposo!–
BD: Dr. Lambert! Sabe, acho que é melhor vocês irem para os seus assentos. A demonstração está prestes a começar.
[Ivan leva Victor embora]
JEH: Aquele garoto tem um temperamento bem difícil. Tem certeza que ele é qualificado para ser o protagonista da sua pequena operação? [ri]
BD: Essa é boa. Ótimo. Diga qualquer coisa em frente ao governo para fechar meu projeto. Por que não ao menos os deixa ver o que temos, antes de decidirem se me deixarão continuar?
JEH: É um desperdício de dinheiro e mão de obra, Bill. Suas engenhocas extravagantes não vão derrotar os alemães. A única coisa que lhe levará para cima é manter o pé no chão. Roosevelt sabe, Eisenhower sabe, Truman com certeza sabe. E, assim que passarmos por este circo, não terão nenhum problema em lhe dizer também.
Amelia: Certo, pessoal, o teste está prestes a começar. Acomodem-se e coloquem seus óculos de proteção.
BD: Só espere e veja.
JEH: É só uma questão de tempo.
[todos se sentam; Bill vai até um púlpito]
BD: Boa tarde, cavalheiros. Todos vocês sabem que tenho uma tendência a discursos longos—
[plateia ri]
BD: Mas estou tão ansioso para ver este teste quanto vocês. Então só direi isto: O que vocês verão hoje é, sem sombra de dúvida, o futuro da guerra na era moderna. Podem começar.
Amelia: Doca para Eldridge, na escuta, Eldridge?
CHET WHICKMAN (CW): [no rádio] Afirmativo, Doca, a engenharia relata que está tudo certo, todos os sistemas prontos. Permissão para proceder?
Amelia: Permissão garantida. Boa sorte, garotos.
CW: Teste do Projeto Arco-íris começando em dez, nove, oito, sete, cinco, quatro...
[sinal cai]
Amelia: Câmbio? Eldridge, perdemos vocês, na escuta, Eldridge—
[Projeto Arco-íris ativa no porto distante; silêncio total; então, o mundo volta]
JEH: Não sei vocês, garotos, mas definitivamente vi aquilo. Claro como o dia.
VL: Cale a boca! Não, isso não está certo. Não era isso que era para acontecer—
Amelia: Eldridge, câmbio, Eldridge, o que aconteceu?
IM: Talvez tenhamos calculado mal a distribuição da lente gravitacional—
BD: Contate-os.
[estática]
Amelia: Estou tentando, senhor. Câmbio, Eldridge!
CW: –oca. Eldridge para Doca. Vocês não vão acreditar nisto… Tem uma pessoa na proa. Uma pessoa que não estava lá antes... Uma mulher.
[rádio sintonizando; Bill sai da sala de interrogação no Eldridge]
CW: Então… O que ela disse, senhor?
BD: Está firme na história dela. A baboseira toda do futuro. Diz que é do ano 20█.
CW: E… você acredita nela?
BD: Você acredita nela, Oficial…
CW: Whickman, senhor. Sargento-assistente Chet Whickman.
BD: Você acreditou dela, Oficial Whickman?
CW: … Acreditei, senhor. Não acho que ninguém… “perdido” daquele jeito tem raciocínio restante o suficiente para mentir.
BD: Ela está convicta, isso é certo. Acredita no que está dizendo. O que significa que ou ela está dizendo a verdade, ou se levou a acreditar que é real. A expressão impassível perfeita. Uma habilidade essencial para um espião.
CW: Como podemos saber? Hm, senhor.
BD: Não podemos. E é por isso que você vai se livrar dela.
CW: Hm… hm… Sim, senhor.
BD: Diga o que quer dizer, filho.
CW: Não tenho intenção de questionar ordens, senhor.
BD: Fale livremente, Oficial Whickman. Por favor.
CW: Bom, eu só… Ela não é uma ameaça, senhor. Não estava armada, não estava fazendo nada além de ficar deitada onde a encontramos. Provavelmente sabe tanto quanto nós sobre o que aconteceu. Está coberta do próprio vômito e completamente indefesa. Só são parece certo atirar em uma mulher indefesa assim, senhor.
BD: Ela apareceu do nada, filho. Do éter. Diz que é do futuro, e admito que o argumento dela é convincente. Mas, se simplesmente apareceu do nada, o que lhe assegura que ela apenas não desaparecerá de volta? Cada segundo que desperdiçamos conversando sobre isso é outro segundo em que ela está planejando como fugir. Não podemos arriscar.
CW: Eu entendo, senhor, mas acho que se ela fosse fugir, agora— se ela pudesse ter fugido até agora, já teria o feito. E, como já a temos aqui....
BD: Vá em frente, Sargento-assistente.
CW: Recrute-a, senhor. O que quer que ela tenha feito, como quer que tenha chegado aqui.... É algo inteligente de verdade. Algo supertecnológico, certo? Como vocês estavam fazendo com o navio. E, o que quer que ela tenha, parece que foi ela quem inventou. É o que diz, pelo menos. Acho que se ela entende mesmo de algo de alto-nível assim, só poderia nos ajudar, certo? E se não for caso... bom, acho que você terá desperdiçado uma semana, por aí.
BD: Recrutá-la…
CW: É só uma ideia, senhor.
BD: Não uma má ideia. Nada má mesmo... Então, Chet, o que acha de uma nova tarefa para você?
[rádio sintonizando]
BD: –você não vai se arrepender, John— sim, eu sei. É uma mudança radical, mas o orçamento da OSS definitivamente tem espaço para negociação. OK, OK. Eu sei. Obrigado. Sim, você também. OK. Tchau.
[Bill desliga o telefone; Sally entra na sala]
SALLY GRISSOM (SG): OK, Donovan, que merda é essa?!
BD: Dra. Grissom, a que devo o prazer—
SG: Ah, cala a boca, Donovan.
BD: Sabe, você realmente não pode falar assim comigo.
SG: Por que você fez isso?
BD: Fiz o quê?
SG: Você… me confinou à solitária! Não sei por que não pode só confiar que não vou vazar segredos do futuro, nem nada do tipo. Eu te disse que não ia falar nada. Mas não! Acha que vou aceitar isso calada?!
BD: Sally, eu—
SG: Demorei um pouco pra perceber, sabe. Primeiro, os técnicos, daí os comissionários, as telefonistas, os calculadores—
BD: Sally! Do que você está falando?
SG: Por que você proibiu a cidade inteira de Polvo de falar comigo?
BD: Não proibi!
SG: Não… não proibiu?
BD: É claro que não! Seria uma péssima ideia. Por que céus eu daria ordens às pessoas com quem você deveria estar trabalhando para lhe ignorar?
SG: Eu… Hm…
BD: Tente ser gentil com as outras crianças, Dra. Grissom.
SG: É…Pode deixar.
[Sally sai; Bill aperta interfone]
BD: Amelia, pode ligar para o Dr. Partridge?
[fita acelera]
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Queria me ver, senhor?
BD: Anthony, você tem que pegar mais leve com Sally Grissom.
AP: Co-Como assim?
BD: Não se faça de bobo comigo. Esteve falando mal da garota para o resto de Polvo. É infantil e está entrando no caminho do progresso.
AP: Oh, sim, do progresso de quem estamos falando, Bill–
BD: Do progresso dela, Anthony. Eu disse a você. É no progresso dela que estou colocando meu dinheiro agora. E você pode ou levar para o pessoal como um namorado rejeitado, ou ser homem e se focar no trabalho. Qual dos dois será?
AP: Mas, vamos lá, Bill, não é justo—
BD: Qual. Dos. Dois. Será?
[Anthony fica em silêncio]
BD: Boa escolha. Da próxima vez que ela pedir voluntários, você está na equipe dela. Fui claro?
AP: Sim. senhor.
BD: Você vai ver. Quando se conhece ela melhor, não é tão–
[Anthony bate a porta]
BD: [suspiro]
[rádio sintonizando]
BD: Bill. Oi. Sim, é você. Precisa me ouvir com bastante atenção. Isso não é uma piada. Nem um trote. O nome do seu pai é Timothy e o da sua mãe é Tish. Você foi atingido por estilhaços no interior da Bélgica e até hoje não consegue sentir nada naquele ponto acima do seu quadril esquerdo. O que faz você se preocupar e perguntar se tem algo de errado com ele, apesar de fazer décadas e provavelmente estar tudo bem... Hmm. É. Hoje é— meu hoje é 1 de Agosto de 1945. Eu sei, este dia não aconteceu ainda. Já está começando a entender? Ótimo.
Se meu Whickman levar a fita para Polvo, e conseguir descobrir como usar aquela maldita máquina, você vai ouvir isso na manhã de dez de julho. Não vou ficar lhe entediando com detalhes; você descobrirá em breve, suponho. Seu Comitê de Supervisão vai chegar de Trinity em alguns dias. A Timepiece não está pronta, e não estará quando eles chegarem. Anthony Partridge, na sabedoria amargurada infinita dele, raptou Sally Grissom e o grupo inteiro dela e os levou para Las Vegas, Nevada, pelo fim de semana. O Comitê vai tentar fechar o projeto.
Sei que está com raiva. Está frustrado. Quer lutar contra isso. Eu sei. Foi o que eu fiz. Você não fará isso. Aqui está o que vai fazer:
Deixe-os aproveitar o fim de semana deles. Não vai fazer diferença, de qualquer forma. Sally está certa: é apenas incrivelmente difícil mostrar a alguém como a Timepiece funciona. Não é chamativa, não é nenhuma bomba atômica. Em vez disso, vai ligar para Edgar Hoover e dizer que entrou em contato com um certo empresário de Nova York chamado John Monroe. Veja só, dei uma investigada. Encontrei o Sr. Monroe, e ele tinha alguns... detalhes bastante íntimos sobre o nosso Sr. Hoover. Detalhes de fato bem chocantes e vívidos sobre os encontros dele com nosso inimigo mútuo.
Sim, é isso mesmo, meu amigo. J. Edgar Hoover é um homossexual. [ri] Vá em frente, aproveite o momento.
Agora, ligue para Hoover, e conte a ele sobre o Sr. Monroe. A menos que queira que o que o Sr. Monroe sabe seja relevado, ele vai tentar revidar. Vai jogar o arquivo que tem sobre você de volta na sua cara. Bill, confie em mim: Não se preocupe. Ele não tem tanto sobre você quanto pensa. Não percebeu que você não tem nada a perder.
É um plano sólido, eu prometo. Tive algumas semanas para bolá-lo. Ele não vai querer perder o poder só para lhe arrastar para baixo junto com ele. E, desde que apoie a Timepiece, o Comitê o seguirá. Ele não vai lhe agradecer, então fique atento, mas se estamos fôssemos um homem de apostas— e sei que somos— eu diria que ele fará a parte dele.
Estou em um motel caindo aos pedaços hoje. A cama range e a cabeceira tem marcas de dentes. Mas, assim que essa fita chegar a você, estarei de volta onde pertenço. Você estará, quero dizer. Pelo jeito a Timepiece é bem útil, no final das contas.
[rádio sintonizando]
BD: [na fita] … Pelo jeito a Timepiece é bem útil, no final das contas.
[fita para]
BD: Isso é tudo.
CW: E onde disse que encontrou isso, senhor?
BD: Só… apareceu aqui. Estava na minha mesa, virei para trás e, quando olhei de volta, estava lá. É genuína, filho, isso está claro. Mas não sei o que fazer com ela.
CW: Bom, senhor… Assumindo que o que você disse na gravação é verdade... Parece um plano suficientemente sólido. É difícil para mim acreditar que não há nada que possamos dizer ao Comitê que o convença a ver do nosso modo, mas você parecia bem certo de que não havia nada que pudéssemos fazer. Bom, suponho que se Hoover estivesse lhe apoiando, considerando o quanto ele odeia você... isso poderia ser o bastante para fazer o Presidente Truman mudar de ideia.
BD: Independentemente de qualquer coisa, teríamos que desacelerar as operações.
CW: Ah, sem dúvida. Provavelmente grande parte da cidade, aposto. É capaz de só termos o bastante—
BD: —o bastante para a equipe da Timepiece.
CW: Exatamente, senhor. Será o bastante?
BD: … Está vendo isto? Isto é só o começo. Se eu puder me avisar antes de qualquer perigo acontecer... É tudo que precisaremos. O resto virá com o tempo. Chet, eu quero que você os siga até Vegas. Jack Wyatt fala demais, e a última de que preciso são repórteres metendo seus narizes em Polvo. Mande Brooks para mim, a equipe dele acabou de finalizar um projeto, e uma cópia do projeto da Timepiece. Retire qualquer coisa que a ligue à equipe de Sally. Quero uma Timepiece extra montada e funcionando em um mês. Já eu, parece que vou ter que fazer uma ligação para o Sr. Hoover.
[rádio sintonizando]
BD: Fita 2, data de envio: 17 de julho de 1945, visando o dia 10 de julho. Isso é depois de eu ter recebido a Fita 1, então espero que ouça ela antes desta. A informação sobre Hoover era verdade. O viadinho cedeu, falou com Truman para nós, mas o que quer que ele disse não foi convincente o bastante. Quando você ligar para ele desta vez, assegure-se de deixar claro o quão convincente deve ser. E, se não funcionar... suponho que vamos continuar tentando até dar certo.
[rádio sintonizando]
BD: Fita 5, data de envio: 26 de julho de 1945, visando o dia 18 de julho. Churchill perdeu as eleições. Diabos, não chegou nem perto. Não sei ao certo como ele conseguiu ir tão mal... É bom cobrar aquele favor que ele nos deve, melhor cedo do que tarde.
[rádio sintonizando; leve distorção estática]
BD: Fita 7, data de envio: 10 de agosto, 1945, visando o dia 4 de agosto. Truman não nos apoiou. Foi correndo implorar ajuda aos soviéticos. De um jeito ou de outro, não vão quebrar o pacto com o Japão a menos que Truman se comprometa a fazer a segunda bomba. A última fita não foi mentira, o Japão não aceitou a Little Boy calado. Diga a Truman para prestar mais atenção. Ele já usou uma bomba, o que é uma a mais?
[rádio sintonizando]
BD: Fita 12, ou… acho que é a 12. 12 de setembro de 1945. Encontrei uma fita sem rótulo. Não sei de quando exatamente ela é, então dane-se minha tentativa de manter estas coisas em ordem. Mas é uma gravação de Chet Whickman confrontando Quentin Barlowe, um dos nossos criptologistas trabalhando para Anthony Partridge nas Mecânicas de Previsão. Parece que Barlowe é um de agente criminoso, espionando-nos para... alguém. Não ficou muito claro quem. Tenho que mandar Whickman investigar isso. Talvez uma atualização da inspeção de segurança de todos... elimine qualquer um estúpido o bastante para invadir a cidade do Bill Selvagem Donovan.
[rádio sintonizando]
BD: Fita 16, data de envio: 3 de dezembro de 1945, visando o dia 28 de novembro. O novo escritório da Central de Inteligência está tomando forma. Mandaram um homem para inspecionar Polvo hoje, o nome dele é Cornish– Hank. Parece um sujeito decente. Bastante interessado no que a Timepiece pode fazer. Pode se tornar um aliado. [funga]
[distorção estática]
BD: Fui frio com ele, mas queria você tentasse a reunião de novo. Aproxime-se dele. Acho que não vamos nos arrepender.
[rádio]
BD: Fita 19, data de envio: 12 de dezembro de 1945, visando o dia 11. Estou em um hospital em DC. Um idiota cruzou um sinal vermelho e bateu na lateral do meu carro na esquina da Avenida 9th com a Rua F. Quebrei a clavícula, perfurei um pulmão, e meu braço esquerdo é basicamente uma coleção frouxa de estilhaços de osso. Só... fique atento, faz o favor?
[rádio sintonizando; distorção estática]
BD: Fita 20, data de envio: 12 de dezembro de 1945, visando o dia 11 de novo. No hospital. De novo, acho. Esperar no sinal não funciona. O idiota bateu em mim por trás, no meio do cruzamento. Talvez tentar um outro caminho da próxima vez?
[rádio sintonizando; distorção estática]
BD: Fita 21. Remarque a reunião. Faça-os ir até você. Fique longe da maldita rua.
[rádio sintonizando]
BD: Fita 26. Diga a ela, merda. Por Deus, diga o que ela significa para você.
[rádio sintonizando]
BD: Fita 29, data de envio: 21 de dezembro de 1945, visando o dia 20 de dezembro. O Sr. Cornish voltou à cidade hoje. Ele me disse que apresentou meu caso para o Comitê com o máximo de convencimento que podia, pelo projeto da Timepiece, mas decidiram fechá-lo mesmo assim...
[rádio sintonizando]
HANK CORNISH (HC): Sinto muito, Bill, de verdade, mas sem algo que eu possa mostrar a eles, é difícil vendê-lo!
BD: Vamos lá! Ele nos deixou livres para fazermos o que quiséssemos por quatro anos!
HC: Isso foi antes da bomba, Bill! Antes de ganharem a maldita guerra!
BD: Ha! “Ganharem a guerra”? Que piada. Derrotaram os alemães e os japas, claro, mas a Guerra de verdade só está começando.
HC: E eu não sei. E sei que seu projeto da Timepiece é a chave para tudo. Mas não é algo que eu possa colocar nas mãos deles e lhes mostrar.
BD: Sim. Vou bolar alguma coisa.
[rádio sintonizando]
BD: Fita 30, 21 de dezembro de 1945. Hank Cornish concordou em anunciar que vamos fechar a cidade na festa de Natal. Se tudo correr como planejado, um certo “barril de pólvora descontrolado” ligado aos restos do Projeto Arco-íris pode se sentir tentando a... tomar medidas drásticas.
[rádio sintonizando; distorção estática]
BD: Fita 31. 21 de dezembro. Maraczek mordeu a isca, a Estação Arco-íris A não passa de história agora. Preciso mandar isso rápido, antes que Sally comece a mudar as coisas.
[rádio sintonizando; distorção estática]
BD: Fita 32. Sally foi impedir a Estação Arco-íris A de explodir. Estou de olho na versão dela que ainda está na festa de Natal, mas Cornish ainda não está convencido. Preciso tentar outra coisa. [tosse]
[rádio sintonizando; distorção estática]
BD: Fita 33. Lambert. Seu filho da puta esquentadinho lindo. Enquanto Sally estava consertando uma estação, ele explodiu a outra. Mas Sally estava lá para detê-lo. Outra Sally. É isso. Essa é nossa oportunidade. Assegure-se de que Cornish esteja lá para encontrar Sally na Estação A, e você para encontrar a outra Sally na Estação B. Isso vai mostrar para ele. Mais uma vez.
[rádio sintonizando; distorção estática]
DUAS SALLY GRISSOMS: Essa é— aaagh...
[distorção estática]
HC: Dra. Grissom, você está bem?
BD: Isso é evidência física o suficiente para você?
HC: Chame um médico!
BD: Consiga os fundos.
HC: O quê? Donovan, sai—
BD: Diga que vai conseguir os fundos.
HC: Deus do céu, você é louco?
BD: Meu tempo está acabando. E o dela também. Consiga. Os. Fundos.
HC: Está bem! Sim, OK? Vou conseguir seus malditos fundos! Mas não adiantariam nada sem ela, então sai da minha frente!
[rádio sintonizando]
BD: Um ano. Temos um ano em uma cidadezinha no Colorado. Um ano antes de a Central de Inteligência colocar um colar de ferro em volta do meu pescoço. Posso ter forçado um pouco a barra com Hank Cornish, mas... fiz o que tenho que fazer. Tenho— tive que fazer.
[distorção estática]
BD: [pigarreia] Um ano no jogo. Mal dá tempo de fazer algo. É claro... tenho muito mais tempo que a CI pensa. Melhor botar as mãos à obra logo.
[rádio sintonizando; interfone]
Secretária: Prefeito Harding, o senhor das dez horas está aqui.
MAYOR HARDING (MH): [no interfone] Mande-o entrar.
BD: Obrigado, querida.
[Bill ajusta o microfone; porta abre, Bill entra]
BD: Prefeito Harding, Bill Donovan. É um prazer conhecê-lo.
MH: Prazer, Sr. Donovan. O que posso fazer por você?
BD: Bom, como você sabe, acabei de me mudar com a minha equipe.
MH: Sim, falei com seu colega, o Agente Cornish. Vocês se mudaram para a velha estação Roebuck, nos arredores da cidade, ao sul, certo?
BD: Sim, senhor, e graças àquele prédio, vamos nos acomodar muito bem aqui. Muito bem.
MH: Bom, tem mais alguma coisa que posso fazer por você, então, Sr. Donovan?
BD: Para falar a verdade, tem sim. Vamos precisar usar uma quantidade significativa de energia na sua estação. Bastante energia, na verdade. Sua usina pode não ser suficiente para fornecer tudo. Trouxe algumas plantas para—
MH: Plantas? Sr. Donovan, as necessidades de eletricidade na nossa cidadezinha são bem modestas. Não precisa de mais do que isso. O que você está sugerindo seria arrancar metade dos fios de cobre da cidade—
BD: Mais de metade, na verdade. Vão precisar destruir a Rua Elm, a Rua Baker, e todo este trecho da estrada que vai até o vale. Sei que é uma via principal para sair e entrar na cidade, então precisaremos construir um desvio—
MH: Sr. Donovan, você está falando de um projeto que precisaria de três ou quatro equipes trabalhando aqui por um mês, sem parar. Desviar o trânsito em volta da Elm seria um verdadeiro pesadelo! Como está planejando pagar por tudo isso? Sua agência deve ter uma dinheirama—
BD: Na verdade, Sr. Prefeito, você vai financiar as reformas.
MH: [ri] Ah, é mesmo?
BD: Pode ser certeza. A menos que queira que seus eleitores descubram sobre como você apunhalou seu amigo e colega pelas costas para chegar onde está hoje...
MH: Eles já sabem. Sr. Donovan! Tornei a coisa bastante pública durante minha campanha. Não queria manter nenhum segredo, para homens como você não conseguirem me forçar a nada! Tem alguma coisa legal e razoável que eu possa lhe fazer, Sr. Donovan? Antes de você acabar com o restinho de bem que deixou neste escritório?
BD: Sim… Parece que isso não lhe convenceu, não é?
MH: [ri] Parece que não, senhor!
BD: Acho que apenas vou ter que tentar de novo.
[rádio sintonizando]
MH: Sr. Donovan, as necessidades de eletricidade na nossa cidadezinha são bem modestas. Não precisa de mais do que isso–
BD: Tenho aqui comigo tecnologia que vai revolucionar este século e o próximo. E, se vier tudo daqui, se você concordar nos subsidiar... poderia lucrar bastante, Sr. Prefeito.
MH: Senhor! Não sei que tipo de homem você pensa que eu sou, mas não serei comprado por um valentão como você!
[rádio sintonizando]
MH: Sr. Donovan, as necessidades de eletricidade na nossa cidadezinha são bem modestas. Não precisa de mais do que isso–
BD: Você pode encher todo o lugar de luz. Vai ser uma maravilha, uma grande atração! “A Cidade Brilhante na Colina”! Pense no dinheiro que trará para a cidade.
MH: Um monte ricaços e cafajestes da cidade vem nos feriados... e destroem a paz em Ponto de Exílio. Eu e você temos ideias bem diferentes do que é bom para esta cidade.
[rádio sintonizando; distorção estática; sons de luta]
BD: ASSINE-OS! ASSINE OS PAPÉIS, MERDA!
MH: Tire as mãos de mim, Sr. Donovan!
[rádio sintonizando]
CW: Senhor, o que você quer? Não estou entendendo.
BD: Quero que você comece a separar fundos e investi-los em reconstruir a rede elétrica desta cidadezinha no Colorado. Vamos ter mudando para lá— ter mudado para lá… Em dois anos estaremos lá e precisa ser preparar... preparou... preparado.
[distorção estática; rádio sintonizando]
BD: [tosse]
CW: Senhor, por que não se senta?
BD: Que merda, Chet, eu estava bem! ... estou bem! Vou ficar bem. Eu... você precisava— precisa fazer… falou… vai falar—
CW: Eu sei, senhor, eu sei. Preciso falar com Jack Wyatt, é capaz de ele acabar matando todos da equipe se continuar—
BD: Não! Você não vê? Ele sabe que estamos chegando. E sabe que sabemos, que sabíamos, que saberemos de todos os planos, e— [ataque de tosse]
CW: Senhor, talvez seja melhor você—
BD: Whickman, você precisa de um plano. Planeje tudo. Tudo que puder pensar, cada contingência. Ele dá um jeito de contornar. Nós estivemos... vamos, vamos estar... temos que estar preparados para ele... preparados para ele.
CW: [suspira]
[rádio sintonizando]
CW: A saúde do Diretor Donovan está piorando mais e mais a cada dia. A fala dele... é como se não conseguisse falar nem uma frase inteira mais... só sequências de palavras! Ainda estou seguindo o plano que ele nos deixou, mas... É minha responsabilidade agora. É tudo minha responsabilidade!
HC: Acalme-se, filho. É por isso que estou aqui. Estou aqui para organizar os próximos passos.
CW: Bom, está me parecendo que todo mundo da equipe simplesmente decidiu que a Timepiece não é importante o bastante para ser digna do foco deles, senhor.
HC: E você disse a eles que o que quer que consigam fazer até o fim do ano será definitivo, certo?
CW: Não vai fazer diferença, senhor. Não são cavalos, não dá para simplesmente chicoteá-los até correrem mais rápido. Nós temos… temos que abordar a questão de outro ângulo.
HC: Qual é sua ideia?
CW: Bom… o Diretor Donovan tinha algumas. Ele disse que temos que atraí-los de volta. Tirar Wyatt da bebida e devolvê-lo ao laboratório. Aliviar a pressão que Helen Partridge está colocando no marido para escolher entre ela e o trabalho.
HC: E para fazer a Dra. Grissom se focar?
CW: Sally é um caso especial, senhor. Não queremos forçá-la. Ela é valiosa para o projeto, e quão mais perto chegar dele.... Bom, maiores as chances de acabar como Bill.
HC: Sim, eu vi. Nós não iríamos querer isso.
CW: Não há nada que você possa fazer? Conseguir-nos mais tempo?
HC: O que acha que tenho feito, filho? Estou sem alternativas! Deixei vocês aproveitarem seu ano, mas a janela está se fechando. E alguém precisa assumir as coisas aqui, ou vai tudo desmoronar. E se você não o fará—
CW: Eu dou conta, senhor.
HC: Então dê!
CW: Os problemas são Wyatt e Partridge. Precisamos conseguir ajuda para Jack— alguém de fora da agência. Ele não confia em uma palavra nossa. Tem que ser alguém que encontrou por si mesmo... [estala os dedos] Ele tem uma garota com quem posso conversar, ela vai colocá-lo de volta nos trilhos!
HC: E os Partridges?
CW: Não acredito que há algo de que a Sra. Partridge gostaria mais do que ver o marido fora daqui. Se vamos manter Anthony Partridge conosco, ela tem que ir embora.
HC: Deixe-a comigo, então. Nada mal, Sr. Whickman. Nada mal mesmo.
[rádio sintonizando; uma multidão sai do clube]
HC: Srta. Partridge, posso falar com você um minuto?
HELEN PARTRIDGE (HP): Hm, claro. A propósito, é Senhora—
HC: Erro meu, Sra. Partridge. Acabei de ver sua apresentação. Sua voz é simplesmente linda.
HP: Ora, obrigada, Sr.—
HC: Oh, perdoe-me, meu nome é Harry Conway, represento Conway, Stevens & Rice. Somos uma agência de talentos sediada em Los Angeles. Recebi uma ligação de um amigo meu que estava passando pela cidade umas semanas atrás, dizendo que eu tinha que ver Helen Partridge cantando! E tenho que lhe dizer, senhora, meu amigo não estava errado. Nem um tiquinho errado.
HP: Ai meu— Você… você não está falando sério. Nesta cidadezinha no meio do nada?
HC: Oh, mas Sra. Partridge eu estou falando 100% sério! Gostaria de oferecer a você a chance de cantar para a nossa companhia. Vamos arrumar tudo na Califórnia, levar você, gravar algumas músicas e, quem sabe, talvez até consiga um contrato em algum lugar—
HP: Sr. Conway, por favor! Aprecio sua oferta, mas... Jesus, quer dizer, Califórnia?
HP: … Não, não, desculpa, eu não posso. Este é só um passatempo bobo. Eu-eu moro aqui, meu marido—
HC: Seu marido está aqui, Helen? Posso falar com ele, talvez?
HP: Ele, hm… N-não, ele não veio hoje...
HC: Oh, bom, então talvez eu possa falar com ele outra noite?
HP: Você teria que nos visitar em casa então, Sr. Conway. Meu marido não veio me ver cantar ainda.
HC: Que… Bom, que pecado. Está perdendo algo especial. Escute, Helen, sei que é muito em que se pensar. Seria desistir de todas as coisas boas que você tem aqui; sua vida tranquila nas montanhas com seu marido, todos os seus amigos na cidade. Mas, se quer meu conselho, seria um pecado desperdiçar uma voz como a sua.
[Hank tira cartão do bolso]
HC: Aqui. Fique com meu cartão, tire um tempo para... pensar na proposta. Ela não tem prazo. Se quiser cantar para nós, tudo que tem que fazer é ligar. Tenha uma boa noite, Sra. Partridge.
[rádio sintonizando]
CW: Com licença, senhorita, seu nome é Penelope Wise?
PENNY WISE (PW): É, posso te ajudar?
CW: Oi, talvez você se lembre de mim? Trabalho com Jack Wyatt.
PW: Oh, sim, ‘cê é hm… o sujeito da segurança. Desculpa, Sr...
CW: O rendimento dele tem piorado ultimamente.
PW: Oi?
CW: Não se preocupe, não é culpa sua. Na verdade, você vai me ajudar a resolver isso.
PW: Olha, eu num acho—
CW: Ele sofreu um ferimento há alguns meses. Isso o afetou. Parece ter o levado a um pouco de... excesso. Comportamento imprudente. Só preciso que você se assegure de que ele está bem.
PW: Escuta aqui, Sr. Medonho. Não sei que que ‘ocê quer, mas o que eu faço ou deixo de fazer com as pessoas que eu me importo não é da sua conta! O Jack é próximo de mim, e não gosto nada de ser incomodada por estranhos me parando e perguntando sobre quem é próximo de mim��
CW: Seu pai.
PW: Meu… pai?
CW: Ethan Wise. Tem uma fazenda de gado a cerca de dois quilômetros da cidade, certo? Parece que ele deixou de pagar algumas hipotecas, aqui e ali. Sabe... eu poderia ajudar com isso.
PW: O que você quer?
CW: Só o ajude. Queremos Jack feliz e saudável, com os olhos brilhando e o rabo abanando quando chegar ao trabalho de manhã. Mantenha a mente dele livre de problemas e cheia de pensamentos felizes. Dê a ele algo para o qual voltar para casa, ao fim do dia. Tire-o da bebida. Só seja você mesma, Senhorita Wise, e tenho certeza que todos conseguirão o que querem.
PW: Mais alguma coisa que eu possa fazer por você?
CW: Não, senho–
PW: –Ótimo. Posso ir agora?
CW: É claro.
[Penny sai]
CW: Obrigada pela cooperação, senhorita!
[rádio sintonizando; distorção estática]
BD: Esta está fadada a ser minha última gravação... É 15 de dezembro... ou 18... 10? Não... não sei mais. É dezembro de 1946, tenho quase certeza. Não consigo organizar os dias na minha cabeça. Posso me sentir esvaindo... Os ataques estão mais frequentes, perco a noção dos meus... Certos dias, passo uma hora só repetindo palavras de novo e de novo e só repetindo palavras de novo e de novo e só repetindo—... Não sei. Não sei o que estou dizendo mais. Merda, Partridge, era para você resolver isso! Você poderia ter tido tudo! Por que não vai pode resolver isso?
[distorção estática aumenta; Bill tosse]
É isso. Sei que é. Preciso… Whickman. Ele vai ter que comandar as coisas para mim agora.
Chet. Escute. Não perca sua determinação. Mantenha-os trabalhando. Estão tão perto, e eu... Se resolverem o problema, mesmo depois de eu morrer, você ainda pode me salvar. Mande o projeto do modelo final de volta para mim, antes de eu—
[uma caixa cai na mesa; distorção estática diminui]
Ha… Haha! Falando no diabo. Aí estão. As fitas, os projetos para uma… parece que algum tipo de sala com a Timepiece dentro e um… HA! A CELA, hm? Oh, Partridge, seu cretino lindo, eu sabia que você vai— sabia que... Sei que você vai concertar tudo!
[Bill disca o telefone; distorção estática]
BD: Whickman! Aqui, venha aqui agora. Conseguimos. Conseguiremos. Eu recebi o... Partridge, ele vai acabar— ou… [tosse] vai ter acabado— Urrgh… Partridge, ele chegou— chegando perto— ele já, e vai ter mandado.... vai.... vai ter mandar... Aaaah! Ele vai ter mandando...
[Bill tosse; derruba o telefone; desmaia]
CW: [no telefone] Não se preocupe, senhor. Estou chegando. Não vou decepcionar você.
[gravador de fita desliga]
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09: Decaimento
[gravador de fita liga]
SALLY GRISSOM (SG): Diário de Sally Grissom, 23 de dezembro de 1946. Esse ano, nosso milagre de Natal veio em forma de uma... “parada bem estranha” é pouco científico demais? Porque é uma parada bem estranha. Partridge e eu estamos trabalhando em um processador que utiliza as propriedades de congelamento temporal da CELA pra solucionar alguns problemas de otimização. Basicamente, um computador funcionando dentro da CELA te dá resultados imediatos. Por si só isso já é bem legal, mas fica ainda melhor. Usando o modelo de previsão de Partridge paralelamente ao processador, ele prevê os resultados mais prováveis e manda eles de volta pro processo inicial. Faça isso algumas centenas de vezes e você consegue um resultado ordens de magnitude mais exato que poderia encontrar até... na verdade, acho que nem 20█ tinha algo tão preciso. Anthony tem chamado a coisa toda de “Processador Assíncrono” – o APU. Ele demanda um nível infernal de programação, mas já mencionei que é praticamente instantâneo? Ainda não tem nenhum sistema operacional funcionando pra ele, mas, quando tiver, tenho o nome perfeito: NoStradamOs. Cara, eu sou boa nisso.
