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Pai,
Nos últimos anos, por alguma razão inexplicável, resolvemos tirar fotos em quase toda reunião de família. Nós não tínhamos esse costume mesmo depois de termos máquinas digitais e celulares com alguma câmera decente... Mas, de repente, a chave virou: Passamos a tirar foto com você no seu aniversário e nos dias dos pais, como nunca fizemos. E quão grata eu sou por isso...
Minha favorita foi a do ano passado! A última, e eu nem sabia... Estávamos como sempre: rindo com você falando alguma abobrinha.
As confraternizações familiares com você eram sempre assim: só riso. Não há explicações sobre o que... Qualquer amenidade, histórias e causos. Raramente havia briga, clima e chateações. Não com você... Talvez entre nós, mas nunca com você.
Outro dia eu tive um sonho, nele a gente se reunia para se vacinar e comemorar o aniversário da Marcela em junho. A Ju fez um bolo de morango com chocolate, e, pra variar, ela me sacaneava e te fazia rir... Acordei com a sua risada ecoando na minha mente.
Meu grande desejo era sonhar vez ou outra com ela, assim, tão vívida na memória, em momentos e por motivos ímpares. Mas eu sou grata a Deus pela tecnologia que imortalizou o seu riso, seus gestos e a sua voz...
Eu sou grata, sobretudo, por ter tido você comigo por 29 anos, e por ter tirado algumas fotos lindas com você. Sou grata, pois até meus 59 anos eu ainda poderei dizer que vivi mais tempo com meu pai do que sem ele neste mundo, ainda que àquela altura do campeonato, eu espero já não estar fazendo mais tantas contas.
Obrigada por ter sido o melhor pai que eu poderia ter tido, por me ensinar a ser leve, alegre e valorizar as pequenas coisas e cada momento. Obrigada por me poupar das coisas ruins, como fizestes tantas vezes, e por me amar como poucos.
Te amo pra sempre!
Sua filhotinha,
Mayara ❤️

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Pai,
Eu sempre lembro de você no meu dia a dia, mas nem sempre escrevo. A correria me impede de gastar o tempo necessário...
Ontem, eu sonhei com você. Sonhei que te abraçava e pude até sentir a textura da sua pele grossa, e seu nariz fino que encostava no meu rosto enquanto eu chorava te perguntando porque você não me levou em mais de suas viagens, porque não tirou comigo mais algumas fotos, e porque não passamos um tempo a mais juntos... Como você com certeza me responderia, você me disse "eu fiz o que deu pra fazer".
Você era assim. Você sabia se arrepender dos seus erros, mas também sabia que era o que você conseguiu fazer naqueles momentos. Não se remoía, nem tentava se esquivar das cobranças que fazíamos. Você era todo compreensão.
Me lembro de uma vez que eu passei um bom tempo magoada com você. Você não me ligava em Alfenas, e não quis comprar um chip da minha operadora de MG pra eu poder te ligar sem roaming... Você tinha celular sobrando em casa, e sua desculpa foi não querer ter que se preocupar em colocar o celular sempre pra carregar, além do seu próprio celular pessoal.
Eu fiquei 4 anos lá, com o tempo você também se ressentiu porque eu ligava pouco, e em geral para pedir alguma ajuda financeira. Você não entendia que pra ligar, eu gastava os únicos 10 reais de crédito que eu tinha pra passar o mês, pra falar muito pouco (por causa do roaming) e arriscaria não ter grana pra pedir um gás ou socorro pra alguém se precisasse... Eu não tinha carro, nem parentes por perto. O crédito que você punha, era minha segurança nesses casos.
Passamos algum tempo magoados um com o outro. Mas um dia, quando eu precisei ir morar com você, resolvi por tudo em pratos limpos.
Você me ouviu... Algumas vezes, fez cara de quem nem imaginava tudo aquilo que eu tinha dito, e ficou emocionado e arrependido. Você sentiu muito por ter me magoado com palavras, e por ter também me deixado sozinha tanto quanto eu te deixei e magoei.
Naquele dia, a mágoa passou. Porque viver com você era assim, sempre reconciliar...
Agora na morte, não é diferente. A gente se culpa e sente saudade, mas na vida, no sonho e na mente, a gente repete: A gente fez o que deu pra fazer.
No foto: Meu pai e irmãos em Alfenas, na única visita deles ali, pelo meu aniversário em 2013.

