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SOL
Gosto de como o Sol
toca a minha pele.
Como eu o sinto
e faz sentido
Gosto como ele tateia meus pelos
enobrecendo a vida dentro de mim
Presenteia-me com a sensação
dourando-me como quem banha de ouro um metal velho.
“Crepita-me” a carne
com sussurros de desejo.
Perco-me entre seus dedos solares.
Aconchego-me como um copo
aspirando o beijo do indivíduo.
E ali, floresço, diante dessa atmosfera anônima
da qual, a existência duvido.
Cresço e sou e vou.
Bebo e sou bebida.
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Prisão
Alisava as paredes que o cercavam,
com seus dedos pequeninos.
Elas, por sua vez, em rigidez,
beliscavam-no com mãos geladas,
mas havia ternura em sua tirania.
Quisessem, talvez, afagar o passarinho atrás das grades.
O toque do bichinho nas paredes
era uma forma de reconhecimento
do âmago de seu ser
e do gosto amargo da comida de detento.
Deveria, ali dentro, recordar-se o que é, quem era.
Pois, dia após dia, acordando prisioneiro,
renasceria um novo ser,
que deveria aprender a fazer de sua prisão um lar.
Mas, a cada renascimento, ele se fragmentava.
Não se perdia, pois era o mesmo caminho.
Se remontava, tomava outra forma, uma nova peça,
uma mais diferente, mais plástica, mais artificial, mais volúvel.
Talvez peças doadas das paredes, que ali ganhavam vida
eram, por hora, suas únicas amigas.
Ele pensava como seria seu rosto agora.
Ou se o mundo seria o mesmo fora dali.
Os sinônimos de liberdade eram os mesmos que um dia conhecera?
Ele era cada vez mais prisioneiro.
Fosse pela perda da esperança de voltar a ser livre.
Fosse pelo costume em se aconchegar
e acostumar-se com o chão duro da cela.
Tentava olhar para o céu em clamor,
Mas seus olhos paravam no teto, fino ou grosso,
era concreto demais para um deus abstrato.
Como é difícil enxergar além da gaiola.
Gaiola antes pequena, um cantinho,
cabia apenas a alma de um bicho só,
ficava cada vez maior, mais larga, mais vazia.
Não era um pássaro que morava ali,
tanto tempo não aguentaria.
Era um sujeitinho homem, até de boa postura.
Agora escorava o corpo,
sem mais pensar no que o delimitaria,
Como se a melancolia
traçasse seu ponto de partida.
Podia ainda observar pelas frestas na grade,
que, com atrevimento, traziam a luz clara do dia,
sua própria agonia.
Às vezes, ria para si mesmo, gozando de sua desgraça,
não porque ele era feliz ali dentro.
O homem sabia: não seria mais feliz lá fora.
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Parada Obrigatória
Eis que a mudança é um estado de graça,
faceira e enfeitada,
carregada no pulso.
– Eu tenho o tempo! – gritou o homem.
Mas saía com pressa,
sem aproveitar a festa que a vida fazia ao seu lado.
Tornou-se peça para o “quebra-quadrado”.
Quem sou eu agora que sei do tempo?
Agora que o encaro de frente,
O que somos um para o outro?
Eu o tenho, o mato e morro.
Posso correr e fugir, prendendo o tempo no braço.
Posso encará-lo e passar o tempo,
enquanto ele se passa em meu rosto.
O tempo, como mãe,
beija minha testa quando me enfureço,
toca minha pele quando saio ao sol,
me faz sábia para o que não conheço.
De mim o tempo nada leva,
mas me deu tudo que tenho:
mais uns anos, mais um amigo,
mais um livro, mais um pouco de tanto.
Sou um pouco de tudo que agora preciso.
E um tudo de que não gosto.
Suspiro.
Abro meus olhos, vou viver.
Por Marília Bento Ribeiro
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