Mas, continuando. A coisa trabalha bem o bastante quando depende de um Sistema mecânico, mas um sistema digital funcionaria bem melhor... e não precisaria de um depósito inteiro cheio de tubos à vácuo. Naturalmente, a primeira coisa que me veio à mente foi adaptar o APU pra usar transistores. Devia ser bem simples de se fazer, em termos de mecânica. Com a nova configuração, começamos a receber resultados praticamente no momento em que inseríamos os cálculos. Mas saem uma confusão. Os resultados vem ou bagunçados, ou faltando pedaços. Bits demais, ou de menos. Todos checamos e checamos de novo o funcionamento da máquina, e ninguém consegue descobrir o que há de errado. Roberts acha que é totalmente aleatório, mas Wyatt ‘tá apostando num fantasma lá dentro. Tipo o Fantasma dos Dados Passados, ou algo do tipo. Assustadoor! De qualquer forma, é bem frustrante não saber nem sequer como começar a responder uma pergunta. Mas, ai, ai, assim é a ciência.
Falando de coisas assustadoras, tenho visto novas caras pela cidade. Todas se encaixam direitinho no estereótipo de espião. O corte de cabelo curtinho, os colarinhos das camisas ligeiramente engomados demais. Balconistas, seguranças, funcionários de escritórios. Todo tipo de profissão. Tenho a sensação de que cada um deles tem um grande “CONFIDENCIAL POR ORDENS DE” carimbado em algum lugar de seus arquivos. Nosso ano acabou, a CIA ‘tá aqui. Eles me dão um terrível senso de déjà vu, como se estivesse de volta no Novo México. Todos ficam me encarando quando passo... ou talvez seja só minha paranoia. Não seria a primeira vez.
[rádio sintonizando; Sally soldando, Anthony trabalhando em um conjunto de problemas; Sally se queima e deixa o ferro cair]
SG: Ai! Merda.
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Pelo jeito doeu. Você está bem? Posso checar a geladeira–
SG: Não, não, tudo bem. Só me passa aquela peça ali. Ali–
AP: Esta?
SG: É, essa. Valeu.
[Sally procura as peças, Anthony para de trabalhar]
AP: Você e Helen se falam, certo? São amistosas? Amigas?
SG: Hm, amistosas. Acho. Por quê?
AP: Ela fala muito sobre si mesma, ou… sobre nós?
SG: Já não ‘tou gostando de pra onde essa conversa ‘tá caminhando.
AP: Helen e eu, nós estamos lidando com uma… discordância. Lembra quando todos fomos para Las Vegas ano passado, e assistimos o teste da Trinity? Ela cismou que o estamos fazendo aqui vai nos levar ao Fim dos Tempos. Desde estão, as coisas não são as mesmas entre nós... Ela se recusa a entender o quão importante esta pesquisa é.
SG: Que rude da parte dela.
AP: Estamos tão perto agora, à beira de realmente mudar o mundo. É incrível, mas também uma pressão gigantesca. Ela não consegue enxergar isso?
SG: Acho que ela sabe exatamente sob que tipo de pressão você ‘tá. Acho que esse é o problema.
AP: Como assim?
SG: Vi seu ponto. Você ‘tá trabalhando 25 horas por dia. Dormindo numa cabana que montou debaixo da sua mesa.
AP: Você tem uma igual debaixo da sua—
SG: Partridge, você já tem uma cama! Uma de verdade. E uma mulher em casa que te quer nela, ao lado dela!
AP: Quando estou lá nós… Não sei. Flutuamos um em volta do outro. Dois planetas em órbita. Quero passar meu tempo onde sou útil.
SG: Quanto tempo faz que você tirou um dia só pra ficar com ela?
AP: Bom, vejamos… Não desde… Eu… Tem um bom tempo, acho.
SG: Eu me lembro daquela noite no deserto. Teve mais que só a bomba. Você lembra? A fogueira? A história sobre seu primeiro encontro, aquela garrafa de vinho?
AP: Sim…
SG: Aí. Essa expressão. Essa é a expressão que você tinha aquela coisa. Você ama ela, cara. Pura e simplesmente. Mas sabe quando mais ‘cê fez essa cara? Depois da bomba explodir.
AP: Não é tão simples, Sally. Eu devotei cinco anos da minha vida a este projeto porque o potencial dele é medido em vidas reais! Estamos à beira de mudar o mundo!
SG: Você não desiste fácil, Partridge, qualquer um consegue ver isso. Mas acho que, depois de superar o fascínio pelo seu mais novo brinquedo, fica com medo do que vem a seguir.
AP: Acha que estou com medo? Essa é sua brilhante teoria?
SG: Qual é o problema? Fala sério, você foi comissionado por dois anos pra criar um modelo pra prever o futuro. Sabe mais sobre prognósticos que qualquer um. Não consegue prever o que vai acontecer contigo se continuar assim?
AP: Pare com isso, Sally. Agora.
[Esther e Jack entram no laboratório]
SG: Então sim! Acho que você ‘tá com medo! Com tanto medo, na verdade, que não consegue nem ouvir o conselho que me pediu!
JACK WYATT (JW): Briga de família? Ei, posso participar? Já que não podemos voltar para casa no Natal, fiquei com um pouco de saudade este ano.
SG: Partridge e eu estávamos tendo um debate agitado sobre o... problema de entropia dos dados do APU. Mas ele se recusou a ouvir meu sábio conselho.
AP: [escarnece]
SG: Talvez vocês tenham mais sorte.
ESTHER ROBERTS (ER): … Então?
AP: O quê?
ER: Qual é a pergunta? Deve ser bem complicada, se deixou Sally fumegando assim.
SG: Ei! Eu não fumego!
JW: Às vezes sim. Só um pouquinho.
AP: O que eu ia dizer era que o processador assíncrono ainda está mostrando erros fatais em 3% de seus cálculos. Tem a ver com o novo sistema de interruptores eletrônicos. A memória não parece estar analisando os bits corretamente, pelos caminhos previstos, e esses 3% são o bastante para estregar qualquer outra coisa que ele tente.
JW: Do que você o chamou, Sally? Um fantasma na máquina? Pergunto-me se é amigável como o Gasparzinho...
ER: Cale a boca, Jack.
AP: Há duas respostas possíveis, aparentemente. Um: há uma falha em como a energia está sendo distribuída e isso confunde o processador e interrompe o sequenciamento. Dois: o processador assíncrono simplesmente não—
SG: Partridge, você ‘tá me matando. Se não gosta de “APU”, pelo menos invente um nome melhor.
AP: O quê? Tudo bem. Que tal o ... Extra-temporal... ou.... o Antitelefone recursi- ... não... Oh! O SuperLaminal Ratificador de Processos! SLURP!
SG/ER/JW: [ri]
ER: Sério, Dr. Partridge? SLURP?
AP: O qu— Ok! Não tenho o talento de Sally para dar nomes. Tudo bem. Mas, sem um jeito de consertar isso, estamos empacados.
SG: Vai ser difícil ajustar a CELA pra um computador maior quando esse não funcionar.
JW: Essa coisa já toma metade do laboratório com todo o hardware dela. Se passar disso, a Dra. Grissom vai ser que trabalhar na Timepiece entre os bancos de dados C7 e C8.
SG: Não lá muito economicamente viável. Nem prático.
AP: Vamos lá, pessoal! Preciso de um resposta! Estou deixando algo crucial passar.
ER: Nós cuspimos na cara da praticidade o tempo todo, Dr. Partridge, e normalmente funciona. Um dos estranhos benefícios de conhecer a Dra. Grissom.
AP: Bom, normalmente ela tem algum tipo de insight mais ou menos agora…
SG: … Oh, então agora você quer minha ajuda?
[rádio sintonizando; música de Natal na copa]
JW: Então, Esther… você e Chet vão fazer algo no feriado? Hein? Você e Chet? Estão namorando, não é?
ER: O quê? Do que você está falando?
JW: Fala sério. Vocês têm se encontrado, não é? Desde uns meses atrás, o fiasco da CELA?
ER: Não! Por que isso sequer passaria pela sua cabeça?
JW: Bom, você têm sido tão reservada sobre o que aconteceu lá... Em um lugar escuro e fechado... Nada com que se ocuparem senão alguns quadrinhos desgastados...
ER: Hmph. “Desgastados”. É a isso que todo meu trabalho duro levou? Você é um ogro.
JW: Não, Esther, vamos lá, estou feliz por você! Não é bom estar com alguém? É exatamente o que você precisa. Quer dizer, há quanto tempo você não tem um pobre coitado na palma da sua mão? Desde o que, a faculdade?
ER: Desculpa, vai ter que repetir o que disse. Não consegui ouvir com todos os grunhidos e rugidos.
JW: Uh, se me lembro bem, você estava toda envolvida com a história de “empurrar Jack de qualquer jeito para uma linda e encantadora garçonete”.
ER: É, de nada, aliás. Como vai a Penny?
JW: Ótima. A lanchonete está fechada esta semana, então passamos a maior parte do final de semana juntos na ca— nós... hm... o passamos juntos.
ER: Ora, ora, Sr. Wyatt, nunca pensei que um cavalheiro como você seria indiscreto assim!
JW: Não mude de assunto. Quantas vezes Chet Whickman sussurrou baboseiras confidenciais no seu ouvido?
[Esther fica em silêncio]
JW: … Ele… oh, ele contou, não é? Ele lhe contou algo lá dentro—
[Jack desliga o rádio]
ER: Não aconteceu nada, OK? Eu tentei!
JW: Ah, vamos lá, o que você está escondendo? Desembuche.
ER: Não… não posso contar.
JW: … Sério?
ER: Não é porque eu não quero! Quer dizer, fala sério, Jack. Eu contaria. Mas Whickman, ele... Você me entende! Material super ultrassecreto, arma em mãos, portas trancadas! As pessoas que o incomodam não acabam bem.
JW: … Não sei se percebeu, mas o comando mudou bastante sua equipe, e você sabe tão bem quanto eu que não são daqui. São de Washington, ou de onde quer que a fábrica que os produz à tonelada é. Esses tipos da inteligência.
ER: Não vi nada.
JW: Viu sim! Não faça isso. Você também os viu, sei disso.
ER: Jack, já ouvi falar de paranoia, mas isso é só—
JW: Não é paranoia, merda! Eu sei que Whickman é assustador, mas não jogue os joguinhos dele, Esther! Você é melhor que isso. Olhe bem à sua volta, e me diga se não tem um clima no ar igual a depois... depois do que aconteceu... A festa de Natal. Ano passado.
ER: E se tiver?
JW: Olha, Penny e eu temos conversado. E ela...vamos pegar o próximo trem para fora daqui, Esther. Próxima parada: qualquer outro lugar.
ER: Então… vai nos deixar.
JW: Nosso ano acabou, os agentes do governo estão aqui, e eles são como tubarões, Esther. Tubarões que farejaram um rastro de sangue na água. E eu não vou ficar pro jantar.
ER: Então é assim? O governo chega aqui e você se manda?
JW: Sim! Agorinha, o mais rápido possível! Riki-tik, como dizem os marinheiros! Antes que Donovan ou Whickman ou nós possamos causar mais danos, Esther! Já se esqueceu de Victor Lambert, Natal passado? Ou Quentin Barlowe, antes disso? Esses homens foram destruídos. Eram bons homens, e o governo dos EUA os usou até não sobrar mais nada.
ER: Eu me lembro, mas você não pode atribuir isso a... Ainda estamos no escuro sobre o que aconteceu com ele.
JW: “No escuro”? Engraçado você mencionar isso, porque é exatamente como me sinto agora! Você passou um dia “no escuto” com Chet Whickman, e agora está jogando o jogo deles. Verdade ou mentira?
ER: … O que nós fazemos é complicado. Saber de todos os detalhes não torna o que precisamos fazer mais fácil.
JW: Você soa como eles, Esther. Soa como Whickman e Donovan e todos os outros homens sem rosto e de terno cinza que dirão qualquer coisa para que mantenhamos nossas cabeças baixas e o progresso na pesquisa. Você... Pensei que quiséssemos ajudar as pessoas. Quem foi a última pessoa que a Timepiece ajudou? Não consegue dizer, porque não tem nenhuma! Ela arruinou vidas, Esther, dos modos mais terríveis! E a Dra. Grissom...
[Esther levanta, vai até a pia]
ER: Ela nunca fala da família. Já percebeu? Não parece certo que ninguém pensou em perguntar.
JW: Ela só evitaria a pergunta. Onde você quer chegar?
ER: Você quer mesmo ir embora?
JW: Quero ir embora. Quero que todos nós vamos! Por que é tão importante naufragar junto com este navio?
ER: Porque talvez ainda haja uma chance de eu– de nós fazermos bem com a Timepiece. Se nos convencermos de que não vale a pena, ninguém nunca mais vai ter essa chance.
JW: Então, se o navio está afundando, você prefere ser a pessoa ao leme. Esse é certamente um tipo de loucura bem específico.
ER: As pessoas costumavam pensar isso sobre visionários. Agora sabemos que eram corajosos. Você poderia ser isso para Penny, Jack. Poderia ser isso para nós também.
JW: … Devo convidar Sally para o Natal, certo?
[rádio sintonizando; Timepiece acelera; Sally digita em um teclado]
AP: Desta vez vai. Desta vez vai. Desta vez. Vai.
SG: CELA iniciando em 3, 2, 1.
[CELA energizando, desacelerando; imprimindo]
SG: Iniciada. Como estão meus bebês?
AP: Estão aqui, mas… Ah, merda!
SG: Mesmo resultado?
AP: Olha isso. Cada resultado está fragmentado de um jeito completamente único. Um lindo e incompreensível floco de neve. Nenhum desses dados corresponde a nada que inserimos. Mais uma vez, então?
SG: Partridge, não sei quem está mais frito: a rede elétrica ou meu cérebro. São só 5:30, o que ainda te dá bastante tempo pra jantar– com a sua esposa.
AP: De novo isso? Sally, não posso ir para casa ainda!
SG: É Natal, colega, o que é meio que uma grande coisa por aqui.
AP: O sistema precisa estar funcionando no Ano Novo.
SG: Precisa?
AP: Sim. E prefiro não entrar em detalhes–
SG: Porra, Partridge, isso não é saudável! Não sei como deixar mais claro! Você vai definhar ou enlouquecer aqui, se continuar assim! Volte pra casa, pro que restou da sua família!
AP: Isso é quase engraçado, vindo de você.
SG: O quê?
AP: Por que não deixa isso para lá? De início, apreciei sua preocupação, mas agora estou começando a perder a paciência com essa– essa obsessão que você tem! Estou ocupando espaço demais? Deixando você desconfortável? É a última pessoa que devia me repreender sobre folgas do trabalho!
SG: Foda-se. Tenha um feliz Natal, Partridge.
[Sally sai, rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 24 de dezembro de 1946. Sabe, nunca entendi o Natal. Como coisa em si. Não entendo. Só me lembra de ser uma adolescente rabugenta, desajeitadamente espremida num canto de uma sala cheia de adultos que não fazem a menor ideia do que dizer pra você, ou até se devem dizer algo pra você. Uma ocasião feita pra aproximar as pessoas, mas que só te faz se sentir ainda mais sozinho. Eu costumava revirar meus olhos pro Natal assim que as pessoas começavam a trocar os enfeites fantasmagóricos por pisca-piscas. É só mais uma desculpa pros americanos encherem cada loja no país– pra espalhar um pouco do espírito natalino com seu dinheirinho suado! A mais incrível época do ano– fiscalmente falando!
Mas ando por essa cidadezinha montanhesca e… é como se toda a minha aversão se esvaísse. Porque, quer saber? Eles acreditam nisso. Não tem nenhuma árvore de plástico, ou lojas de departamento. O espírito natalino deles não é comprado. É real. Essas pessoas se reúnem em volta da lareira, e realmente se importam umas com as outras. Sabe? Tipo, que tipo de pessoa eu seria se não visse algo tão... [funga] É só... é difícil, sabe? Olha só o Partridge, ele está mais que feliz em estragar tudo quando nem sequer... nem sequer faz sentido.
Ele tem que saber, né? Tem que saber o que ela ‘tá prestes a fazer.
[batida na porta]
ER: [do outro lado da porta] Olá?
JW: [do outro lado da porta] Ei, Dra. Grissom! Sally, está aí?
SG: Ah, merda. [funga]
[rádio sintonizando]
AP: Começando fase de teste de 20 variáveis, com o Processador Assíncrono alimentado pela CELA e transistores Grissom modificados. As variáveis de entrada se referem aos resultados do evento da morte de William Donovan.
[Timepiece acelera; Anthony digita variáveis; CELA ativa; resultados são impressos]
AP: Resultados do teste 44-C determinado com velocidade até então característica, com... os dados incompreensíveis característicos.
[Anthony amassa os resultados]
AP: … Natal. Natal agora, máquina do mal amanhã. Estou chegando, Helen.
[Anthony se levanta, derrubando seu gravador]
AGENT MARSH (AM): Oh, boa tarde, Doutor.
AP: Uh, boa tarde. Posso ajudar com alguma coisa?
AM: Não, senhor, só fechando pela noite, e me assegurando que todos voltem para casa para aproveitar um pouco o Natal.
AP: Bom, hm, eu estava justamente me arrumando para isso, se me der um momento.
AM: Temo que terei que lhe pedir para sair agora, Doutor, se puder deixar tudo como está.
AP: Por que, Sr…?
AM: Marsh, senhor. Agente Nicolas Marsh.
AP: Agente… Entendo.
AM: Preciso fechar tudo, se não se importa.
AP: Não, certamente. É claro. Feliz Natal, Agente Marsh.
AM: Para você também, Doutor Partridge. Deus lhe abençoe.
[rádio sintonizando]
JW: [do outro lado da porta] Sally, abra a porta! Temos uma pergunta!
ER: [do outro lado da porta] Tem uma campainha, Jack, talvez ela não consiga nos ouvir–
SG: Um segundo!
[porta abre]
JW: Sally! Ainda está aqui, ótimo!
SG: Que foi, pessoal?
ER: Estávamos com medo de o Dr. Partridge já ter perguntado– espera aí, você estava–
SG: Entrem logo, ‘tá congelando aqui!
[Esther e Jack entram; porta fecha]
SG: O que foi?
ER: Você estava chorando?
SG: O quê? Não! O que estão fazendo aqui, aliás? Tenho um telefone.
JW: Tentamos ligar. Várias vezes, até. Caiu direto na sua Secretária-mática, tive que deixar mensagens.
SG: Secretáriatron. De novo: você, aqui, por quê?
JW: Sozinha em casa na véspera de Natal, chorando sobre seu gravador de fita, [fareja] sóbria, pelo jeito, e com o telefone desconectado? Meu deus, se tiver comida congelada no seu balcão da cozinha, Sally, acho que vou perder minha vontade de viver.
ER: Jack, por favor. Sally, odeio concordar com… qualquer uma dessas coisas, mas vamos lá. Viemos aqui por você, sabe.
JW: Não tem uma reunião da família Grissom para qual você devia estar indo?
SG: [respira fundo] OK. Ok, ótimo. Sabe... posso estar cometendo traição ou algo do tipo, mas tudo bem. Não sou só uma cientista genial que inventou uma máquina do tempo. Sou do século XXI. Construí o protótipo da Timepiece por acidente. Apareci na proa de um navio de Guerra e vomitei na camisa toda de um marinheiro, quando ele me ajudou a levantar. E aí, Donovan me abduziu e levou pra Polvo. E aí... e aí, Donovan me abduziu e levou pra Polvo– Nada? Sério?
ER: Não acho que este trabalho nos surpreenda mais, Sally.
JW: E já cuspimos fogo por causa de viagem do tempo Natal passado.
ER: Espera aí, nós fizemos o quê?
JW: … Conto para você depois.
SG: Estão falando sério.
ER: Estamos. Encare os fatos, você é diferente, sempre foi. As pessoas percebem, mas não são nós. Não saberiam o que estão procurando.
JW: E ninguém que já conheci fala como você. Ou come como você. Ou encara a xícara de café com uma expressão vazia quando está pensando em um problema como você.
ER: Ele está certo sobre sua dieta. É assustadora.
SG: Eu… Valeu? Obrigada? Acho? Por que estão sendo legais comigo?
ER: [fazendo sua melhor imitação de Whickman] Essa informação é confidencial, Dra. Grissom.
JW: Espera, você botou mesmo tudo para fora em cima de um marinheiro, quando chegou aqui?
SG: Na verdade… era o Whickman.
[Sally, Esther e Jack desatam a rir, estilo fim de episódio de série de comédia dos anos 70; Esther e Jack param antes de Sally, que começa a soar levemente maníaca]
SG: [ainda tomando fôlego] OK, OK, o que era tão importante que vocês se arrastaram até aqui, nesse inferno gelado, pra me dizer?
JW: Bom, estamos em cima da hora, mas já convidei a Roberts, que já fez a.. a vela estranha dela–
ER: É um menorah!
JW: –E Penny já disse que eu devia levar meus amigos, então... Quer passar o Natal conosco?
[Sally começa a chorar]
ER: Jack!
JW: Ai meus Deus, o que foi que eu disse, Sally… Ai meu Deus, por favor, Esther, conserte isso, conserte isso agora–
ER: O que foi, querida?
SG: [chorando] Não é culpa dele. Só estou um desastre agora. Valeu, Wyatt, eu adoraria ir. Definitivamente.
JW: OK, mas isso significa que podemos ligar seu telefone de novo? Para podermos rir das mensagens terríveis e ligar para você de fato, se precisarmos?
SG: Qual é a sua com meu telefone? Quantas mensagens vocês– deixaram?
[Sally conecta a Secretáriatron de volta e dá play; a fita está distorcida]
SG: ‘Pera aí…
[mensagem corrompida de Jack]
SG: Essa bobina inteira ‘tá corrompida?
JW: Queda de energia?
ER: É totalmente plausível, dado o consumo de energia do APU. Mas nunca ouvi sobre uma queda de energia causando um decaimento livre de indução assim.
SG: Mas ouve só, parece... um padrão. Um pulso. Decaimento de indução… Preciso ir pro laboratório!
ER: Mas acabamos de vir de lá!
JW: Aah, você está arruinando o Natal! Isso está igual àquela vez que meu pai caiu do telhado vestido de Papai Noel.
SG: É um pulso de táquions! Vindo da Timepiece. Como o rastreador de sinal que desenvolvemos em março! Ou o apagão em Polvo? É o pulso! É claro que é o pulso! Preciso ir pro laboratório!
JW: Vamos mesmo voltar para o trabalho agora?
SG: Pense nisso como um presente de Natal pro Partridge.
[telefone toca]
JW: Viu? Alguém quer falar com você. Um milagre de Natal.
ER: Pode ser um milagre de Hanukkah.
JW: O Hanukkah é inventado, Esther–
SG: Vão esquentar o carro, já, já eu vou.
JW: OK.
[Jack e Esther saem; Sally atende o telefone]
SG: Alô?
[rádio sintonizando; vozes ao fundo no telefone]
SG: Alô?
HELEN PARTRIDGE (HP): Alô, Sally.
SG: Helen? Hm, olá, feliz Natal—
HP: Espero que esteja satisfeita. Sabe, com seu progresso. Sua colmeiazinha feliz.
SG: Não ‘tou entendendo. Helen, ‘tá tudo bem?
HP: Acho que você tem uma boa ideia de como “tudo” está. Não é surda ou cega como alguns de nós!
SG: Helen, se isso é sobre Anthony, eu—
HP: Cala a boca! Só. Cala. A. Boca. Uma vez na sua vida, não vai escapar de uma situação falando sobre ela até confundir todo mundo!
SG: Helen, por favor, só me diz o que aconteceu—!
HP: NÃO! Não! Anthony e eu– nós tínhamos uma vida! E aí ele aceitou uma oferta de trabalho do governo e as coisas ficaram difíceis. Mas éramos fortes! Ele me amava! Eu me arrastei até o meio do deserto, e nenhuma vez duvidei que ficaríamos juntos para sempre. Ele ia salvar a humanidade, e me fez acreditar que poderia fazê-lo. E quem um belo dia apareceu, senão o grande enigma que é Sally Grissom? A cereja no topo do sundae de segredos que todos levaremos para o túmulo, querendo ou não! Sabe, a última vez que subi no palco, tudo que queria era substituir as letras de uma música por todo segredo que já tive que guardar para você, ou Anthony, ou Bill Donovan. Cantá-los a plenos pulmões para esta cidadezinha ignorante inteira ouvir, com direto a bis!
SG: Me sinto do mesmo jeito.
HP: Não fale comigo como se você fosse igual às pessoas normais, Sally Grissom! Não sei o que acham que é comportamento aceitável onde você vem. O que você era antes de cair no nosso mundo como uma bota em cima de uma formiga.
[buzina de caminhote ao fundo]
SG: Helen, de onde você está ligando?
HP: Estou fora, Sally. Estou indo embora! Encontrei um empresário para o canto. Vão me ajudar a me mudar, a me estabelecer em um novo lugar.
SG: Onde vai ser isso?
HP: Não importa. Tenho algumas coisas para organizar antes de ir, então vou manter isso breve. Mas quero que me prometa uma coisa. Se algum dia me considerou uma amiga, faça isso por mim.
SG: Helen, o que quer que eu faça?
HP: Só… não diga nada. Não conte a ele.
SG: Então por que me contar?
HP: Porque agora você terá que olhar nos olhos dele e mentir. Mentir sobre algo que ele ama. Exatamente como você o obrigou a fazer comigo.
SG: … Isso é pesado, Helen. É… cruel.
HP: Sally Grissom, você é a pior coisa que já aconteceu comigo.
[Helen desliga; rádio sintonizando; tique-taque de um relógio de pêndulo; passos se aproximando do lado de fora pela neve; porta abre e Anthony entra, tira o casaco]
AP: Querida! Feliz Natal! Por que as luzes estão apagadas? Queimou o fusível? Helen?
[Anthony anda pela casa vazia; liga uma lâmpada]
AP: Helen? Sinto muito. Sei que voltei tarde, eu... tenho voltado tarde há tempo demais. Helen! Amor, você está aqui?
[Antony sobe as escadas, e então as desce]
AP: Não, não, não, não, ela não pode ter feito algo tão...
[Anthony joga o telefone no chão; o relógio badala; Anthony joga uma cadeira nele; rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 24 de dezembro de 1946. Parte dois, acho. Acabei de chegar no laboratório pra checar o progresso que Partridge fez com o APU, e ele não ‘tá aqui. A ligação não completou quando liguei pra casa dele, então... acho que só vou deixar um recado? Posso estar exagerando. Quero estar. Mas, falando sério, só quero parar de pensar sobre eles. Sobre todo o Show da Família Partridge. Vou deixar um recado com minha teoria sobre pulsos radioativos na mesa dele, e passar a Véspera de Natal com meus amigos. Acho que, dessa vez, eu mereço.
[rádio sintonizando; Bill à beira da morte]
BILL DONOVAN (BD): … E- e nós fizemos- nós faremos- nós fizemos- Whickman vai- é você? É você?
HANK CORNISH (HC): Jesus, Maria, José. Quando ele ficou tão mal?
CHET WHICKMAN (CW): Vocês certamente não tiveram pressa para fazer isso.
HC: Não estou gostando do seu tom, filho. Eu disse a Bill que demoraria cerca de um ano, um ano atrás, quase no mesmo dia. Já pensou que talvez só esteja perto demais de tudo isso?
CW: Não posso dizer que a pergunta já me manteve acordado à noite, senhor. Coisas demais para fazer além disso. Posso ser sincero, senhor?
HC: Vá em frente.
CW: Eu duvidaria da objetividade de qualquer um com esta função, mas tem sido a minha por anos, agora. Quer desmanchar esta missão? É direito seu. Mas não acho que vá acontecer.
HC: O que lhe dá tanta certeza?
CW: Você é um homem prático, que trabalha para homens práticos. Conheço essa operação da cabeça aos pés e, mais importante...
[Chet coloca uma caixa da mesa]
CW: –Sei onde todos os corpos estão enterrados.
HC: O que é isso?
[Hank mexe na caixa]
CW: Posso fazer uma de duas coisas, Agente Cornish: Posso destruir essa caixa inteira com uma bola de demolição, ou posso guardá-la. Uma dessas coisas lhe dará o mundo em que gostaria de viver. O mundo que ele sonhou.
HC: Olha só você estendendo as duas, que bonito! Só isso, ou tem mais?
[tosse de Bill piora; distorção estática; Bill desmaia]
HC: Bill!
CW: Filho da puta.
HC: Agente Wells! Wells, chame um médico aqui, agora!
CW: Não! Agente Cornish, isso não vai ajudar.
HC: Como assim “não vai ajudar”?
CW: Sabemos o que precisamos fazer agora. Sempre soubemos.
[rádio sintonizando; uma maca leva Bill embora; Anthony entra]
AP: Oficial Whickman! Aquele era o diretor? O que diabos aconteceu?
CW: O que está fazendo aqui, Doutor?
AP: Bom, eu estava… Acabei de sair do laboratório. Sally deixou um recado sobre a CELA, sobre como as informações decaem junto com o padrão do pulso de táquions quando a Timepiece ou qualquer tecnologia ligada a ela é usada. E isso me deixou pensando— decaimento de informações é exatamente o que aconteceu com Bill! As informações no cérebro dele estão decaindo! Acho, bom, se o puséssemos na CELA, creio ser altamente provável que seja possível deter, se não reverter completamente, os sintomas dele. Essa é a melhor ideia que tivemos até agora!
CW: Vou mandar isso para análise e... programar uma demonstração assim que puder. Com licença, Anthony, tenho que ir.
[Chet sai; Anthony xereta a caixa]
AP: O que é isso? “Donovan: 28 de outubro, 1943”. “Donovan/ Grissom, janeiro de 44.” “Donovan/ Partridge–”… Que diabos?
[gravador de fita desliga]
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08: Cela
[gravador de fita liga; Jack e Esther jogando cartas na copa]
[Jack e Esther estão sentados a uma mesa jogando cartas, Anthony os assiste. Não se ouve nada além de os dois jogando por alguns segundos. Jack dá um tapa na mesa.]
ESTHER ROBERTS (ER): Hmm...
[cartas]
ER: Isso!
JACK WYATT (JW): Merda.
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Isso foi bom, ou…?
[cartas]
JW: Tem certeza de que quer fazer isso?
ER: Certeza absoluta.
JW: OK…
[cartas]
ER: Hm. Interessante.
[Sally entra correndo na copa]
SALLY GRISSOM (SG): Ai meu Deus, ai meu Deus, ai meu Deus…
AP: Sally?/JW: O que houve?/ER: Meu Deus, Sally, o que foi?
SG: Tinha uma bolha temporal, que eu... hm...
[Sally desmaia]
ER: Dra. Grissom!
[gravador de fita pausa; música-tema; gravador de fita liga]
JW: Sally, o que houve?
SG: Tinha… ‘Tava tão escuro… Eu ‘tava gritando. Vocês não me ouviram?
AP: Do que você está falando? Não ouvimos nada.
ER: Vou pegar um copo d’água para ela.
[Esther levanta, pega água da pia]
SG: Alguma coisa deu errado… Alguma coisa deu errado com a Timepiece… espera, em que ano estamos?
JW: Oh não.
AP: Sally, é 1946. Dois de agosto de 1946.
SG: Isso é bom. Ainda é hoje.
ER: Aqui, bebe isso. Tome.
[Sally bebe]
ER: Cheque o relógio dela.
JW: Ela está na nossa frente cerca de, não sei, uma hora e meia?
ER: Acabamos de ver você, um minuto atrás.
[rádio sintonizando; um circuito solto faísca]
SG: Podem ir na frente. Só vou acabar de instalar um novo focador e alcanço vocês depois.
JW: Não demore demais. Estou com o pressentimento de que nossa próxima partida de Dilema será digna de ser assistida.
[Jack e Esther saem]
SG: [sussurrando] Com certeza, se alguém conseguisse entender.
[Sally mexe na Timepiece; o circuito completa; CELA acelera]
SG: Uou, não, não, não, que mer–
[CELA apaga por um segundo]
SG: [gritando, torturada] Socorro! Socorro!... Ai meu Deus…
[rádio sintonizando]
SG: Não sei o que aconteceu. Ela ativou do nada e, de repente, a sala ficou escura, tão escura...
ER: Você sabe o que isso significa?
SG: Nunca vi nada tão escuro…
AP: Ela ficou presa em tempo nulo por uma hora e meia e ficou completamente bem.
SG: Bem?!
ER: Talvez não nos trinques. Mas a máquina parou os fótons externos, exatamente como prevíamos!
JW: E ela não ficou pedacinhos com os micropulos!
SG: Fala sério! Pessoal, eu… eu aprecio suas tentativas de teorizar, mas, hm... vou tirar o resto do dia de folga.
ER: Totalmente compreensível. Melhoras, Sally.
JW: Tem certeza de que não quer deixar um médico dar uma olhada em você? Ainda não estamos completamente certos do que o campo nulo sequer faz com uma pessoa–
SG: Vou pra casa.
JW: OK, mas…
AP: Jack, só a deixe ir. Além disso, se algo de ruim acontecer com ela, ficará com ela. Viagem no tempo não é contagiosa.
JW: Mas faz mal?
