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"I read in a book once that 67% of people die when nobody is looking. What I never could find is how many people live when nobody is watching."
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queijocomgoiaba · 6 years ago
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“TEORIA PURA DO DIREITO”: a escolha do nome para Hans Kelsen
         A seguinte dissertação tem valor complementar à disciplina de Filosofia do Direito, ministrada pelo Professor Daniel Machado, e busca explicar de forma sintética quais os motivos para Hans Kelsen optar pela escolha do nome “Teoria Pura do Direito” em sua obra mais reconhecida.
O autor, nascido em Praga no ano de 1881, foi um filósofo e jurista que recebe grande atenção não apenas por sua atuação em meio jurídico, mas também pela grande produção literária, tendo publicado mais de quatrocentos livros e artigos. Especialmente por possuir ligações com o modelo social-democrata, mas também por ser judeu, foi perseguido pelo regime nazista e refugiou-se na Suíça, República Tcheca e Estados Unidos. Portanto, assume-se que o contexto vivenciado por ele influenciou em grande parte a fundamentação de sua obra mais importante.
Ele procurou teorizar o Direito tal qual ele é, não como deveria ser. Atribuindo ainda o fracasso dos modelos jurídicos a sua idealização exacerbada. Mesmo que as normas estejam no campo prescritivo, do dever ser, o direito em si deve primeiramente ser analisado a partir do campo descritivo. Entendendo o que ele é, aquelas poderiam ser redigidas de acordo.
Para ele, o Direito deve ser visto como uma ciência à parte, tão ausente de arbitrariedade quanto a matemática. E é justamente desse ponto que surge sentido a denominação de sua obra, vez que o Direito não é puro, mas sim a teoria que o descreve. Até esse momento histórico, a ciência jurídica era sistematizada e conjugada com outras áreas como a filosofia, sociologia, política, ética, economia e psicologia. Consequentemente, ao longo dos regimes e governantes implantados, normas se adaptariam às ingerências contemporâneas.
Kelsen propõe essa separação. Como adepto à ideologia positivista, o Direito é aquele que se encontra nas leis, nos códigos, criado por homens e para homens. Sem qualquer influência de um Direito Natural idealizado e perfeito. Portanto, para que a norma seja jurídica, não importa se é justa ou ética, basta que preencha os requisitos formais. Ela deve encontrar-se em uma posição neutra meio às modificações de seu exterior.
Dessa forma, valores abstratos, como os encontrados nos princípios, devem ser objeto dos ramos da sociologia e filosofia, não do Direito. Este não deve ser flexível a interpretações abrangentes ou à tão comentada “boa-fé”, mas uma descrição lógica e rígida.
Diferente do que majoritariamente é entendido na doutrina, em especial após grandes tratados como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a teoria de Kelsen rompe abruptamente com o conceito de justiça e Direito. A justificativa do autor é feita a partir do entendimento de que a legitimação desde último não pode ser dada a partir de conceitos da moral e da justiça, uma vez que assim abriria espaço para uma interpretação abrangente da norma.
Para ele, a justiça absoluta, como algo transcendente, não existe dentro do Direito. Uma conduta justa é aquela que corresponde à norma positivada. Isso porque as demais matérias não-exatas não correspondem com a realidade do que a ciência jurídica precisa. Essas são ciências subjetivas, que abrem espaço às interpretações particulares, aos aspectos históricos e ao momento político. E a ciência jurídica precisa ser descrita sem qualquer tipo de inferência, por uma teoria pura do Direito.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Judicialização da Política
   "Artigo 102, parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.
   Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.
   § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.        
   § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)". 
           Um dos temas de maior relevância dentro das esferas política, jurídica e acadêmica é o processo de judicialização que o sistema brasileiro enfrenta, especialmente no que se trata de política. Idolatrada por uns e odiada por outros, segundo Luís Roberto Barroso, jurista, professor e ministro do Supremo Tribunal Federal desde 26 de junho de 2013:
   "Judicialização significa que algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo — em cujo âmbito se encontram o presidente da República, seus ministérios e a administração pública em geral. Como intuitivo, a judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação da sociedade."
           Em sua formação original, o poder judiciário seria responsável pela interpretação de acordo com a lei para resolução de conflitos. Dessa forma, seria incumbido de apreciar e julgar segundo um ordenamento jurídico elaborado por outro dos poderes, o legislativo. Todavia, recorrentemente  verifica-se um fenômeno intitulado "ativismo judicial", onde o judiciário utiliza-se de uma interpretação extensiva do conteúdo constitucional e a partir desta toma decisões sem respaldo legal. Esta ocorrência não se confunde com a judicialização que, diferentemente, respalda-se em normas constitucionais que preveem atuação de acordo com os limites da lei.
           Enquanto sua função é a interpretação e julgamento, em formas gerais, a do poder legislativo é a elaboração de leis e do executivo a administração do Estado e respaldo prático às leis aprovadas. Entretanto, nem sempre efetivam de forma satisfatória seus papéis e o judiciário como garantidor vê-se obrigado a fazer as normas terem sua devida aplicação.
           A Constituição brasileira adota um sistema garantista, onde sua incumbência não é apenas descrever formas de organização estatal, mas também assegurar direitos individuais e sociais. Através de normas de eficácia programática, estabelece parâmetros a serem atingidos para plenitude das funções do Estado. Prevê também normas de eficácia limitada, onde o assunto é apresentado, mas deverá ser tratado posteriormente em legislação própria. Não ocorrendo por parte governamental a execução cabal dos programas e/ou confecção de regulamentos próprios do conteúdo limitado, o poder judiciário utiliza-se de atributos constitucionais como o mandado de injunção, a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão ou apenas alvarás judiciais para que sejam resguardados os direitos antevistos.
            Vale ressaltar nesse ponto que as decisões tomadas pelo poder judiciário, especialmente na figura do Supremo Tribunal Federal - maior representação da judicialização em questões de suma relevância -,  não partem da inciativa de ministros. Partem da própria sociedade que colocam neste órgão a crença de uma medida favorável à manutenção ou instauração de seus direitos constitucionalmente previstos. A maior prova da mudança de papéis que a própria comunidade passou a requerer dá-se na mudança de concentração em manifestações na Capital Federal. Onde anteriormente dava-se em órgãos do poder legislativo e agora realizam-se no edifício do Supremo Tribunal Federal.
