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daterraaomundo · 7 years
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Numa das paredes do meu quarto, no famigerado 105 C, onde você aparece de surpresa para almoçar comigo ou às sete da noite depois de um dia exaustivo que ainda não se findou, há um papelzinho roxo colado com uma fita adesiva com desenhos de lebre, daquelas que fazem parte dos artigos de papelaria bonitinhos que eu tanto gosto. Neste papelzinho roxo, há nossos planos — se é que posso chamá-los assim.
Sendo bem honesta, sei que a palavra “planos” te apavora, enquanto me encanta. Diferente de você, eu gosto de pensar a longo prazo e imaginar mil caraminholas mirabolantes que possam acontecer. Você chamaria isso de “criar falsas expectativas e quebrar a cara”, caso nada aconteça. Entretanto, eu penso como possibilidades e circunstâncias — afinal, tudo pode acontecer.
Você ficou relutante quando eu disse para escrevermos coisas nesse papel roxo, mas aceitou caso fossem coisas que não precisassem de muito tempo para serem realizadas. Você escreveu três planos e eu também. A proposta ficou ainda mais “brega” a partir do momento em que decidimos acender velas, com cores respectivas aos planos, quando os mesmos se concretizassem. Das minhas ideias loucas e inusitadas, você compra todas — e ainda acrescenta algo.
A verdade é que eu quis colocar algo naquele papelzinho que me causou receio. Você sempre soube do meu gosto imenso por viagens e descobrir novas coisas e lugares, mas me parecia um tanto surreal escrever “viajar junto a você” quando nós sabemos que eu sempre volto à minha terra natal em meu período de férias e que isto não é considerado uma real viagem para mim. Por isso, não escrevi. Deixei para lá, esqueci, guardei para mim e pensei em outra coisa.
Porém, a vida — e o universo, e você, e a sua família — sempre me surpreende e eu, um tanto cabeça nas nuvens e atrapalhada, acabo me esquecendo disso. Talvez duas semanas, nem isso, depois de escrevermos no papelzinho roxo, você me apareceu com um “vamos viajar durante o fim de semana”. 
Nunca foi tão gostoso acordar em plena madrugada e pegarmos a estrada. Nunca foi tão incrível passar oito horas e pouquinho dentro de um carro com você, entre cochilos e conversas. Nunca foi tão engraçado eu assustar com a sua mão fazendo carinho na minha perna enquanto eu dormia, mesmo eu ficando brava na hora. Nunca foi tão empolgante conhecer o que restava da sua família — que você me contava e eu tentava adivinhar quem eram pelas características faladas. Nunca foi tão surpreendente não fazer nenhum plano e somente ir.
Talvez eu devesse ser menos controladora e ansiosa, meu bem. Talvez a vida não precise de tantos planos, somente que as coisas aconteçam no tempo delas; justamente porque, por mais irônico que aparenta ser, não realizamos nenhum plano do papel roxo adesivado em minha parede — ainda. Talvez, aos poucos, eu vá compreendendo as lições que você vem me ensinando e aceitando que sim, o imprevisível também é legal, que está tudo bem em não haver cobranças e que, às vezes, por mais cansativo que seja, rodar o oeste paranaense de carro pode ser recompensador — mesmo que isso signifique dormir num caminhão, coisa que eu nunca imaginei fazer na minha vida.
Não é apenas por isso que a minha gratidão é exorbitante. Conhecer lugares, ver outros lados das pessoas, entender um pouco da sua ancestralidade, criar uma intimidade e, quiçá, um vínculo com todos que me acolheram tão bem, faz com que o sentimento de pertencer a algum lugar, a ter um novo lar me cerceie e não me abandone.
No momento, o único plano que tenho é que eu não quero nunca me esquecer de nós. Por acaso ou destino ou circunstância, nós nos achamos. O resto há de nos achar também.
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daterraaomundo · 7 years
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Olá, meu bem
Dizem que quando se está aprendendo uma nova língua, seus pensamentos tendem a serem feitos no novo idioma. Eu nunca fui boa em inglês, mas confesso que pensei em te dizer um “sweetheart” hoje pela manhã — porque a pronúncia dessa palavra é tão amena e doce, extremamente diferente do meu humor matinal, que faz com que eu me lembre dos seus pequenos olhos que, aliás, trazem o mundo dentro deles. Eu já te disse isso, meu bem?
Quem sabe, eu não sei, mas este gosto em descobrir e deixar-me aprender coisas novas, seja idiomas ou carícias — porque, convenhamos, não sou a pessoa mais afetiva deste mundo, quiçá universo — esteja me fazendo um bem danado, já que você me é exemplo nestas duas coisas em específico: o segundo idioma — carregado num sotaque catarinense, digno de barriga verde, por falar nisso — e o afeto que nunca me nega, sempre me abrange, jamais me falta.
Talvez seja ingenuidade minha, mas penso que da mesma forma em que um novo idioma acrescenta algumas características em nós, como, por exemplo, pensar numa língua diferente, essa tal “linguagem afetiva”, a qual estou aprendendo a lidar de forma direta, também nos faça mais carinhosos, dispostos à demonstrar e seguros de que não é fraqueza nenhuma admitir que está tudo bem gostar de um afago nos cabelos antes de dormir. Aliás, eu gosto do seu-meu-nosso afago.
Eu preciso que saiba, porque isto já é quase uma necessidade das minhas entranhas, que a casca grossa que há em mim, já não está tão presente assim. E que me engrandece tomar consciência de que, mesmo inconscientemente, aprendo diariamente com seus jeitos e molequices. Você me faz ter vontade de dar “check” em cada possível item evolutivo desta minha encarnação. Obrigada.