AP: Eu… nunca disse isso…
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, três de agosto de 1946. Ontem teve quase 26 horas pra mim. O quão estranho é isso? A equipe está trabalhando em usar a Timepiece pra gerar um campo de tempo nulo. Não estávamos nem perto de prontos pra entrar nele, mas houve um incidente... Acho que devo ter ligado algo, ou cruzado algum fio, e a coisa ligou. Fiquei presa da bolha temporal por, tipo, uma hora e meia. Foi terrível. Você não sabe o que é escuridão de verdade até que fica presa num lugar em que a luz não pode nem sequer entrar.
Só escapei depois que o gerador descarregou; tentei cortar a energia, mas alguma sobre ficar presa em um único momento torna o aproveitamento de energia da Timepiece incrivelmente eficiente. Converte 99% de eletricidade em 100% de terror psicológico. Haha.
Donovan vai ficar feliz de saber disso… exceto que ele não tem inspecionado nossos relatórios mais? Pra um cara que lutou com unhas e dentes pra nos manter trabalhando, Donovan com certeza ‘tá adotando uma abordagem de não interferência. Mas aprendi a não perguntar o que ele ‘tá fazendo.
Apesar de tudo que tive que aguentar, o campo de tempo nulo funcionou melhor do que poderíamos esperar. Claro, agora temos que aprender, testar e melhorar. Precisamos descobrir mais sobre como o campo de tempo nulo funciona—
[rádio sintonizando]
SG: —de Sally Grissom, 8 de setembro de 1946. Então, depois do meu consideravelmente bem-sucedido acidente com o gerador de campo nulo da Timepiece mês passado, temos tentado desenvolver ainda mais a tecnologia, e acho que ‘tamos prontos. Ah, lembra semana passada, quando eu disse que ‘tava pensando em um nome pra ele? Acho que me decidi em “CELA”. Campo Extrínseco Limítrofe Assíncrono. Sacou? Eu trabalhei nisso por… tipo, horas, provavelmente. Você pode achar frívolo, mas acredito firmemente na eficiência de siglas descritivas.
Desde que comecei a trabalhar pro Donovan, temos problemas em demonstrar um uso prático pra tecnologia da Timepiece. Tentamos uma dúzia de jeitos de mostrar as utilidades da viagem temporal, mas, sem uma perspectiva que siga uma linha do tempo diferente, o observador nunca poderia perceber a mudança. Acho que a CELA é o que tenho procurado. Depois de três anos trabalhando na Timepiece e um ano e tanto trabalhando na Matriz Inibidora de Higgs original, no século XXI, finalmente me deparei com algo realmente demonstrável! Admito que é um pouco tarde demais pra salvar o resto da ODAR, mas, pra ser completamente sincera, não sei se conseguiria ajudá-los mesmo se não fosse. Tem um motivo por que ninguém no meu tempo se lembra de Polvo, Novo México. O Projeto Manhattan derrotou eles. Uma grande bala dentro de grande arma pra dar fim a uma grande guerra. Uma bolha temporal, por outro lado? Isso tem fineza, tem estilo… e mil diferentes usos. Não tenho certeza do que vamos fazer primeiro, mas a equipe encheu dois quadros negros com ideias.
[rádio sintonizando; Sally escrevendo ideias em um quadro negro]
SG: Vamos lá, pessoal, não tem resposta errada. Sei que fabricação é a ideia mais óbvia aqui, mas tem mais.
JW: OK, você poderia… plantar um pomar em um instante?
SG: Precisaria de um armazém bem grande ou algo do tipo, mas gosto do seu estilo! O que mais?
AP: Um computador poderia lhe dar uma resposta com a rapidez que precisasse.
SG: Gostei. Você tem perspicácia, Partridge.
AP: Esse é literalmente meu departamento. Mas obrigado.
ER: E se pudesse… envelhecer vinho mais rápido?
JW: Sério, Esther? Sua ideia é “deixar barris descasarem por bastante tempo”?
ER: Oh, bom, desculpa se—
SG: Ei, Wyatt! Não tem resposta errada quando se está brainstorming.
ER: … O que é brainstorming?
SG: Sabe, funciona pra uísque também. Um uso perfeitamente razoável pra CELA.
AP: Sally, não acho que todos nós concordamos com esse nome.
SG: É minha máquina, eu escolho o nome.
JW: [ao lado] Eu disse.
ER: Cale a boca.
SG: Ooh! Tive uma ideia! Tire cochilos por quanto tempo quiser! Por dias! Quem não gosta de cochilos?
JW: Ei, que tal cinemas instantâneos?
SG: Adorei!
AP: Grandes salas de leitura privadas. Demore o quanto quiser para ler qualquer livro.
SG: Tempo suficiente, enfim! O que mais?
ER: Que tal o forno mais rápido do mundo?
JW: Essa é só minha ideia das frutas de novo!
ER: Cozinhas não são fazendas, Jack.
SG: Gostei dessa. Sabiam que dá pra usar sinais de radar pra cozinhar?
[rádio sintonizando]
SG: —mas a maioria das ideias vão precisar de gente dentro da CELA. E, apesar de eu ter passado tempo lá, não foi a) de propósito b) por muito tempo, relativamente falando (e objetivamente também não) e c) coletar dados era a última coisa na minha mente. Então, amanhã, ninguém menos que nossa Esther Roberts vai passar voluntariamente 24 horas lá dentro. Nós tiramos nos palitinhos, bom, eles tiraram. Eu me isentei, e Partridge ia ser o sortudo a entrar, mas Roberts confessou que na verdade ‘tava interessada em ir. Ela disse que queria ser uma “pioneira na ciência emergente” — o que, sabe, bom pra ela— e Partridge ficou mais que feliz de ceder o lugar. Ele diz que a ideia da CELA já é assombradora o bastante, nem se fala em entrar lá dentro. Então, amanhã vai ser a grande chance da Roberts, e estamos todos empolgados pra ver o que vai acontecer. Ela vai ficar bem! Heh... Ela vai ficar bem… É.
[rádio sintonizando; computador processando cálculos]
SG: –cador está sintonizado pra detectar as frequências que estamos procurando.
JW: Então, está pronta, Esther?
ER: Você já me vez essa pergunta doze vezes. Talvez minha resposta mude na décima terceira.
JW: Então, está pro– ai!
[Esther dá um tapa em Jack]
AP: Sem briguinhas, pessoal. Isso é sério.
ER: Dra. Grissom, como é lá dentro de verdade?
SG: Bom, fora a escuridão infinita, é bem chato. Espero que tenha trazido livros.
ER: Tenho uma lanterna e algumas coisas na minha mochila para não me entediar.
AP: E têm comida, água e baterias extras nesta caixa. Então, desde que tudo corra como planejado, você não vai morrer de fome.
ER: Desde que tudo corra como planejado…
AP: Planos são o melhor que temos.
ER: … Não se pode fazer omelete sem quebrar alguns ovos, certo?
SG: Só espero que nenhum dos ovos em questão sejam seu cérebro. Eu odiaria perder a única outra mulher nessa maldita equipe.
JW: OK. Tudo pronto, com a última série de cálculos, calibrei os controles da Timepiece para gerar o efeito de tempo nulo em um raio de três metros pelas próximas 24 horas.
[Chet entra]
SG: Whickman, chegou bem na hora.
AP: OK, Esther, vou ligar as bobinas de condensação. Estaremos bem aqui, o tempo todo. Literalmente.
ER: Vocês são sortudos. Só vão ter que lidar com isso por, no máximo, trinta segundos.
[CELA acelera]
CHET WHICKMAN (CW): Então, Doutora, o que é que você queria que eu visse?
SG: Programamos a Timepiece pra gerar uma bolha temporal. Roberts vai passar um dia lá enquanto apenas um momento passa aqui. Bem legal, né?
CW: Espera aí, ela vai entrar na máquina?
SG: Não, só vai ficar dentro daquele círculo de fita ali no chão.
CW: Não, ela não pode! Você precisa parar isso!
AP: Não é hora para isso, Chet. A máquina já está ligada. Se cortássemos a energia, não daria para saber o que aconteceria–
CW: Esther! Você precisa sair daí, Esther!
ER: [gritando por cima do barulho] O quê?
[Chet corre em direção a Esther]
CW: Esther! É perigoso!
JW: ES[THER!]
SG: WHI[CKMAN!]
AP: PARE-[O, AGORA!]
CW: ESPERA!
[a CELA se abre em torno deles; as vozes de Sally, Jack e Anthony esvanecem]
ER: Ótimo, você conseguiu, estragou tudo.
CW: Estraguei tudo! Você vai se matar.
ER: Uou, está escuro para caramba aqui. Espera aí.
[Esther mexe na mochila dela; liga lanterna]
ER: Bem melhor. Não precisava daquilo. Estávamos processando cálculos há dias, sabíamos o que estávamos fazendo.
CW: Senhorita Roberts, normalmente não sou do tipo de homem que fala palavrões em frente de uma dama, mas você não tem a menor ideia da merda que está falando.
ER: Oh! Que palavras rudes! O que será dos meus delicados ouvidos agora que foram atingidos pelas suas terríveis profanidades!
CW: Por quanto tempo vamos ficar presos aqui?
ER: Quando estávamos pensando que seria só eu, a viagem estava planejada para durar 24 horas, relativamente–
CW: 24 horas?!
ER: –mas agora que você se meteu e estamos presos aqui, não sei.
CW: Eu estava tentando puxar você para fora. Este lugar é perigoso!
ER: Tínhamos o calibrado para apenas uma pessoa e suprimentos. Você acabou de torná-lo mais perigoso. Bom trabalho. Independentemente de qualquer coisa, estamos presos aqui pelo próximo dia. Espero que goste de ler, tenho um pacote cheio de Astonishing Tales, Detective Comics, um baralho... e algumas palavras cruzadas, mas elas são só para mim.
CW: Não devíamos ter um protocolo vigente em que, se seu oficial de segurança começa a gritar “Pare! Pare!”, você para? Isso foi uma péssima ideia.
ER: Vamos ficar bem. Temos rações para quatro dias para nossa estada de 24 horas. Bom, rações para dois dias, com você, não vou lhe deixar morrendo de fome. Mas temos livros e luz e... tudo que preciso para esta expedição. Só tem um saco de dormir, mas acho que tenho um cobertor ali dentro que pode usar.
[Esther procura entre os suprimentos]
ER: Não, não tem. Espero que não fique com frio demais no chão.
CW: É a Timepiece. Ela não é segura.
ER: É tão segura quanto podemos fazê-la. Para que acha que está nos pagando? A menos... que saiba algo que não sabemos.
CW: Tudo que posso dizer para você é que é... venenosa, de algum jeito?
ER: Venenosa como em “ferrão de abelha” ou como em “grande dose de cianeto”?
CW: Nenhum dos dois. Usar a Timepiece… envenena a mente, mas não o físico. É como se saber na sua cabeça que a cadeia de causa e consequência é uma bagunça começasse a comer você por dentro.
ER: Como sabe de tudo isso?
CW: Não posso dizer.
ER: Porque, espera, não me diga, é confidencial.
CW: –Confidencial, é.
ER: Vai persistir com isso até aqui? Olhe em volta, para quem eu vou contar? Ei, pessoal! Viagem no tempo faz mal!
CW: Não estou preocupado com você contando para alguém enquanto estamos aqui. É quando sairmos... se sairmos...
ER: E para quem eu contaria isso lá fora?
CW: Sua equipe, claro. Sally, Jack.
ER: O que, não posso guardar um segredo? Além disso, por que eles não podem saber?... Na verdade, espera aí, por que não sabiam?
CW: Eu posso explicar–
ER: Só vai afirmar do nada que é perigoso para mim e pronto? Estamos trabalhando nessa coisa há três anos! Há quanto tempo vocês sabem disso? Se não ficasse sabendo do nosso experimento hoje, nunca teria dito nada, teria?
CW: Não é isso!
ER: Então o que é?
CW: Saber torna os efeitos piores.
ER: [ri] Como assim?
CW: Pelo que podemos dizer, descobrir o que a Timepiece faz só piora sua condição. Eu nem devia estar lhe contando sobre isso.
ER: Em que está se baseando? Por que sabe disso? Dê-me um pingo de evidência do que está dizendo.
[Chet fica em silêncio]
ER: OK, tudo bem. Se quer agir como uma criança, fique à vontade. Tenho o dia todo. Tenho livros e palavras cruzadas. Ficarei bem.
[fita acelera; Esther lendo]
ER: Quer me contar o que sabe?
CW: Não.
ER: OK.
[fita acelera; Esther resolvendo palavras cruzadas]
ER: E agora?
CW: Estou confortável aqui.
[fita acelera; Esther embaralhando um baralho]
ER: Pronto para falar?
CW: Sim.
ER: Sério?
CW: Não.
[fita acelera]
ER: Ei, Oficial Whickman?
CW: Ainda não vou falar–
ER: Não, não é… Posso lhe perguntar uma coisa?
CW: [suspiro] Claro.
ER: Acha que vamos sair daqui?
CW: … Por que está me perguntando? Você é a cientista. Não é para sairmos?
ER: É, mas… e se não sairmos? E se você invadir aqui estragou alguma coisa e agora estamos presos? E se Sally ter saído foi sorte? E se morrermos aqui e, depois de um segundo, tudo que nossos amigos encontrarem sejam duas pilhas de poeira em forma de gente?
CW: É possível, mas não acho que vá acontecer.
ER: Por quê? Você não faz a menor ideia de como esta coisa funciona. Nossa equipe poderia escrever livros e livros sobre a Timepiece e nunca passar do superficial. O que lhe dá tanta certeza?
CW: Tenho fé em você. E em Sally, Anthony e Jack. São as pessoas mais inteligentes que conheço.
ER: Mas falhamos com tanta frequência no passado. E se acabarmos como Quentin Barlowe?
CW: Vocês falharam antes por causa de mau planejamento e esposas vingativas, nunca por não serem inteligentes. Nesse aspecto, posso confiar em vocês.
ER: … Obrigada.
[fita acelera]
CW: É Bill Donovan.
ER: Finalmente vai falar?
CW: Quer ouvir sobre isso ou não?
ER: Desculpa, continue.
CW: Bill está doente. Ele tem… Ele desenvolveu esta enfermidade. Chame-a do que quiser. Doença da Timepiece? Tanto faz. Ele… Não sabemos quanto tempo ele tem.
ER: OK, como ele contraiu essa doença?
CW: Ele tem usado a Timepiece. Para voltar no tempo. Algumas vezes... Um monte de vezes.
ER: Ninguém nunca usou a Timepiece. Ela só funciona para mandar coisas de volta no tempo, ninguém nunca a usou por si mesmo–
CW: Você pode ter… perdido algumas coisas. Enquanto estávamos no Novo México, o Diretor Donovan, ele... ele mandou construir uma para uso próprio.
ER: … Está falando sério? Ele sabe o mal que poderia ter causado? Para nós? Para o espaço-tempo? Para–
CW: Tenho certeza de que ele está completamente ciente do mal que causou agora.
ER: Porque agora ele tem, o que, o shell shock da viagem no tempo?
CW: Essa é teoria em que nós estamos trabalhando.
ER: OK, quem são “nós”?
CW: Estou com alguns contatos de Donovan na comunidade de inteligência trabalhando nisso, apesar de não saberem que ele é o paciente. E o Dr. Partridge está revistando tudo que foi documentado sobre a Timepiece para descobrir o que exatamente está causando isso.
ER: Por que não contar para Sally? Por que não Jack, ou eu?
CW: Vocês poderiam contar para a Doutora.
ER: E não podemos contar para Sally porque, o que, ela foi mais exposta à Timepiece que nós? Jack e eu passamos o mesmo tanto de horas em volta daquela coisa nos últimos três anos.
CW: Sally é um… caso especial.
ER: Que diabos isso sequer significa?
CW: Ela contou alguma coisa para vocês sobre o que fez antes de começar a trabalhar conosco?
ER: Como assim… Não sei, algo sobre um laboratório em Connecticut, onde ela desenvolveu a Timepiece por acidente, e então foi contatada por Donovan e se mudou para Polvo?
CW: Isso é oitenta por cento da história.
ER: E o resto?
CW: Ela estava trabalhando em um laboratório █ anos no futuro. Algo deu errado, e agora está aqui. Ela foi a razão de as coisas acabarem não dando certo na Filadélfia.
ER: Huh… Sinto que devia estar mais chocada.
CW: [ri] Com certeza explica um pouco da estranheza dela, não é?
ER: … Agora tenho este monte de perguntas para ela, mas não sei se posso perguntar, se posso saber... Sinto que preciso conhecê-la do zero agora.
CW: Bom, então está com sorte. Como você sabe, não é difícil fazer Sally dizer o que pensa.
ER: Mas o que ainda não entendo é... o que o Diretor fez com a Timepiece?
CW: O que você faria?
ER: Nada. Eu não a usaria.
CW: Mas não é uma santa? Finja que tem intenções menos nobres.
ER: Hm… consertar meus erros do passado e me assegurar de que eu alcance sucesso no futuro? ... Sally disse que algo assim aconteceria quando viemos para cá!
CW: Naquele ponto ela já estava atrasada pelo menos seis meses. Talvez mais.
ER: Por que está me contando tudo isso? O que aconteceu com sua rede de segredos?
CW: Bom, é como você disse: não é como se desse para contar a ninguém nas sei lá quantas horas que ainda ficaremos aqui.
ER: E quando sairmos?
CW: Quando sairmos… você não vai dizer nada.
ER: Ou o quê?
[Chet fica em silêncio]
ER: Oh… Quer dizer, sei que você poderia me matar, mas... sempre que considerei a possibilidade, nunca pensei que o faria... a nenhum de nós, digo.
CW: Eu o faria. Se precisasse.
ER: Entendo.
CW: Mas, sinceramente, Esther? O que preciso agora é de alguém para me apoiar.
ER: Você me ameaça e logo em seguida me pede para ser sua amiga… Sabe mesmo como conquistar uma garota, hein.
CW: Escuta, com Donovan fora de ação por pelo menos o futuro próximo, estou no comando da nossa pequena operação. Já tem algum tempo que estou. E preciso de alguém com quem eu possa contar que não esteja gerando ainda mais caos. Alguém como você. Esther. Esta é uma oportunidade. Para fazer o bem. Para Bill Donovan, para… para todo mundo.
ER: Para fazer o quê? Manter segredos dos meus amigos e ajudar a curar o estranho caso de arrogância aguda do meu chefe?
CW: Bill não é o único que apresentou sintomas.
ER: ...Sally?
CW: Nem toda aquela estranheza vem do futuro.
ER: Chet, você podia só dizer sim. Precisa mesmo aprender a ser mais direito.
CW: [ri] Desculpa… Força do hábito. Vem com a carreira, suponho. Então, Senhorita Roberts, o que vai ser? Posso contar com você?
ER: Não devo não não-discordar, suponho.
CW: Muito engraçado! Está pegando o jeito rapidinho. Nunca use uma só palavra definitiva quando quatro ambíguas servem.
[Esther ri]
CW: Estou falando sério. Você consegue. Acho que de todos nós aqui, só você conseguiria fazer isso. Ajude-me a usar o que temos para ajudar as pessoas. Não é isso que quer? Ser uma pioneira? Não foi por isso que se voluntariou para viver um dia inteiro em um piscar de olhos? Para ousar? Para fazer algo que nunca foi feito?
[gravador de fita acelera; Esther e Chet jogando cartas; CELA começa a colapsar]
ER: OK, depois de fazer isso, você constrói o rio com uma sequência de cartas–
[CELA dissipa]
JW/AP/SG: [juntos] Vocês estão bem?/ Graças a Deus/ O que aconteceu?
ER: Acabou. Estamos de volta.
SG: Os dois entraram no campo nulo e estão são e salvos! Isso é um bom sinal.
ER: Ooou voltamos para assombrar voooocês como faaantasmas tempooorais—
JW: Bom, tão sãos quanto antes de entrar!
AP: Chet, o que diabos foi aquilo?
CW: Eu, hm, hm–
ER: –Houve um mal-entendido sobre os parâmetros do experimento. Esclareci a confusão enquanto estávamos lá. Enquanto... espera, lá?
SG: Lá dentro?
JW: No quando?
ER: É, enquanto estávamos lá.
AP: E o que o cronômetro diz?
ER: Parou em vinte e quatro horas, trinta e oito minutos e zero ponto quatrocentos e nove segundos.
SG: Então a massa extra não alterou o efeito significantemente! Ótimo!
JW: Então agora somos todos só sorrisos? Ninguém liga para o que acabou de acontecer? Esther, o que houve lá dentro?
ER: Nada demais. Conversamos, falamos de livros, do tempo–
CW: Da falta de tempo–
ER: E o ensinei a jogar Dilema–
CW: Começou a ensinar–
ER: Tudo bem mundano.
[fita rebobina]
CW: — que se voluntariou para viver um dia inteiro em um piscar de olhos? Para ousar? Para fazer algo que nunca foi feito?... Quer saber um segredo?
ER: Você deve estar quase estourando deles.
CW: Eu o matei. Eu matei Quentin.
ER: Pensei que a esposa dele tinha o matado!
CW: Em grande parte, sim. Ela atirou a bala que o mata na nossa próxima linha do tempo e, de lá, a coisa toda se torna este... ciclo de tragédia. Mas a primeira bala que o atingiu veio de outro lugar... de outro tempo. Quando o Diretor ainda estava usando a Timepiece, ele achou uma gravação. E me deu. Ela vinha de outra linha do tempo. De que não nos lembramos.
ER: Porque é assim que linhas do tempo funcionam.
CW: Sim. Mas acabou que fui eu a matar Quentin da primeira vez. A outra versão de mim atirou a bala que acertou a nossa vers��o dele.
ER: E em que você estava mirando?
CW: Essa é a parte estranha… Eu estava tentando atirar no Quentin. Veja bem, quando ele morreu, eu estava fazendo uma inspeção interna da nossa equipe. Depois do que aconteceu, só pulei o nome dele. Mas, em uma linha do tempo em que ele não tinha morrido, acho que descobri que era algum tipo de agente duplo? O arquivo inteiro dele era falso.
ER: Está de brincadeira…
CW: A parte mais estranha foi quando perguntei a Donovan sobre o assunto. No final, Quentin nunca foi Quentin. E não trabalhava para a Axis, nem para os russos, nem nada do tipo; ele trabalhava para nós. Estava nos espionando para uma versão futura do Diretor. O então-atual... uou, isso é complicado, espera aí... o então-atual Diretor não fazia ideia, até começar a usar a Timepiece para manipular as coisas, mas a outra versão de mim não sabia disso. Ele só tinha ordens para eliminar quaisquer espiões que aparecessem. Então, uma das balas que ele-eu atirou atingiu a Timepiece enquanto ligava, voltou no tempo, e acertou o Quentin que conhecíamos.
ER: Isso… ele é louco. Por que Donovan mandaria alguém para espionar ele mesmo?
CW: Ele gosta de ter controle sobre os inimigos. E o Diretor é seu próprio pior inimigo.
ER: Então, todo o luto de June foi culpa dele?
CW: Pode-se dizer que sim.
ER: Por quê?
CW: É só a paranoia—
ER: Por que me contar isso. Tudo isso é… é demais.
CW: Porque estou no comando agora. E, com sua ajuda... vou me assegurar de que nada do tipo nunca mais volte a acontecer. Você me disse que não usaria a Timepiece. Vou lhe dizer uma coisa: ela será usada. Eu a usarei. E é por isso que preciso de uma santa como você. Para me ajudar a usá-la do jeito certo.
ER: … OK.
CW: OK?
ER: OK.
[gravador de fita desliga]
#ars paradoxica pt-br#ars paradoxica#tradução pt-br#esse é um dos meus caps favoritos#mas NUSS#deu trabalho viu
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07: Distração
[gravador de fita liga]
Pessoa ao Telefone 1: Pode me dar um nome, pelo menos? Ou como o paciente ficou tão mal tão rápido.
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Não, não posso lhe dizer quem é. Nem por quê.
PT1: Mas o período em que se deu a degradação tem que estar exagerado–
AP: Nossas melhores estimativas indicam que a maior parte do dano foi infringido em dez a catorze meses... Eu sei.
PT1: Está difícil para mim assim. Simmons mandou você aqui?
[rádio sintonizando]
SALLY GRISSOM (SG): Diário de Sally Grissom, 18 de agosto de 1946. Sabe, tenho que admitir, acho que morar em Ponto de Exílio tem sido realmente bom pra minha saúde mental, a longo prazo. Não estou cercada por política militar, posso andar por mais de um quilômetro sem chegar a deserto sem fim, e posso ter um hobby que não é imediatamente roubado pelo Departamento de Guerra. Nos últimos meses, meio que virei a latoeira residente de Ponto de Exílio. Consertando utensílios, coisas do tipo. As notícias sobre minha “Secretáriatron” se espalharam rápido— não se fica sem saber das coisas por muito tempo em uma cidade pequena como essa. Comecei a receber ligações de gente que nem conheço, só porque queriam ouvir a mensagem. Muitos ficaram decepcionados quando eu atendi, e pelo menos uma não acreditou que era eu mesmo do outro lado da linha.
[rádio sintonizando]
SG: Alô?
Mulher ao telefone: Oooh, então, como isso funciona?
SG: Eeh… como uma ligação telefônica? Você fala comigo, e eu respondo? Nós, hm... conversamos?
Mulher ao telefone: Uoooou. Isso é incrível! Absolutamente incrível. Você deve ter várias respostas, certo?
SG: Respostas pra quê? Ah, não, não, você ‘tá falando comigo. Com uma pessoa.
Mulher ao telefone: É, está bom. É, isso tudo soa bem, superconvincente. Mas consigo distinguir. É sua voz, está fina demais. Parece uma vitrola.
SG: Oh, uou. Ops, você me pegou. Isso mesmo, sou só uma gravação.
Mulher ao telefone: Ha, eu sabia. Que farsa barata.
[rádio sintonizando]
SG: Não sei o que ela achou, que eu era algum tipo de fantasma-robô telefônico perfeito dentro da máquina? Eu precisaria de tipo, sei lá, integrar síntese e reconhecimento de voz, processamento natural de linguagem, e só ter dúzias de teraflops aqui. Fala sério. Posso ser um gênio do futuro, mas não sou mágica. Dito isso, percebi que os cálculos que a Timepiece precisa definitivamente vão precisar de um computador. Bom, talvez não toda a compatibilidade de von Neumann, mas vai precisar de uma unidade lógica de algum tipo, e não pode ser do tamanho de uma pick-up, então estive tentando... “pré-inventar” o transistor. Pedi um pouco de germânio e de ouro, mas esse tipo de coisa é bem mais difícil de encontrar quando não se tem toda a funcionalidade dos Bell Labs atrás de você. Metade do serviço é arranjar materiais puros o bastante pra dar pra trabalhar. Não é como se tivesse uma refinaria de metais raros na cidade. Quer dizer, tenho sim uma pequena forja, mas não é como se eu pudesse só pegar... Hmm. Tive uma ideia. Vou voltar a isso depois.
Bom, continuando, estive tentando manter esse tipo de coisa fora do trabalho de Wyatt e Roberts, porque acredito que ainda há espaço pra surpresas no mundo, mas acho que posso precisar falar com Partridge sobre o assunto. A formação dele vai ajudar com as portas lógicas, e ele tem sido um bom ouvinte, se nada mais. E, quando construir os transistores, é capaz de eu tentar construir um rádio portátil, apesar de que isso pode ser à frente demais pro século XX, então não vou forçar muito minha sorte.
Depois de desbancarmos a teoria de movimento positivo no tempo de Roberts há uns meses, dei outro serviço pra equipe: usar a Timepiece pra gerar uma região de movimento em tempo nulo. Basicamente, intensificamos os emissores até a parede de glúons começar a condensar levemente, e daí puxamos... é uma– é uma bolha temporal. O tempo passa na bolha, o tempo fica parado fora dela... Uma bolha temporal. Não preciso ficar usando esse jargão impressionante o tempo todo. O que é isso, minha tese de graduação? Então, [aceleração começa] essencialmente, estávamos tentando oscilar a direção temporal de um volume espacial no campo âncora em uma frequência que neutralize a aceleração negativa no tempo, pra atingir um produto interno de Minkowski com uma assinatura nula— ‘tou fazendo a mesma coisa de novo. Basicamente, [derrotada, roubada de seu crescendo de tagarelice tecnológica] você usa a Timepiece pra voltar, digamos, um segundo, e deixa um segundo em tempo real passar, daí volta um segundo, e espera um segundo. Et cetera. Do lado de fora, o tempo permanece congelado por um segundo. Bolha temporal. É claro, rodar uma vez por segundo é lento e pesado demais pra ser prático, então é necessário aumentar bastante a frequência desses micropulos, e isso é uma coisa perigosa com a Timepiece. E é por isso que preciso de computação melhor: pra impedir a física meter uma em si mesma. De novo.
E, enquanto Roberts e Wyatt trabalham nisso— bom... enquanto Roberts trabalha nisso, Partridge está mergulhando fundo em como utilizar a onda de táquions criada pelas viagens da Timepiece. Fótons se movendo mais rápido que a luz são desprendidos da posição do evento, e viajam de volta no tempo dali. Anos atrás, em Polvo, quando conheci Partridge, tivemos um problema com uma emissão similar acabando com a energia da cidade por causa de um teste em nosso futuro próximo. Mas, desde estão, descobrimos como impedir elas de causarem interferência elétrica. Me lembro de perceber algumas horas antes da revisão da Timepiece que, se não medíssemos nenhuma interferência, nossa hipótese estaria correta. Ter os resultados antes mesmo de começar— oh, se todo meu trabalho pudesse ser tão tranquilo.
Fico pensando na Sally Grissom que era três anos atrás. Tipo, se ela fosse confrontada com um paradoxo como esse. Ela se intimidaria, ou taparia os ouvidos pra não escutar nada, ou talvez só fugiria, gritando de terror. Mas... crescerei desde então. Cresci desde então? Agora, só quis ter fugido, na maior parte do tempo... Quer dizer, só quero fugir, na maior parte do tempo.
[distorção estática]
SG: … Nossa, que confusão que eu arrumei, hein? Ugh. Você nunca vai responder, vai? Pelo jeito ‘tou querendo até que minhas gravações respondam.
[rádio sintonizando]
Pessoa ao Telefone 2: Estou na minha casa, Anthony. Acabei de sair de um turno de dezoito horas no trabalho e não tenho tempo para os seus joguinhos de pacientes de mentira.
AP: Entendo que acabou de chegar em casa, Gordon. Se pudesse só me dizer... Gor— [desliga]
[rádio sintonizando]
ESTHER ROBERTS (ER): Certo, estou saindo. Vocês dois cuidam de tudo por aqui?
AP: Sim, sim. Só preciso finalizar uma papelada.
SG: Hm. Roberts, acho que é a primeira vez em um mês que você sai daqui antes de nós.
ER: Queria me arrumar direito pelo menos uma vez, antes do show. Estou empolgada, você não?
SG: Mal posso esperar.
ER: Vejo você em algumas horas.
[Esther sai]
AP: Ela saiu. Então, o que queria me mostrar?
SG: OK, dá uma olhada nessas plantas.
AP: Claro, deixe-me ver...
SG: Estive trabalhando num novo modelo de circuito. Deve diminuir a carga de trabalho da navegação.
AP: O que é isso? Quer dizer, parece um.. não, não pode... mas... você só pode estar brincando. É brincadeira, certo?
SG: Não, verdade pura. Teoricamente comprovado. Eu acho ‘né, se você acredita na validação ontológica de uma teoria de eletricidade que só existe na sua mente–
AP: Você mesma desenvolveu isso, ou é trapaça? Quer saber, nem sei se importa. Estou impressionado de qualquer forma.
SG: Bom, tem um pouco da minha própria ingenuidade de acreditar eu conseguiria construir ele... mas sim, tive ajuda.
AP: Isso faz o que acho que faz?
SG: A-hã.
AP: Tudo que você tem é uma semicondução meia-boca. Isso não tem os mesmos problemas de confiabilidade de fios de contato?
SG: Só espere. No meu presente, vai ter bilhões desses em uma superfície de 5 centímetros. Vão enviar essas coisas em Hallmark Cards. E daí você vai jogar eles fora porque são, na melhor das hipóteses, triviais e, na pior, irritantes.
AP: Você está balançando um lindo futuro bem na frente dos meus olhos, mas nunca poderei vê-lo.
SG: E quem disse que não vai?
AP: Eu fiz as contas, Sally. Estarei com quase cem quando seu presente chegar.
SG: Não vai ter que esperar tanto. Com certeza vai ver pelo menos os cartões. Bom, provavelmente vai ter que esperar algumas décadas até os computares legais de verdade começarem a aparecer, mas–
AP: O que vai fazer com isso?
SG: Bom, só tenho algumas plantas e um pouco de fé de que provavelmente vai funcionar. Mas, no futuro, quero usar uma versão disso pra começar a construir portas lógicas discretas.
AP: Para a Timepiece?
SG: Essa é a ideia, sim. Se conseguimos tirar alguns cálculos do fardo dos interruptores mecânicos, podemos diminuir o tamanho e conseguir um vetor de navegação bem mais rápido.
AP: Bom, o que me vem à cabeça é que podíamos diminuir para apenas os três primeiros compartimentos e então pegar o... [suspira] Por que você tinha que me mostrar isso?
SG: Como assim?
AP: Quando há um problema assim, é tudo em que consigo pensar. Sou um cão de caça. Balance algo brilhante na minha frente e nada no mundo me impedirá de sonhar acordado sobre as possibilidades do seu... como está chamando-o?
SG: É um circuito transcondutivo.
AP: E qual é o nome disso no seu tempo?
SG: … Se chama transistor.
AP: E eu ia dizer para descontinuar seus experimentos telefônicos...
SG: Você, hm… você sabe sobre aquilo?
AP: É claro que sei. Estava no Lou’s Diner e ouvi alguém falando sobre uma mulher com um dispositivo estranho no telefone dela. Dispositivos estranhos levam direto a você.
SG: Só estava brincando com algumas peças…
AP: Estava brincando ou testando o quanto de 20█ poderia trazer para cá?