           Diferente do que pensa Pierpaolo Cruz Bottini, professor da USP, o judiciário, não elabora nenhuma política pública. Ele apenas exerce o papel ao qual foi atribuído, interpretar o texto da lei. A atribulação inicia-se quando a interpretação foge apenas de seu entendimento gramatical e passa à histórica, sistemática e teleológica. A multiplicidade de aplicações dos princípios constitucionais salvaguarda ao judiciário que seu entendimento possa ser mais abrangente que a pura aplicação da norma como escrita. Esta dinâmica pode ser entendida como manobra para abuso de poder. Uma vez que não cria, mas interpreta de uma forma discricionária.
           Sem embargo, no Artigo 102 da CRFB consta que os ministros do STF serão nomeados pelo Presidente da República em concordância com maioria absoluta do Senado Federal. Dessa forma, se são os próprios poderes executivo e legislativo que decidem quem serão os integrantes da Suprema Corte, é coerente presumir que estes estão de acordo em suas ideologias quanto ao futuro do Brasil. Garantindo os outros poderes a confiança nestes para tomada de decisões, ainda que não pareçam o tipo de deliberação a ser tomada pelo poder judiciário.
           Um dos argumentos a ser considerado é a manifestação de vontade da população que, dado certo momento, poderá não mais estar de acordo com as decisões judiciais, mas nada poderá fazer, visto que os magistrados possuem cargos vitalícios. Fato é que o sistema de organização do Brasil não satisfaz há anos. Não apenas neste poder como em todos os outros. Entretanto, o judiciário não toma medidas por si. Não é ele próprio quem distribui seus processos e busca súmulas. É a população quem faz isto e, se o número de processos continua a crescer, é porque confiam ou os outros poderes não estão efetuando o bastante.
           Dessa forma, o poder judiciário não está agindo conforme sua arbitrariedade e atribuindo a si papéis que não são concernentes. Do contrário, age conforme o previsto em norma constitucional e conceitos doutrinários de interpretação. Portanto, se for de entendimento majoritário a alçada de demasiadas incumbências ao poder judiciário, especialmente o STF, deverão os representantes eleitos da população através de poder constituinte reorganizar quais apanágios serão desta vez concedidos.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Karl Marx em si
               Possivelmente pela eloquência de seus discursos, Karl Marx foi o cientista social que acredito ter o maior poder de influir. Pela linguagem utilizada, seus escritos possuem praticamente a função de um adágio não apenas às classes elitizadas, como às periféricas, que inclusive são seu maior público alvo. Ele foi um filósofo, escritor, economista, historiador, sociólogo e jornalista nascido na antiga Prússia, em 1818. Das suas obras, o principal interesse era as relações de economia: trabalho e capital. Entre essas encontram-se o Manifesto Comunista (1848) e O Capital (1867-1894), responsáveis por fazê-lo conhecido em todo o mundo.
               Apesar de prover argumentos persuasivos, conforme anteriormente mencionado, o autor possuía dificuldade em expressar seus aflorados sentimentos anti-burgueses sem, dessa forma, deferir críticas pessoais aos inimigos que colecionou ao longo de sua trajetória. Apesar de incluir um doutorado na área da filosofia clássica que imediatamente em nada era influenciado por seus pensamentos progressistas, sua formação foi fortemente prejudicada por estes que não ficavam de fora de suas interações. As duras críticas não acarretaram nenhuma benesse em vida. Do contrário, apenas atravancaram sua carreira na medida em que qualquer tentativa de inserção no âmbito acadêmico era firmemente depreciada.
               Se apenas por si os discursos de Marx adquiriam oposição, é indubitável que seu posicionamento sobre a figura da religião atrairia ainda mais repúdio. Seu entendimento era o da religião como instrumento político e social para encobrir as mazelas em que encontravam-se as classes inferiores. Ou melhor, o objetivo não era de fato religioso, mas o de evitar a repercussão entre o proletariado de seu status social e economicamente inferior se comparado ao clero e burguesia.
               Diferentemente de grande parte dos cientistas sociais, Marx não apenas atribui críticas ao sistema vigente ou narra suas origens. Para além disto, ele teoriza um modelo ideal de sociedade e configura um manual de como atingi-lo. Entretanto, sua arenga possui capacidade inferencial limitada. Uma teoria que material e formalmente deve estar baseada em estudos, no caso de Marx é repleta de entendimentos próprios. É fato que nem todo seu discurso é feito dessas, se assim fosse, atualmente não seria aceito em plenitude no meio acadêmico. Todavia, é inegável que parte de suas fundamentações não correspondem ao processo de experimento-conclusão. Originam-se em seu entendimento particular e deste formam-se estudos para justificá-las.
               Apesar de utilizar-se de recursos linguísticos de função persuasiva, considerava sua contemporânea sociedade como alienadamente dominada pelos meios de comunicação em massa. Enquanto inseriam na percepção popular o modo que deveriam viver, o governo deixou-se tomar pelas multinacionais que passaram a controlar os Estados conforme seus próprios interesses. Bem como a gestão de recursos era efetuada de forma temerária sem a inconsonância popular que encontrava-se absorta.
               Obstante entendimento de sua teoria como materialista por abordar questões econômicas, políticas e sociais no que abrangem a luta de classes, para além dessas, Marx dava azo a constantes críticas sobre o materialismo. Efetivamente, realizava acentuada reprimenda ao espiritualismo religioso, mas pretensiosamente falava sobre uma verdadeira espiritualidade que, ao invés de corrupiar abstratamente, gravitava no entusiasmo de uma sociedade unida por um mesmo substrato. Um mesmo sentimento de abnegação perante um bem maior.