Isto é apenas um dos textos que eu disse que faria através das minhas reflexões, quando estávamos na casa de um amigo. Você havia dito que ficaria clichê, piegas, bem romance adolescente. Eu concordei. Porém, disse que estas coisas fariam sentido só daqui alguns anos. Me enganei, meu bem, porque, para mim, no momento em que comecei a escrever, completou-se o total sentido. A vida vale à pena quando a gente ama.
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daterraaomundo · 9 years
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O fim é um novo início
Ninguém está preparado para a morte, seja sendo o espectador ou o protagonista. E por mais que saibamos que, hora ou outra, ela virá — por enfermidade, acaso ou calamidade —, ela sempre acaba nos pegando de surpresa: não bate à porta, não pede licença, não anuncia a sua chegada —   ou seria partida? — e nos deixa à mercê, de mãos atadas, nos perguntando o que faremos daqui para frente.
Às vezes, ela vem aos poucos e nos tira, de pedacinho em pedacinho, o que amamos. Falência dos rins, do corpo, da alma: falência da vida. Já outras, é avassaladora e sem aviso prévio: invade a morada do corpo dizendo que o prazo se esgotou e, quando se vê, não há o ir e vir dos pulmões, o pulso já não pulsa e massagens cardíacas não adiantam mais.
Quando a vi de perto, em meus braços, foi de forma rápida, quase instantânea: numa hora estava eu dormindo, na madrugada de sábado, esperando que, dali a pouco tempo, estaríamos em Ubatuba saudando a Rainha do Mar; em outra, estava com meu avô em meus braços, ensinando meu pai o resto de uma massagem cardíaca que aprendi na época de colégio, tentando dar um último suspiro de vida para quem deu a sua por mim.
A verdade é que eu nunca havia entrado — e ainda não entrei —, ao menos, num cemitério, quiçá ver alguém beirando à morte. Morrer, para mim, sempre aparentou ser como a frase icônica de Peter Pan, onde ele diz que “morrer seria uma enorme aventura”. Entretanto, naquele momento, essa “aventura” não me pertencia. Será, então, que me restaria alguma? Eu não sabia. A única coisa que eu soube era que o amanhecer estava lindo naquele vinte e quatro de janeiro e que a camiseta que vestia era presente do meu avô, do último natal. 
A camiseta trazia um poema de Drummond, onde o eu-lírico indaga “E agora, José?”. Ironicamente, a primeira pessoa a falar comigo me perguntou a mesma coisa. No impulso, eu disse que nós continuaríamos. “Sem cavalo preto/ Que fuja do galope/ Você marcha, José/ José, para onde?”. Eu também não sabia.
Eu apenas lembrava do riso e da presença constante, do olhar constante. De dizer bobagens no jantar e de, às vezes, dançarmos no quintal de casa, cantarolando alguma música da década de 60. De sempre estarmos juntos, dentro ou fora de casa, dividindo o pão ou disputando o controle remoto da televisão, enquanto um insistia em ver futebol e o outro, programa de culinária.
Com o passar dos dias, continuar aparentou ser uma boa resposta. Não precisava de justificativa, porque se bastava. Realista, porém dura na medida certa. Poderia ser utilizada como motivação, caso não perguntassem como você faria aquilo  — porque, mais uma vez, eu não sabia.
Entretanto, quando é que percebemos a sutil diferença entre sinônimos e camuflagem? “Com a chave na mão/ Quer abrir a porta,/ Não existe porta;/ Quer morrer no mar,/ Mas o mar secou;/ Quer ir para Minas,/ Minas não há mais!/ José, e agora?”. Fugimos, enrolamos, protelamos e nos engamos: a qualquer lugar que vamos, nós nos deparamos com que nos aflige. Fechamos os olhos, viramos o rosto, mudamos de calçada, de roupa, de casa: mas está lá, dentro de nós. Aos poucos, percebi que aquele continuar era, na verdade, fugir.
Como, então, continuar sem fugir? Não há um método. Todas as tentativas aparentarão ser falhas, porém, nenhuma falhará se não houver tentativas — falhar e tentar ou não falhar e não tentar? Às vezes, nos prendemos tanto em não errarmos que, ao menos, nem cogitamos a possibilidade de tentarmos algo. Eu, naqueles dias, me vi sem escolha: ou eu tentava podendo errar, ou eu errava sem tentar. 
Eu, consciente e decisivamente, errei algumas vezes. Pensava que ajudando aos outros, eu me ajudaria. Porém, como eu poderia ajudar outro alguém, sendo que eu também precisava de ajuda? Aos olhos de alguns, a decisão foi egoísta, mas, primeiramente, eu teria que me ajudar, antes de ajudar alguém. Estar plena para “encaminhar” alguém à plenitude.
Assim, a busca se iniciou. O foco não era responder “quem eu sou?”, mas descobrir “o que eu sou?”. Percebi o quão massificada e estagnada estava quando participei de um workshop do Teatro do Oprimido e, numa das dinâmicas, me disseram para representar em mímica o que eu gostava. Eu não soube. Fiquei atônita, imóvel, andando em círculos em meus próprios pensamentos. O que você gosta? O que você sente? O que você pensa? Eu não sabia.
Acontece que, após imensa e profunda reflexão, percebi que sempre dizia “eu não sei” para questões que eu fugia. Talvez a verdade seja que a minha vida sempre fora uma eterna fuga, onde, agora, eu não sei qual é o caminho para voltar à mim. Entretanto, eu quero voltar: às raízes, aos modos, costumes e ao ser. É por isso que escrevo agora — para voltar à mim.
Hoje, sei que a efemeridade dos fatos não me atormenta mais, já que a segunda fase modernista me aconchega. E mesmo tendo algumas pedras no caminho, permanecer se tornou a aventura. O fim também pode ser um novo início — e este é o meu.
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