SG: Foi você que me disse que não importava se eu alterasse o passado–
AP: Claro, mas isso foi antes de todo o drama com a Timepiece… antes de perdermos Quentin.
SG: Aquilo… não foi minha culpa.
AP: Sei que não foi, havia uma viúva furiosa e algum tipo de lógica de paradoxo autorrealizável, eu entendo. Mas tem que admitir que você– que todos nós estamos brincando com forças fora do nosso controle.
SG: E agora está me dando lições de moral sobre os limites do progresso científico.
AP: Não estou falando só da ciência... Talvez seja mais sensato manter a discrição. Lembra, lá em Polvo, do agente do governo que nos disse que estávamos despedidos?
SG: Mais ou menos. Collins? Cornwall?
AP: Cornish. Hank Cornish.
SG: Que que tem ele?
AP: Eu o vi outro dia.
SG: Você viu ele?
AP: Na loja de 1,99. Estava só andando pelos corredores.
SG: O qu– aqui? Tipo, aqui em Ponto de Exílio? E era ele, o mesmo cara?
AP: Tenho certeza de que era o Cornish. Ele até disse que estava trabalhando com o Grupo Central de Inteligência quando apareceu em dezembro...
SG: O que significa que ele pode só ser parte da mudança do CI dos próximos meses, ou só ‘tá aqui de férias, ou...
AP: Ou…
SG: … Tem alguma coisa estranha acontecendo.
AP: Tem que ser muita coincidência, Sally. O cara que cuidou da nossa papelada de demissão de repente aparece bem no nosso quintal?
SG: O quintal que Donovan diz ser tão remoto que é quase como se fôssemos fantasmas?
AP: Tem algo acontecendo, tenho certeza.
SG: Eu diria que você está sendo paranoico se já não soubesse que temos boas razões pra sermos.
AP: O que estou tentando dizer, Sally, é para tomar cuidado. Há monstros debaixo da cama, independentemente de você poder vê-los ou não.
SG: Vou dormir com um olho aberto.
AP: Isso.
[rádio sintonizando; carrinho do PAT andando]
SG: [sem fôlego] Diário de Grissom. Umas 7:45, 18 de agosto. Estamos investigando algumas das coisas que Partridge disse sobre a aparição de um tal de Agente Hank Cornish, então peguei o PAT emprestado depois do serviço. Pra ser sincera, não temos a melhor segurança do mundo no prédio do trabalho.
AP: Ou qualquer segurança, para falar a verdade.
SG: Bom, temos Whickman.
AP: Ele é mesmo um segurança? Pensei que fosse só o mordomo de Bill.
SG: Segundo ele, já fez de tudo. Não é como se tivéssemos uma hierarquia mais. Pensei que não quisesse sua voz gravada, pra não terem provas contra você.
AP: Ah, diabos, tenho certeza de que eles têm coisa o bastante para me enforcar por traição em algum lugar. Como sequer me convenceu a vir até aqui?
[rádio sintonizando]
SG: Vou dormir com um olho aberto.
AP: Isso.
[Anthony volta ao trabalho]
SG: Partridge?
AP: Sim?
SG: Quer pegar o PAT emprestado e investigar o que viu–
AP: –Com certeza.
[rádio sintonizando]
SG: Se me lembro bem, não foi difícil.
AP: E você?
SG: Bom, meus diários em áudio provavelmente já têm minha condenação inteira montada.
AP: Já lhe contei minha teoria sobre Polvo?
SG: Qual delas?
AP: Microfones nas paredes.
SG: Hã?
AP: Ocasionalmente, enquanto estava trabalhando ou jantando, ouvia uns zumbidos baixinhos. Helen insistiu para eu ir a um médico, examinar meus ouvidos, mas nunca encontraram nada. Eu costumava brincar que Bill colocava microfones nas paredes e gravava tudo o que dizíamos.
SG: Muito engraçado.
AP: E ele amava essas coisas, também. Uma vez disse algo sobre o rádio ser o futuro da espionagem.
SG: Está dizendo que tudo que dissemos no Novo México foi grampeado?
AP: Provavelmente não. É mais provável que seja paranoia produzida pela minha mente exausta. Quer dizer, provavelmente havia um gravador no escritório dele, mas no lugar todo? Fala sério, isso seria exagero.
SG: É.
[corrupção de sinal]
SG: Exagero.
AP: É claro, nossos apetrechos são o futuro da espionagem agora. Sem trocadilhos.
SG: Sim, trocadilhos.
AP: Tudo bem, foi intencional. Então, vamos fazer isso? Eu me sinto estranho neste estacionamento, sozinho.
SG: Estou ligando ele.
[PAT ligando]
AP: Tenho que admitir, temos uns brinquedos bem incríveis. Está menor do que da última vez em que o vi.
SG: Fiz algumas modificações no PAT logo antes de Polvo ser fechada. Aqui dentro tem uma versão em miniatura altamente modificada da Timepiece. É sem fio. E, além disso, agora é inerte.
AP: Que alívio não ter que me preocupar com June Barlowe me assassinando.
SG: Bom, não por causa de confusões temporais, pelo menos. Nós... O que aconteceu com ela?
AP: Chet, hm… hmm. Sabe, não tenho certeza. Ela atirou em um empregado em uma base militar... Assumo que foi para a corte marcial, ou algo do tipo.
SG: Hm. Pesado. Então, quando você viu Cornish?
AP: Depois do trabalho na… quarta.
SG: Deixa eu ver…
[PAT é rapidamente ajustado para trás]
SG: Quarta à noite, você disse? Um horário mais exato ajudaria.
AP: Tente entre seis e meia e sete.
[PAT é ajustado para horas, e então para minutos]
SG: Bom, ali está você. Ele estava usando algum acessório distintivo? Um chapéu, ou algo do tipo?
AP: Olha esta cena, Sally. Vê alguém que não esteja usando chapéu? Diabos, eu estou um usando chapéu ali.
SG: Desculpa a pergunta.
[ajustando o PAT]
AP: Ooh, espera, para! É ele, é ele bem ali.
SG: Aquele cara? Vamos dar uma olhada mais de perto.
[SG começa a aproximar o PAT, não percebendo um pedestre]
Pedestre: Oh, com licença!
SG: Ah, desculpa!
AP: Desculpe-nos, por favor, Departamento do Interior.
SG: Não, fala sério, isso não pode ‘tar certo.
AP: Temos que segui-lo.
SG: O quê?
AP: Temos que segui-lo! Descobrir aonde ele vai, o que está fazendo.
SG: Partidge, ‘tá ficando bem tarde. Já, já o show vai começar.
AP: Eu sei, eu sei. Só faça o que estou pedindo. Nós o seguimos, vemos se há algo de interessante e então irei para lá. Você não perderá o show.
SG: Pensei que você é que estaria preocupado de perdê-lo.
AP: … Essa ideia foi sua. Vai me ajudar ou não?
[rádio sintonizando; PAT em um carro em movimento]
SG: Essa é perseguição de carro mais lenta que já vi.
AP: Bom, se você prestasse mais atenção no carro que estamos perseguindo, eu não ficaria errando as curvas.
SG: Estou olhando através de uma câmera viajante no tempo de 35 quilos. Não foi exatamente feita pra ser portátil.
AP: Todas estas casas parecem iguais à noite.
SG: Olha, ele está desacelerando! ‘Tá estacionando naquela casa ali! Não esqueça o endereço: Avenida ███,175
AP: Ele está fazendo algo além disso?
SG: Não sei, provavelmente tirando o… outra pessoa está estacionando na garagem.
AP: Oh, ótimo, mais espiões.
SG: Oh não.
AP: O quê?
SG: Dirige. Agora.
AP: O que foi?
SG: Só dirige!
[carro acelera; PAT desliga]
SG: Whickman ‘tava lá. Apareceu no esconderijo de Cornish como se ‘tivesse sendo esperado, como se ‘tivesse visitando prum cafezinho de domingo. Devem estar trabalhando juntos.
AP: Está deduzindo muito do que viu.
SG: Sei o que vi, OK? Você ‘tava certo. Há mais ali do que as aparências sugerem. Satisfeito?
AP: Por que diabos eu estaria satisfeito com isso?
SG: Só vamos pro show, ok? Não quero pensar nisso até amanhã.
AP: Eu… Eu não posso ir.
SG: Por que não?
AP: Não posso.
SG: Não vai ir ver sua própria esposa?
AP: Não é isso!
SG: Na verdade, é exatamente isso. Poucas frases são tão claras quanto “Não posso ir”, quando não se vai a algo.
AP: Olha, eu levo você lá. Mas não conte a Helen que o fiz. Não conte aos outros que estava aqui também. Vou levar o PAT de volta para o laboratório, e ninguém vai saber que foi tirado do lugar.
SG: Meu Deus, o que você tem? Não vou mentir pra sua esposa pra você—
AP: Então só vai chegar e falar para ela “Oh, eu e seu marido roubados um equipamento do trabalho para que pudéssemos espiar uns espiões”?
SG: … Não.
AP: Ótimo. Obrigado.
SG: O que vou dizer pra ela quando perguntar?
AP: Diga a ela… não sei. Diga a ela qualquer coisa que pareça crível.
SG: Fora a verdade.
AP: Sei que estou pedindo muito de você.
SG: É bom você não estar se encontrando com outra pessoa.
AP: Prometo que não.
SG: Acredito em você. Mas não tenho certeza de que isso melhora a situação.
[Anthony estaciona; Sally sai; rádio sintonizando]
Pessoa ao Telefone 3: Não creio que não haja possibilidade de isto ser contaminação por radiação. Se eu pudesse examinar o paciente...
AP: NÃO é radiação. Estou lhe afirmando, não é... na verdade… O que você diria se fosse radiação?
[rádio sintonizando; dentro de um clube de jazz]
SG: Ei, Oficial Whickman!
CHET WHICKMAN (CW): Doutora! Veio a ver cantar?
SG: Sim! Quis vir mostrar meu apoio.
CW: Você viu o Dr. Partridge em algum lugar?
SG: Ele não pôde vir. ‘Tava murmurando algo sobre um vazamento nos capacitadores quando saí. Mandou os cumprimentos pra estrela da noite, obviamente. Roberts, Wyatt e a garota dele estão numa mesa ali na frente, quer se juntar a nós?
CW: Sim, darei uma passada lá, claro.
[fita acelera]
ER/JACK WYATT (JW): [cumprimentam Chet]
PENNY WISE (PW): E quem seria esse?
SG: Penny Wise, esse é o Oficial da Mais Elevada Primeira Classe, Chet Whickman. Whickman, Wise.
CW: Prazer em conhecê-la.
PW: Imagino.
JW: Chet é o cara que nos protege quando estamos em campo.
PW: Quais são as ameaças pruma estação de pesquisa? Lebres? Radialistas procurando previsões do tempo? Nuvens carregadas?
CW: [ri] Tem sempre alguma coisa acontecendo. Você devia ficar agradecida por meu trabalho ser geralmente tranquilo.
ER: Pessoal, shiu, ela vai cantar.
[aplauso]
HELEN PARTRIDGE: [no palco] Espero que não tenham sentido minha falta. Já faz algum tempo.
[banda começa a tocar, e Helen canta “A Nightingale Sang in Barkley Square”]
That certain night, the night we met | Naquela certa noite, a noite em que nos conhecemos
There was magic abroad in the air | Havia mágica pelo ar
There were angels dining at the Ritz | Havia anjos jantando no Ritz
And a nightingale sang in Barkley Square |... E o rouxinol cantou no Barkly Square
ER: Ela é fantástica!
PW: Sua amiga faz isso direto?
JW: É a primeira vez em um bom tempo, acho. Sabe quanto tempo faz, Dra. Grissom?
SG: Eu, hm… eeh… E-hm-não?
CW: Acho que Helen não canta em público desde que os Partidges se mudaram para o Novo México. É uma pena. Não esconda seus talentos– sabe, como a Parábola dos Talentos?
PW: Pensei que aquela fosse uma história avisando pra num enterrar dinheiro no chão.
JW: Pensei que fosse para ser o aval de Jesus para o capitalismo moderno.
CW: O que estou dizendo é que ela devia continuar. Acho que tem futuro.
JW: É, se apenas o Dr. Partidge estivesse aqui pra vê-la.
ER: Onde ele está, aliás?
SG: Ainda no trabalho. Ele não queria perder o show. Sabe o quão ocupados estamos ultimamente.
JW: Pode me culpar por isso.
ER: É o que normalmente fazemos, Jack.
SG: Pelo menos saímos hoje.
JW: A propósito, por que não fazemos isso com mais frequência? Parece que nem vejo vocês mais.
ER: É, Jack, por que nunca vejo você mais?
JW: Desde que fiquei na sua frente nos nossos jogos de Dilema, você tem me evitado no almoço.
PW: Dilema?
SG: É um jogo de cartas que a mãe de Esther inventou. Jack é o único de nós que sabe jogar.
CW: Ela tentou me ensinar uma vez e meu nariz começou a sangrar.
SG: Nunca sei direito o que ‘tá acontecendo, mas tenho quase certeza de que os dois são superbons.
ER: É, é você quem tem evitado nosso jogo. O que foi, Jack? Tenho que encontrar outro oponente que não vá desistir no instante em que houver um estágio 51 na mesa?
JW: Oh, então, como você sente falta de ganhar, tenho que colocar minha sequência decadente à disposição para que possa tentar fazer outra rodada lenta?
ER: Eu não precisaria de um novo oponente se um digno só deixasse de bobagem. Estou aqui, como sempre estive.
JW: Com os riscos altos como estão, pode ser prudente jogar outra coisa.
ER: Não sei nem por que estou brigando por isso. Você mal consegue segurar um Conjunto de Rio. É como assistir uma criancinha fazendo a declaração de impostos.
JW: Pensei que você queria um jogo fácil. Assim você pode colocar seu nome no quadro de classificação inteiro, sem ter que dividir com ninguém.
ER: Quadro de classificação? Que quadro de classificação? Não tem mais ninguém que joga. Tem um espaço vazio gigante no lugar do seu nome, e foi você quem desistiu dele. Você. Jack Wyatt, amigo do Povo e Desistente de Jogos!
JW: Desisti tanto quanto você desistiu quando jogou fora seu par de cincos na Disputa da Black Friday. Sei que estava roubando.
PW: Eles num ‘tão brigando sobre cartas, ‘tão?
SG: Não.
ER: Isso é ridículo e você sabe. Vamos lá, ponha toda a culpa em mim. Sei que você quer. Porque está assustado demais para admitir que perdeu.
JW: Você sabe o que fez. Uma consciência pesada não precisa de acusadores.
ER: E, ainda assim, você acusa! Aqueles dois cincos estavam totalmente dentro das regras. Para que fico aguentando oponentes meia-boca quando posso ter quatro vezes mais competição com a Doutora Grissom?
SG: Não me inclua nisso.
ER: Oh, bom, desculpe-me por querer explorar um conjunto de regras profundo e cativante com um amigo.
JW: Você devia tentar jogar contra si mesma, sabe? É exaustivo. “Agite isso” e “Divida o monte’ aquilo. Não é Paciência, Esther.
ER: Por que jogar quando seu oponente é um peixinho fora d’água?
JW: Quer saber, você é uma—
PW: Jack?
[Penny levanta da mesa]
PW: Jack, acho melhor nós irmos.
JW: É, acho… acho que é uma boa ideia.
PW: Sinto muito. Jack também sente.
[os dois saem]
ER: É melhor sentir mesmo, ou—
SG: Esther, agora não.
[música acaba, aplauso; rádio sintonizando; fora do clube]
JW: É, bom, estou me sentindo… Não sei como dizê-lo. Tem alguma palavra que soe greco-romana que signifique uma mistura de medo, mal-estar e raiva?
PW: Ennui?
JW: … Eu devia conhecer essa.
PW: Foi ‘ocê que disse, não eu... O que foi?
JW: Quase morri tentando não arruinar uma festa de Natal. Não é um ambiente de trabalho saudável.
PW: É, ‘cê pode dizer isso.
JW: E o projeto? Nem sei mais o que estamos fazendo! O objetivo final é… Não sei nem se cheguei a saber um dia.
PW: Isso num ‘tá certo. Ele num pode te tratar igual notícia velha e ainda te fazer trabalhar feito cachorro!
JW: Penny...
PW: Jack, olha à sua volta. A guerra ‘cabou, é hora de parar de lutar.
JW: Mas eu não quero sair! Sally pode até agir como uma louca, mas salvou minha pele mais vezes que posso contar. E trabalho com Esther desde a faculdade. [suspiro] Ela estava certa sobre eu estar a deixando na mão. Não é justo com ela. Ou com os outros.
PW: Eu sei que ‘ocê se importa com seus amigos, mas tem ‘cê que fazer o que é melhor procê. E num acho que trabalhar feito um escravo numa agência, ou sei lá o que que é, de ciência secreta até num restar nada docê ‘tá incluído nisso. ‘Cê bebeu demais hoje e ficou um pouco exaltado. Tem nada de errado nisso.
JW: É, mas em quantas noites eu não bebo um pouco demais e então, quando as coisas esquentam... me sinto fora de controle. Desde que a morfina que me deram acabou, sinto uma dor na minha cabeça. Onde fui atingido.
PW: Sinto muito.
JW: Nada a faz passar… nada além da bebida.
PW: Oh, Jack, eu não fazia ideia–
JW: Às vezes não consigo sair da cama sem beber. Uma vez até calculei quanto tempo demoraria para eu ficar sóbrio e poder ir ao trabalho. Não queria dizer nada porque as coisas estão indo tão bem e... estou com medo. Dói tanto pensar com a dor. E de que sirvo se não consigo pensar?
PW: ‘Cê é bom pra mim. Melhor que ‘cê pensa. Não quero te ver se machucando.
JW: Não se consigo escolher entre a dor, de um lado, e o veneno, de outro.
PW: Essas num podem ser suas únicas opções. Nós vamos achar outro jeito.
JW: Nós? Pensei que se lhe contasse, você me deixaria mais rápido que—
PW: Num vou a lugar nenhum. Fico muito feliz que ‘cê tenha me contado. Agora posso ajudar também.
JW: Penny, eu… Obrigado.
[rádio sintonizando; diferentes ligações telefônicas]
AP: Os sintomas do paciente incluem sangramentos nasais, contusões, riscos de hemorragia, aneurismas, hipotálamo inflamado, afasia–
[muda]
AP: Ele tem sangramentos nasais constantes–
[muda]
AP: –hipotálamo está inflamando–
[muda]
AP: Tem uma gigante–
[muda]
AP: Contusão… extensiva–
[muda]
AP: –risco de hemorragia–
[muda]
AP: –no cérebro–
[muda; no escritório, Anthony no telefone; Chet entra]
AP: Se lhe é de algum consolo, nunca ouvi falar de “afasia específica para tempos verbais” também. Sim, sei que você é o médico, eu não quis— Certo, obrigado, de qualquer forma. Obrigado. Sim. Tchau.
[Anthony desliga]
CW: Parece que não teve sorte.
AP: Liguei para todas as pessoas que eu conhecia. Algumas que não conhecia. Não vai ficar feliz com os resultados. Disse que estava trabalhando em algo?
CW: Estão testando terapia experimental em ratos. Os resultados são... inconclusivos.
AP: Quão inconclusivos?
CW: Podem ajudá-lo, mas podem não o ajudar. Independentemente de qualquer coisa, você realmente não gostaria de ser um daqueles ratos.
AP: Não parece ser nosso plano mais sólido...
CW: O que quer que façamos, estaríamos em cima da hora se começássemos ontem.
AP: Estamos sem opções… Merda.
[gravador de fita para]
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06: Exílio
[gravador de fita liga; dentro de um caminhão]
BILL DONOVAN (BD): Chet, quanto tempo falta?
CHET WHICKMAN (CW): Aproximadamente 45 minutos.
JACK WYATT (JW): Então, por favor, podem nos dizer para onde, em nome de Deus, estamos indo?
SALLY GRISSOM (SG): Ainda não cortei “prisão militar” e “matadouro” da lista.
CW: Para ser completamente sincero com você, Doutora Grissom, se fôssemos desaparecer com vocês, não teríamos dirigido metade do caminho até o Canadá para fazê-lo. O deserto já é bem vazio.
ESTHER ROBERTS (ER): Bom saber quão poucos escrúpulos vocês têm sobre nos matar...
BD: Por que levaríamos vocês a uma prisão?
ER: Porque... porque fizemos a cidade ser fechada. Foram nossa culpa todo o dinheiro e recursos desperdiçados. E agora somos traidores.
SG: Somos pontas soltas.
JW: Ou ambos.
BD: Relaxe, todo mundo. Estamos levando vocês à cidade de Ponto de Exílio, Colorado.
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Fale sério, Bill, isso soa inventado.
BD: Chet?
CW: Hm... Fundada em 1917, altitude de 7742 pés. É a 84ª cidade mais alta dos Estados Unidos continentais.
ER: É como ter uma enciclopédia.
CW: Não sei o que quer de mim. Puseram isso em um panfleto.
BD: Vocês quatro foram tudo o que restou da Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos. Vocês, Chet e eu.
SG: E os quatro jeeps cheio da máquina do tempo atrás de nós.
CW: E a Sra. Partridge.
HP: Na maior parte do tempo, sou só uma acompanhante...
BD: Queria que vocês quatro soubessem: acredito no trabalho que estão realizando. Não há nem palavras para o quanto acredito no que estão fazendo. Mas foi decidido que os Estados Unidos precisam de um serviço de inteligência coordenado. Não essa farsa fragmentada que estivemos mantendo até agora.
ER: O que isso tem a ver conosco?
SG: Ha. Haha. Ahahaha. Haaahahahaha. Não.
ER: O quê?
SG: Donovan acha que a Timepiece vai dar a ele uma vantagem na corrida pra virar o próximo melhor setor de inteligência dos Estados Unidos. Mas está errado. A Timepiece mal funciona, e sozinha não é nem perto de tão útil quanto ele acha.
BD: Você está certa, não é. É por isso que não está trabalhando para a Central de Inteligência.
SG: Então o que estamos fazendo aqui?
BD: Se eu prometer ser breve, param de me interromper?
SG: Vou dar meu máximo, mas você ‘tá pedindo muito.
BD: Vocês não trabalharão para uma agência. Trabalharão diretamente para mim.
HP: Então não estão nem sequer trabalhando para o governo?
CW: É isso que vai dizer no talão de pagamento. Mas não vai ser exatamente verdade.
BD: Ponto de Exílio foi designada como posto avançado da Central de Inteligência, mas o projeto de vocês não será oficialmente uma parte dele. Oficialmente, vocês estavam sem rumo. [cof] Seus contratos com os Serviços Estratégicos acabaram, a ADRA não existia mais. [cof]
JW: Isso não parece exatamente legítimo...
SG: Você ‘tá bem, colega?
BD: Ficarei bem. Consegui garantir a vocês o mesmo acesso a recursos que tinham em Polvo. E funcionarão no mesmo sistema, pelo menos pelo primeiro ano ou por volta disso. O quanto demorar para o governo passar pela burocracia. Vai tudo se encaixar à sua volta, e ninguém soube que não é para estarem lá para começo de conversa.
ER: Acha mesmo que vale tudo isso?
BD: Acho que você não entende. O trabalho que estão fazendo, a máquina que inventaram... foi a maior conquista da humanidade desde a lâmpada. Desde a prensa. Desde a pólvora e o ferro e a roda. Desde que o homem descobriu o fogo. O que estão fazendo tem potencial ilimitado para mudar o mundo. Eu verei... eu vi isso, claro como o dia. E não me perdoaria se deixasse vocês desistirem por causa de alguns pequenos contratempos.
JW: Pequenos contratempos?! Um homem morreu!
BD: Desculpe-me. Eu me expressei mal. Os contratempos foram substanciais. Mas onde o mundo estaria se Thomas Edison tivesse desistido toda vez que falhou?
AP: Bill, esse foi um ótimo discurso, mas e eu? O que estou fazendo aqui?
BD: O Projeto de Mecânicas de Previsão está sendo integrado à pesquisa da Timepiece. Anthony, você será parte da equipe de Sally.
HP: Mas Anthony era seu diretor de desenvolvimento de projetos!
BD: E agora não é mais.
HP: E você só vai jogar tudo aquilo fora?
AP: Obrigado, Helen, sério, mas não preciso de você se metendo assim...
HP: Me metendo?! Como pode deixá-lo fazer isso?
AP: Discutimos isso depois.
SG: Mas, Donovan, por que está fazendo isso? O que você ganha sustentando a Timepiece, e em segredo? Nós te damos “a maior conquista desde a lâmpada” pra usar como quiser, pra que você possa usar viagem no tempo pra espionagem e zombar do devido processo legal? Não, não vou participar disso.
BD: Escuta, sei o que devem achar de mim. Um homem grande com uma pasta cheia de segredos e planos escondidos. Mas a verdade é que quando Polvo foi fechada, perdi mais que qualquer um de vocês. Banido para uma pequena cidade montanhesca, despojado de tudo que possuía. [cof] Estou usando os últimos favores que deviam para mim para convencê-los a me deixarem continuar, e me fornecerem recursos o bastante para manter o projeto. Por quê? Porque vou acreditar que o trabalho que estão realizando ia... vai mudar o mundo para melhor. Acredito que o mundo precisa de nós. E acho que se não acreditassem em mim, não teriam me seguido até aqui.
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 23 de fevereiro de 1946. Então, estou aqui há algumas semanas... que tipo de nome é Ponto de Exílio, aliás? Estou lendo nas entrelinhas aqui, mas o panfleto de boas-vindas da cidade implica que um punhado de mineiros ficou revoltado com uma disputa trabalhista qualquer, decidiu bêbado abandonar o buraco na terra que estava ocupando e, quando ficou sóbrio, abriu a loja no meio da floresta. Era o exílio deles. O lugar de exí- Ponto. Ponto de Exílio. Estava tentando dizer ponto de exílio. Porque, você sabe, é o nome... quer saber? Deixa pra lá. Não sei por que estou explicando isso pro meu diário.
Talvez o ar daqui esteja me afetando. É bem mais rarefeito que no Novo México, denso como era com toda a poeira do deserto. Aqui em cima é mais limpo. Me sinto... sei lá. Revigorada. É claro, isso pode ser eu só começando a sentir a hipóxia generalizada. Veremos.
Acho que sou a única pessoa do nosso anteriormente feliz grupo de cientistas que está realmente gostando do novo lugar. Partridge não está apreciando o que é essencialmente um rebaixamento e, depois do que houve no Natal, Wyatt não parece mais tão envolvido. Eu não saberia dizer, minha cabeça ainda está meio confusa sobre tudo que aconteceu. Acho que um encontro com o Grande Nada faz superciência secreta do governo parecer sem graça. Roberts tem trabalhado três vezes mais só pra cobrir as lacunas que eles deixam. Pobre garota. Precisa desesperadamente de uma folga, mas não acho que tenho uma pra dar pra ela.
[rádio sintonizando; Esther e Jack jogando cartas]
ER: Não acho que funcione assim.
JW: É, mas você está sugerindo que só façamos tudo o que o Diretor mandar.
ER: Estou dizendo que isso é o melhor para o projeto.
JW: Quando o que é melhor para o projeto interfere no que é melhor para nós?
ER: Nós quatro somos as únicas pessoas no mundo que sabem o bastante para manter a Timepiece funcionando. Não podemos simplesmente abandoná-la justo quando está ganhando uma segunda chance.
JW: Ou só podemos deixá-la hibernando. Podemos conseguir empregos de verdade, que pagam dinheiro! Mesmo se algum de nós falhar no setor privado, qualquer universidade beirando a decente ficaria mais do que feliz em nos contratar.
ER: Não há nenhum outro lugar como este. Esta é uma oportunidade única. Estamos desenvolvendo uma matéria de física completamente nova. Que tipo de pagamento vale isso?
JW: Bom, considerando que não podemos nem sequer falar sobre nossa nova matéria de física e que todo crédito provavelmente irá para a Dra. Grissom ou, pior, Bill Donovan.
ER: É com isso que você se importa? Crédito?
JW: Com o nosso salário, pode apostar que sim.
ER: Você está agindo como uma criança.
JW: Você não estava lá. Não teve sua cabeça esmagada por um lunático exausto, mal pago e superestressado que estava carregando um cano.
ER: Tem razão, eu não estava lá. Mas estou aqui agora. E vou ficar, vou continuar fazendo o meu trabalho. Se quer desistir, é direito seu. Mas isso significa que vai sobrar tudo para mim. E isso significa que não tenho tempo para sentir peninha de você.
[Esther joga as cartas, levanta da mesa]
ER: Acabamos aqui.
[Esther sai, esbarrando no gravador de fita; rádio sintonizando]
SG: Diferente deles, estou acostumada a ser uma forasteira. Na verdade, está bem melhor dessa vez. As pessoas de Ponto de Exílio são simpáticas e hospitaleiras. Parece que Sally Grissom é uma jogadora de conversa fora decente, quando não está roubando empregos porque foi de hoverboard até 1943. Tudo está mudando nos EUA. As pessoas estão otimistas sobre o que vem a seguir. O entusiasmo pós-guerra aqui é palpável. Todo mundo está igual àquele marinheiro no Dia da Vitória, só que... menos nojento. Pras pessoas de P de E, sou só a agradável garota nova na cidade que faz algo vago com rochas e mapas na pequena base do Departamento do Interior. É claro, na verdade trabalho pro Departamento de Tecnicamente Nem Sequer EUA, desenvolvendo sistemas de coleta de informação incrivelmente complicados, mas alguém realmente sabe o que seus vizinhos fazem no trabalho?
[rádio sintonizando]
HP: Você me disse que isso era uma transferência, uma promoção! E agora descubro não só que não está trabalhando mais para o Exército, mas que é mais uma das abelhas operárias de Sally? Está falando sério?
AP: Helen, você ouviu o Diretor. Ele arriscou o próprio pescoço para nos trazer para cá. Não teria o feito se não precisasse da minha perícia no assunto. Precisam de mim aqui.
HP: Eu preciso de você aqui! Saímos de Massacchusetts por você. Pus tudo em espera por você. Você me contou sobre seu projeto secreto, que tinha que ir ajudar a acabar com a guerra. E o fez! Mas agora lutamos a última guerra e é hora de os soldados voltarem para casa.
AP: Não estou lutando, Helen. Não estou lutando guerras. Estou tentando acabar com elas. Antes mesmo de começarem.
HP: Acredita mesmo que vai acabar com todas as guerras? Acha que é mais inteligente que todos os grandes e terríveis homens que disseram exatamente isso ao longo da história?
AP: Eu tenho mais capacidade de fazê-lo que qualquer um desses homens teve!
HP: Tem mesmo? Ou só está caindo na mesma armadilha que caíram? César, Alexandre, Napoleão. O imperador e o Kaiser e o Fuhrer. Todos acharam que trariam paz ao mundo. E lutaram e lutaram e, no fim das contas, milhares morreram e as pessoas continuam lutando. Acha mesmo que é tão diferente, só porque tem ferramentas melhores? Eu vi a bomba, Anthony. E foi só a primeira. Agora o mundo a viu também. E acha que vão fugir com o rabo entre as pernas? Não. Agora tudo mudou, e todos querem uma para si.
AP: Escuta, Helen... Eu amo você.
HP: Também amo você.
AP: E preciso fazer isso. E preciso de você aqui comigo.
HP: Fico preocupada com você, Anthony. O tempo todo. Toda essa pressão que coloca sobre si mesmo. O que sequer estamos fazendo aqui, no meio do nada, fazendo Deus sabe o que, comigo sentada à toa o dia inteiro desejando que, uma vez na vida, fôssemos só um casal normal vivendo vidas normais em uma cidade normal?
AP: Esta é uma cidade normal! Um pouco remota, mas... Olha, não é mais como era antes. Não precisa ficar tomando cuidado com cada palavra que diz, perguntando-se se falou demais. Bom- ainda não pode contar o que eu faço a ninguém, mas foi sempre assim. Podemos ser pessoas de verdade aqui, Helen. Podemos ter uma vida. As coisas no Novo México não eram perfeitas, mas podemos tentar de novo aqui. Quero fazer isso com você, Helen. É a única mulher que já amei.
HP: Nosso segredinho...
AP: Nosso segredinho.
HP: Qual é seu disfarce desta vez?
AP: Departamento do Interior. Se alguém perguntar, diga que tem a ver com radares e previsão do tempo.
HP: Acha mesmo que podemos fazer isso funcionar? Olhe nos meus olhos e diga a verdade.
AP: Não posso prever o futuro, mas acho que sim. Sei que sim. Somos fortes.
HP: Seu trabalho não era para ser prever o futuro?
AP: OK, você tem um ponto. Posso prever o futuro. E prevejo que vamos nos sair muito bem.
HP: O jantar está esfriando.
AP: Suponho que sim.
[rádio sintonizando]
SG: Tem quase três anos que estou nos anos quarenta, e já superei a maior parte das diferenças culturais. Consigo acompanhar o jazz animado deles e, apesar da minha imitação do Borat não funcionar muito bem aqui, nunca funcionou de verdade em 20█ também, então talvez só não fosse pra ser. Troquei a Internet pelo rádio e-[arquejo] livros de verdade, de uma biblioteca. Ainda faltam alguns anos pra TV ficar popular o bastante pra ser acessível. Uma régua de cálculo e um bloco de papel não são bem um MATLAB. As coisas de que mais tenho saudade são as pequenas conveniências. E-mail. GPS. Pizza na sua porta em trinta minutos ou menos. Coisas que não vão revolucionar sua vida, mas que podem deixar seu dia melhor. Mas não é como se os componentes dessas coisas já não existissem separadamente. Bom, os satélites de GPS ainda não estão no céu, mas... pizza existe. E, até os satélites chegarem lá, acho que posso refazer um pouco do século XX1 eu mesma.