               Grande parte das críticas atuais ao posicionamento marxista é sobre sua aplicabilidade. O setor terciário hoje é o mais desenvolvido e o que comanda a maior parte da economia de todo globo. Dificultando portanto o desmembramento social entre burguesia e proletariado. Todavia, não se pode pospor o fato das grandes obras marxistas serem penejadas na metade do século XIX. A nível de comparação, Jean-Baptiste de Lamarck, o autor da Lei do Uso ou Desuso¹, teve sua teoria publicada em 1809, apenas 30 anos distante da primeira publicação de Karl Marx. Inferindo a sociologia como ciência, é fato que um século e meio depois a teoria marxista não seria aplicada ou entendida da mesma forma.
               Assim, a cognição das obras de Karl Marx não deve ser vista como modelo alternativo de sociedade a ser inteiramente aplicado. Mas de entusiasmo na confecção de uma teoria progressista que, assim como o proposto, deverá trazer uma reforma a todo sistema político, econômico e social de forma a visar não o capital como desígnio e motor de uma sociedade, mas a aprazibilidade dos vínculos inter-humanos.
1 A Lei do Uso ou Desuso foi a teoria que preconizou a Teoria da Seleção Natural de Charles Darwin. Esta dizia que a evolução dos animais deu-se através de uma adaptação progressiva ao meio em que viviam. Desenvolvendo órgãos e habilidades de acordo com o uso e atrofiando de acordo com o desuso.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Michel Foucault
i. Vigiar e Punir: Nascimento da Prisão
                Michel Foucault foi um filósofo, historiador, teórico social, filólogo e crítico literário nascido em 1926, na França. Entre os principais interesses para suas abalizadas discussões estão o poder e o saber como forma de controle social (uma crítica resoluta das instituições de todos os tipos), a psiquiatria, a sexualidade e os sistemas prisionais.
                Deste último assunto surge a obra "Vigiar e Punir: nascimento da prisão", publicada em 1975. O livro trás através de análises históricas os principais motivos para as modificações na esfera penal não apenas da França, como de todo o mundo. Onde o suplício e a exposição do condenado fora extinta praticamente em sua totalidade entre o fim do século XVIII e início do século XIX, dando lugar a um novo entendimento sobre o objeto da pena.
                Anterior ao processo de reforma, não apenas dos sistemas prisionais, como do cálculo e da pena, a aplicação de punições dava-se na maior parte em meios de maior gravidade que o fato cometido pelo agente. Por vezes, a constante prática de torturas trazia os juízes e carrascos à figura de perversos na visão da população e a intenção do suplícios perdia-se.
                Foucault dizia que "a certeza de ser punido é que deve desviar o homem do crime e não mais o abominável teatro". A realização de torturas seguida de morte realizada em praça pública demonstrava a mais absurda ideia de barbárie e ao invés de causar medo à população, podia trazer compaixão ao agente e o entendimento de que aquele que nasce criminoso, não pode consertar-se.
                Era majoritário o número de pessoas que no momento de sua morte ou tortura, ao invés de demonstrarem agressividade, manifestavam arrependimento e pediam perdão ao Senhor. Se no próprio momento da morte, onde a tortura tirava a humanidade pela extrema dor, agentes utilizavam os intervalos de tempo para pedir perdão a Deus, não estariam estes tão arrependidos de seus atos a ponto de não os realizar novamente? Seria de fato necessária punição de tão alta gravidade?
                A cada vez mais frequente visão de que os atos praticados não em muito diferenciavam-se dos crimes originalmente praticados pelos agentes, faz surgir novo entendimento dissolvido ao longo dos anos de que a penalidade não deveria mais ser aplicada ao corpo do agente pois não era este o responsável por cometer o crime, apenas o instrumento.
                O agente agora deveria ser visto como uma engrenagem quebrada ao longo de toda máquina que é a sociedade. Consertando esta engrenagem, toda máquina voltaria a funcionar em seu perfeito estado. Desta forma, os carrascos, anatomistas e outras figuras que antes tinham o papel de punir, são agora substituídos em sua maioria por guardas, médicos, capelães, psiquiatras, psicólogos e educadores que, dentro de instituições prisionais, obtêm resultados sem a necessidade de atos de extrema gravidade como antes ocorriam.
                Nas exceções onde consideravam-se impossíveis as tentativas de ressocialização dos indivíduos e a intensidade de seus crimes eram de tanta relevância, continuavam sendo aplicadas as penas de morte. Entretanto, não mais eram adaptadas à personalidade e culpabilidade do agente. A lei agora exigia sua generalização pois o importante não era a punição, o sofrimento corpóreo, mas puramente a extinção da vida pelo medo do retorno do agente ao convívio social.
                Nas palavras de Foucault "a guilhotina suprime a vida tal como a prisão suprime a liberdade, ou uma multa tira os bens". A guilhotina, bem como o aparelho de forca, não possui a função de fazer o agente sentir as dores da morte, mas de tirar-lhe a vida.
                Entretanto, ainda que em teoria as novas leis abolissem medidas punitivas desumanas, a realidade era diferente. O que antes era um espetáculo transmitido à população com o objetivo de prevenir que cometessem os mesmos crimes, agora tramita em segredo. Quase como uma prática recreativa dos policiais e agentes penitenciários.
                Pela discordância particular dos novos meios punitivos, os representantes do Estado desconsideram que as penas tomam caráter incorpóreo e o que se pune também modifica suas considerações. Se antes o punível era o crime apenas pelos elementos do crime, agora para além destes vinga-se também a culpabilidade, as perversões, os impulsos, o querer agir e a intensidade da ação.
                A definição do que passa a ser punido e julgado não é simplesmente descrever. Resume-se no entendimento de que a gravidade do crime está na intensidade da má-fé do agente tanto quanto na gravidade do crime.  A melhor representação deste fato na esfera jurídica atual brasileira encontra-se no Artigo 59 do Código Penal que, para além das qualificadoras, julga de acordo com a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias, consequências do crime, bem como o comportamento da vítima.
                Nestes pretextos para o cálculo da pena são também avaliadas particularidades do agente que em nada influenciam no crime de fato. É feita uma suposição a respeito da capacidade do indivíduo de viver respeitando o ordenamento jurídico ou não.
