Tumgik
escritora-emcrise12 · 3 years
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Uma visão da morte
A morte sempre foi algo que rondou minha vida, como a de todos. Mas observando minha pequena existência ela sempre esteve ali, do meu lado, rondando. A primeira vez que ela se fez presente foi quando meu bisavô faleceu, eu tinha três anos na ocasião, então não a compreendia direito, mas aquela foi a primeira perda que tive. Alguns anos mais para frente, quando eu tinha nove anos, meu pai descobriu um câncer, não foi difícil de tratar, mas dá mesma forma, e mesmo que quase imperceptível a morte novamente apareceu, mas dessa vez não conseguiu chegar perto, pois meu pai acabou melhorando. Em seguida minha avó materna teve um AVC,graças a algo divino não precisamos nos preocupar,pois novamente nada aconteceu. Vovó sobreviveu. Oito anos mais tarde a morte apareceu novamente, mas dessa vez para levar minha avó paterna, que por conta de problemas de saúde somados a idade avançada se juntou a morte, quase como se estivesse indo com uma velha amiga. Por mais que a situação fosse até que aceitável, como quando aconteceu na primeira vez que cruzamos nossos caminhos oficialmente, para mim a situação acabou me apresentando a alguém que até então não vivia constantemente comigo, minha grande amiga a ansiedade. Ela acabou grudando em mim por um bom tempo, e sempre que aparecia era por que queria falar sobre a morte. Talvez tenha sido ali que eu percebi que eu não era como os personagens de livros e filmes que viviam eternamente,mas que minha vida era frágil como uma xícara de porcelana, em que as rachaduras vão aparecendo conforme o tempo vai passando e que um dia não vai ter mais conserto. Só mais tarde quando busquei ajuda que percebi que esses questionamentos já estavam ali comigo,desde o ano anterior quando um dos meus tio-avôs faleceu.
O mais inaceitável foi apenas perceber isso em um momento de mudanças, ainda mais no meu último ano no colégio. E quando as coisas estavam se encaminhando para que a ansiedade e nossas conversas sobre a morte passassem, perdi uma querida professora para o câncer. Minha amiga permaneceu comigo por mais um tempo, até que suas visitas deram uma diminuída e o assunto mudou. No ano seguinte uma nova fase minha se iniciaria, algo novo, como se o que tivesse ficado para trás havia morrido,e o que sobrou eram apenas memórias doces. O novo veio da mesma forma que uma criança vem ao mundo, depois de meses de preparação, algumas contrações e muita expectativa, 2020 deu a luz ao meu primeiro ano de faculdade. No meio de muita euforia por conta desse novo começo quase não percebi que a morte novamente veio me rondar, mas dessa não porque alguém próximo iria morrer, mas por que uma situação que ninguém esperava aconteceu. Uma pandemia se instaurou, e com ela muitas pessoas se foram. O luto agora não era só específico e individual , mas coletivo, pois todos os dias pessoas do mundo inteiro perdiam entes queridos para o vírus. Os países entraram em colapso, e a crise que até então era pequena, cresceu, praticamente se triplicou,e agora se didivia entre financeira, sanitária e humanitária. Alguns lugares conseguiram aos poucos se recuperarem e fazerem diversas vacinas para que isso ajudasse a população a frear as mortes. Mas isso foi em outros países, aqui no Brasil foi diferente, como sempre. Em quase um ano em que estamos "presos" em nossas casas com medo de uma ameaça, inicialmente invisível, muitos ainda questionam se ela realmente existe e se matou mesmo mais de 200 milhões de pessoas em um só país, o nosso. Quando eu achei que o luto coletivo era o único sentimento que teria que lidar, mas novamente a morte rondou minha família, dessa vez se aproximando e levando também de braços dados o pai do meu tio, avô dos meus primos. Foi nesse momento que percebi que a empatia que tenho é muito forte, pois me encontrei colocando-me no lugar de quem estava de luto, mas sem perceber que eu também tinha a minha parte nele. Mesmo que não o considerasse assim em voz alta, inconscientemente ele era uma outra figura de avô na minha vida. Naquela mesma semana descobri que outra professora minha estava mal, porém dessa vez com Covid, porém ela não era apenas minha antiga professora de português que havia me insentivado a escrever, mas também a mãe de uma grande amiga minha. Mesmo com a preocupação ainda achei um tempo de me conectar com minhas crenças e rezar para que ela melhorasse, porém alguns dias depois ela faleceu. O problema da situação que estou vivendo agora é que não consigo confortar ninguém que perdeu alguém. Não posso abraçar, o que posso fazer é confortar essas pessoas por mensagens ou ligações. O que deixa a situação ainda mais triste. Mesmo não gostando nenhum pouco de ir em velórios,eles fazem falta nesse momento, a última despedida. E quando eu achava que nada mais iria acontecer e abalar meu grupo de amigas, o irmão de uma delas acabou voltando para a casa, só que não a que ele morava com sua esposa e três filhos, mas para a espiritual. Novamente a situação nos pegou de surpresa, já que as coisas estavam controladas.
O que mais me deixa com raiva é que muitos ainda fingem que a situação da pandemia não está acontecendo. É fato que alguns precisam sair para trabalhar,se expor para conseguir colocar comida na mesa. O inaceitável para mim é quem sai de forma irresponsável,vai em aglomerações e depois leva o vírus para dentro de casa. Quem sai e vai protestar em favor de algo que está matando milhares de pessoas diariamente no país,ovacionam um genocida, proferem palavras de ordem a um regime que matou e torturou muitos no passado, se recusam a usar o único escudo que temos contra a contaminação, uma simples máscara e a tomarem algo que a princípio nos ajudaria a começar a viver nossas vidas de volta. Portanto, a morte sempre está perto quando nossas vidas se encontram em perigo, já que ela sempre está nos rondando.
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