O primeiro passo nessa direção é reaprender eletrônica. Acabei construindo uma máquina de gravação que percebi que era basicamente... bom, era só um circuito que eu podia ligar num gravador e seria essencialmente uma secretária eletrônica. Quer dizer, não tenho certeza de quando ela foi inventada, mas provavelmente existe em algum lugar. Só construí uma com os materiais a que tenho fácil acesso. Estou definitivamente alguns anos à frente da comercialização dessa tecnologia, mas consegui fazer uma pra mim e provavelmente poderia fazer mais algumas pra dar pra amigos e tal. Nada que vá redefinir meu dia de trabalho, só posso redirecionar ligações perdidas, ocasionalmente. É claro, vai ser um saco ensinar as pessoas a usar ela. Não acredito que vou ter que ensinar sobre tecnologia a pessoas nascidas nos anos vinte duas vezes.
[rádio sintonizando; bip]
SG (na secretária eletrônica): Olá! Este é o telefone grava-mático de mensagens em voz da Dra. Sally Grissom. Não estou em casa agora, mas esse aparelho grava uma pequena mensagem que poderei ouvir mais tarde. Em alguns instantes, vou parar de falar, e vai ter um clique. Depois do clique, deixe sua mensagem.
[gravação acaba]
SG: [acelerando] Quando acabar, desligue o telefone. Vou retornar a ligação assim que puder. Sei que é complicado, e aprecio de verdade sua cooperação. Obrigada, tenha um bom dia!
[bip; rádio sintonizando]
SG: Acho minha primeira tentativa de mensagem extrovertida encheu uma bobina inteira de fita. Tem muita informação. Mas as pessoas não são idiotas, vão conseguir entender. Não posso ter mensagens de texto, mas pelo menos não vou ter que me preocupar se meu telefone está tocando quando estiver em outro lugar. Sabe como é. Com todas as pessoas que me ligam... tenho certeza de que vai ser útil, um dia desses. Vou começar a trabalhar em mensagens de texto semana que vem.
Mas isso é só uma distração. Estive evitando o trabalho um pouco. Recebi um relatório da Roberts e do Wyatt sobre uma nova experiência pra Timepiece, pra testar a viabilidade de movimentação positiva no tempo... Foi só a Roberts que desenvolveu a teoria. O relatório tem os nomes dos dois, e ela ainda não disse uma palavra sobre o assunto, mas vi eles nas mesas. Costumava ter camaradagem entre nós três. Sabe como é, contávamos piadas, sorríamos, ríamos enquanto trabalhávamos. Cantamos algumas vezes. Mas agora é só... silêncio.
A máquina funciona te puxando pra trás em direção ao Experimento Filadélfia, mas estamos procurando um modo de fazer ela viajar pra frente. Se der certo, nós poderíamos... eu poderia... eu poderia descobrir como voltar pra casa. As chances são mínimas, mas, fala sério... eu não estaria morta! Morta pro presente, pelo menos, ou como quer que isso fosse funcionar com paradoxos e o San Dimas Time e tal.
Vale a pena voltar? Pra começar, eu não estaria voltando pros 20█ que deixei, disso tenho certeza. Não tem a menor chance de cada molécula se alinhar da mesma forma e criar o mesmo mundo que deixei pra trás. Não agora. Eu não teria os mesmos relacionamentos com as mesmas pessoas mesmo nas melhores circunstâncias. Por que esperar que aqueles mesmos corpos sequer existam, o mesmo padrão de genética e circunstância pra corresponder às pessoas que eu conhecia? Não que eu tivesse muitos amigos em casa... É meio desanimador. Mas temo que Partridge e Whickman me julgariam se eu não fizesse tudo que posso pra voltar pra casa. É o que devia fazer, certo? Ir de volta ao... [suspiro] de volta ao futuro? Merda.
[rádio sintonizando; restaurante]
JW: Ótimo, porque estou praticamente faminto.
PENNY WISE (PW): Vou insistir pra capricharem nessa coxa de peru. Entre eu e você, acho eles meio mesquinhos.
JW: Fico grato.
PW: Sem problemas, docinho. Meu nome é Penny, é só chamar se precisar de algo.
JW: Com certeza- Farei isso se precisar.
PW: Espero que sim.
ER: Hm, Penny? Pode me trazer outra xícara de café?
PW: Claro, querida. Já volto.
JW: Prazer em conhecê-la...
[Penny sai]
SG: Uou, garoto, posso ouvir os fogos de artifício.
JW: Do que você está falando?
SG: Aquela coisa toda! Vamos lá, não me diga que não viu. [voz dramática] “Estou praticamente faminto!”
ER: Não estou enxergando.
SG: Ele ‘tava praticamente babando em cima dela.
JW: Eu disse para a garota que queria um sanduíche.
SG: Claro, com a sua boca. Mas eu vi nos seus olhos. Ficou totalmente caidinho por ela.
JW: Sally, essa garota é irrelevante. Estou no meu horário de almoço, e ela está no trabalho. Não é exatamente a melhor hora para um encontro com o futuro amor da minha vida.
SG: Não, é a hora perfeita! Você volta hoje à noite, pergunta a ela quando o turno dela acaba...
JW: E ela tem alguma opinião no assunto?
SG: Claro, ela ‘tá totalmente a fim de você! Mas bastante progressivo da sua parte. Ótima derrubada de estereótipos.
JW: ... Obrigado?
[Penny volta com o café]
PW: Aqui ‘tá seu café. Então, dondé que ‘ocês vieram?
ER: Novo México. Nossa companhia acabou de nos transferir para as montanhas.
PW: Foram ‘ocês que se mudaram pro velho armazém de madeira na borda da cidade?
SG: Nós mesmos.
PW: Bom, bem-vindos a Ponto de Exílio.
SG: Obrigada, Penny-hm... Qual é seu sobrenome?
PW: Wise.
SG: Bom, Wise, esse cara aqui ‘tava falando agorinha sobre como seu atendimento foi excelente hoje.
JW: Sally, o que você está fazendo—
SG: Na verdade, ele estava nos falando que, por sua causa, esse será nosso novo local de almoço na cidade.
PW: Nossa senhora...
JW: Não, eu não disse, eu estava só—
PW: Cê ‘tava só o quê?
ER: Ele estava só o quê?
JW: Nada. Eu só... aprecio... serviço de qualidade. Isso é tudo.
PW: Bom, eu... brigada. Faço o que posso. Já volto com seu sanduíche.
[Penny sai]
SG: Viu?
ER: É, definitivamente vejo agora.
JW: Não é nada! Estão colocando palavras na minha boca! Ser cupido é muito mais complicado do que só dizer a duas pessoas que gostam uma da outra!
SG: Então você gosta dela...
ER: Já viu Boêmio Encantador? Ou A Loja Da Esquina? Nesse eles não se suportavam!
SG: Oh! Mens@gem Pra Você!
ER: Exatamente. Você recebe uma mensagem, e acontece de vir ela justo da pessoa que você odeia. Só precisa de uma palavra.
PW: E que palavra é essa?
ER: Uh, nada.
PW: Aqui ‘tá seu Reuben—
ER: Obrigada.
PW: E seus biscoitos com molho de salsicha—
SG: Ótimo, valeu mesmo.
PW: E uma coxa de peru, bem reforçada.
JW: Oh, uou, não sei se consigo comer isso tudo de uma vez.
PW: Bom, se precisar de uma mãozinha para terminar, eu não me importaria. Só chamar se precisar de mais alguma coisa, OK, docinho?
JW: Na verdade, tenho um pedido sim.
PW: E qual é?
JW: Você hm... Você gostaria...
PW: Sim?
JW: Seu nome é mesmo Penny Wise?
PW: [suspiro exasperado] É. Meus acharam que ia ser o máximo.
JW: Pelo menos é fácil de lembrar. Você é inesquecível... Hm, olá, Jack Wyatt.
PW: Bom, Jack Wyatt... me encontre hoje à noite e te conto tudo enquanto comemos uma torta. Fechamos lá pras nove. Até lá, Às, tenho mesas a atender.
[Penny sai]
JW: OK, agora eu vejo.
[rádio sintonizando; Sally e Anthony trabalhando na máquina]
SG: E aí o Wyatt fala [voz boba] “Não sei do que você está falando! Nem sequer gosto de garotas! ” e eu digo a ele pra calar a boca e falar com ela. Ou abrir a boca, acho— o ponto é que ele ‘tava errado.
[Timepiece liga; distorção estática]
SG: OK, checa agora.
AP: Um-vinte.
SG: Merda.
[Timepiece desliga]
SG: Então, digo a ele pra ir incomodar a garota depois do trabalho, e nem precisava, ela voltou com nossa comida com o flerte ligado no máximo. A garot–- e o nome dela era Penny Wise, sabe? Pennywise? Juro por Deus, era o nome verdadeiro dela—
AP: Sally, o que estamos fazendo aqui?
SG: Como assim? Aqui e agora? Ou existencialmente?
AP: No meio do nada. Acho que preciso recalibrar meus vários compassos internos.
SG: Bom, nossos processos corporais naturais estão bombeando sangue rico em oxigênio para os nossos tecidos, enquanto sinais eletroquímicos nos nossos cérebros estimulam a complexa, mas conveniente ilusão de consciência e controlam o corpo: mãos, braços, pés, pernas. Suas cordas vocais estão vibrando para empurrar o ar através da sua boca, moldado pelos seus dentes e língua, para ser interpretado pelo meu cérebro como linguagem.
AP: ... De forma mais geral.
SG: Estamos usando ferramentas pra fazer o nosso trabalho.
AP: Sally! Pare de dar uma de sabichona.
SG: Estamos fazendo a verificação de falhas dos circuitos principais da Matriz Inibidora de Higgs Aplicada, codinome TIMEPIECE, em preparação para uma rodada de testes.
[Timepiece liga, distorção estática]
SG: E agora?
AP: Um-vinte e três.
SG: Merda.
[Timepiece desliga]
AP: E por que estamos fazendo isso?
SG: Porque trabalhamos pra uma divisão supersecreta do serviço de inteligência dos Estados Unidos da América, e queremos nos assegurar de que está à altura.
AP: E por que estamos fazendo isso para eles?
SG: Porque são incrivelmente poderosos, porque nos pagam, porque Donovan fez um discurso motivacional, e porque é a única oportunidade de trabalhar com ciência literalmente décadas a frente de seu tempo. Pode escolher.
AP: E por que eles querem isso?
SG: “Eles” são uma pessoa, objeto ou mineral? Qual é a das Vinte Perguntas?
AP: Estou curioso. Por que eles, por que Donovan, querem a Timepiece?
SG: Vai chegar ao ponto?
AP: Como chegamos aqui?
SG: Ah, fala sério, você não–
AP: Não, quer dizer, de Polvo a Ponto de Exílio.
SG: Viemos de van.
AP: Não! Quer dizer... antes de chegar aqui, eu estava gerindo meia-dúzia de projetos inovadores. Depois, você se se tornou um pé no saco diário—
SG: E, espero, uma amiga e colega de confiança.
AP: Isso também. E aí as coisas começaram a sair do controle. A Timepiece foi ativada, houve uma viagem para Las Vegas, e aí o acidente de Quentin, e aparentemente você fez um trabalho incrível na noite de Natal. Perdi a maior parte daquele dia, mas Jack me contou que estava em três lugares ao mesmo tempo.
SG: Ha. Bom, aquela noite foi bem confusa pra mim também.
[Timepiece liga; distorção estática]
SG: Tenta agora.
AP: Meu ponto é, não posso evitar fazer os cálculos e concluir que a Timepiece não trouxe nada a não ser problemas a ninguém.
SG: Isso provavelmente é verdade.
AP: Então por que Donovan continua acreditando no projeto? Em nós?
SG: Pra falar a verdade, não sei. Sei o que pode acontecer, as coisas incríveis que podemos fazer se conseguirmos desenvolver um sistema efetivo pra essa coisa... mas você tem razão. Falhamos demais. Mais do que acertamos, na verdade.
AP: Então pergunto de novo: O que estamos fazendo aqui?
SG: ... Quero ver essa máquina funcionando. Quero ver ela ajudar alguém.
AP: Não era esse o problema? Não dá para vê-la funcionando? Ou funcionou, ou não, e não dá para saber, ou algo do tipo?
SG: Se desse pra ver o que mudou... Se desse... Ugh. Não sei. Quem sabe o que acontece quando você muda algo pequeno... O que o medidor está dizendo?
AP: Um-vinte e sete.
SG: Perfeito! OK. Vamos botar essa mocinha pra trabalhar.
AP: Bom, dois anos atrás eu era basicamente seu chefe, e agora você é definitivamente minha chefe.
SG: Escuta, Partridge. Não sou sua chefe. De todas as pessoas aqui que poderiam ser suas chefes, sou a que menos é. Partridge, a Timepiece precisa de você. Essa equipe precisa de você. Eu preciso de você. Mas não como um subordinado. Preciso de alguém que olhe pra frente enquanto eu olho pra trás. O milagre da Timepiece não é só nos levar pra trás, é a possibilidade de usar ela pra mudar como vamos pra frente. E é o único que pode nos ajudar com isso. Sem você, a Timepiece fica empacada. Pronto?
AP: Pronto.
[empurrando alavancas; Timepice acelerando]
AP: Sally... se a Timepiece conseguir fazer o que estamos tentando, acha que voltaria para o futuro?
SG: Não sei. Mas gostaria de ter a opção.
[Timepiece ativa; rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 1 de Março de 1946. Te poupando dos detalhes entediantes, a hipótese não foi comprovada no teste com a Timepiece. Sabemos agora, sem uma sombra de dúvida, que avançar no tempo usando os princípios dela é efetivamente impossível. Quer dizer, avançar no tempo sempre foi possível, só... na velocidade de um segundo por segundo. Sei que da última vez que gravei aqui fiz altas conjecturas sobre não querer voltar pra 20█, mas, agora que sei que não posso, bom... dói. Quer dizer, já era um tiro no escuro desde o começo, mas agora que temos números sustentando tudo, não consigo evitar me sentir como uma criança petulante que quer o que não pode ter. A grama é sempre mais verde, sabe?
Os resultados não são de todo ruins. Pudemos dar uma olhada melhor da resposta taquiônica dos fótons que é gerada pelo uso da Timepiece. Se modulada errado, causaria algo como o pulso eletromagnético que vi nos meus primeiros meses com a ADRA. Mas, com alguns ajustes, parece que dá pra ajustar a frequência do pulso, tipo uma “assinatura” atribuída a uma ativação específica da Timepiece. É claro, ela só existe realmente no ponto de origem e daí viaja pra trás no tempo em direção ao Eldridge. Então, minhas desculpas vão pra tripulação do Eldridge em outubro de 1943, que passou sua viagem sendo bombardeada por uma quantidade sempre crescente de táquions. Mas, se tivesse algo lá pra receber eles, provavelmente daria acompanhar todas as viagens feitas com a Timepiece. O ponto âncora teria que ser mudado pra uma estação de escuta diferente, ou algo programado pra receber as respostas do futuro quando o Arco-íris for ativado; é capaz de ser possível até montar um sistema pra localizar eles. Não poderia não ser conveniente, sabe? O que você faria se pudesse mapear os deslocamentos das areias do tempo?
[rádio sintonizando; distorção estática]
BD: Vou assumir que está subentendido que pode não espalhar essas informações além desta... sala. Não pode espalhar isso para fora desta sala.
AP: Mas as pessoas precisam saber! Tem certeza que é por causa do que... você fez... com a Timepiece?
CW: Se estava lá antes, a Timepiece acelerou o processou. A conjugação dele está uma bagunça.
BD: [tosse] Você merece todos os agradecimentos, Chet. Eu poderei... Consigo falar sozinho. Só me deem um minuto.
AP: Por que não contou isso para Sally?
BD: Sally estava volátil. Estamos mantendo isso o mais secreto possível.
CW: Por favor, você tem que ajudá-lo. Entende que tudo foi pelo bem da ADRA, pelo bem de todos nós. E agora ele está morrendo.
AP: O que quer que eu faça?
BD: Eu precisava que conseguisse a resposta certa. Curar o que há de errado com o meu raciocínio.
CW: Você é a única pessoa a quem podemos recorrer.
AP: Diretor... Bill. Eu farei tudo que puder para lhe salvar. Irei até o fim, mas você precisa abrir o jogo com a equipe. Pelo menos conte à Sally. Ela merece saber sobre o que você fez.
BD: Já falamos disso. Mas só onde você encontra a resposta certa. Quando chegar não fale a ninguém. Inaceitável.
[Bill tosse; distorção estática se intensifica]
CW: Anthony... ajude-o. Por favor.
[gravador de fita desliga]
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05: Meia-noite
[gravador de fita liga; multidão ao fundo]
SALLY GRISSOM (SG): [sem fôlego] OK... Diário... Sally Grissom... 21 de dezembro de 1945... São, hm, 12:26? Isso não pode ‘tar certo. Preciso arrumar meu relógio. Acho que são umas nove e quinze, nove e meia? Estou numa despensa. Tinha uma fonte de energia aqui, mas não é recarregada há não sei quantas semanas, então a Timepiece só pôde me voltar umas horas. Infelizmente, não antes de ‘tar tudo encaixotado. A Timepiece não muda sua posição relativa à Terra, então agora ‘tou trancada dentro de uma despensa. Todo mundo ‘tá na festa de Natal. Ainda não sabem que foram despedidos. E definitivamente não sabem que a cidade vai ser reduzida a cinzas em duas horas. E era pra eu estar tentando impedir isso agora, mas estou presa nesse armário idiota!
Já que estou aqui, posso aproveitar e explicar a catástrofe que estamos tentando impedir. Começou na festa, algumas horas atrás... ou talvez não? Victor Lambert ‘tava explicando pra mim, o Projeto Arco-Íris foi feito pra dobrar luz...
[rádio sintonizando; multidão na festa, música natalina]
VICTOR LAMBERT (VL):... Arco-íris foi feito para dobrar luz, entende? Pensamos que, se pudéssemos dobrar a luz que envolve um navio, ele desapareceria de vista, certo? Mas, depois do Eldrigde, depois da Filadélfia... ei, tivemos que desistir do nosso sonho. Então, talvez não pudéssemos tornar o navio invisível, mas ainda tínhamos toda aquela pesquisa de qualidade. Aí pensamos, e se dobrássemos a luz em um recipiente, você sabe, para levá-la conosco? O Arco-íris deu dois passos para trás e dois para o lado. Adaptamos nossos designs originais em um sistema para utilizar a luz do sol. Mas eu e Ivan fomos ambiciosos demais, tentando capturar e estocar cada fóton na área almejada. O desafio não era guardar toda a energia, veja bem. Era armazená-la até que você precise nela. As pessoas precisam de eletricidade o dia inteiro, e estudos já provaram que a coleta de energia solar chega a zero durante a noite.
JACK WYATT (JW): Sabichão.
SG: Wyatt, ele não ‘tá errado.
VL: Então construímos um grande círculo de fiação que passa por toda a cidade. Uma rede gigante de cobre. Lembra, alguns anos atrás, uma semana em que tudo ficou com gosto de moeda? Estávamos instalando.
JW: E não sentiram que deviam nos avisar?
VL: Está insatisfeito com sua energia gratuita e ilimitada?
JW: Bom... acho que não...
VL: A rede é mantida por dois aquecedores solares, cada um em uma extremidade da cidade. Desde que instalamos o sistema, estive cuidando de um deles, enquanto Ivan controla o outro. Cada um absorve energia durante o dia e estoca a carga elétrica em células fotovoltaicas gigantes. De noite, as células descarregam vagarosamente e levam energia até as casas de vocês de pouco em pouco. E nem sequer perceberam.
[rádio sintonizando]
SG: É claro, se ele soubesse que Ivan Maraczek abandonaria a estação dele no minuto em que todo mundo perdeu os empregos... que Ivan não estaria lá pra fazer algo quando um descontrole no sistema fizesse a energia estocada atingir níveis críticos... provavelmente teria dito tudo aquilo com um pouco mais de urgência e um pouco menos de... exposição.
[rádio sintonizando]
HANK CORNISH (HC): Com licença, pessoal. Um minuto de atenção, por favor?
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Silêncio, silêncio todo mundo.
[música para]
HC: Obrigado. Olá, sinto muito interromper a festa, pessoal, meu avião passou por uma área de tempo ruim enquanto vinha para cá. Meu nome é Agente Hank Cornish, estou com o CIG, o Grupo Central de Inteligência. Estou aqui para agradecer a vocês, em nome do Presidente e do povo americano, por todo o trabalho que realizaram aqui em Polvo nos últimos anos. Os homens e mulheres neste salão deram inúmeros passos para o avanço da ciência e tecnologia, e ajudaram pessoalmente a manter a América segura. Então, gostaria de agradecer.
[Hank aplaude; multidão aplaude confusamente]
HC: Sim, obrigado, obrigado. E é no auge que iremos fechar as operações de todo o pessoal da Agência de Desenvolvimento de Recursos Anômalos e, começando em primeiro de janeiro, todos serão absorvidos pelo CIG.
[multidão aflita]
HELEN PARTRIDGE (HP): Espera um minuto... O que vai acontecer com a cidade?
HC: O Departamento de Estado separou alguns fundos para custos de indenização e realocação. Vejam bem, são todos muitos importantes para nós, e valorizamos o trabalho que realizaram, então cuidamos de tudo para vocês. Agora, a cidade em si e tudo o que descobriram aqui é propriedade do governo dos Estados Unidos e será apreendido, assim como quaisquer recursos de projetos ativos.
VL: Ele disse recursos de projetos—
HC: Sinto muito, realmente não queria ter ocupado tanto do seu tempo. Tenham uma ótima festa, pessoal, feliz Natal.
[Hank sai]
VL: O que isso significa?
AP: Significa que estamos acabados.
ESTHER ROBERTS (ER): Então é isso? Fomos todos despedidos?
AP: Significa que não tem ninguém para nos despedir.
JW: E aí, o que fazemos agora?
AP: Começamos a procurar novos empregos. Tenho certeza de que conseguimos arranjar bons currículos para quem quer que devemos ser oficialmente.
VL: E é isso?
AP: É isso. Estamos em um beco sem saída.
JW: ... Não sei sobre vocês, mas vim aqui para uma festa de Natal. E estou decidido a esperar até esse copo estar vazio para pensar no que fazer a seguir.
[multidão concorda]
AP: Tem um tempo que estou querendo tomar uma garrafa de absinto que ganhei há uns anos.
ER: Mas absinto é ilegal.
AP: Não na Espanha. Um colega trouxe escondido do outro lado do Atlântico para mim.
ER: Quantos dos seus colegas fizeram bico de traficantes de bebida na Europa devastada pela guerra?
AP: Esther, houve um tempo em que todos fizemos bico de traficantes de bebida na Europa devastada pela guerra! Mas os tempos mudam.
HP: Oh, por favor. Esther, ele a comprou no Canadá. Traficou-a para fora da Manitoba devastada pela guerra. É moonshine com corante verde.
ER: Isso soa adequadamente depressivo.
AP: Absinto é um licor cuja melhor acompanhante é a tristeza.
VL: Quem disse isso?
AP: Nathaniel Hawthorne, acredito.
ER: Acredita? Você acredita que Hawthorne disse isso?
AP: Não faço ideia. Nunca li Hawthorne. Mas gosto de pensar que ele o disse.
[fita acelera]
JW: [muito bêbado] Nós bebemos para esquecer, ou lembramos para termos algo a perder quando bebemos?
AP: [também consideravelmente bêbado] Você já está bêbado.
JW: Estou! Eu devia aproveitar a vida, agora que sou o mais novo membro da fila da sopa.
SG: Me faz um favor, Hooverville, vai buscar outra garrafa na despensa.
JW: Sim, senhora, capitã! É para já!
[trovão]
SG: Uou, o tempo ‘tá fechando lá fora.
HP: Melhor ainda, para afogar nossas mágoas.
SG: Então, pra onde vocês vão?
HP: Não tenho certeza. Algum lugar verde, acho. Estou farta dessa areia marrom e dessa planície sem fim. Queria morar em algum lugar com serras cobertas de árvores. E acho que será bom para nós nos acomodarmos. Viver aqui é tão... estressante. Acho que uma vidinha tranquila seria perfeita para nós agora.
SG: Soa agradável.
HP: Mas eles disseram... “todos os recursos”. Alguém já lhe disse o que isso significa para você?
SG: Ainda não. Mas dediquei dois anos da minha vida a esse lugar, me comportei pela maior parte do tempo. Acho que consigo fazer eles enxergarem a razão.
HP: E se não conseguir?
SG: Então que se fodam.
HP: Oh, bom... OK! Um brinde a isso!
[taças tilintam]
VL: Eu mesmo imagino que vou levar o trabalho que desenvolvi aqui e continuá-lo. As coisas que fiz aqui vão mudar o mundo! Vou vender patentes, fazer rios de dinheiros e viver uma vida mais tranquila.
SG: Eu não teria tanta certeza—
JW: Dra. Grissom, achei esta garrafa, ela serve?
SG: Ótimo trabalho, meu amigo!
HP: Querem que eu sirva a bebida nos drinks para vocês?
SG: Por quê? Essa é pra mim.
[bebida é servida, Sally bebe; trovão]
SG: Mais um. Uou. Esse foi um belo trovão.
HP: Eu não me preocuparia.
JW: É, olha, não se preocupe! Estamos só desempregados, não podemos contar para ninguém sobre o nosso emprego, e seremos jogados de volta no mundo como uma cavala capturada por uma rede de atum–
HP: OK, Jack, acho que você já bebeu demais... Vou deitá-lo em algum lugar, e tentar achar uma toalete. Com licença.
[Helen leva Jack embora]
SG: Huh. Para onde eu iria... Isso é, se me deixassem sair...
[trovão, luz acaba]
SG: E no três... Ei, Lambert, você é o cara da energia, alguma ideia?
VL: Não sei, eu devia dar uma olhada... Ivan! Jesus, ele deve estar devastado...
SG: Por quê?
VL: Bom... Eu e ele nos conhecemos há anos. Fui eu quem o trouxe para Polvo, mas... ele tem o mau hábito de ser despedido de todo lugar em que trabalha. Polvo era uma espécie de última chance. E agora...
[explosão elétrica de ficção científica]
VL: Isso não pode ser bom.
SG: O que foi isso?
VL: Aposto que houve alguma falha na estação de Ivan e um acúmulo de energia está causando a sobrecarga do gerador Arco-íris.
SG: Uma aposta bem específica.
VL: O que posso dizer? Eu desenvolvi o sistema, estou bastante familiar com como ele opera.
[sirena de emergência]
VL: E ainda está. Bem na hora.
JW: Meu Deus, nós vamos morrer aqui. Já estou vendo. Já vi... [chora]
AP: Não vamos morrer aqui, mantenha-se firme.
SG: Lambert, quanto tempo temos?
VL: Não muito. Cerca de trinta minutos até sobrecarregar, e mais uma hora mais ou menos até o Efeito Eldrigde trazer a cidade abaixo.
SG: O Efeito Eldridge?
VL: Foi antes de você chegar. O Experimento Filadélfia foi para o saco depois de o gerator Arco-íris parar de dobrar luz e partir para o próprio tecido do espaço-tempo. Por sorte, foi apenas por um segundo, mas... Sally, ei, Sally, aonde você está indo?
[rádio sintonizando]
SG: Então, corri lá pra fora pra ver o que tinha acontecido. Tinha um brilho estranho vindo dos limites da cidade, onde Lambert tinha dito que a estação era. Se um efeito como o que me trouxe aqui acontecesse de novo, podia arruinar tudo que eu fiz. Deus, podia até mexer com meu primeiro pulo de 20█, e eu teria que lidar com outra de mim sentada entre as ruínas da base. Não tenho certeza de que conseguiria lidar com outra eu por aqui. Quer dizer, além de agora, já que eu... Deixa pra lá.
Fui correndo até o laboratório e peguei a Timepiece. Pensei que se pudesse voltar e impedir a explosão antes de qualquer reação sobrecarregar a massa na estação, resolveria tudo. Mas admito, eu hesitei. Quando estava sozinha com ela, não sei, só senti essa vontade de... correr. Só fazer as malas, levar tudo, a Timepiece, todas as minhas anotações, e ir pro mais longe dali que pudesse. Mas, conforme tirava a capa da máquina, ouvi a voz de June Barlowe. Em frente à Timepiece, arma apontada pra minha cabeça.
[rádio sintonizando]
JUNE BARLOWE: Mas você está! Você construiu essa coisa que promete consertar tudo que um dia foi quebrado, e só a deixa parada? Com medo demais para fazer qualquer coisa com esse poder, porque teme que pode acabar se arrependendo?
[rádio sintonizando]
SG: Não sei se foi a bebida ou a adrenalina, mas olhei pra Timepiece e vi, e soube que podia, de verdade, salvar todo mundo. Se não todo mundo, pelo menos os meus amigos em Polvo. Então arrumei a máquina, comecei a ligar ela ... e lembrei que a energia tinha acabado no laboratório. Obviamente. Por sorte, tinha essa pequena fonte de energia extra. Peguei ela e vim até esse armário, pra ter certeza de que ninguém me veria quando chegasse ao passado... E foi por aí que começamos.
Quero acreditar que algum tipo de milagre vai me tirar daqui. Isso, ou eu faço a coisa difícil e bato nas paredes até que alguém que provavelmente ‘tá conversando comigo agora possa—
[porta se abra, sons de festa]
JW: Dra. Grissom?
SG: Wyatt! Ótimo.
JW: Você usou a Timepiece?
SG: Como... Por que você acha isso?
JW: Bom, você está dentro de uma despensa que estava trancada de fora, está toda molhada e não está chovendo, e construímos uma máquina do tempo e posso estar bêbado, mas não sou idiota.
[trovão]
SG: Oh! Me lembro desse trovão! Que horas são?
JW: Você não tem um re- ah, certo. São 9:38.
SG: Só mais duas horas e meia...
JW: Você saiu logo depois da meia-noite?
SG: Meia-noite em ponto, na verdade. Não foi exatamente planejado, mas certamente deixa a matemática mais fácil.
JW: Você não planejou isso? Então, quando me pediu para ir buscar a garrafa, não tinha planejado que eu encontrasse você?
SG: ‘Pera aí, quando eu...A garrafa! Ha! Sou um gênio! Sally do passado é o máximo!
[Sally faz um “toca aqui” consigo mesma]
JW: Você acabou de tipo, fazer um “toca aqui” consigo mesma?
SG: Uma garota tem que se manter positiva quando a cidade ‘tá prestes a explodir. AH, É MESMO. Esqueci de te falar, a cidade ‘tá prestes a explodir!
JW: Por que você não começou com isso?!
SG: Escuta, você precisa me ajudar com isso. A cidade ‘tá em perigo, e temos um limite de tempo e alguns objetivos claros, então tem que se livrar da sua letargia de moonshine verde e cooperar comigo aqui!
JW: Certo, OK, entendi, estou com você. Do que precisa?
SG: Deixa eu pensar. Lambert ainda ‘tá na festa?
JW: Até onde eu sei, está lá com todo mundo. E você! Acabamos de descobrir que fomos demitidos... Espera, isso aconteceu com você também, certo?
SG: Infelizmente.
JW: Alguma ideia do porquê?
SG: Não! Eu sou de tipo, três horas na sua frente. Vamos lá, cara, foco. Um desses coletores Arco-íris vai sobrecarregar e gerar uma reação em cadeia que vai–
JW: Destruir a cidade?
SG: Isso aí. Oh, e vai destruir a Timepiece, e possivelmente meter uma no espaço-tempo.
JW: Os riscos são bem altos, hein?
SG: C’est la vie. Então, precisa me ajudar a sair do prédio, e daí avisar Lambert. Vou tentar chegar até a outra estação pra ver se consigo impedir essa coisa toda de explodir. Certo?
JW: Posso só perguntar–o qu–por que estamos sequer salvando essa cidade? Nem sequer gosto dela. Nem sequer trabalho aqui mais!
SG: Você pode tentar fazer uma evacuação total de Polvo em meia hora. Ou talvez só prefira deixar milhares de pessoas morrerem.
JW: É, OK, tudo bem, então vamos consertar a engenhoca quebrada?
SG: Ou morrer tentando.
JW: Não é lá um grande conjunto de opções.
SG: Não mesmo.
[rádio sintonizando]
SG: Essa é a parte complicada. Se alguém nos vir, vamos ter que–
HP: Oh, Jack, aí está você! E... Olá, Sally.
SG: Helen, que bom te... ver.
HP: Acabei de sair do salão, e você estava lá, eu juro...
SG: Não, eu... fui ao banheiro.
HP: As toaletes não são na outra direção?
SG: Tem uma... pouco usada por aqui. Gosto da privacidade.
HP: E tem o belo Jack Wyatt para lhe acompanhar?
JW: Só cruzei com ela enquanto estava voltando... Só fui buscar uma–
HP: [ri] Não se preocupe, não estão quebrando nenhuma lei descendo o corredor juntos. Vou procurar a toalete secreta lendária da Sally. Espero que seja tão boa quanto você diz que é. A maioria das toaletes para mulheres deste lugar é lastimável...
SG: Não é nada que valha—
HP: Bom, aproveitem seu tempo, de qualquer forma! Divirtam-se hoje à noite. Pode ser sua última chance... mas acho que já perceberam isso.
[Helen sai]
SG: Isso foi estranho.
JW: Um encontro no banheiro secreto?
SG: Só quero sair daqui. Busque o Lambert e diga a ele que a estação de energia precisa de atenção. Quando estiverem fora da festa, conte o resto pra ele. Vou até a estação do Maraczek ver o que posso fazer de lá.
JW: E vai levar a Timepiece com você?
SG: Posso precisar dela de novo. E, além disso, não dá pra deixar duas máquinas no mesmo lugar. Alguém pode inventar de fazer duplicatas.
[trovão]
SG: Vamos lá.