                Desta forma, o poder não mais institui-se no medo do que pode ocorrer ao próprio corpo, qual o método de flagelação aplicado manifestadamente aos olhos da população e de acordo com a lei. O que passa a existir é uma "microfísica" que implica a submissão dos agentes através de manobras e estratégias implícitas.
                Nos últimos anos, ocorreram revoltas nas prisões de todo o mundo por conta do frio, excesso de população, fome e outros fatores que continuam por garantir aos indivíduos a qualidade de inferiores não somente perante a lei e a figura dos guardas como representantes do Estado, mas como particulares.
                Ao invés da ressocialização e crença de que a prática de atitudes ilícitas não fazem parte de seu ser, apenas um ato disposto a arrependimento que representa um passado nada correlato ao presente e principalmente ao futuro, alguns instrumentos financiados pelo governo podem exercer aos presos o sentimento de exata contrariedade. Tratá-los com repugnância, praticamente como se não pertencessem à mesma espécie, é implantar em suas próprias cabeças a desilusão da possibilidade de uma vida melhor.
 ii. Carandiru:
                Carandiru é um filme brasileiro lançado em 11 de abril 2003 que conta com a direção de Hector Babenco e atuação de atores globais como Luiz Carlos Vasconcelos, Ivan de Almeida, Wagner Moura, Ailton Graça e Milhem Cortaz. Baseado no best-seller "Estação Carandiru", obra do médico, professor e escritor Dráuzio Varella, publicado em 1999, o filme entrou para lista de 100 melhores filmes brasileiros de todos os tempos realizada pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema.
                A primeira cena registrada no filme é uma discussão que ocorre em um dos pavilhões quando Lula, um dos presos, revolta-se contra Peixeira por acreditar que este havia assassinado seu pai. Negro Preto, um dos presos mais velhos que tinha a função de comandar todo complexo e consequentemente a cozinha, chega ao lugar da confusão e de forma ditatorial toma suas medidas para o conflito extinga-se.
                Logo neste momento, percebe-se que o controle não encontra-se nas mãos dos guardas penitenciários, mas nos próprios presos que tendo acesso a facas e outros instrumentos de periculosidade, escolhem por não cometer crimes ali dentro. Ainda que o receio de terem suas penas aumentadas exista, o que prevalece é o respeito pela figura do Negro Preto.
                Em outro momento do roteiro, durante conversa com um dos funcionários, o diretor do presídio afirma que seus papéis ali são apenas de mediadores com o mundo externo e administradores dos recursos financeiros. Pois, de fato, os comandantes daquele lugar são os próprios presos que unidos são muito mais fortes.
                Após esta desavença inicial, surge a figura de Dráuzio Varella que dirige-se ao complexo penitenciário para voluntariamente exercer campanha de prevenção contra vírus da AIDS. Este, mesmo receoso de início, aos poucos adquire a confiança dos presidiários que começam a contar suas histórias e os motivos para estarem naquela situação.
                À parte dos casos, o objetivo principal do filme era exemplificar as péssimas condições oferecidas pelo sistema carcerário que além de desumanizar os indivíduos que ali encontravam-se, não exerciam qualquer tipo de reabilitação. A exemplo da cena em que Majestade, o chefe do tráfico dentro do complexo, é mordido por um rato e quem realiza os procedimentos médicos é um dos próprios detentos sob o efeito de crack.
                Durante as visitas de Dráuzio Varella, são identificados não apenas inúmeros casos de AIDS, como sarna, tuberculose, e diversas outras doenças que, sem tratamento suficiente, padeciam os detentos. Fica clara a tratada situação na figura de Claudiomiro, representado por Ricardo Blat, que encontrava-se em estágio final de tuberculose, mas nada podia fazer, nem ao mesmo isolar-se por falta de espaço.
                Já no último quarto do filme, o roteiro que antes parecia escrito como o fim de contar casos e fazer um apanhado geral de como era o complexo, agora é tratado em forma de documentário. As cenas intercalam-se entre relatos dos sobreviventes e cenas do que viria a acontecer. Por conta de uma briga territorial na região em que os internos colocavam suas roupas para secar, Barba e outro detento reuniram forças de seus grupos e assim começaram se agredir.
                Sem a certo saber o motivo da briga, mas acreditando tratar-se de uma rebelião, os outros detentos abraçaram a causa e através de uma barricada impediram a entrada de outras pessoas em um dos pavilhões. Expulsando para tanto a presença de todos os agentes penitenciários.
                Quando a revolta já estava feita e parte dos prédios destruídos e em chamas, através das janelas puderam ver ao lado de fora do pavilhão um pelotão de choque da Polícia Militar armado de metralhadoras, escudos, cachorros e máscaras cobrindo o rosto, deixando apenas a faixa dos olhos à mostra.
                O diretor da casa de detenção que até então exercia certo grau de empatia pelos internos, tentou convencer os oficiais da Polícia Militar que não tomassem nenhuma medida desmedida pois os detentos respeitavam sua figura. Este, ao pedir que jogassem fora todas as facas e outros objetos de periculosidade, foi atendido pelos detentos que dispuseram tecidos brancos pelas janelas em sinal de paz. Entretanto, estas medidas não foram suficientes para Polícia Militar que demonstrava-se determinada em sua função ali.
                Não se sabe até hoje o real motivo para o início da rebelião, embora saiba-se que ocorreu entre Barba e o outro detento. Não se sabe também o que motivou a ação dos Policiais Militares visto que mesmo após obediência dos detentos, optaram por efetuar diversos tiros à queima roupa que oficialmente vieram a matar 111 detentos, mas segundo relatos extraoficiais, ultrapassava 250. Há quem diga ter sido uma medida administrativa premeditada para diminuir o número de detentos que à época era de 7200, embora a capacidade fosse de de 3250.
                Ao receberem ordens que se encerrassem as mortes, os policiais determinaram que os detentos se despissem e através de uma fila dirigissem-se ao pátio onde deveriam ficar sentados com as mãos nos joelhos e cabeças entre as pernas. Logo após, os próprios presos foram encarregados por moverem os corpos dos mortos para o térreo através dos corredores lavados em sangue.