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Pai,
Hoje, logo pela manhã, eu vi um arco-íris indo para a escola. Olhar para ele e para aquele sol da manhã que cega os olhos com infinita beleza, sentir aquele friozinho bom e um leve calor na face ainda sonolenta, me fez sentir alegria e me lembrei de você.
Dentre todas as pessoas em minha vida, você sempre foi a que mais me levou a contemplar as belezas da natureza.
Eu me lembro de gostar muito de ver o céu noturno e as estrelas... Lembro de algumas vezes quando, em noites de verão, você colocava as cadeiras de plástico no quintal da frente de casa e ficava conversando com a minha mãe, tomando cerveja com sal e limão na boca da lata. Eu sempre pedia para experimentar a cerveja, e você deixava, "mas só um pouquinho!". Lembro de me deitar no chão duro de cimento e observar o céu enquanto os adultos conversavam... De vez em quando alguém fazia algum comentário sobre o céu, e me ensinava sobre as constelações famosas como o Cruzeiro do Sul e as famosas "três Marias" do cinturão de Orion.
Mais tarde, depois da separação de vocês, perdi as contas de quantas vezes você me levou para ver o pôr do sol no banhado, em alguma colina do Urbanova ou naquela praça do Estoril, atrás do Sesi (embora lá não desse pra ver o por do sol em si, mas era uma vista bonita!).
Nesses momentos, já na minha adolescência, nós gastávamos horas e horas filosofando sobre a vida e a morte, ou comentando sobre algum livro ou música que a gente tinha lido e ouvido... Eu lia algumas coisas que eu escrevia pra você, e você adorava.
Nessa época, eu me sentia muito solitária em casa durante a semana com a mãe em depressão, e os finais de semana com você eram sempre revigorantes pela profundidade e leveza das conversas. Você era assim: Leve e profundo ao mesmo tempo.
Como você sempre amou viajar, carros e motos, não poderia ser diferente: Com você eu aprendi a apreciar o vento no peito e nos cabelos. Eu gostava de, na estrada, abrir o vidro do carro com você e fazer ondinhas com a mão contra o vento... E você era a única pessoa com quem eu me sentia a vontade o suficiente para aproveitar relaxada um passeio de moto.
Com você também aprendi a me divertir com a chuva que caía, mesmo quando ela machucava um pouco a pele contra o vento na moto, e dei muita risada dos chinelos que perdi nas enxurradas que enfrentávamos voltando do Thermas.
Você foi a pessoa que mais me levou para o mar... Eu praticamente só ia a praia com você, e lá eu sempre esperava você entrar na água para eu entrar junto também. Você engoliu muita água salgada na vida pra me levantar acima das ondas! Também me ensinou a mergulhar e a boiar... Você dizia sempre para eu não me preocupar, porque "bosta não afunda". Era sempre engraçado, nunca uma ofensa.
Pai, Deus nos deu a natureza para falar um pouco de Si, de Sua beleza, poder e majestade... Sempre podemos ver a assinatura Dele em tudo o que Ele criou. Felizmente, também me deu você para treinar meu olhar ao que é belo e singelo. E agora que você partiu, por pura graça, Ele me deu o prazer de lembrar de você a cada nascer e por do sol, na chuva, no vento, na praia e na noite escura... E embora hoje eu chore um pouco, sei que ainda vou sorrir muito por esse grande presente.

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Pai,
Eu me lembro do último dia em que estive pessoalmente com você...
Você pegou COVID19 e alguns dias depois tivemos que levar você para o hospital.
Você nunca foi de fazer drama, e sempre se manteve positivo quanto qualquer coisa... Você sempre dizia que estava bem, mesmo sem estar, e dizia que iria ficar bem, mesmo com medo. Você se preocupava em não nos preocupar, e eu tentei fazer o mesmo por você...
Eu te peguei na sua casa, conversamos um pouco, embora eu tenha falado mais, porque você estava cansado. Lá no hospital, eu sentei um pouco longe de você, para evitar contágio, ainda que minha vontade era ficar juntinha...
Para que você não se cansasse, eu evitei conversar com você.
Para que pensasse que eu estava calma e despreocupada, tirei o celular e o fone do bolso e comecei a ouvir um podcast de notícias.
Você olhou para mim com um olhar de riso, surpreso com a minha reação tranquila, como quem espera uma consulta médica de rotina. E eu disse "que foi?". Eu sabia o que você estava pensando, mesmo você dizendo que não era nada.
Você já tinha me dito antes, de modo aleatório, que achava que, se você pegasse COVID19, você morreria. Eu sabia que você estava com medo. No fundo, eu também estava.
Em segredo, eu tirei uma foto. Pensei que talvez você não quisesse tirar uma "selfie", mas gostaria de ter uma recordação sua, caso aquela fosse a última.
Você foi internado e eu estava orgulhosa de poder te ser útil, de poder ajudar e servir, te levando ao médico mais de uma vez, pegando suas coisas, ficando lá até às 3h da madrugada para assinar os papéis necessários. Era a única coisa que me apaziguava o coração: Caso o pior acontecesse, ao menos eu teria amado você em serviço.
Antes de ir embora, eu disse a você de forma otimista que você logo sairia dali... Você, ao contrário, duvidou "se eu sair, né?".
Eu reagi como de costume, mandei você ficar quieto e não falar besteira. Mas me arrependo... Eu deveria ter perguntado o que estava sentindo, e se estava com medo. Deveria ter te ouvido e tentado te fazer sentir que você não estava sozinho, apesar de tudo. Deveria ter dito com mais profundidade e seriedade o quanto eu te amava.
Eu não sabia como ser um suporte emocional para você ali, e apenas reproduzi o que você sempre fez. Agi como se estivesse tudo bem, como se aquele momento fosse leve como todos os outros em que seu riso fácil invadia. Eu estava pronta para uma piada, mas você estava sério.
Eu nunca entendi isso em você. Você sabia rir até em velórios e conseguia nunca ser impróprio, uma alegria sempre bem vinda... Nem todos tem esse dom.
Eu não sabia como conciliar minha necessidade de te dar um possível último abraço e ainda assim continuar fazendo você pensar que estava tudo bem, e que eu estava confiante de que logo você sairia de lá... Então eu te abracei. De forma rápida, e muito longe do coração. Foi, de longe, um dos piores abraços que eu te dei na vida, mas eu sei que você entende.
Você me agradeceu com amor por eu ter estado ali, e encheu meu coração de gratidão por essa oportunidade de te amar sem palavras.
Eu entrei no carro, que era seu, e chorei indo para casa... Aquela foi a última vez que eu abracei meu pai.

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Não adianta nem tentar me esquecer
Durante muito tempo em sua vida
Eu vou viver
Detalhes tão pequenos de nós dois
São coisas muito grandes pra esquecer
E a toda hora vão estar presentes
Você vai ver...
(Roberto Carlos e Erasmo Carlos)

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