[rádio sintonizando; Sally dirigindo na chuva]
SG: Estou a caminho da Arco-íris-A, a estação em que Maraczek trabalha... então, ele e Lambert eram colegas de trabalho e agora são, o que, guardas exaltados? Talvez sair do complexo militar industrial agora seja uma boa ideia. Estaria livre de incômodos como esse. Eu podia desaparecer amanhã. Sumir do mapa. Estou num tempo em que é fácil arranjar uma nova identidade. Nada mais de Sally Grissom. Eu poderia ser- AAAH
[trovão, raio atinge a estação]
SG: Bom, pelo menos agora eu sei o que vai causar a falha na Arco-íris-A. Uma das antenas da estação acabou de ser atingida por um raio. São 10:04, aliás. Se essa coisa ‘tá coletando energia, provavelmente só absorveu mais do que aguentava de uma vez. Lambert disse algo sobre uma alavanca de descarga, uma que desligaria a toda a estação e mandaria qualquer energia excedente pro solo. Mas é capaz de explodir enquanto eu estiver lá. Já ‘tá bem tarde. Então, se você ‘tá ouvindo isso, estou morta. Ou talvez esteja viva e você só esteja ouvindo a gravação. De qualquer forma, te vejo do outro lado!
[rádio sintonizando; dentro da estação prestes a explodir]
SG: Olá? Ivan, alguém em casa? ... Certo, o que estou fazendo aqui? Parece um animal morrendo. Pelo menos está sendo usada pra algo nobre, em teoria. Nobre e mortal. Como Argon. Os controles de emergência devem estar bem... aqui! Eu tenho... oh, meia hora. Bastante tempo. Você consegue, Sally.
[Sally empurra a alavanca, e a energia se dissipa sem explodir]
SG: Ótimo... Dia salvo! Legal! Huh... provavelmente vão empacotar essas coisas de manhã. Talvez se eu só der uma olhadinha...
[fita acelera]
SG: —ível! Isso esmagaria completamente a tecnologia de aquecimento solar do meu tempo. Me pergunto por que nunca foi desenvolvido. Se eu fosse a ADRA, colocaria no mercado o mais rápido possível. Meu tempo realmente devia ter tido isso. Me pergunto o que acon— UOU!
[explosão, rádio sintonizando]
SG: ‘Tá tudo bem, ‘tá tudo bem! Relaxa, ‘tou aqui pra ajudar!
IVAN MORMONT (IM): Você! Onde você! Como você—
SG: Shh, shh shh shh. Recupere seu fôlego, deixa eu falar. Você é Ivan Maraczek, certo?
IM: ... A-hã.
SG: Certo, é você quem eu ‘tava procurando. Maraczek, quantas horas são?
IM: 9:15. Você está usando um relógio—
SG: OK, Ivan, em mais ou menos cinquenta minutos, esse prédio vai ser atingido por um raio.
IM: Como você poderia saber—
SG: Esse prédio vai ser atingido por um raio, e preciso que você fique aqui.
IM: Isso soa perigoso.
SG: Foco, Maraczek. Fique do lado de fora, se fizer questão. Mas precisa ficar aqui pra quando as coisas saírem do controle. Não importa o que acontecer. Não importa se perder seu emprego.
IM: Vou perder meu emprego?
SG: O quê? Não! Bom... sim. Ops. Desculpa se estraguei a surpresa. Por tipo, quinze minutos.
IM: Já vi você em Polvo, mas não sei por que está aqui. Como sabe de tudo isso? O que está fazendo aqui?
SG: Preferia não ter que explicar tudo isso de novo, mas já que você ‘tá me fazendo um favor e tenho um minuto, vou te esclarecer. Tudo começou quando—
[fita acelera]
SG: —e aí teve essa explosão lá fora, e saí correndo, e tudo que podia ver era um incêndio do outro lado da cidade. Entrei no meu carro e dirigi até lá o mais rápido que podia, mas a Arco-íris-B já tinha virado cinzas. Acho... acho que Wyatt e Lambert estavam lá.
IM: O quê? Victor? Não! Eu o conheço há quase uma década... Ele me salvou de... Não, você está errada, não pode ser verdade.
SG: Não é. Não se posso fazer algo pra impedir o que aconteceu.
IM: Tenho que ir até ele. Tenho que salvá-lo.
SG: Você tem que ficar aqui. Se sair, a Arco-íris-A ‘tá ferrada também. Precisa estar aqui quando o raio atingir a estação, ou estamos todos condenados, etc. Vou consertar isso.
IM: Aonde você vai?
SG: Já ouviu o ditado: “onde há fumaça, há fogo”? Vou chegar lá antes de a fumaça sequer ter chance de surgir.
IM: Não, nunca ouvi esse ditado! Do que você está falando?
[rádio sintonizando; gerador Arco-íris quebrado]
SG: Lambert! Lambert— o que diabos aconteceu aqui?
[Victor destruindo a máquina com um cano]
VL: Não vou deixar eles se safarem mais!
SG: O que você ‘tá fazendo? O que aconteceu com o Wyatt?
VL: Ele entrou no caminho.
SG: Você fez isso com ele?
VL: A ADRA está me enchendo há tempo demais, chega desta cidade e das pessoas nela para mim.
SG: Wyatt— Jack, consegue me ouvir? Acho que ele ‘tá machucado de verdade!
VL: Se não posso partir com os frutos do meu trabalho, então ninguém pode!
SG: O que ele te disse?
[rádio sintonizando; Jack e Victor entram]
JW: Tudo que Sally precisa é que nos asseguremos que nada de terrível aconteça aqui.
VL: Bom, nesse caso, é melhor eu pegar o máximo das minhas patentes antigas que conseguir antes de sair.
JW: Sabe que nunca vão deixar você levá-las, não é?
VL: Para o inferno que não vão. Dei meu máximo neste lugar por anos. Vou pegar meus projetos de volta e levá-los a algum lugar em que sejam apreciados. General Eletric, estou pensando.
JW: Victor, não é assim que a ADRA funciona, e você sabe. Estão fechando esta cidade, e tudo dentro dela. Vão enterrar suas patentes, e vão enterrar você. Acha que Donovan não vai perceber quando a GE só acontecer de inventar independentemente algo que só existe em uma base científica mais que super-secreta? Saberão que foi você antes mesmo de poder dizer “que se faça a luz”.
VL: Não, posso enfrentá-los, posso—
JW: Vai enfrentar a parte do governo dos EUA que pode contratar milhares de pessoas, mandá-las para o meio do deserto, manter segredo por quatro anos, e despedi-las sem uma explicação? Vai enfrentá-los?
VL: Você tem razão. Sem chance de me deixarem ficar com elas...
[Victor pega cano]
VL: Bom... Para cada ação, há uma reação igual e oposta...
JW: Vai quebrá-la?! Não! Não é assim que funciona! Você não pode só-
[Victor golpeia a máquina, acertando Jack na volta; rádio sintonizando]
VL: Essa máquina é minha maior conquista, e não vou deixar que seja transportada para um depósito empoeirado e mantida lá até o Tio Sam precisar dela para outra guerra!
SG: Não vai ser assim! Pense em todo bem que essa coisa pode fazer! O que ela faria se saísse dessa cidade.
VL: A Arco-íris nunca fará nenhum bem fora desta cidade! Nunca vai sair desta cidade.
SG: Mas você está indo embora! Está sendo liberado de tudo isso! Alguns de nós gostariam de essa sorte.
VL: Não tem nada lá fora para mim. A ADRA se assegurou disso. Ah, claro, vão me arranjar um emprego como professor titular de universidade medíocre. Mas se assegurarão de que não me envolva em nada digno de nota de novo... nunca mais. É isso. Essa máquina é minha contribuição para a ciência, e vai desaparecer sem deixar nem sequer um nome para trás.
SG: Escuta, precisamos levar Wyatt ao médico. Ele ‘tá inconsciente e isso é algo que não se pode deixar acontecer de jeito nenhum.
VL: Deixe-o sangrando no chão, por mim. Leve-o até o hospital, se faz questão. Vou destruir essa máquina até a última peça e parafuso, e depois vou queimar meus projetos.
SG: Vai matar todo mundo aqui, incluindo você.
VL: Que seja! Não tenho nada a perder.
[Sally soca Victor; eles lutam, Victor dá um swing, erra; Sally pula nas costas de Victor e o enforca; rádio sintonizando]
BILL DONOVAN (BD): Fez um ótimo trabalho hoje à noite, Sally. Estou orgulhoso de você ter colocado a Timepiece para funcionar quando foi necessário, apesar de que nunca vai ouvir isso de mim de novo, e nunca ouvi nada sobre qualquer tipo de uso não autorizado de equipamento da ADRA por uma antiga empregada.
SG: Eu não poderia fazer nenhum comentário sobre isso. Soa positivamente traiçoeiro.
BD: Eu lhe asseguro que não deixarei a Timepiece morrer. Estou trabalhando em algo, e tem um cargo para você lá, se estiver interessada. Caso contrário, está livre para ir. Tão livre quanto uma pessoa na sua posição pode estar, pelo menos. Ficou presa em uma torre por tempo demais. O Agente Cornish me pediu para lhe escoltar. Está aqui para discutir suas opções.
SG: Vou ser sincera, depois dessa semana, não tenho certeza de que quero meu emprego de volta. Ou novo emprego. E não um oferecido por vocês, pra ser um pouco rude. Você acertou em cheio com a metáfora da torre. Wyatt ainda ‘tá se recuperando. Esse lugar destrói as pessoas.
BD: Destrói, mas sua melhor chance de fazer algo realmente incrível é aqui. O que mais há lá fora para você?
SG: Eu mesma posso descobrir meu caminho. Não preciso de ninguém chamado Agente me dizendo o que posso e não posso fazer.
BD: Seria bom ouvir o que ele tem a dizer. O Agente Cornish é mais interessante do que você pensa.
[porta se abre]
OUTRA SALLY GRISSOM: Bom, eu aprecio sua oferta, mas vou ter—
HC: Ah, aí está você. Estávamos esperando.
SG/SG: Essa sou—aaagh...
[distorção estática]
BD: Sally! Sally!
HC: Dra. Grissom, você está bem?
[distorção estática; rádio sintonizando, Jingle Bells tocando no rádio]
SG: unggh...
ER: Sally! Eh, Doutora Grissom! Você está acordada.
[rádio desliga]
SG: Que horas são? Preciso voltar pro laboratório.
ER: Não, acabou. Você deteve Victor. As estações de energia estão bem, acabei de visitar Jack alguns quartos abaixo, ele está bem abalado...
SG: Do que você ‘tá falando?
ER: Você sabe, quando dirigiu como uma louca apagando incêndios, tentando impedir Victor de destruir a cidade? Foi como se você estivesse em oito lugares ao mesmo tempo. Super impressionante.
SG: Eu não... Quando eu fiz isso?
ER: Sally, querida, que dia é hoje?
SG: É, aah... Minha cabeça. É sexta, certo?
ER: É segunda. Véspera de Natal. Você está desmaiada desde que salvou a cidade, na noite da festa.
SG: Eu salvei a cidade?
ER: Você deve ter perdido a memória de fatiga e de estresse. Mas nos salvou, apesar de termos sido todos despedidos.
SG: Meu deus, sinto muito. Deixa eu falar com o Donovan, posso acertar alguma coisa—
ER: Sally, Sally, vai com calma! Está tudo bem! Não foi nada que você fez. Estão fechando a cidade. Mas vai ficar tudo bem! Donovan vai levar nossa equipe para outro lugar. Colorado, acho. Eu, você, Jack e acho que até o Doutor Partridge também. Ficaremos todos bem.
SG: Salvei a cidade e meu emprego, e não tenho nem sequer o senso comum de me lembrar? Típico.
[rádio sintonizando]
HC: Ela está acordada.
BD: E como está?
HC: Dentro dos parâmetros esperados. Perdeu a memória dos dois últimos dias inteiros, para a nossa sorte. A que foi até Lambert estava ficando... rebelde. A que foi até Maraczek parecia estar indo na mesma direção.
BD: Bom, era de se esperar. Com qual você ficou?
HC: Faz diferença? Só há uma Sally Grissom. Mas dê uma olhada na autópsia dela. Lesões cerebrais, nervos danificados... está apresentando exatamente os mesmos sintomas que você.
BD: Não tenho todo o tempo do mundo. Descubra uma cura.
[gravador de fita desliga]
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04: Bala
[gravador de fita liga]
Sally Grissom (SG): Seria de se pensar que dois anos vivendo em Polvo teriam me deixado casca-grossa. Que nada mais poderia me surpreender. Deus, ainda estou com dificuldade de juntar tudo na minha mente. Acho melhor começar do começo. Uma das bobinas supercondutoras tinha rachado durante um teste de ciclo de energia. Roberts e Wyatt estavam ambos fora por motivos pessoais, então convoquei Barlowe pro meu time para termos mais um par de mãos. Estávamos trocando a bobina e Barlowe estava— merda. não fiz a introdução de sempre, fiz? Diário de Sally Grissom, 21 de setembro de 1945. Seria de se pensar que...
[rádio sintonizando]
SG: —Então Donovan vem e me pergunta: “Guitarras me dão dor de cabeça. Você não fica surda com toda aquela balbúrdia?” Mas não é sobre preservar a audição, cara, é sobre sentir a música– me passa esses alicates, por favor?
QUENTIN BARLOWE (QB): OK. Pode me mostrar o que está fazendo? Sei que é assim que você organiza–
SG: A-hã, só– chega um pouco pra trás.
QB: Desculpa.
SG: Valeu. Daí, eu falo pra ele que é sobre deixar a música tomar conta da sua mente, liberar suas emoções, deixar o animal dentro de você tomar conta—
[distorção estática, bala atravessa o tempo, Quentin cai no chão]
—o que ele achou completamente ridículo, acho que ficou quase ofendido. “Autocontrole é uma virtude”, ele disse, “que todos devemos almejar”. Aquele cara dá uma afrouxada alguma hora? Porque ‘né, vamos lá. Ei, Barlowe, você lembra a quantos graus ajustamos a resposta derivada? Barlowe? Ah, ‘pera, lembrei. Foi a 53,7 graus. Como pude esquecer quanto é oito vezes a raiz quadrada de 45? Mas, continuando, sei que somos uma comunidade científica, que somos todos dedicados à lógica e ao conhecimento, mas todo mundo tem que se soltar de vez em quando, certo? ... Certo? Barlowe? Ei, está tudo be— AI!
[Sally bate a cabeça na Timepiece]
SG: Depois de a minha visão clarear, chamei os médicos, mas o Barlowe já tinha partido quando chegaram. Mais importante, minha equipe tinha perdido outro membro, a Timepiece ainda estava quebrada e, aparentemente, ela mata pessoas agora. Ótimo. Foi algo que eu fiz com a máquina? Eu não conseguiria me perdoar se movi uma mola que acabou acertando ele, ou desencadeei uma função raio da morte anteriormente desconhecida. Sei lá, inventar coisas acidentalmente tende a não dar certo pra mim.
[rádio sintonizando]
CHET WHICKMAN (CW): E você não viu nem ouviu ninguém mais entrar?
SG: Não, senhor. Minha cabeça estava debaixo da Timepiece.
CW: Então não viu o golpe mortal de Quentin sendo infligido.
SG: Não vi o– quê? Não.
CW: Por que não me conta o que viu, então?
SG: Não sei, estávamos trabalhando no protótipo, olhei pra cima e ele estava no chão, sangrando.
CW: E há quanto tempo Quentin estava trabalhando com você?
SG: Hoje foi o primeiro dia. Roberts está em Nova York com a mãe, e Wyatt foi visitar uma indústria de transformação de um dos materiais que precisamos. Preenchi a papelada duas semanas atrás. Você deve ter visto.
CW: E, claro, você não atirou nele, certo?
SG: Não, é claro que eu não... ‘pera aí– atirar nele?
CW: Nem acidentalmente?
SG: Não, eu– atirar nele? Estávamos aqui consertando a máquina, todas as portas estavam fechadas! Nem sequer temos uma arma aqui! Como ele poderia ter levado um tiro?
CW: É tudo que estou tentando descobrir, Sally. Então me diga você. Você estava lá.
SG: Isso foi tudo que aconteceu. Virei pra ver ele, bati minha cabeça e fiquei desacordada até quando chamei os médicos. Barlowe levou mesmo um tiro? Achei que tinha sido acertado por uma peça que voou da máquina ou algo do tipo.
[Chet abre um arquivo]
CW: Nosso legista tirou uma quarenta e cinco direto do peito de Quentin. Ele disse que foi atirada de uma 1911 comum.
SG: Uma pistola? Não tinha ninguém perto o bastante pra atirar nele além de mim. Diabos, não tinha mais ninguém aqui além de... oh.
CW: Entendeu por que estou lhe fazendo essas perguntas?
SG: Eu não atirei nele. ‘Pera aí. Isso não é engraçado. Você sabe que não atirei nele.
CW: Então a única outra explicação em que consigo pensar é uma bala mágica.
SG: Chet, me diz que sabe que não atirei nele.
CW: O corpo de um dos nossos no necrotério, e não faço nem ideia do que falar para a esposa dele.
SG: Barlowe era casado?
CW: Sim, com a June? Há uns dois anos?
SG: Oh, eu não sabia.
CW: Você encontrou com eles. Várias vezes. Nós dois já fomos a festas em que os dois estavam juntos.
SG: Oh... sim, fomos mesmo.
CW: Você tem algo que eu possa dizer para ela?
SG: Tipo o quê?
CW: Não sei. Uma explicação perfeitamente plausível para tudo isso.
SG: “Perfeitamente” não é como as coisas funcionam aqui. Você sabe disso.
CW: Então outra coisa. Qualquer coisa.
SG: Eu... eu não tenho nada a dizer. Mas vou descobrir o que aconteceu.
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, domingo, 16 de setembro de 1945. Acabei de voltar do funeral de Quentin Barlowe. Foi... solene não é bem a palavra certa. Quer dizer, em termos de reuniões sociais, funerais são o total oposto de, digamos, partidas de futebol. Mas esse foi... foi só... estranho? Veja bem, nenhum de nós conhecia o Barlowe bem de verdade. Nem Partridge tinha muito a dizer sobre o próprio assistente de laboratório.
[rádio sintonizando; ao ar livre]
ANTHONY PARTRIDGE: Trabalhei com Quentin por quase um ano. Ele... era um homem reservado. Silencioso. Mas sempre dedicado. A habilidade de manter registros dele era fantástica, nunca duvidei da capacidade dele de fazer... ciência. Ele me dava a impressão de ter algo sempre passando pela cabeça. Não sei o que achava que estávamos fazendo aqui. Mas continuou fazendo, então devia acreditar no nosso trabalho.
Padre: Obrigado, Dr. Partridge. Alguém mais gostaria de dizer alguma coisa?
ESTHER ROBERTS: [ao longe] Eu. [ anda em direção ao microfone] Quentin era um homem gentil. Sempre cortês. Sempre apenas querendo não se meter na vida de ninguém. Queria que ele tivesse se metido mais. Queria tê-lo visto mais.
Padre: Isso foi muito amável, Dra. Roberts, obrigado. Alguém mais?
SG: Hm... Eu fui a última pessoa ver o Bar... Quentin vivo. Ele estava ajudando no meu laboratório. Ele... eu não conhecia ele muito bem. Ele parecia... intrometido. No trabalho, aquele dia, ficou o tempo todo colado em mim. Acho que isso indica que era... um dedicado buscador do conhecimento? Eu não... Desculpa, eu achava ele incômodo e um pouquinho medonho. Ele estava tão perto de mim que me surpreendi de ter sido ele a levar o tiro e não eu. Sinto muito pela sua perda, June.
Padre: Bom... Obrigado por falar de coração, Dra. Grissom. Tenho certeza de que todos apreciamos. Acredito que a Sra. Barlowe tenha algumas palavras a nos dizer agora?
[June sai andando; multidão arqueja]
Padre: Sra. Barlowe?
[rádio sintonizando]
SG: Foi um desastre. Não sei o que queriam que eu dissesse. Talvez que sempre apreciei o fato de que Barlowe nunca roubou meu lanche? Ou que a morte dele foi especialmente interessante, de um ponto de vista científico?
... Uou, cara, morrer foi a coisa mais interessante que Quentin Barlowe fez? Isso é pesado.
Mas tenho certeza de que ele tinha família, ou amigos, ou algo do tipo, certo? Todo mundo tem uma história. Todo mundo é uma pessoa. Mas, durante todo o discurso, June Barlowe só me encarou com uma raiva fervente e superfocada. Encarou até as profundezas da minha alma.
Você sabe como é, quando está em uma festa, tentando contar a alguém sobre um tio idiota, gritando por causa do barulho, quando Smash Mouth para de tocar abruptamente, bem na hora em que você ‘tá dizendo uma palavra que soa como um palavrão particularmente ofensivo fora de contexto. E aí, todo mundo para o que está fazendo, vira na sua direção e te encara. Tudo que você poderia dizer depois disso só pioraria sua situação, então você fica lá, feito boba, sem ter o que fazer- repreendida, morrendo de medo de dizer mais qualquer coisa- e ninguém disse nada nos últimos 25 segundos e a saída é do outro lado da sala, então não tem escapatória? Foi esse tipo de olhar que June me deu.
Depois da performance do meu show de uma mulher só– “Sally Destrói o Funeral”– escapuli pro meu assento entre as fileiras de cientistas vestidos de preto. Pensei que a punição de June Barlowe pra mim tinha acabado, mas, conforme saíamos, avistei ela perto das casas e ela ficou me encarando durante todo o trajeto. Saí de lá o mais rápido que pude e fui correndo pra casa. Sei que June não ia me machucar, mas há uma possibilidade de eu ter ficado escondida num canto do meu quarto, enrolada em cobertores por uma hora ou por aí... só pra ter certeza.
Quer saber? Vou provar pra eles. Vou descobrir como ele morreu e mostrar que não foi culpa minha. Só preciso construir... alguma coisa. Alguma coisa que mostre o que realmente aconteceu.
[rádio sintonizando]
SG: Dra. Sally Grissom, diário de experiências, são hm, 2:57 da manhã, já é quinta, merda. Quinta, 20 de setembro de 1945. Esse é o primeiro teste do Projetor de Atividade de Táquios— o PAT. Fiz ele de um nó de matriz de portas, um osciloscópio e um tubo de raios catódicos que peguei emprestados de outro projeto. Bom, ‘tou dizendo que peguei emprestado... me pergunto se notaram. Vou dizer a eles... sei lá. Vou dizer a eles que foi pela ciência. Então, o que eu tenho aqui é um sistema que detecta a atividade dos táquions...
[distorção estática]
SG: ... amplifica essa luz e reproduz ela nessa tela. Na prática, te permite ver o passado. Pelo menos acho que permite. Passei as últimas 67 horas mergulhada em teoria e inalando um monte de vapores de solda, então é hora de colocar meus óculos de cientista e testar essa merda. Espero que funcione. Eu odiaria acabar de volta na Filadélfia.
[PAT liga]
SG: Certo, ainda aqui, ainda inteira, isso é bom sinal. A imagem está focando. E... uou. Aqui está, programei ele pra dez minutos atrás. ‘Tá passando uma imagem surpreendentemente vívida de mim, mexendo com umas ferramentas do banco. Estranho. Mas também INCRIVELMENTE da hora.
[carrinho passa]
SG: Então, essa coisa é bloqueada por localização, porque usa os modelos de estabilização da Timepiece. Custou uma matemática das mais pretensiosas pra sincronizar a coisa toda com o movimento planetário, e eu não queria passar os próximos meses calculando de novo, então meio que só... enfiei lá dentro. Literalmente. Meu ponto é, só dá pra ver onde o carrinho está, e ele está ligado à Timepiece, porque inibidores de campo de Higgs não crescem em árvores.
Ok, certo.. estou convencida. PAT: sucesso total. Agora tenho que trazer o Whickman aqui—
[fita acelera]
CW: Espera um minuto, Doutora. Está me dizendo que construiu uma janela no tempo... com uma televisão?
SG: Do meu ponto de vista, se você vai olhar pro passado, é bom pelo menos fazer isso com um pouco de estilo. Tive que abrir a Timepiece e ligar essa coisa lá, então é melhor tomar cuida—
[Chet liga a tela]
SG: Ei, olha aí, ‘tá ligado.
CW: Está mostrando o que está na nossa frente. Mas é o passado?
SG: 7:27. Foi quando cheguei aqui hoje de manhã. Dá pra me ver abrindo a porta logo ali.
CW: Eu estaria na minha cozinha, tomando café... Isso vai mudar tudo. Sobre sistemas de segurança, sobre comunicação. Tudo.
SG: Podemos manter isso em segredo? Pelo menos por um tempinho. Me dê um tempo pra me assegurar de que isso não seria desastroso demais nas mãos erradas. Ou nas mãos certas. Nas mãos de qualquer pessoa.
CW: Isso é quebrar cerca de meia dúzia de regras. Você precisa mesmo parar de me pedir para guardar todos os seus segredos.
SG: Bom, você devia parar de estar em uma posição pra ser secre- tado.
CW: Secretado? Que nojo, Sally.
SG: [sarcástica] Muito engraçado.
CW: Se essa coisa faz mesmo o que você está dizendo, sistemas de segurança serão apenas uma memória distante. Quem precisa de uma transmissão ao vivo quando pode simplesmente assistir o que aconteceu?
SG: Bom, ele roteia as respostas dos táquions pela Timepiece, então precisa estar ao alcance de um cabo. E, além disso, não tenho certeza de que estou OK com o governo de olho em tudo que já aconteceu depois de 1943.
CW: Eu não me importo. Não tenho nada a esconder.
SG: É o que sempre dizem. Ninguém tem nada a esconder até o Grande Irmão ter uma máquina do tempo.
CW: O Grande o quê?
SG: Meu Deus, vocês ainda não leram 1984? Quem são vocês, homens da caverna?
CW: Desculpa, acho que perdi alguma coisa.
SG: Tem um– só... se você vir um autor chamado Orwell na próxima vez que for a uma livraria, compre um livro dele. E acham que eu sou presciente... Quer ver o que aconteceu com Barlowe ou não?
CW: Estou ansioso para ver sua engenhoca fazer a mágica dela.
SG: E aí você vai me tirar da lista de suspeitos da morte do Barlowe.
CW: [ri] Doutora, você não pensou mesmo que estava sendo investigada sobre isso, pensou?
SG: Não, eu... ‘pera aí, o quê?
CW: Eu soube que você não tinha matado o Barlowe no momento em que me falou que não tinha. Não é burra o bastante para mentir daquele jeito de cara. E, além disso, se realmente suspeitássemos de você... não sei se essa conversa seria tão amigável. Está me dizendo que fez tudo isso porque achou que era suspeita de assassinato?
SG: Bom... talvez um pouquinho. Um tiquinho só. Passei três noites seguidas em claro. Nada demais.
CW: Só me leve até a cena do crime e, depois, devia ir dormir um sono.
[Sally ajusta o PAT para o tempo certo]
SG: Certo, ‘tou ajustando ele pra última sexta. Que horas eram? Segundo as informações disponíveis, sei que ‘tava no fim da manhã, mas eu não ‘tava checando meu relógio quando Barlowe caiu.
CW: Baseado no seu testemunho, evidência médica e nossa própria investigação, concluímos que aconteceu aproximadamente às 11:34. Nossa, o que eu não daria para ter uma filmagem de qualquer lugar, a qualquer hora. E eu achando que um circuito fechado de TV era chique. Essa coisa transmite som também?
SG: Whickman, a imagem já é o bastante. Sonhe um pouco menos.
CW: Ei, sou só um segurança. O que eu saberia das suas engenhocas científicas?
[ajustando o PAT]
SG: OK, estou começando de depois do evento e indo de trás pra frente– ali estão os paramédicos indo socorrer o corpo do Barlowe no laboratório, descendo ele e indo embora, ali estou eu ligando pra eles não voltaram, gritando e daí voltando a trabalhar, a poça de sangue volta pro Barlowe–
CW: Já entendi, Doutora. Você está indo de trás para frente. Pule para o fim.
SG: OK, aqui está. Avançando um segundo por quadro, Barlowe está de pé, Barlowe está de pé, e está caindo no chão.
CW: Espero não ter esse olhar na minha cara quando morrer.
SG: ... Não seja atingido por uma bala vinda do nada?
CW: Vou colocar na minha lista. Dá para conseguir uma imagem mais precisa?
SG: Vou desacelerar pra um décimo de segundo por quadro.
[PAT estala como se tivesse mudando slides]
CW: Espera— ali. É a bala. Vire o carrinho de lado. De onde ela foi atirada?
[carrinho andando]
SG: Parece que... do nada.
CW: Continue voltando.
[clica clica]
SG: E aí... ela desaparece.
CW: Como isso sequer pode acontecer?
SG: Vou ajustar o mais precisamente que consigo com esse protótipo. Vamos chegar aos microssegundos.
[só um monte de cliques, você entende a ideia]
SG: ‘Tá lá, e aí não ‘tá. [clica] Lá, [clica] e aí não.
CW: Mas de onde ela veio? Não creio que balas simplesmente se materializem do nada. Não ainda, pelo menos. Sua máquina fez isso?
SG: Provavelmente.
CW: Mas a bala chega a velocidade máxima! Alguém tem que tê-la atirado, certo?
SG: Sei lá. Minha caixa só vê o passado. Se a bala veio mesmo de uma ativação da Timepiece, tem que ter sido atirada do futuro relativo à última sexta. Além disso, a morte de Barlowe causou mudanças na linha do tempo... não tem jeito de saber de onde a bala original veio, ou que circunstâncias levaram ela a ser atirada.
CW: Está dizendo que não faz ideia?
SG: Até onde os princípios científicos fantasticamente teóricos com que tenho me virado nos últimos dois anos vão, sim, quer dizer, sabemos onde, porque a Timepiece não move nada no espaço, mas isso é tudo que posso te dizer. Todo o resto é dedução. Estilo detetive temporal.
CW: Estilo o quê?
SG: Bom, sei que não depende de mim, mas acho que devíamos tentar impedir quem quer que vai atirar a bala no Barlowe de atirar ela. Se a pessoa sequer quer atirar nele ainda.
CW: Mas não dá pra saber quem foi antes de a cena do crime acontecer.
SG: Certamente é um caso mais difícil que seu assassinato habitual.
CW: Então... é isso? Vamos para casa e esperamos que ninguém cometa um assassinato que não possamos resolver?
SG: Infelizmente.
CW: Isso está errado... parece que estamos desistindo. Odeio isso.
SG: Além disso, podíamos revistar todo o pessoal que fica perto do local de teste, ver se estão armados.
CW: O protocolo exige que toda a equipe de segurança carregue uma pistola de serviço enquanto estiver no trabalho. Estou armado agora.
SG: Você não ‘tá quebrando meia dúzia de regras só de estar aqui?
CW: Sim, mas certamente não serei eu a atirar no Dr. Barlowe.
SG: Nenhuma arma significa que Barlowe não pode levar o tiro.
CW: Algo que já aconteceu.
SG: Bom, se você insiste em olhar pra coisa tão linearmente...
CW: Está dizendo que se banirmos armas vamos o quê? Trazê-lo de volta à vida?
SG: Nem a pau, mas alguma outra versão do Barlowe ainda pode sobreviver.
CW: Mas aí, é claro, você nunca vai construir sua TV-temporal como consequência.
SG: ‘Tá vendo como essa linha de pensamento rapidinho sai do controle? Olha, ou o Barlowe leva o tiro, ou não leva. De qualquer forma, da nossa perspectiva, ele ‘tá morto. Minha solução mantém ele vivo em algum lugar no espaço-tempo. Sem armas, sem balas, ninguém leva tiro.
CW: Qual é a causa, e qual é a consequência?
SG: Meu problema é que fico encarando elas na ordem errada.
CW: Você é uma mulher e tanto com quem se trabalhar, Doutora. Estou tonto.
SG: Bem-vindo ao clube.
[rádio sintonizando]
SG: Então, descobrimos que não fazíamos ideia de quem tinha atirado no Barlowe. A bala veio do nada, então tudo que podíamos dizer é que vinha do futuro. Ah, é mesmo! Não se esqueça, Sally: Nova ideia: Detetive temporal. Bom, daí, eu ‘tava sozinha no laboratório tinha algumas horas, depois de o Whickman sair, porque ainda tinha perguntas que precisavam ser respondidas.
[rádio sintonizando; PAT ligado, carrinho andando]
SG: E ali estou eu, debaixo da Timepiece, e Barlowe está bem aqui, então o tiro veio do... Ei, que isso—
[porta do galpão abre e fecha]
SG: Olá?
[passos]
SG: Sabe que posso te ouvir, ‘né? Não sou muito fã desse joguinho todo de “entrada dramática”.
JUNE BARLOWE (JB): Está na hora de termos uma conversa, Sally.
SG: O qu- AI!
[Sally acerta a cabeça na Timepiece de novo. Comédia. ]
SG: June Barlowe! Eu- merda, toda vez! Quem te deixou entrar aqui?
JB: Eu mesma.
SG: Eu, uh, assumo que essa não é uma visita social?
JB: Posso lhe dizer o que apareceu na minha porta hoje de manhã?
SG: Leite? Um velho primo? Um cachorro perdido? Alguma quarta coisa antes de você inevitavelmente me contar de qualquer forma?
JB: Uma carta e um pacote. A carta, direto da mesa do Diretor, dizia que eu tinha 48 horas para desocupar minha casa aqui em Polvo. Sem o Quentin, evidentemente não tenho o direito de continuar vivendo aqui. Ninguém me disse uma palavra diretamente. A campainha tocou, e foi isso. O pacote continha chaves para a minha nova casa, trezentos dólares e todos os papéis que jamais poderia precisar como preparação para minha nova vida.
SG: Sua nova vida?
JB: Estão me fazendo assumir uma nova identidade. É para a minha “proteção”. Ninguém realmente sai de Polvo. Levam indenização a sério aqui. Agora sou Alice Hayworth de Carlsbad, Novo México. Já ouviu falar de Carlsbad, Sally?
SG: Não... não posso dizer que já.