                O Massacre do Carandiru ficou marcado na história do país e, ainda que o nome seja uma referência ao bairro de São Paulo em que localizava-se a casa de detenção, será sempre associado ao acontecido. Embora o massacre tenha sua relevância, acredita-se também que o papel principal tanto do filme quanto do livro seja expor as mazelas que encontravam-se os detentos.
 iii. Sistema Prisional Brasileiro:
                Em 1850 surge no Rio de Janeiro a Casa de Correção da Corte, primeira penitenciária do Brasil cujo desde seu princípio vem cercadas de problemas. Se hoje, 167 anos após sua criação ainda discute-se o valor dos investimentos em infraestrutura para infratores, à época de sua implantação a discordância ia muito além. "Naquele momento há o argumento que ainda hoje está presente, que é: ‘porque gastar dinheiro com prisão? Se você tem um monte de gente pobre nas ruas precisando de ajuda, você vai construir exatamente para aqueles que são transgressores? ’”, explica Marcos Bretas, professor de História do Brasil da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
                Apesar de Foucault escrever em seu antes mencionado livro sobre o assunto e a própria Constituição da República datada de 1988 dispor explicitamente a importância da divisão penitenciária de acordo com a gravidade do delito, é cada vez mais comum que não ocorra. O ceticismo sobre a eficácia do cumprimento de uma pena no seu quesito ressocializador, torna cada vez mais difícil entender se é apropriada à realidade, não apenas brasileira, a forma que é entendido o sistema carcerário.
                A descrença da população sobre um futuro aos internos fora do crime torna cada vez mais difícil desprender do dinheiro público medidas que tragam humanitárias condições de vida. Especialmente em período de crise, é difícil concordar com o orçamento público que investe dois mil e trezentos reais por ano com alunos de ensino médio, enquanto os gastos com presos em instituições estaduais é de vinte e um mil por ano.
                Ainda que possam crer em um futuro com melhores condições de vida para os detentos, compreender que para este investimento será retirado dinheiro de outras áreas do orçamento público causa descontentamento de praticamente a totalidade da população. Entretanto, não se pode ignorar que a superlotação, falta de higiene e violação sexual dos detentos tiram suas próprias caracterizações humanas.
                De acordo com o Ministério da Justiça, é quase o dobro o número de detentos se comparados ao número de vagas. E, embora deva-se pensar em condições humanas para estes indivíduos, é inegável que algumas medidas trazem consequências imediatas para a sociedade fora dos muros. A superlotação e manutenção de detentos internados por crimes de diferentes gravidades em um mesmo espaço faz com que ao invés de repreensão, apresentem agentes de menores periculosidades a crimes de maior gravidade.
                Se a análise de melhor solução para sistemas prisionais fosse simples, não estaria sempre entrando em pauta nas discussões. É fato que em primeiro lugar deva-se diminuir o número de detentos por vagas e, obviamente, o número de crimes. Para tanto, a principal medida deve sempre ser investir em educação e conhecimento para populações de todas as classes para que entenda o homem como um ser inserido em uma sociedade. Onde o egoísmo nunca é a melhor solução para o sistema.
                Entretanto, a ética, respeito e disciplina cada vez mais são perdidos em todos as esferas da sociedade. Seja no âmbito familiar quanto profissional e educacional. Dessa forma, a má administração e falta de correção nos lugares onde precisam estar presentes torna a distribuição de orçamentos uma corrida estacionária.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Karl Marx e o Manifesto Comunista
Introdução:
               Karl Marx foi um filósofo, escritor, economista, historiador, sociólogo e jornalista nascido na antiga Prússia em 1818. Em suas obras, seu principal interesse eram as relações de economia - trabalho e capital. Entre essas encontram-se o Manifesto Comunista (1848) e O Capital (1867-1894), as duas obras responsáveis por fazê-lo conhecido em todo o mundo.
               O Manifesto Comunista (Das Kommunistische Manifest) foi publicado pela primeira vez em 21 de fevereiro de 1848 e não contou apenas com a autoria de Karl Marx como também de Friedrich Engels¹. A obra foi escrita em meio a um período de bastante instabilidade e insatisfação entre o povo e a política.
               Por conta da clareza nos objetivos e visão realista expressas no Manifesto Comunista, uma das instituições de maior relevância no âmbito político-revolucionário da Inglaterra, a Liga dos Justos, convocou Marx e Engels para que assumissem a liderança e desempenhassem o papel de líderes de uma mudança social radical.
               Estes então trocaram o nome da liga para "Liga Comunista" e a divulgação de seus ideais tomou proporções magnânimas. Segundo Hobsbawm (1996, página 28), "nunca houve uma revolução que se tivesse espalhado tão rápida e amplamente, alastrando-se como fogo na palha por sobre fronteiras, países e mesmo oceanos".
 Do Manifesto Comunista:
               Logo em seu primeiro capítulo, a obra conta com a mais emblemática frase associada à figura de Karl Marx:
"A história de todas as sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história das lutas de classes."
               Sugerindo desta forma que desde o início do que hoje entendemos como sociedade, o motivo de todas as guerras era o desentendimento entre dois grupos pertencentes a esferas diferentes da sociedade. E estas guerras só resolveriam-se de duas formas: uma transformação revolucionária de todo sistema ou pela destruição das classes através de luta armada.
               O fator que modificou as eras sociais, até o momento em que Marx vivia, não havia sido a extinção das classes, mas as novas condições de opressões oferecidas. Assim, separa toda sociedade em dois grandes grupos: a burguesia e o proletariado.
               A primeira seria detentora dos meios de produção por conta da transição do sistema feudal para capitalista, onde o aumento da demanda de produtos e da população urbana tornaram estes os mantenedores da economia. O governo a esta privilegiaria na medida em que "é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa", a partir do momento em que abre mão de diversas liberdades apenas para manutenção da liberdade de comércio, já que trazia lucro. Esse advento garantiu que as profissões perdessem seu caráter vocativo e agora envolvessem a questão monetária como de maior relevância.
