Meu Deus, só agora me lembrei que a gente morre. Mas – mas eu também?! Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos. Sim”
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— Vejo seu rosto arranhado. Pequenos riscos vermelhos na pele e no branco dos olhos. É o sal das lágrimas… e imagino seu coração lutando com o que não alcança. Só as coisas desimportantes deveriam nos ocupar, menina Olívia. Sei que você é uma mulher, mas não posso deixar de notar o tempo que tem pela frente. Ninguém nunca nos ensina a rir de nossa falta de saída. E o que mais podemos fazer? Chorar pouco resolve e muito deforma. Ainda assim, engolimos a chave e choramos entalados. Quem dera eu mesma fosse capaz de fazer o que digo. Ah… não sou! Olhe as manchetes que o Rodolfo insiste em exibir, quanto desânimo sabem me dar. Quanta angústia produzem ao tocar minha pele flácida. Passei a vida querendo ter outras notícias, acho até que lutei por elas no meu quintal. Agora estou cansada e, principalmente, velha, enquanto a realidade está cada dia mais insuperável. Não tenho mais tempo para essa concretude, não verei nada se resolver.
Carla Madeira é poesia! A Natureza da Mordida é mais uma obra com uma intensa carga emocional da autora, trazendo duas personagens com sentimentos fortes e alinhados, apesar de ainda em descoberta sobre a vida. Uma delas tem uma vida já vivida e se vai à medida que esquece seus próprios acontecimentos, mas, mesmo assim, carrega tudo o que já experimentou. Por ironia do destino, ela conhece Olívia, uma jovem que enfrenta a dor da perda e precisa de novas lentes para seguir descobrindo o que a vida — e tudo o mais que ainda tem para aprender — pode lhe oferecer.
Biá era uma frequentadora assídua da banca do Rodolfo, exclusivamente da parte do sebo. Segundo ela, as notícias não mereciam mais sua atenção.
Sinto que, assim como em seus demais romances, essa será uma leitura revigorante, capaz de trazer grandes reflexões e novas perspectivas, com uma escrita cuja essência encapsula a beleza da vida.
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Unknown - Paloma Salgado Diaz , 2023.
Chilean , b. 1990s
Oil on canvas ,
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“E se a vida for só uma coleção de experiências essencialmente desconexas? Por que uma coisa tem decorrer de outra, com algum significado?”
Sally Rooney é minha autora favorita, e o motivo pelo qual aprecio tanto suas histórias é sua capacidade de desnudar, com delicadeza e precisão, os sentimentos humanos, abordando-os sob uma perspectiva antropológica e filosófica de maneira extremamente satisfatória.
Intermezzo é um livro sobre dois irmãos que enfrentam o luto juntos, mas separados. Vivem vidas distantes, porém semelhantes. Ambos lidam com o desafio que é existir, cada um com suas próprias perspectivas e ideais. No entanto, no fim das contas, o que permeia a maior parte de suas vidas são seus relacionamentos, sejam eles amorosos, familiares ou sociais.
O que acontece quando você finalmente se olha no espelho após algo que mudou sua vida, e o reflexo que vê é irreconhecível? Como você se recupera disso? Como encara a intimidade e a vulnerabilidade quando esses sentimentos lhe são completamente estranhos? Como se reconcilia com o amor e a conexão humana e se entrega a eles?
Embora Peter e Ivan tenham seus próprios relacionamentos complicados, grande parte do livro está desprovida do aspecto romântico frequentemente presente em outras obras de Sally Rooney. Em vez disso, Rooney dedica tempo e cuidado para desenvolver minuciosamente as personalidades dos dois irmãos e, por consequência, sua relação conturbada. Ambos possuem traços distintamente desagradáveis, mas ela nunca deixa de oferecer a eles a gentileza e a graça autoral que caracterizam sua escrita.
Em um livro que, no fundo, trata de amor, luto e arrependimentos, acho que essa é a coisa mais bonita que ela poderia ter feito.
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Nada me é mais atraente em uma história do que a abertura que vi em A Hora da Estrela. Comecei a leitura desse livro assim que o comprei durante a Bienal do Livro de São Paulo e, instantaneamente, me vi imersa na narrativa. Perguntava-me o que esperar: ironia, sarcasmo, reflexões culturais, músicas ou qualquer outra coisa? Brilhante!
Uma simples abertura, um universo de questões. Um tom leve, que indicava pensamentos ainda mais profundos. Senso de humor e respeito por determinadas conquistas culturais e conexões humanas.
O romance de Clarice Lispector é narrado por uma das personagens mais excêntricas que já li. Ele alega contar a história de uma jovem mulher, mas sua maior preocupação está em si mesmo e em sua motivação como autor. Desde o início, destaca a maneira como a história será contada e o que realmente importa para ele:
“Que ninguém se engane, só consigo a simplicidade através de muito trabalho.”
Como uma reflexão sobre a arte de contar histórias e a complexa rede de relações entre autores, narradores, personagens e leitores, esta é uma obra-prima excepcional. Eu poderia citar cada página.
Também é um relato impressionante sobre as diferentes camadas da identidade humana e sobre como estabelecemos o que somos e por quê. Vai à raiz da monstruosidade da condição humana, questionando se somos normais ou desajustados:
“Quem nunca se perguntou em algum momento: sou um monstro ou isso é ser uma pessoa?”
E esclarece as necessidades do indivíduo criativo e pensante:
“Tinha um quarto só para ela. Mal acreditava que usufruía o espaço. E nem uma palavra era ouvida. Então dançou num ato de absoluta coragem, pois a tia não a entenderia. Dançava e rodopiava porque ao estar sozinha se tornava: l-i-v-r-e!”
Explora a questão da verdade, da crença e da realidade. Às vezes, as mentiras são mais decentes e corteses do que a verdade. Às vezes, as coisas existem apenas porque acreditamos nelas. E, às vezes, pedimos perdão a seres que sabemos não existir — e somos perdoados!
Macabéa trabalha como datilógrafa mal remunerada e mora em uma pensão com outras quatro jovens nos cortiços do Rio de Janeiro. Suas habilidades de digitação são precárias, e ela está sob ameaça de demissão. Ela não tem amigos e quase não interage nem mesmo com as mulheres com quem divide a moradia. Nunca recebeu um presente na vida. Não possui roupas quentes e treme de frio no inverno, vestindo peças finas. Frequentemente, é chamada de feia. É magra, talvez anoréxica. Não toma banho com frequência e tem um cheiro desagradável.
Raramente come algo além de cachorros-quentes e Coca-Cola. Não sabe o que é espaguete. Não sabe usar cosméticos e, de qualquer forma, não teria dinheiro para comprá-los.
“Ah pudesse eu pegar Macabéa, dar-lhe um bom banho, um prato de sopa quente, um beijo na testa enquanto a cobria com um cobertor. E fazer que quando ela acordasse encontrasse simplesmente o grande luxo de viver.”
Quanto à trama, este livro é feito de nada. Mas isso pouco importa. Ele transborda vida!
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