JB: Eu também não! Tenho certeza de que é uma graça de cidade. Alice Hayworth ama lá, mas não estou certa sobre mim!
SG: Não sei onde você quer chegar com isso. O que isso tem a ver comigo?
JB: Você? Você matou meu marido! Você matou o homem com quem dividi os dois anos mais felizes da minha vida, e agora sua operação está me tomando meu próprio nome!
SG: OK, ‘pera aí, só um instante. Primeiro, não matei seu marido, nem de longe. Segundo, por favor, nunca pense que a ADRA é “minha operação”.
JB: Não minta para mim, Sally, por favor. Não tinha mais ninguém na sala. Você atirou no meu marido a sangue frio. E agora estou sendo mandada para longe para acobertar seus crimes.
SG: Não! Não foi isso que aconteceu!
JB: Não foi? Então o que está acontecendo, Sally? O quê, você estava dormindo com ele?
SG: Uou! Nem pensar. June, você precisa se acalmar.
JB: O que você está fazendo, Sally? Acha que sou idiota? Sou só mais uma qualquer para você.
SG: Não, você... você é a June! Você é parte da cidade. Você...
JB: Diga qualquer coisa. Diga uma coisa que saiba sobre mim. Diabos, diga uma coisa sobre o Quentin.
SG: Bom, você fez ótimos canapés de cogumelo na festa de quatro de julho–
JB: Cale sua merda de boca agora. É isso que pensa de mim? Você me define pela comida que faço? Eu nem cozinho muito. Você acha que sou uma dona de casa dispensável! Não liga para pessoas como eu!
SG: June, eu não penso assim! Sinto muito mesmo pelo que houve com o Quentin. Mas eu não estava dormindo com ele. E certamente não matei ele.
JB: Pode mentir o quanto quiser, Sally. Não importa o que você diz, porque vai consertar tudo.
SG: Tudo bem! Posso falar com o Donovan. Tenho certeza de que consigo acertar as coisas com ele. Você não vai precisa mudar sua identidade, pode ficar em Polvo, perto do... perto do seu marido.
JB: Não, vamos consertar isso. Eu e você. Aqui e agora. Com sua máquina do tempo.
SG: [balbucia] Não, por que você– Isso não é– Do que você ‘tá falando–
JB: Você acha mesmo que sou idiota, não acha? Sei no que o Quentin estava trabalhando. Eu era casada com ele. Sei o que essa coisa faz. Vocês a chamam de Timepiece, para mim é uma imitação barata do Wells.
SG: ‘Pera aí, isso não é justo. A máquina dele ia pro outro lado.
JB: Eles voltaram no fim, OK? Só fique quieta! Você vai pegar essa máquina, vai voltar para a semana passada e vai consertar tudo o que quebrou.
SG: Não posso só fazer um passeiozinho pra semana passada. A Timepiece mal funciona. Deus, estava quebrada quando Quentin...
JB: Quando Quentin o quê?
SG: Não sei se um tecido vivo sobreviveria à viagem com a máquina como está agora. E mesmo se eu voltasse, não sei como pararia o que aconteceu.
JB: Bom, quando estiver lá, você me conta.
SG: É isso que estou dizendo! Eu estava lá! Quem sabe o que aconteceria se tivesse duas de mim no mesmo lugar, ao mesmo tempo? Aqui, olha!
[Sally ajusta o PAT para a morte de Quentin, carrinho anda]
SG: Aqui, ali está o seu marido, logo antes de morrer. Essa máquina mostra o passado. Ele está bem ali, e eu estou bem ali, trabalhando debaixo do protótipo. Como eu poderia ter atirado nele?
JB: Como isso... Mesmo se não atirou, você é responsável por consertar tudo.
SG: Sinto muito, June, mas não posso fazer isso.
JB: Não pode, ou não vai?
SG: Nenhum? Os dois?
JB: Se coerção não funciona, talvez ameaças o façam.
[June tira uma arma da bolsa e a engatilha]
SG: June, não, Por favor, guarde isso. Você vai—
JB: Você vai ligar a máquina, vai nos levar de volta para semana passada e nós duas vamos salvar meu marido. Ou eu posso lhe matar aqui e agora. A escolha é sua.
SG: Vamos sair de perto da máquina, largar a arma e conversar sobre isso um instante. Você não sabe o que está fazendo.
JB: Juro por Deus, ou você nos manda para lá agora ou meto uma bala no seu peito!
SG: Escuta– o que aconteceu, aconteceu. Como você pode viver quando o passado é tão incerto quanto o futuro?! Não estou mais no controle da vida e da morte que você–
JB: Mas você está! Você construiu essa coisa que promete consertar tudo que um dia foi quebrado, e só a deixa parada? Com medo demais para fazer qualquer coisa com esse poder, porque teme que pode acabar se arrependendo? Você tem a causalidade na palma das suas mãos e fica esbanjando seu domínio sobre ela a cada segundo que passa com suas teorias e anotações.
SG: Uh, acho que você quis dizer “desperdiçando”.
JB: POR QUE VOCÊ NÃO CONSEGUE LEVAR ISSO A SÉRIO?!
[June atira; bala viaja no tempo]
SG: ... Oh não. Ah, cara, vou passar mal.
JB: Eu atirei em você. Acabei de atirar em você. Para onde a bala foi?
SG: Olha o monitor.
[Sally avança o PAT]
JB: O quê? Mas isso não... não é...
[Chet entra; June desaba no chão, chorando]
JB: Não posso... Não posso...
CW: Sally?
SG: Chegou uns segundos atrasado, Oficial Whickman. Ou bem na hora, dependendo do seu ponto de vista.
CW: O que aconteceu aqui?
SG: Lembra mais cedo, quando estávamos falando sobre causas e consequências?
CW: Como assim?
SG: Foi ela. Ela atirou no próprio marido.
CW: O quê?
[Chet pega a arma]
CW: Como ela sequer conseguiu isso?
SG: Ela só queria o marido de volta. E agora é a razão de ele ter falecido.
CW: É arrogância.
SG: Não, arrogância é para os reis. O resto de nós só ganha ironia cruel.
[rádio sintonizando]
SG: [suspiro] É um equívoco comum pensar que o tempo desacelera em um momento de estresse extremo. É verdade que sua amígdala gera uma resposta no seu hipotálamo, causando uma descarga de adrenalina da sua glândula adrenal, mas isso já foi provado ser uma ilusão. Você lembra do evento mais devagar por suas memórias nebulosas dele. Mas eu assisti à arma de June Barlowe atirando a bala que eu tinha passado dias procurando. Me lembro claramente do vagaroso rodar do tambor, no instante em que explosão da pólvora mandava a bala direto pra minha cara. E, por um breve momento, esqueci da Timepiece, de Quentin Barlowe e Polvo e 1945. E fiquei com medo. Quando o inibidor de campo de Higgs que o PAT usa puxava a bala pra semana passada, o medo se foi e se tornou um vazio do meu estômago, me deixando sem escolha senão assistir a tragédia que eu achei que estava tentando prevenir, não provar. Mas salvou minha vida. Não consigo acreditar que é a primeira vez que alguém tenta me matar por dar uma de espertalhona.
Segundo o que tudo indica, é um loop agora. Quentin é morto pela bala de June, eu invento o PAT, estabelecendo as condições pra que a viúva de luto Barlowe venha e cause sua própria ruína. Mas, depois de tudo isso, ainda tem uma coisa sobre a qual não tenho certeza. Quem atirou a primeira bala? Sei que a June torna a situação recursiva, mas a primeira bala não tinha razão nenhuma pra estar ali. Tinha uma linha do tempo em que Barlowe não tinha morrido semana passada, e a bala veio de outro lugar. De outro tempo, desculpa. Mas acho que nunca saberemos. Não acho que teremos acesso a essa versão. Isso só vai continuar me incomodando pra sempre.
[rádio sintonizando; Timepiece funcionando]
CW: Com licença, Dr. Barlowe?
QB: Oficial Whickman, como posso ajudá-lo?
CW: Sinto muito, Quentin, mas vou precisar lhe fazer algumas perguntas.
QB: À vontade.
CW: Bom, elas são um pouco pessoais.
QB: Como assim, pessoais?
CW: Dr. Barlowe, qual era o nome da primeira garota que você beijou?
QB: June. Você conhece a June.
CW: Não, eu não quis– bom, sabe, estou falando de coisa de primeira série. Só o nome.
QB: Não sei o que você está insinuando, mas nunca fiz nada com ninguém além dela.
CW: Tudo bem. Só preciso fazer algumas perguntas.
QB: Se quiser uma lista detalhada de cada garota que acompanhei até a casa dela—
CW: Quando você era criança, qual colega você odiava mais na escola?
QB: Qual colega eu o quê?
CW: Você sabe, o garoto da sua sala que você odiava mais que tudo no mundo. Não suportava a cara dele. O motivo do ressentimento já foi esquecido há muito tempo– ele dedurou você, ou talvez você tenha o dedurado; não importa. Tudo que ele dizia e fazia era vil...
QB: Está me perguntando sobre minhas rixas de infância?
CW: Quem foi para você? Tudo bem, todo mundo teve uma. Só desembuche. Não precisa hesitar—
QB: Darren Little. Nossa, não penso no quanto odeio aquele garoto há décadas. Ele era da minha sala na, quando foi, terceira série? Era um garoto terrível. Sempre me derrubava quando eu passava perto da carteira dele. Jesus, estou mesmo desejando mal a um garoto de nove anos...
CW: E que escola você frequentava quando conheceu o Darren? Não deve ser muito difícil. Deve lembrar o nome da sua escola de ensino fundamental, certo?
QB: Uh, deixe-me pensar, o nome dela era, hm...
CW: Imaginei. Quando fui designado para Polvo, pensei que era hora de atualizar a inspeção de segurança de todo mundo. E aí, cheguei em você.
QB: Olha, não sei onde você quer chegar–
CW: Quentin Barlowe não existe. Tenho que admitir, fizeram um trabalho de primeira. Você tem formulários fiscais, históricos escolares, seu currículo é tão detalhado que chega a ser suspeito. Mas papéis não fazem uma pessoa; você não existia antes de 1943.
QB: Eu informei vocês quando consegui o emprego– houve um incêndio, a casa em que morei na infância–
CW: Oh sim, eu me assegurei de checar isso. Não houve um único incêndio que se encaixasse na descrição que você deu na área de Evanston, Illinois. Fui até as escolas que você clama ter frequentado. Nenhum registro de Quentin Barlowe. Até rastreei todo Barlowe e todo Quentin que pude encontrar, só para ter certeza. Você subestimou meu rigor. Você subestimou nosso rigor. Sua esposa fazia parte da farsa também?
QB: Não, June é real! Whickman, precisa prestar muita atenção em mim. Não é o que parece.
CW: Parece-me que você é um espião.
[Chet ergue a arma dele]
QB: Ei, ei, não há necessidade nenhuma de tomar medidas drásticas, OK?
CW: Para quem você trabalha? Os japas? Os Krauts? Ou os russos já se viraram contra nós?
QB: Não sou um deles! Trabalho para vocês! Oficial Whickman, por favor, tem que acreditar em mim! Certo, eu menti sobre o meu passado. Sobre de onde vim. Mas juro por Deus e tudo que é sagrado que não estou trabalhando para mais ninguém. Sou um homem da ADRA, total e inteiramente, estou do lado de vocês!
CW: Eu... Eu acredito em você.
QG: ... Você acredita? Sério?
CW: Você soa sincero. Tenho uma boa intuição para esse tipo de coisa.
QB: Oh, obrigado! Obrigado!
CW: Mas também tenho ordens.
[Chet atira duas vezes; um tiro acerta Quentin, outro atravessa o tempo; Quentin grunhe, cai no chão]
CW: Uma de duas balas? A essa distância? Está ficando enferrujado, Chet.
[gravador de fita desliga]
#ars paradoxica pt-br#ars paradoxica#tradução pt-br#deixei as falas da sally mais informais um pouco dessa vez#devo passar ajustando os capítulos anteriores em breve
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03: Trinity, Ato II
[gravador de fita liga; carro dirigindo]
CHET WHICKMAN (CW): Então... Você está com raiva de mim. Eu entendo.
SALLY GRISSOM (SG): O que te deu a impressão de que ‘tou com raiva de você?
CW: Bom, primeiro, você está com uma careta igual a de uma criancinha birrenta e, segundo, não falou comigo nenhuma vez desde que entramos na estrada. Tentei lhe dar um espaço, mas poderia dizer alguma coisa antes de chegarmos lá?
[rádio sintonizando; hotel]
CW: Meus homens e eu estamos aqui para levar vocês de volta a Polvo, sob ordens do Diretor Donovan.
SG: E você é...?
CW: Não se lembra de mim?
[rádio sintonizando; carro]
SG: Tenho o direito de ficar brava quando estou sendo presa e acusada de traição por tirar um dia de folga.
CW: Só tecnicamente. Estou apenas lhe levando de volta para casa.
SG: Bom, agora que o silêncio está quebrado, do que você quer falar?
CW: Não sei. Da última vez que nos falamos, você estava um pouco amarrada– literalmente, se me lembro bem. Como está?
[rádio sintonizando; hotel]
SG: Você estava no Eldridge!
CW: Isso mesmo. Chet Whickman. É um prazer lhe ver de novo.
[rádio sintonizando; carro]
SG: Desde então, parece que fui de amarrada à presa.
CW: Você sabe que não pode só sair. Tudo que você diz, tudo o que faz, pode ter consequências catastróficas. Você foi classificada como segredo nacional.
SG: Eu sei disso, eu sei... É só...
CW: Está chateada porque dei um pronto das suas férias?
SG: Mais chateada com o fato de que estou confinada a trabalhar pra um cara que pode enviar seus capangas a mil quilômetros de distância em um estalar de dedos.
[rádio sintonizando;hotel]
CW: Teve sua noite de farra no cassino, agora é hora de voltar para casa.
SG: Vocês sabiam que tínhamos saído?
CW: É claro que sabíamos. Sabíamos que estavam saindo antes mesmo de saírem da base. O Diretor Donovan me enviou para ficar na cola de vocês uma hora depois de fugirem.
SG: Então só nos deixaram vagar por Vegas até se entediarem? Não têm nada melhor pra fazer?
CW: Senhora, por favor, não questione a cadeia de comando. O Diretor não tinha que lhes deixar sair, mas ele gosta de dar um pouco de liberdade aos seus subordinados. Imaginei que, depois do seu pequeno encontro com a segurança do cassino, provavelmente era uma boa ideia extrair vocês do local.
[rádio sintonizando; carro]
CW: Poxa, Dra. Grissom, não sou um capanga qualquer! Temos uma ligação. Eu estava lá quando você apareceu do nada. Bom, não do nada, mas 20█ é o mais próximo do nada que se dá para conseguir. E estou aqui para levar você de volta para casa em segurança.
SG: Se me lembro bem, quando nos conhecemos, você era só um humilde marinheiro do outro lado do país.
CW: [ri] Bom, depois da Filadélfia, fui promovido e transferido. Normalmente, aumentam seu acesso a informações quando você vê demais, e acabou que o que sei, o que vi, significava que eu precisava fazer algo diferente. Não estou dizendo que me encapuzaram e me mandaram para o outro lado do país, mas sem dúvida foi como me senti.
SG: Nada disso me é estranho. Essa não é primeira história de como meu aparecimento em 1943 virou a vida de alguém de cabeça pra baixo.
[rádio sintonizando; hotel]
SG: Não acredito.
CW: Se vier comigo agora, prometo que não se meterão em nenhum problema.
SG: DEFINITIVAMENTE não dá pra acreditar nisso.
CW: Certo, certo, em nenhum problema em que já não estejam metidos. Vocês têm o Juízo Final na terça, não achavam mesmo que podiam sair aos 45 do segundo tempo para apostar com prostitutas pelo final de semana, achavam?
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Na verdade, a lei de prostituição de Nevada–
HELEN PARTRIDGE (HP): Anthony!
[rádio sintonizando; carro]
CW: Troquei mar infinito por areia infinita, e meus pés nunca se sentiram tão firmes. O Diretor Donovan não costuma adotar uma estratégia administrativa tranquila. Sempre sacode as coisas no momento em que você fica confortável. Nunca é entendiante. E pelo menos o risco de afogamento é bem menor aqui.
SG: Bom, não estou confortável ainda, então acho que ‘tou segura, por hora.
CW: Você me pareceu bem confortável lá. Tem amigos, uma casa, um emprego, e ouvi que sua pesquisa com a Timepiece é revolucionária. Eu mesmo não entendo nada dela, mas sei que está anos à frente de qualquer coisa que o mundo já tenha visto.
SG: Tenho um amigo. E dois assistentes de laboratório. Tenho uma... masmorra de quarto, e um trabalho que trata uma folga como uma fuga. Sou uma prisioneira, nós dois sabemos disso.
CW: Nada nesse mundo é de graça. Sally. Você devia saber disso. Levando tudo em consideração, está muito bem aqui. Você gosta de fazer essas coisas engenhosas de ciência, certo? Acha que algum outro lugar no país vai contratar alguém com um diploma do futuro? Estaria internada em um hospício agora se não estivesse conosco. Só uma moça sem-teto louca na Filadélfia, insistindo que é do futuro.
SG: ‘Tá me dizendo que seria pior pra mim se o Donovan não me mantivesse presa?
CW: Estou dizendo que Polvo lhe dá um salário, uma casa, e um bom objetivo.
SG: Não um que eu tenha escolhido.
CW: Talvez não, mas aposto um níquel que é o mais realizador que poderia achar em 1945.
SG: Então talvez 1945 é que seja o problema.
CW: Bom, você é a cientista, não é? Não consegue descobrir como voltar para casa?
SG: Segundo os maiores especialistas no assunto, o melhor jeito de voltar pro séc.XXI é esperando cinco décadas e meia.
CW: Por quê?
SG: A Timepiece, nosso inibidor do mecanismo de Higgs, foi feita pra fazer coisas levitarem, não pra mandar elas de volta no tempo. E, por causa do Projeto Arco-íris, só posso viajar pra trás no tempo. Só funciona pra viagens de ida.
CW: É sempre assim com vocês gênios. Tentam fazer um aerodeslizador e acabam com uma máquina do tempo. E se construíssem outra máquina para avançar no tempo?
SG: É alavancar uma série de acidentes científicos pra alcançar um resultado bem específico. Os princípios que governam esses fenômenos são no mínimo nebulosos. Pode acreditar, o único caminho pra casa é esperar.
CW: Isso é pura injustiça, Sally. Sinto muito mesmo.
SG: Valeu, Whickman.
[pneu estoura; carro derrapa, desacelera, para, desliga]
CW: Uou, uou, uou!
SG: Que houve?
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 15 de julho de 1945. O Oficial Whickman foi ao hotel pra nos prender e levar de volta pra Polvo. Tínhamos passado da metade do caminho quando dois dos caminhões que ‘távamos dirigindo passaram por cima da mesma rocha pontuda. Estamos presos no meio do deserto. É isso... Eu... Fim desse registro. Sei lá.
[rádio sintonizando]
HP: Como assim, ficar aqui?
CW: Sinto muito, senhora, é o protocolo oficial. Ninguém além de nós pode sequer saber que estamos aqui. Tenho que mandar os outros homens primeiro, e estarão de volta para nos buscar amanhã de manhã. Não cabemos todos com eles, então acamparemos nos outros caminhões hoje à noite.
HP: Isso é absurdo.
AP: Não vai ser tão ruim, querida. Oras, pode ser até bom passar a noite sob as estrelas. Não fazemos isso há, o que, quatro anos? Desde que estávamos namorando.
HP: É, acho que sim...
SG: Eu gostaria de voltar com os soldados, por favor.
CW: Sinto muito. Dra. Grissom, mas tenho ordens estritas para não tirar os olhos de você. Doutores Wyatt, Roberts e Barlowe, estão livres para voltar para Polvo.
ESTHER/JACK/QUENTIN: Bom, se você vai ficar, Dra. Grissom/ Não tenho nada urgente para fazer lá/ Até que não está nada mal aqui/ Eu devia ficar.
SG: Pessoal, tudo bem. Só porque tenho que ficar aqui não significa que vocês também têm. Voltem pra casa.
ESTHER/JACK/QUENTIN: OK, ótimo/ Maravilha/ Preciso mesmo voltar para lá.
[os três saem]
AP: Então... alguém tem marshmallows?
CW: Esse é o espírito!
[rádio sintonizando; Chet acende uma fogueira]
CW: Isso deve servir.
AP: Está uma bela noite, não é?
HP: Está bem nublado. Estava esperando ver mais estrelas.
SG: Parece que vai chover antes de amanhecer.
HP: Oh, que pena.
AP: Olha só o que encontrei na minha mala!
[vinho balançando dentro da garrafa]
SG: Isso é uma garrafa de vinho?
AP: Não uma garrafa qualquer. É um Bordeaux ’28.
HP: Oh, Anthony, não acredito!
SG: Não acredita em quê?
HP: É a garrafa do nosso primeiro encontro!
CW: Oh, fantástico!
[Anthony abre a garrafa, serve o vinho em xícaras]
AP: Ela era a cantora de uma banda de jazz em um barzinho no centro da cidade, o Soft Note. Eu costumava ir até lá para trabalhar. Nunca gostei de trabalhar em casa, ou em bibliotecas. Então levava meus livros para o Soft Note e fazia meu serviço lá. Mas, claro, nunca conseguia ser produtivo quando Helen estava cantando.
HP: Ele costumava se sentar em uma cabine nos fundos, escondido atrás de uma pilha de cadernos e livros, e me encarar enquanto eu cantava. Eu o notava e tentava conversar com ele, mas era tão tímido...
AP: Então, quando comecei a trabalhar para o governo, convidei-a para sair.
HP: Ele tinha acabado de receber o primeiro pagamento, e me levou para um restaurante incrível, uma gracinha. Os pratos, as mesas, a decoração, tudo sobre ele gritava “luxo”.
AP: Devo ter gastado meu salário inteiro naquele jantar.
HP: Durante todo o jantar, ele ficou contando empolgado sobre novo emprego. Prometeu que mudaria o mundo para melhor.
AP: Então comprei essa garrafa de vinho ridiculamente cara, e jurei que usaria meus conhecimentos para melhorar o mundo.
HP: Estava juntando poeira no armário desde então. Não acredito que a trouxe com você!
AP: Eu ia fazer uma surpresa para você, mas a chance nunca veio.
SG: Então por que beber ela agora?
AP: Agora me pareceu um momento tão bom quanto qualquer outro. Estamos fazendo o trabalho que eu pretendia fazer quando a comprei, e estou cercado pelas pessoas envolvidas. Oficial Whickman pelo governo, Sally pela ciência, Helen pela minha paixão.
SG/CW: Saúde!
[fita acelera]
HP: Acho que vou me recolher. Já passou bastante da minha hora de dormir. Não fiquem acordados até muito tarde.
AP: Não ficaremos.
SG: Não se preocupe, agora mesmo eu vou também.
[Helen sai]
AP: Pela sua cara, parece que você está precisando de uns vinte anos de sono.
SG: Os últimos dias foram difíceis, só isso.
AP: Estou para lhe perguntar sobre isso há um tempo. Quando abandonei meu projeto, estava modelando sistemas de previsão, e agora... não faço a menor ideia do que você está fazendo. Do que sua máquina realmente faz.
SG: Bom, já tem um tempo que estamos tentando descobrir justamente isso.
AP: Você não sabe como funciona?
SG: Ei, Fleming não sabia que estava inventando a penicilina, sabia? O protótipo da Timepiece no hangar, ele foi construído de partes da minha máquina. A que trouxe de volta pro passado— Quer dizer... pro agora.
AP: Certo. O que ela fazia antes, então?
SG: Eu estava trabalhando numa máquina que, em teoria, desprenderia corpos do campo de Higgs—
AP: Do-do campo de quem? Higgs?
SG: Oh, um... É... vamos só chamá-lo de um campo-âncora. E é esse campo-âncora que dá massa às partículas. Eu queria criar uma matriz de portas de que o negasse.
AP: Anti... matéria? Negar a gravidade?
SG: Essa era a ideia.
AP: Como você foi de antigravidade à viagem no tempo?
SG: Você trabalhou no Projeto Arco-íris?
AP: Só nos estágios iniciais. Nunca subi a bordo do Eldridge.
SG: Bom, acabou que vocês inventaram a coisa errada acidentalmente também.
AP: Um aparelho que camuflaria um navio de guerra distorcendo a luz em volta dele.
SG: Bom, funcionou bem até demais. Distorcia a luz em torno do navio– junto com todo o resto. Nunca se sustentou por tempo o bastante para causar danos a longo prazo, mas nos poucos instantes que o aparelho Arco-íris funcionou, ele criou um poço que distorceu enormemente as regiões do espaço-tempo próximas. E aquele momento provou atrair qualquer coisa que por acaso estivesse solta por perto, em termos de relatividade.
AP: E isso inclui você, █ anos depois.
SG: Exatamente. O Eldridge é como um imã pra os objetos afetados pelo campo inibidor.
AP: Então quando um objeto é afetado pela sua máquina, volta para a Filadélfia em 1943?
SG: Esse é o princípio que estamos explorar com a Timepiece.
AP: E se houver um jeito de modular a–
SG: Modular a aceleração para tornar viagens de volta no tempo para um momento específico possíveis? Bem-vindo à nossa empreitada.
AP: E eu pensando que Manhattan era o mais avançado que tínhamos. Dane-se a bomba, vocês estão construindo uma máquina do tempo de HG Wells na vida real. Como você leva o movimento planetário em conta? Você sabe, a Terra gira em torno do sol a trinta quilômetros por segundo, como vocês se asseguram de não irem parar no meio do espaço?
SG: Essa é a nossa maior questão grande parte do tempo. Wyatt e Robets passaram o Quatro de Julho deles sincronizando a aceleração da Timepiece com a da Terra.
AP: Não é de se admirar que estejam cansados. Deus os abençoe.
SG: Mas dar à máquina um modo de processar essas instruções tem sido difícil.
AP: Complicadas demais?
SG: Bom, não é querendo me gabar, mas de onde eu venho, nossos computadores são bem melhores nesse tipo de coisa. Não me importo de passar umas horas a mais esperando nossas respostas serem computadas, mas ter que enviar os dados à Harvard pra conseguir uma leitura de cartão perfurado?
AP: Suspeito que você não seja lá um grande artesão. Artesã.
SG: Você não tem noção. Provavelmente acha que 20█ tem quilômetros de prédios cheios de tubos a vácuo.
AP: Sei que alguém já vai ter inventado uma máquina de Turing eletrônica a esse ponto. Vão caber na sua casa. Já entendi.
SG: [ri]
AP: Então, como você vai apresentar isso para o Comitê?
SG: Não faço a menor ideia. Estou empacada. Ou coloco eles mesmos pra viajar no tempo, ou... Faço algum tipo de truque elaborado que pareça legal, mas que na verdade não mostre nada da máquina? Não sei. Acho que vou dormir e pensar mais um pouco.
AP: Você vai conseguir, Sally. É boa no que faz.
SG: Fala isso pro Comitê.
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 16 de julho de 1945. Em casa de novo. A noite no deserto foi divertida. Produtiva, acho. Resolvi o que apresentar pro Comitê. Mas, mais importante do que o que fizemos ontem à noite, foi o que fizemos o hoje de manhã. Hoje de manhã, vimos o mundo mudar.
[de manhã no deserto]
CW: Sally! Sally, acorda!
SG: [sonolenta] Mrrm, o que foi? Já chegamos?
SG (diário): Whickman nos acordou pouco depois das cinco. Me disse pra sair do carro. Disse que ficou culpado por...
CW: ... Fiquei culpado por dar um fim prematuro às suas férias, então pensei que deixaria que vissem algo especial. Venham comigo.
AP: [boceja] O que houve? Aonde estamos indo?
CW: Para o meio do deserto. Já vai começar, corram!
SG: O que já vai começar?
SG (diário): Paramos em um desfiladeiro a uns cem metros dos caminhões. O mundo ainda não tinha acordado. Tinha acabado de chover, e o ar estava carregado de petricor.
CW: OK, pessoal, mantenham os olhos no horizonte.
HP: É para olharmos para quê?
CW: Só espere um pouquinho.
SG (diário): Chet checou seu relógio. Deu algumas batidinhas no visor, contando os segundos para a detonação. E então...
SG: Uou!
SG (diário): Em um instante, o céu se acendeu. Conforme o núcleo de plutônio da Trinity alcançava massa crítica, a emissão resultante de calor e luz transformou noite em dia. Houve um brilho ao longe na direção de Alamogordo, refletido pelas montanhas à nossa volta. Foi tão brilhante que tentei desviar meus olhos, mas algo profundo e primitivo dentro de mim não me deixava. Eu tinha visto filmagens da explosão, mas não podiam ter me preparado para vê-la de fato. Elas nunca conseguiam capturar as cores. Vermelhos e amarelos mais brilhantes do que eu jamais havia visto. Traços de violeta e verde escalavam a coluna ardente até o topo do cogumelo, aquela maldita nuvem que estará sempre associada à capacidade de auto-destruição da civilização. Agora somos todos filhos da puta. Levou um minuto para o som nos alcançar.
[explosão nuclear de vinte quilotoneladas]
SG (diário): O chão tremeu. Cobri meus ouvidos para atenuar o rugido da fissão nuclear convertida em arma. Então, a coluna se dissipou, dissolvendo-se no pôr do sol roxo-hematoma. Tinha acabado. As reações gêmeas de terror e admiração no rosto de Whickman, a alegria desenfreada no de Partridge, o choque e o terror no da esposa dele... Depois da explosão, acho que nenhum de nós disse nada. Cerca de uma hora depois, os soldados nos buscaram e levaram de volta. O jornal daquela noite falou algo sobre um detonamento de explosivos, mas todo mundo em Polvo sabia o que estava acontecendo. Era o começo de uma nova era. Os membros da equipe de Oppenheimer eram heróis, ou pelo menos era para serem. Engenheiros impressionantes, sem dúvida. Eram eles heróis porque acabarão com a guerra? Talvez. Stalin, Truman e Chruchill estão dividindo a Alemanha neste instante, conforme falo. E claro, Manhattan pôs os Estados Unidos em primeiro na corrida nuclear, mas a única razão porque a Rússia– ou, suponho, a União Soviética– construiu sua bomba foi porque tínhamos a nossa. A destruição mutuamente assegurada é só uma disputa para manter o mesmo padrão termonuclear do que os outros. Mas estou colocando a carroça na frente dos bois. Acho que sou a única pessoa no universo que sabe o que acontece nas próximas décadas, e não há muitos lugares em que eu possa apreciar esse fato sem ser jogada em uma prisão militar ou um hospício.
Mas o Comitê de Supervisão quer um espetáculo.
[telefone tocando]
Armas nucleares não são poderosas apenas por causa da explosão ou da chuva radioativa, mas por causa do efeito intimidante. Então, dei a eles um espetáculo.
[Anthony atende o telefone]
SG: [no telefone] Partridge, preciso de um favor.
AP: [no telefone] Pode falar.
SG (diário): Três envelopes, pra Eisenhower, Donovan e Groves. Dentro de cada um deles estavam os resultados dos jogos do jornal de terça que vem e uma declaração da perspicácia técnica da Timepiece, assinada pelos três daqui uma semana. E, claro, uma versão não assinada da mesma carta. Falei pra esperarem uma semana, checarem os resultados e assinarem a nova declaração. Era prova que a Timepiece podia mandar coisas de volta no tempo. Pelo menos pro Comitê.
SG: [no telefone] Como seus modelos de previsão funcionam com esportes?
AP: [no telefone] O que você está querendo fazer?
SG (diário): Partridge e eu passamos as últimas horas antes do Juízo Final descobrindo que os Cubs tinham 99.8% de chance de ganhar dos Phillies de 7 a 3 na próxima terça. Pouca gente demais aprecia o poder da análise estatística super-profunda. Daí, escrevi uma carta enfatizando os usos potencias do projeto e forjei as assinaturas dos três pra que parecesse legítimo. A apresentação decorreu sem nenhum problema. Me assegurei de que Roberts e Wyatt não estivessem comigo. Nunca contei a eles o que fiz. Não precisam disso pesando em suas consciências.
Espero que tenhamos acertado o resultado do jogo. É uma aposta. Se os Cubs perderam, ou eu sou incompetente, ou uma fraude, e provavelmente vou ser despedida. Se ganharem, então sou um gênio. Dá um trabalhão tramar algo arriscado assim, na verdade. Provavelmente teria sido mais impressionante contar pra eles. As coisas que não fazemos por dinheiro. Tenho uma máquina do tempo e ainda assim não consigo convencer as pessoas a pagar por ela a menos que minta um bocado. Mas as pequenas mentiras tornam o que precisamos fazer bem mais fácil.
[rádio sintonizando]
AP: Helen, o que houve? Você estava tão quieta no caminho para casa. Tudo bem?
HP: Você mentiu para mim. Quebrou a promessa.
AP: O quê? Querida, do que você está falando? Quando?
HP: Nosso primeiro encontro. Você prometeu que seu trabalho mudaria o mundo para melhor.
AP: Eu não estava mentindo, Helen. Ainda estou fazendo aquele mesmo trabalho benéfico—
HP: Eu vi o que aqueles homens estavam fazendo, Anthony. Vi com meus próprios olhos. Aquilo NÃO era trabalho benéfico. Aquilo NÃO estava mudando o mundo para melhor.
AP: Não fizemos aquilo, querida. Não fomos nós.
HP: Não faz diferença! Homens como Donovan levam homens como você a construir máquinas como aquela. Estão usando seus dons e seu esforço para construir... aquilo! Aquela coisa terrível! Meu Deus, Anthony, nós bebemos a promessa ontem à noite... meu estômago está revirando.
AP: Querida, acalme-se.
HP: Vamos embora. Vou fazer minhas malas agora, e vamos embora.