               Os mestres de ofício agora darão lugar a burgueses detentores de grandes indústrias a vapor, dando início à era das indústrias modernas. Como consequência do crescimento das indústrias, a universalização do comércio faz com que produtos de diversas regiões possam ser adquiridos pelo mesmo comprador. E, por obter matéria-prima mais barata em outros pontos do globo, estes deixam de adquirir das suas próprias regiões.
               No entanto, essa medida força a economia local a encaixar-se nos padrões de baixo custo sob pena de ficarem fora do mercado, desconsiderando as circunstâncias que fazem produtores longínquos venderem por menores preços. Ressaltando-se que a matéria-prima aqui assume a mesma posição da mão de obra. O importante nesse momento não é dar foco ao que está sendo produzido, mas quem está produzindo.
               Nesse sentido, a luta de classes entrava-se pela classe produtora não ser dona dos meios de produção. O papel do proletário agora é apenas de uma peça no grande maquinário empresarial cuja participação pode facilmente ser substituída. A efemeridade de um operário no sistema empresarial torna-o propenso a aceitar condições de trabalho inferiores pelo medo do desemprego.
               No combate a estas ações que trazem o proletário a uma posição paupérrima, o intento comunista é unir toda esta classe e promover uma revolução contra a burguesia. Revolução esta que deve estar preparada no caso da eclosão de uma luta armada. Como pode-se notar, diferentemente do socialismo utópico, Marx oferece junto à sua ideologia uma forma de colocá-la em prática.
               Para instauração deste sistema, Marx oferece não apenas um modo econômico de pensar, mas também um de socialmente conviver. Através da abolição da propriedade privada e do conceito tradicional de família, pretende proporcionar o entendimento de coletividade como o correto. Não podendo assim um indivíduo acumular capital visando seu próprio benefício ou o de sua família porque o bem de toda população está em primeiro lugar.
               Junto com essas medidas estaria a intervenção cada vez maior do Estado - centralização de créditos em apenas um banco nacional, censura dos meios de comunicação, estatização de empresas, cultivo de terras improdutivas pelo poder público, educação gratuita para todos -, igual densidade demográfica em todo território, cobrança de impostos progressivos, trabalho obrigatório para todos e, consequentemente com a abolição dos itens no parágrafo anterior, o fim do direito de herança.
               Entretanto, ainda que a teoria encontrada no Manifesto Comunista estivesse bem fundamentada, sua aplicação exigia a comoção de uma grande quantidade de indivíduos. Por este motivo, muitas vezes os partidos comunistas uniam-se a outros e o ideal perdia-se no processo.
               Mas, em suma, o objetivo do Manifesto, e fundamentalmente de Karl Marx, era apresentar uma teoria que não tramitasse apenas no âmbito utópico, como anteriormente era visto o socialismo. A intenção era propor uma ideologia pela qual todo proletariado solidarizar-se-ia e através de uma revolução, ainda que armada, um novo sistema seria instaurado. Sistema esse que através da influência máxima do Estado, iria contra o individualismo, o acúmulo de capital e a propriedade privada em face de uma sociedade igualitária livre das mazelas do capitalismo excludente.
 Da aplicação de fato:
               O primeiro passo descrito no Manifesto Comunista para implantação do novo sistema é a unificação de todo proletariado para dar início a uma revolução comunista. A primeira aplicação de um movimento do tipo foi liderada por Lenin² e ocorreu na Rússia em 1917, 34 anos após a morte de Karl Marx. Com a divulgação ocorrida, inevitavelmente, entre todos os sindicatos e nações, outras revoluções ocorreram na Europa sob o financiamento da União Soviética.
               Também desenvolveu-se na China uma revolução comunista que instaurou o Maoísmo, uma corrente comunista baseada também nos ideais de Mao Tsé-Tung. Na época de sua aplicação, a ideologia mudou radicalmente o sistema em que a sociedade estava incluída. Todavia, após a morte do líder em 1976, a prática do maoísmo foi abandonada e aplicado um governo que aproxima-se muito mais do capitalismo.
               O último caso relevante de instauração de regime comunista através de revolução ocorreu em Cuba no ano de 1956. O movimento retirou a ditadura de Fulgencio Batista  instaurou um regime unipartidário comunista comandado pelo líder da revolução Fidel Castro. No entanto, pela proximidade com a maior potência capitalista, os Estados Unidos vêm financiando ataques e exercendo boicotes desde o momento da instauração do socialismo até os presentes dias.
               O ativismo socialista defende que a efetividade do sistema não ocorreu plenamente até hoje por conta do meio em que as revoluções estavam inseridas. Ainda não ocorreu na história mundial o entendimento de toda massa proletária e uma revolução geral por parte da mesma. O que ocorreu até agora foram movimentos isolados que, mesmo movidos pela mesma ideologia dispersada, não entraram em prática por todo o globo.
               O sistema socialista determina uma ditadura proletária onde todos os trabalhadores estariam no poder. Entretanto, conforme parafraseado por Thomas Hobbes: "o homem é o lobo do homem". Não se sabe se a natureza do homem, de todos os homens, é bondosa o suficiente para garantir que aqueles representantes do povo agiriam de fato para o bem destes. Se com o passar do tempo o espírito inspirado na revolução afrouxar-se-ia, levando a um regime fracassado nos mesmos erros dos anteriores.
               Uma emblemática questão apontada por antissocialistas é a falta de incentivo que a extinção da propriedade privada trás no intento de inovações e melhorias. Entretanto, no governo de Fidel Castro, as medidas foram de fato voltadas para o povo e um país que antes encontrava-se em estado de miséria, apontou consideráveis melhorias em todos os indicadores sociais. Mesmo com toda política de boicotes exercida pelos Estados Unidos.
               Outro ponto a ser considerado é o regime socialista postar-se assumidamente como uma ditadura, não importando assim o posicionamento do povo sobre a concordância com o sistema regente ou não. Pelos meios de transporte estarem nas mãos do Estado, abandonar este por conta de discordância política não é uma possibilidade. A exemplo do regime de Kim Jong-un na Coréia do Norte, onde aquele que é pego na tentativa de abandonar o país é mandado para campos de concentração e punido.