AP: Você sabe que não podemos simplesmente ir—
HP: Eu não ligo! Não ligo que influência esses homens têm sobre você!
AP: Não vou embora, Helen.
HP: O quê?
AP: Eles têm meu trabalho agora. Não posso simplesmente abandoná-lo. Tenho que ficar.
HP: Anthony, você não pode estar OK com isso. Com o que acabou de ver.
AP: É claro que não. É terrível. Mas meu trabalho não acabará assim. Eles só estavam construindo uma bomba. Eu posso fazer muito mais. E vou ficar de olho em tudo, assegurar-me de que não usem o que inventei para machucar ninguém.
HP: Você é mesmo tão inocente assim? O exército vai fazer o que quiser com seu trabalho, e mandar você embora com uma nota de cinco dólares e um tapinha na cabeça.
AP: Não posso abandonar isso, Helen. É tudo pelo que já trabalhei.
HP: Não sou eu tudo pelo que você já trabalhou?
AP: Você sabe que isso não é verdade. Trabalhei pelo melhoramento da humanidade. Trabalhei pela ciência.
HP: Resposta errada, Anthony.
[Helen sobe as escadas]
AP: Rrrrgh!
[rádio sintonizando]
BILL DONOVAN (BD): –O que estavam pensando? Deus do céu, eu devia manter Sally Grissom em uma cela por tempo o bastante para ela encontrar consigo mesma no futuro. E qual foi o papel de Anthony Partigde nisso?
CW: Planejou a coisa inteira, senhor. Orquestrou a viagem toda.
BD: O que, para uma cidade-resort a 10 horas de distância logo antes da reunião que podia muito bem acabar ou salvar esta cidade? Que motivo ele poderia ter para isso?
CW: Parece sim particularmente descuidado. Como foi a apresentação da Timepiece, senhor?
BD: Foi... simplesmente terrível. Usaram a pesquisa de Anthony para adivinhar com segurança o resultado do jogo dos Cubs.
CQ: Como o Comitê reagiu?
BD: Groves ficou curioso, mas entediado, no fim das contas. Ike se animou como um garotinho no Natal, mas tenho a impressão de que não durará. Foi um truque barato, e eles podem não saber ainda, mas descobrirão em breve.
CW: ... Posso dar minha opinião, senhor?
BD: Claro, por que não?
CW: Acho que Anthony pode estar tentando afundar a equipe de Grissom.
BD: Por que acha isso?
CW: Bom, como você disse, senhor, nenhuma parte desse plano parece uma boa ideia. E eu conheço o Anthony, ele não é descuidado.
BD: O que você está tentando dizer... que ele está tentando nos destruir de dentro?
CW: Não acho que todos nós. Acho que ele está tentando destruir Sally.
[gravador de fita desliga]
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03: Trinity, Ato 1
[gravador de fita liga]
SALLY GRISSOM (SG): O sistema que estamos propondo... ele gera um campo que nega os efeitos do que tenho chamado de mecanismo Grissom. Simplificando, massas dentro do campo limitadas a uma região espacialmente consistente são puxadas ao longo de uma curva temporal fechada em direção a regiões do tempo-espaço com densidade supersimétrica. O Projeto Arco-Íris inadvertidamente criou tal região, catalisando uma reação parecida com o que aconteceria em uma singularidade entre as partículas presentes—
BILL DONOVAN (BD): [interrompe a apresentação] Sally. Sall- Sally. SALLY.
SG: Algum problema?
BD: Está fazendo a mesma coisa de novo. Você tem mais sílabas que um dicionário animado. Não estou entendendo uma palavra do que está dizendo.
ESTHER ROBERTS (ER): Com todo o respeito, Diretor Donovan, é um conceito bem simples. O experimento na Filadélfia dois anos atrás criou um Coletor de Lorentzian–
JACK WYATT (JW): Um Coletor de Lorentzian que é capaz de simular uma curva temporal que quebra o Horizonte de Cauchy, efetivamente criando uma estrutura causal que...
BD: Parem. Todos vocês, parem. Ninguém está entendendo o que, em nome de Deus, nenhum de vocês está falando. É só baboseira. Isso não vai funcionar com o Comitê de Supervisão semana que vem. Estão vindo de Manhattan, e não vou perder para aquela cidade-bomba.
ER: Ouvi o chamarem de Juízo Final na sala de recreação.
BD: Não deviam. Esse é um hábito que eu gostaria que vocês quebrassem. Demonizar o Comitê de Supervisão não lhes faz nenhum favor.
SG: Bom, tecnicamente, não estamos demonizando eles, estamos divinizando.
BD: Você não é tão esperta quanto acha que é, e subestima a capacidade dos homens para quem falará. Eles não são facilmente impressionáveis, não vão cair na sua brincadeirinha de batata quente com essa retórica de jornaleiro.
SG: Quer, o que, que a gente faça ciência pra leigos pra você??
BD: Quero que vocês façam uma apresentação que eu consiga entender sem um maldito PhD! E não o chame de mecanismo Grissom. Você soa delirante.
ER: Não é como se tivéssemos tempo para dar um curso avançado sobre a física da relatividade. O trabalho que estamos realizando aqui está quebrando os limites do conhecimento científico. Se está achando difícil entender, tenha empatia por nós, que temos que explicar tudo.
JW: Não saberíamos metade dessas coisas se não fosse a pesquisa da Dra. Grissom.
SG: Vocês chegaram bem longe sem a minha... pesquisa.
ER: Diretor Donovan, precisamos que o Comitê renove nosso orçamento. Precisamos de redundância operacional contínua. Por exemplo, só temos um conjunto de inibidores. E se ele quebrar? E se voltar para o Eldrigde? O protótipo da Dra. Grissom é único em toda a existência. E, Doutora, a propósito, o que poderia ter feito você se livrar de todas as tentativas falhas da máquina antes de começarmos a trabalhar para você?
SG: Eu... queria começar do zero.
BD: Leio os relatórios de vocês toda semana e ainda mal entendo o que estão fazendo. Preciso que se coloquem no lugar dos outros.
JW: Estamos tentando, Bill, estamos mesmo, mas eles também têm que fazer um esforço! Temos um monte de informação que nos custou anos para compreender. E agora temos que condensar todo o nosso trabalho em pequenas doses para que esses ricaços consigam digerir?
SG: Desculpa, Donovan, pode me esclarecer uma coisa, por favor?
BD: O que é, Doutora?
SG: Você não está falando da ilha de Manhattan, está?
BD: Preciso que me conte tudo o que sabe. Tudo. Agora.
SG: Eu... eu não percebi. Vai acontecer logo?
BD: Conte-me. Quanto você sabe do... O que você sabe?
SG: Não posso falar nada. Você sabe que não posso. Já fiz esse discurso pra você vezes suficientes.
ER: Do que vocês dois estão falando?
BD/SG: É confidencial.
SG: Te conto quando você crescer.
BD: Se você sabe sobre Manhattan, então deve saber que me contar não vai impedir nada. Já está grande demais a este ponto. Pode descer do seu pedestal.
SG: Pedestal? Nós estamos falando... Trinity é exatamente o tipo de coisa de que estou falando, Donovan. O que você acha que sabe nem sequer se compara ao que eu já vi. Você não poderia nem imaginar o que sei. Talvez Trinity seja a pior coisa que já fizemos. Como espécie.
BD: Só me responda: Ela dá um fim à guerra?
SG: Claro, sem dúvida. É. Dá um fim à guerra. Dá um fim a toda nossa noção anterior de guerra. Transforma a guerra de uma luta de boxe em um jogo de xadrez, fingindo estar em um “impasse” de agora até o fim dos tempos. Você vai se sentir em casa.
[Sally bate a porta atrás dela]
JW: ... Então... devemos...
BD: Só saiam.
ER/JW: [murmurando enquanto saem]
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 9 de julho de 1945. Estou empacada. Donovan quer que eu desenvolva uma demonstração prática da Timepiece, e não tenho ideia do que vou fazer. Estou batendo minha cabeça contra a parede há horas, mas nada me ocorre. Foi relativamente simples descobrir como funcionam os princípios que puxam os objetos pro horário certo e mesmo lugar– tudo é puxado de volta pra Filadélfia em 1943, mas se você comparar a aceleração espacial à movimentação da Terra e parar, indo de trás pra frente quando chegar no Eldrigde, dá pra chegar num horário pré-definido preciso. Mas, por hora, é só teoria. Na prática, é mais difícil de se perceber isso de fato, e infinitamente mais difícil de se explicar pra alguém. É uma questão relacionada a cones de luz e linhas do tempo. O que quer que mandasse de volta no tempo, só desapareceria, da minha perspectiva – Eu não recebo uma laranja que mandei pra mim mesma hoje, porque nunca fiz isso ontem. Claro, em alguma outra linha do tempo, recebi a laranja, mas isso não é parte da minha história. Não é como se desse pra acompanhar esse de tipo de coisas entre...
[distorção estática]
SG: ... questão relacionada a cones de luz e linhas do tempo. O que quer que você mande de volta no tempo, é puro chute, não dá pra saber se vai estar por perto pra ver a coisa chegar. Por exemplo, uma laranja aparece na minha mesa, certo? O que eu faço? Só espero um dia e mando ela de volta pra mim? Isso só criaria um loop redundante, fazendo a laranja envelhecer um dia cada vez que voltasse no tempo, até virar pó. Se arranjar uma nova laranja pra enviar, tem que ser a mesma, mas um dia mais nova? Como vou saber se escolherei a mesma fruta? Como posso saber se não tem uma pobre Sally Grissom por aí entre as Eternidades Cegas que não acorda um dia se afogando num mar de laranjas? Viu, agora você entende o meu problema, né? Roberts e Wyatt já estão fazendo hora extra pra montar um novo protótipo antes do Juízo Final, e seria injusto jogar outra tarefa impossível em cima deles, então vou ter que me virar sozinha dessa vez. [suspiro] Preciso de uma pausa.
[rádio sintonizando; sons de jantar]
ANTHONY PARTRIDGE (AP): Sally, você tem que relaxar um pouco. O Juízo Final não vai lhe matar.
SG: Ah, graças a Deus. Estive quebrando minha cabeça por meses por causa disso.
AP: Não, está certo. Já passei por burocracia assim antes. É terrível. Só não tão ruim quanto parece.
SG: [amarga] Ah, que alívio! Muito obrigada. Você devia dar palestras motivacionais. Partridge, não é só que eu tenho que demonstrar algo impossível, tenho que fazê-lo na frente do meu chefe, do chefe da OSS; diretor de Serviços Estratégicos; e da porra do presidente.
AP: Quem?
SG: Você sabe, o Comitê de Supervisão: Donovan, Leslie Groves, Dwight Eisenhower?
AP: Você quis dizer o General Eisenhower?
SG: ... É. Isso aí. Foi isso que eu quis dizer.
AP: Ah, vamos lá, Sally, você é uma péssima mentirosa. Dá para ver que sabe de alguma coisa, só desembuche.
SG: Não, o quê? Por que eu...
AP: O General vira presidente?
SG: Você ‘tá lou- não, você ‘tá louco, cara! Isso... não–
AP: Ele vira, não é?
SG: O que, não faço nem ideia–
AP: Sabe, você podia se aproveitar dessas escorregadas. Podia fazer uma fortuna apostando em corridas de cavalo ou algo do tipo.
SG: Não pensei em trazer um almanaque de esportes comigo.
AP: Conte-me de novo o que é impossível sobre esse experimento.
SG: Simplesmente não dá pra observar ele. Ou você vive num mundo onde não recebeu o item que mandou pro passado, o que faz a máquina aparentar defeituosa, ou vive num mundo onde recebeu, o que parece só um truque barato.
AP: Por que não só mandar uma pessoa cerca de uma hora de volta no tempo e depois trazê-la para fazer um relatório? Ela pode adivinhar um número escrito em um pedaço do papel depois do momento para o qual voltará, ou algo do tipo.
SG: Bom, é tudo uma questão de relatividade, né? A única referência pela qual dá observar a viagem é a do viajante. Do ponto de vista de um observador, ou você não mudou nada, ou a mudança sempre fez parte da história. Portanto, o único jeito de mostrar ao Comitê como a máquina funciona é fazer eles de cobaias também. E não quero ter que lidar com a esposa de Bill Donovan perguntando por que o marido dela sumiu da face da Terra. E é isso ou... parecer que estou fazendo um truque barato. Só estou... empacada.
AP: Parece-me que você está precisando de umas férias.
SG: [ri]
AP: Quantos dias até a guilhotina?
SG: Cinco até o Juízo Final. Seis até eu ser levada embora da cidade numa van preta sem identificação.
AP: Tirar uma folga é o melhor que você pode fazer agora. Tome um pouco de ar livre, clareie sua mente.
SG: Eu... uh, não acho que meu combinado com o Donovan me dê dias de férias.
AP: E quem disse que o chefe precisa saber? Será como um passeio de empresa. Levarei a Helen. Vamos levar nossas equipes também. Meu colega, Quentin Barlowe, está com a cabeça nas trincheiras há meses, e tenho certeza que Ester e Jack gostariam de um pouco de sol.
SG: Barlowe? O cara quietinho que fica te seguindo pelo laboratório como um cachorrinho estudioso?
AP: Ele pode até ser quieto, mas faz a parte dele. Provavelmente até mais do que devia.
SG: Partridge, se todos nós fugirmos no meio dessa semana do inferno, acabaríamos com todo o tempo pro projeto. O que é tão irônico como soa.
AP: Bom, você sempre pode usar a Timepiece, voltar alguns dias, retomar as coisas de onde parou...
SG: Não sei nem por que vim pedir sua ajuda!
AP: Sally, confie em mim, você quer tirar uma folga agora. Está empacada porque está pensando demais no assunto. Todos vocês estão. Quero os três na minha porta, amanhã às sete e meia da manhã. Estamos de férias. E nada de “mas”.
[rádio sintonizando; conversa indistinta]
JW: Dr, Partridge, você está consciente de que o Juízo Final é em quatro dias?
HELEN PARTRIDGE (HP): Eu tentei avisá-lo que vocês não iriam querer ir.
AP: Ela efetivamente me avisou, e eu efetivamente a ignorei. É disso que vocês precisam, e ponto final.
ER: É irresponsável abandonar a apresentação da Timepiece assim! Simplesmente não temos tempo!
SG: Escuta, Roberts, o Partridge ‘tá certo. Se continuarem trabalhando nesse ritmo, vocês já vão estar mortos quando chegar o Natal. E aí, vão trabalhar até a morte ou entrar no carro?
[portas do carro são abertas, todos entram]
JW: Para onde estamos indo, aliás?
AP: Las Vegas, Nevada. Alguns dias jogando cartas e bebendo lhes fará mais bem do que poderiam imaginar.
ER: Vegas? Para que, dados e garotas de programa? Não, obrigada.
JW: Na verdade, esse tipo de negócio não é mais legal em Vegas. Roosevelt suprimiu todo o mercado bem veementemente alguns anos atrás, quando a base foi inaugurada.
AP: Ótimo saber que o Wyatt é um especialista na lei de prostituição de Nevada.
JW: Não sou um especialista! Meu primo é mecânico lá.
AP: Ah, claro. Seu “primo” é o especialista.
JW: Você está me chamando de pervertido, colega?
HP: Anthony, chega...
AP: [ri] Certo, certo, Jack. Só estou pegando no seu pé.
QUENTIN BARLOWE (QB): Dr. Partridge, tem certeza de que essa é uma boa ideia? Acho que prefiro só passar o final de semana em casa.
AP: De jeito nenhum, meu amigo.
ER: Uh, eu sou a única que nunca ouviu a voz dele antes?
SG: Vamos lá, gente. Sei que estamos correndo contra o tempo aqui, mas não faz sentido ficarmos perdendo a cabeça por causa disso. Em vez disso, vamos pra Vegas.
JW: Está bem, mas não sou um pervertido.
SG: Anotado, Wyatt. E o resto?
ER: Bom, acho que não faz sentido ficar para trás se vou ser a única trabalhando.
SG: Ótimo!
[motor do carro liga, dirigem estrada de chão afora]
AP: Então, qual é o plano?
SG: Me passa aquele cobertor.
JW: Plano? Para que precisamos de um plano?
HP: Você não sabia? A Dra. Grissom não pode sair da cidade.
ER: O quê? Espera aí, isso é ridículo! Por quê?!
[Sally se esconde debaixo dos assentos]
JW: Dra. Grisssom, o que você está fazendo? / SG: Só relaxa! Levanta as pernas! Levanta as pernas. / JW: Ei, o quê! / ER: Dra. .— aah! / QB: ... Deus do céu.
[carro freia, Anthony abre a janela]
Guarda: Bom dia, Dr. Partridge, vai sair da cidade?
AP: Sim, senhor, vamos fazer algumas medições lá fora, na meseta. Minha esposa preparou um piquenique.
HP: Bom dia, oficial.
Guarda: Bom dia, senhora. Podem me mostrar seus passes, por favor?
[todos entregam os passes]
AP: Aqui estão.
SG: [sussura] Ai! Não chuta!
Guarda: Parece meio cheio aí dentro.
ER: Uh... É, todo o equipamento aqui com certeza deixa bem apertado.
Guarda: Tudo em ordem. Tenham um bom dia, e tomem cuidado!
AP: Obrigado! Você também.
[carro sai da cidade, Sally emerge]
SG: Sutil, pessoal. Essa foi sutil.
[fita acelera]
ER: Dra. Grissom, posso lhe fazer uma pergunta?
SG: Manda.
ER: O que é Manhattan?
SG: Uma ilha em Nova York. Você não é de lá?
JW: O primeiro navio americano a fazer uma visita autorizada à Baía de Tóquio?
SG: ‘Pera aí, sério?
JW: O Centenário é este ano. Muito pode acontecer em cem anos de relações diplomáticas.
SG: E ele se chamava Manhattan? Huh.
ER: Dra. Grissom, você sabe ao que estou me referindo. Quando você e o Diretor Donovan estavam conversando. Manhattan, e Trinity.
SG: São codinomes.
AP: Codinomes que vocês não deviam conhecer, aliás. A curiosidade matou o gato.
ER: É, mas vocês sabem o que é. Não vou contar a ninguém. Só estou curiosa.
SG: Sabem como estamos trabalhando no nosso projeto científico ultrassecreto? Eles também. Manhattan é como nós. Trinity é a Timepiece deles.
ER: Eles estão construindo uma... máquina como a nossa? Algo para a guerra?
SG: Não exatamente, é... um pouco mais direta que a nossa.
AP: E ainda não estou certo do que exatamente é a Trinity. Só tenho uma hipótese bem vaga, porque mantive minha orelha em pé, e meu trabalho é descobrir o que as pessoas farão a seguir.
ER: E então, o que é? Vocês disseram algo sobre um dissuasor, certo? Sobre transformar a guerra de uma luta de boxe em um jogo de xadrez?
SG: Algo do tipo.
AP: Você não vai contar para ela, vai?
SG: Sem chace. Ela vai descobrir em breve, de qualquer forma.
[fita acelera]
ER: Como você pode acreditar nisso?
QB: Está escrito no texto, claro como o dia!
JW: Evidência irrefutável!
ER: Mas ele voa!
JW: E daí?
ER: E daí? Jay Garrick tem que correr para todo lugar! Você sabe quanto atrito isso gera?
QB: Não estamos falando de voar!
SG: Bem que podíamos estar! O Super-homem é mais rápido que uma bala.
QB: O Flash também.
SG: O Super-homem ganha os poderes dele da luz do sol amarelo! O Flash ganhou os poderes dele do que... água pesada?
JW: Água dura.
SG: Água dura! Isso é ridículo! Ele se molhou um pouco e daí consegue correr rápido? Por favor.
JW: Bom, e se eles estivessem correndo em uma pista de Kriptonita?
ER: Irrelevante! As coisas que eles inventam no rádio não contam. Não-oficial.
QB: Em uma corrida em terra entre o Flash e o Super-homem, o Flash ganharia.
SG: Sem chance!
JW: O Flash consegue parar balas!
SG: O Super-homem não precisa! Elas só quicam quando atingem ele. Presta atenção, o Super-homem consegue voar mais rápido que a velocidade da luz!
ER: ... Não, não consegue.
QB: Do que você está falando?
SG: Eu, uh... deixa pra lá.
JW: O Super-homem é só um idiota de capa usando a cueca do lado de fora.
ER: Jay Garrick usa um capacete idiota.
JW: É bom você retirar isso!
[fita acelera; rádio do carro sintonizando até uma música tocar]
HP: Oh, eu adoro essa!
[Helen canta “Till The End of Time”]
Till the wells run dry Até os poços secarem
And each mountain disappears E todas as montanhas desaparecerem
I’ll be there for you to care for you Estarei lá para você, para cuidar de você
Through laughter and through tears Na alegria e na tristeza
So take my heart in sweet surrender Então aceite meu coração, que se entrega docemente
And tenderly say that I’m E diga com ternura que sou
The one you love and live for Aquele que você ama e para quem vive
Till the end of time Até o fim dos tempos
SG: Helen... Isso foi lindo.
HP: Você achou mesmo?
[fita acelera]
ER: Está completamente sufocante aqui. Como eles podem estar dormindo?
HP: Acho que a inconsciência é a escolha mais sã neste calor.
ER: A quanto tempo estamos dirigindo?
AP: A maior parte das nove horas de estrada. Só falta mais uma hora, por aí.
HP: Quanto tempo?!
AP: Foi por isso que saímos tão cedo hoje, querida. Eu queria me assegurar de que chegaríamos lá antes do pôr do sol.
ER: O que nós seis possivelmente poderíamos ganhar de uma cidade-resort?
AP: Esther, você já foi a um parque de diversões?
ER: Fui a Coney Island algumas vezes quando era criança...
AP: Quando estava na faculdade, uma vez tive um trabalho que estava me matando. Um relatório sobre movimento orbital. Eu simplesmente não conseguia acabá-lo. Trabalhei por quatro dias sem parar, e no fim não conseguia nem forçar meus dedos a escrever. Eu podia sentir o prazo nos meus calcanhares, estava perdendo o sono. E então, além de tudo isso, tive que sair da cidade para a Ação de Graças e visitar minha avó na Pensilvânia. Não queria ir, queria terminar o relatório, mas meu pai teria me batido até a Cochinchina se eu não aparecesse. E ela morava pertinho deste parque de diversões. Dorney Park, se não me engano. E minha avó, como a velhinha gentil que era, viu como eu estava cabisbaixo e me levou para passar o dia lá.
ER: E lá você andou em uma montanha russa qualquer e teve o momento de genialidade que precisava para acabar o relatório?
AP: Não. Mas me diverti. Nenhuma preocupação no mundo. Todas as minhas aflições desapareceram. Fez maravilhas para a minha saúde mental.
ER: Certo, mas o que isso tem a ver com a nossa situação?
AP: Bom, a vovó Partridge era uma mulher maravilhosa, mas, nos seus últimos anos, ela ficou um pouco... esquecida.
HP: [arquejo] Ela esqueceu você?
AP: Era para ela me buscar às cinco, mas não apareceu até as oito.
HP: Oh não!
AP: Passei três horas no estacionamento, onde a ansiedade de estar perdendo tempo precioso de trabalho voltou com tudo.
ER: E foi lá que você teve sua epifania?
AP: Esther, você está perdendo o ponto. Eu não tive uma. Voltei para o meu quarto, sentei em frente à minha máquina de escrever e acabei o trabalho. Nenhuma epifania. Mas a perda de tempo me forçou a ser produtivo. Não há espaço para bloqueios criativos quando o ponteiro está contra você. Eu não tinha tempo para duvidar de mim mesmo. Só para terminar.
ER: Então, você gabaritou o relatório?
AP: Nem perto. Fiquei a um fio de ser reprovado.
ER: ... Isso não está lá aumentando muito minha confiança.
AP: Veja bem, no fim, eu só não tinha muito a dizer sobre o assunto. Teria falhado indo ou não ao Dorney Park. Meu ponto é: vocês vão terminar sua apresentação da Timepiece não importa o quê. Porque precisam fazê-lo. Sua equipe sabe o que fazer. Vão acordar no dia seguinte e ou terão sucedido, ou terão falhado, e então comerão seu café da manhã, e seguirão em frente. Antes, vocês estavam se matando de trabalhar. Com essa viagem, pelo menos poderão viver de verdade.
[fita acelera; carro para, motor desliga]
HP: Só estou dizendo que talvez você tivesse chances melhores em uma universidade, um lugar onde fosse apreciado—
AP: Helen, não quero falar sobre isso agora. [mais alto] Chegamos, pessoal!
[todos acordando, bocejando, etc]
JW: Que horas são?
ER: Onze e pouco.
SG: Então essa é Las Vegas, hein?
AP: Isso não é algo que as pessoas de onde você vem façam?
SG: Não, fazíamos sim. É só... diferente.
ER: Uma coisa eu digo. Parece até dia com o tanto de neon que tem aqui. É como uma Times Square no deserto.
AP: OK, peguem suas coisas, pessoal. Vou fazer o check-in e nos encontramos de manhã.
[todos saem do carro; rádio sintonizando; sons abafados de um café; uma mala é aberta, som se foca em um diálogo]
QB: Ele não estava no quarto quando acordei, assumi que estava dando uma corrida ou algo do tipo.
ER: Não o vejo desde que nos separamos ontem à noite.
AP: Acha que devemos mandar um grupo para procurá-lo?
SG: ‘Pera aí, não, ‘tou vendo ele cambaleando na nossa direção ali na frente. Quase certeza de que ele ‘tá com as mesmas roupas de ontem.
AP: Olha só quem decidiu só aparecer nesta manhã... início da tarde.
JW: Foi uma longa noite.
SG: Testando o banimento da prostituição em Nevada, presumo.
JW: Decidi checar os caça-níqueis depois de vocês irem dormir.
QB: Quanto você perdeu?
JW: Na verdade, ganhei cinco dólares... Foi só depois de apostar que gastei $4.75 em bebida.
SG: É aí que eles pegam você.
ER: Também pegam você nos caça-níqueis, nas mesas, no hotel...
SG: Essa cidade é essencialmente um poço sem fundo para jogar dinheiro fora.
AP: Aw, relaxem, meninas. Esse é para ser um final de semana divertido! De vez em quando, o poço joga dinheiro de volta.
ER: Não acho divertido pagar alguém pela possibilidade de devolver seu dinheiro.
JW: Você pode só se divertir jogando os jogos.
ER: Eu preferiria ganhá-los.
SG: Devia jogar mais 21, então.
ER: Por quê?
SG: Você sabe, estratégia básica de 21, contar cartas e tal?
ER: Não, não sei.
SG: Cara, algum de vocês tem um baralho?
QB: Tenho um no meu quarto.
SG: Sigam-me, pessoal. Matemática vai deixar vocês sem chão.
JW: Nós não viemos aqui para fugir do trabalho?
[rádio sintonizando; um dealer em um cassino cheio vira uma carta]
Dealer: 21. De novo. Muito bem, senhora.
[aplauso fraco]
ER: É minha noite de sorte!
[rádio sintonizando; o grupo em um bar de jazz chique, bebendo]
JW: À Doutora Sally Grissom. Porque sem o algoritmo de contar cartas louco dela, estaríamos duros e sóbrios.
ER/QB/HP/AP: Saúde!
SG: Aw, só mostrei os números. Foi a Roberts que jogou.
ER: Mas sem a ajuda de vocês cinco, estaria bebendo sozinha hoje.
HP: Sozinha e rica.
ER: Hoje cedo, eu sabia o mesmo tanto que vocês todos sobre análise estatística no 21.
HP: Não todos nós. Um pouco mais que eu, eu diria. Só um tiquinho.
QB: Eram coisas bem óbvias, na verdade.
SG: Devíamos manter a coisa da contagem de cartas só entre nós —uh... em privado.
HP: Acho que nós todos somos capazes de guardar um segredo.
JW: Temos uma bendita máquina do tempo no nosso quintal, pelo amor de Deus.
[Anthony dá um tapa em Jack]
AP: Presta atenção!
JW: Ah, vamos lá, não tem ninguém nos ouvindo.
SG: Mais uma rodada, pessoal?
JW: Coom certeza.
ER: Aqui, toma uns dólares. Mantenha as bebidas vindo.
SG: Já volto.
[rádio sintonizando]
Cientista: E eles é que nos perguntam se é seguro? Aposto cinco contos que o sudeste inteiro vai se explodir...
SG: [ao fundo] Ei, um sidecar, um martini seco, um French 75, dois scotch com licor e uma gin tônica, por favor?
Barman: Já vai.
Cientista: ... Aposto até mais dois na possibilidade da coisa toda nem funcionar. A este ponto, não tenho nem certeza de que—
SG: Que gravador chique você tem aí.
Cientista: É, é... top de linha.
SG: Dita coisas pra ele frequentemente?
Cientista: Coisas do trabalho, sim. Desculpe-me, mas—
SG: O que você faz da vida?
Cientista: Sou físico.
SG: ‘Tá de brincadeira?! Eu também! Pra quem você trabalha?
Cientista: Pa-para o governo. No Novo México.
SG: E como está indo por lá?
Cientista: Não posso falar sobre isso.
SG: OK, mas... como está indo?
Cientista: Bom, estou no uísque número...
[copos batendo]
Cientista: Esse tanto.
SG: Ruim assim, é?
Cientista: Sentado em um banco bambo, esperando o fim dos tempos.
SG: Sei como você se sente.
Cientista: Duvido muito. Vi o fim chegando. Sei o que acontece quando as forças primordiais do universo colapsam sobre si mesmas. Sei que não haverá saída.
SG: Você tem a impressão de que os bloquinhos de construção do universo são brinquedos nas suas mãos, e que isso vai partir o mundo em dois. E queria poder voltar a trabalhar com teoria pura, a escrever equações em cadernos. Queria que o mundo parasse de pegar conhecimento que devia ser usado para melhorar a humanidade e usar ele para matar uns aos outros. Acho que isso resume bem o que está sentindo?
Cientista: ... Quem é você?
SG: Como eu disse, com uma física também.
Cientista: De onde você veio?
SG: Você trabalha em Los Alamos, certo? Eu em Polvo. Algumas horas a sul de vocês. Mesmo tipo de coisa que estão fazendo, mas estamos com a ADRA, em vez de com a ACE.
Cientista: Nunca ouvi falar.
SG: E ninguém sabe o que vocês estão fazendo. Exceto eu. Acho que estamos quites, então.
Cientista: Todas as pessoas... vejo os rostos delas nos meus sonhos. Milhões de vozes sendo engolidas pelas chamas descontroláveis. O sangue delas nas minhas mãos. O silêncio delas pesa sobre mim. Então estou bebendo. Bebendo até não aguentar mais, ou até o mundo acabar. O que vier primeiro.
SG: E qual vem primeiro?
Cientista: Mantenha seus olhos no horizonte amanhã de manhã e verá do que estou falando. Talvez seja a última coisa que verá.
SG: Não duvido.
Cientista: Eles me disseram que ajudaríamos a dar um fim à guerra.
SG: Vai dar um fim a ela. Vai mudar o foco da conversa. Homens maus sempre farão coisas más, mas isso é com eles. Não com você.
Cientista: Como você sabe?
SG: Se ajuda, finja que foi um palpite de sorte.
[copos batendo]
Barman: Aqui estão, querida.
SG: Essa é minha parada.
Cientista: Aproveite seus drinks enquanto ainda pode.
SG: Por bem mais tempo do que você pensa. Cuide-se.
[Cientista bebe um gole e olha para o nada; Sally vai embora com as bebidas]
SG: [ao fundo] Aonde eles foram? Gente? Gente?
[rádio sintonizando]
SG: Diário de Sally Grissom, 15 de julho de 1945. Parece que nosso papo pós-jantar não agradou muito o pessoal do cassino. Quem imaginaria que eles não apreciariam nós tagarelando sobre trapacear no meio do bar?
JW: Foi você que ensinou Esther a contar cartas!
SG: O que acho que foi minha culpa, em parte. E aí eles nos chutaram do hotel.
ER: Nem chutaram, está mais para literalmente jogaram na sarjeta...
SG: ‘Cês sabem que não deviam ‘tar me ouvindo gravar isso, e nem se fala dos comentários, certo?
JW: Estamos ajudando.
ER: Estamos ajudando!
QB: Não, não estão.
SG: Eu encontrei eles do lado de fora do cassino, com as nossas malas. Todos vermelho-sangue da poeira de Nevada.
AP: Bela descrição, Virginia Woolf.
SG: Viemos pra outro hotel– espero que a equipe do Last Frontier não fale com a do El Rancho. Que é onde estamos agora. Infelizmente, só tinha um quarto vago na pousada, e nós seis temos que dividir ele.
ER: [pega o microfone] A Dra. Grissom fala enquanto dorme!
SG: Chega, não quero ouvir isso. Saiam antes que eu comece a contar todos os seus terríveis segredos.
[todos saem, exceto Sally]
SG: Ah, enfim um pouco de paz. Bom, ainda não resolvi o que vou fazer pro Juízo Final. Foi uma boa pausa, mas minha cabeça não está nem um pouco mais clara do que quando saí. Tenho literalmente que superar uma bomba atômica, e a Timepiece não tem o mesmo apelo visual. Se o Comitê estiver esperando algo como a bomba da gente, vai se desapontar. Nossa máquina não derruba casas, destrói cidades inteiras, ou ilumina o céu noturno com o poder de vários sóis. Não sei o que o Donovan espera que eu faça, além de tirar um coelho da minha–
[batidas na porta]
AP: [do outro lado da porta] Sally.
SG: O quê?
AP: Você está sendo requisitada aqui fora.
SG: Não acabei minha gravação ainda!
ER: Dra. Grissom, isso é mais importante. Só venha logo.
SG: Do que você está falando?
[porta se abre]
CHET WHICKMAN (CW): Boa tarde, Dra. Grissom. Você está presa por violação do Ato de Espionagem.
AP: Seu acompanhante está aqui.
[gravador de fita desliga]
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