               Concluindo, o Manifesto Comunista apresenta uma ideologia cuja origem deu-se em meio a Revolução Industrial no fim do século XIX. Um período onde a realidade vivenciada pelos indivíduos muito diferenciava-se da atual. A divisão entre burguesia e proletariado era extremamente marcada e as condições de vida demasiadamente difíceis. Não que hoje o modo de vida seja fácil, mas o welfare state³, ainda que não aplicado em todo o globo, trouxe uma elevação no padrão de vida.
               A harmonização entre as classes sociais hoje torna mais difícil diferenciar uma de outra. Ainda que ao redor de todo mundo existam sociedades empresárias cuja dominação do mercado dá-se de forma quase integral, o poder estatal não se encontra diretamente nas mãos destes. Se antes era mais simples associar ao dono dos meios de produção toda mais-valia, agora um trabalhador especializado pode receber mais que aquele.
               Desta forma, não é através de uma revolução comunista que poderá instalar-se uma igualdade de fato, mas na conscientização de todas as classes de que é este intento a melhor opção para benefício de toda população. Através do entendimento de que o homem é um animal político (Aristóteles) e estará sempre vivendo em conjunto, compreende-se que o bem-estar social consequentemente melhorará o padrão de vida de todo o globo.
               Entretanto, falar de conscientização do socialismo científico é quase como regredi-lo ao estágio de utópico. O homem nas condições que hoje vivemos não entende o altruísmo imediato como opção de melhoria mediada. Assim, é possível atingir a igualdade prática baseada na ideologia de Marx no que concerne ao funcionamento do sistema no âmbito econômico se o homem entender o que de fato uma economia esquerdista representa.
                Mas não no âmbito social ou de sua instauração. Primeiro pois abolir a família é de extrema aversão para maior parte da população. E segundo pois diferenciar a classe dominante da dominada nos dias de hoje torna-se impossível, impossibilitando uma revolução de proletários contra burgueses.
 Da alienação:
               Uma outra obra de relevância de Karl Marx foi o conjunto de notas escritas no ano de 1844 cujo nome dado à compilação e publicação feita em 1932 foi Manuscritos Econômicos e Filosóficos. Em seu conteúdo, aborda o tema controverso da alienação em quatro partes:
               A alienação em relação ao produto do trabalho que dá-se quando o produtor não reconhece aquele produto como seu na medida em que não expressou sua individualidade, sua essência, no que estava produzindo. O fazendo apenas pois assim foi acordado, não podendo ter o produto como se de fato fosse próprio.
               A alienação no processo de produção é aquela que acontece quando o que move o trabalhador são os meios para sobreviver, e não o prazer de ver sua realização. O trabalho é considerado um fardo pois apenas se visa as recompensas no fim da jornada.
               A alienação do sujeito enquanto pertencente ao gênero humano ocorre quando um indivíduo é separado de sua essência. Ele perde sua conexão com a comunidade e isola-se. Este indivíduo perde sua autenticidade não apenas nas produções de seu trabalho, mas também na vida social.
               A alienação em relação aos outros homens está ligada à anterior e pode até ser vista como uma consequência. Após o isolamento do indivíduo, ele não se vê como parte importante da engrenagem social e sua própria vida torna-se sem sentido. Como diz Christopher McCandless: "a felicidade só é real quando compartilhada".
               À parte da influência do capitalismo, a alienação faz-se presente na figura da propriedade privada. Para que o dominante possa usufruir da produção do dominado, é necessário que este não seja íntimo daquilo que produziu. Desta forma, terá para si que aquele produto não é seu, mesmo que o tenha fabricado.
 Vida de Inseto:
               O filme Vida de Inseto (Bug's Life), sob direção de John Lasseter, foi lançado em 1998 nos Estados Unidos e, apesar de ter como receptor principal o público infantil, possui questões de grande valor para vida adulta e instigações sobre formas de governo.
               A história tem como personagem principal Filk, uma formiga macho cujas habilidades de projetista nem sempre trazem o melhor resultado. Entre uma de suas invenções estava uma serra que auxiliaria a colônia na colheita de grãos. A personagem não consegue entender o porquê da colônia não aceitar suas idéias considerando que elas trariam benefício, já que trabalhariam menos e receberiam mais.
               Logo neste primeiro momento, percebe-se referência à colônia como uma organização socialista onde cada formiga, crente no sistema e nas palavras da rainha, trabalha de forma metodizada para o bem da colônia. Ainda que implique dividir todos os produtos das jornadas de trabalho.
               Estes fatores fazem com que os receptores das mensagens pensem se o próprio trabalho proposto pela colônia não é uma forma de alienação. Uma mera interrupção no meio de produção, como o fato das formigas terem de contornar uma folha, as faz desesperadas por não saberem o que fazer isoladamente, apenas em conjunto, recebendo ordens.
               Após este cenário principal, é apresentado que a parte da produção excedente ao necessário para sobrevivência das formigas é oferecido a um grupo de gafanhotos que em uma relação abusiva de falsa proteção exercem um tipo de troca. Estes permaneceriam longe da colônia e em contrapartida esta deveria oferecer um grande monte de comida, suficiente para alimentar todos os gafanhotos e ainda sobrar.
               Fica confuso no entanto compreender qual a figura dos gafanhotos se comparada à realidade social. Inicialmente pensa-se no Estado capitalista, que mesmo tendo função praticamente nula em uma sociedade de economia liberal, continua por lucrar em cima de sua população. E ao invés de unidade com seu povo, porta-se de forma tão individual com suas atitudes que passa a impressão de, de fato ser outra espécie.
               Em segundo momento pensa-se na colônia como trabalhadores de uma grande indústria alienada e nos gafanhotos como os burgueses donos do meio de produção que mesmo sem ter realizado qualquer tipo de trabalho braçal, continua por receber o excedente.
               Quando a pilha de comida está pronta, Filk acidentalmente esbarra com seu protótipo em uma pedra de sustentação e todo monte de comida cai em uma lagoa. O grupo de gafanhotos dirige-se à colônia e, ao descobrir que sua comida não encontra-se ali, destrói parte da colônia e, ameaçando as formigas, exige que até o fim da próxima estação seja a ele oferecido um monte de comida com o dobro de tamanho.
               Como uma forma de exílio disfarçado, a rainha manda Filk em uma expedição fora da colônia a procura de ajuda. Mesmo sabendo que nunca ocorreria, seria pelo menos uma forma de manter o indivíduo desvirtuoso fora da comunidade. O que ela não esperava era que ele voltasse com um grupo disposto a defendê-los da ameaça dos gafanhotos.
               À parte de todo um trâmite sobre a identidade do grupo de visitantes [serem na verdade um grupo de performistas circenses que entenderam o recrutamento não como para uma guerra iminente, mas uma peça de teatro], quando a colônia vangloriando a figura dos "guerreiros" vai à luta contra os gafanhotos, toda tática de ataque e defesa frustra-se.
               No entanto, em alguns momentos antes deste ataque, um gafanhoto sugere ao chefe Hopper que não mais exerçam as cobranças à colônia de formigas, já que possuem comida suficiente para toda estação. Neste momento, através de uma metáfora, Hopper mostra que o ataque de uma semente não é suficiente para causar nenhuma injúria, mas uma pluralidade de grãos reunida causa um estrago gigante. O mesmo acontece nas formigas, a partir do momento que elas perceberem sua força quando juntas, ganham em sua quantidade.
               E  é isto que ocorre ao fim do filme, quando percebem seu estado de alienadas pelo medo instaurado pelos gafanhotos e o tamanho de sua força, juntas conseguem depor aqueles que não agem com nenhum benefício para colônia, apenas usurpam seus ganhos.
 A Revolução dos Bichos:
               O filme A Revolução dos Bichos (Animal Farm), sob direção de John Stepherson e baseado no bestseller de mesmo nome escrito por George Orwell, foi lançado no dia 03 de outubro de 1999. Seu conteúdo utiliza-se de uma metáfora para analisar as relações entre o proletariado, representado pelos animais, e a burguesia, representada pelo homem.
               A história passa-se em uma fazenda cuja direção está sob a figura de Sr. Jones, um homem que põe-se como prioridade sobre os animais. Optando por comprar comidas e bebidas em excesso ao invés de alimentação para os animais que realizam o trabalho de fato. Estes organizam-se e seguindo os pensamentos do porco Major (figurando Karl Marx), realizam uma revolução e expulsam os homens da fazenda. Assumindo como própria, são agora inteiramente responsáveis pelos meios e pela produção.
               A liderança é tomada pelo grupo dos porcos que, considerando-se mais inteligentes, creem ser o melhor para o grupo. Um destes, inspirado pelos princípios do Major ditos apenas em abstrato, escreve em lugar público mandamentos que concretizam os ideais para que não se percam. No entanto, a figura gananciosa de Napoleão entra em cena e assume sozinho a liderança.
               Ao descobrir um objeto utilizado por humanos, a televisão, faz-se dela para realizar parte de sua alienação. Toma medidas que normalmente causariam desconforto aos outros animais e em contrapartida apresentam a figura da televisão como distração. Esta medida funciona para os animais de mais fácil influência, como as ovelhas, mas não para os de maior capacidade cognitiva.
               Cada vez mais as atitudes de Napoleão tornam-se ditatoriais e o regime confunde-se com o anterior tido sob administração de Sr. Jones. As cargas de trabalho são gigantes e as recompensas cada vez menores. Nem mais o mínimo de comida está sendo oferecido. Enquanto isto, os porcos assumem a casa que antes pertenciam aos humanos começam a agir costumeiramente como eles.
               Parte dos mandamentos originais dizia que porcos não deveriam dormir em camas, beber álcool e todos os animais seriam iguais. Entretanto, para fazerem-se de acordo com a lei, modificam-na para não dormir em camas com lençóis, beber álcool em excesso e todos os animais seriam iguais, mas alguns estariam em exceção.
               Estas atitudes fazem entender que o pensamento de George Orwell era contrário ao sistema comunista pois não acreditava nos indivíduos, independente da classe social como seres bondosos e altruístas, mas que facilmente perderiam o objetivo e tomariam decisões para benefício próprio.
               O que apresenta como solução para as mazelas sociais não é uma revolução, mas uma nova forma de relacionamento entre o homem e o humano/burguês e proletário. Deixando clara a importância de estabelecer princípios fundamentais de vida dos animais/proletariado, o homem/burguês deveria ter uma nova atitude e novo entendimento. A sugestão de Orwell poderia estar envolvida com um welfare state ou sistema social-democrata.
   ¹ Friedrich Engels foi um teórico revolucionário alemão que, junto com Karl Marx, desenvolveu o socialismo científico. Teoria essa que, diferentemente do socialismo utópico, tinha como objetico o alcance de uma sociedade socialista através de padões reais. Cuja prática não se torna tão distante e ilusória.
² Vladimir Ilyich Ulyanov, conhecido pelo pseudônimo Lenin, foi um advogado, revolucionário comunista, político e teórico político russo que através da Revolução Comunista de 1917 instaurou-se como chefe de governo da República Russa/República Socialista Federativa Soviética da Rússia/União Soviética até o ano de 1924.
³ Welfare State, ou Estado de Bem-Estar é, em suma, um estado atingido pela sociedade onde através da assistência estatal seria garantido a todos indivíduos condições mínimas. Direitos fundamentais às suas existências como educação, saúde, habitação, renda e segurança.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Hurricane Pedro
Hoje eu assisti “Very Good Girls” e pela primeira vez entendi o motivo para não ter conseguido escrever outro dia. Por algum motivo as palavras não se concretizavam e tudo parecia forçado. Talvez porque fosse. Assim como nós.
Eu não preciso moldar-me nos teus padrões. Não preciso conhecer novos lugares para termos algo sobre o que conversar. Pelo menos não por ti. Conheceu-me assim e é desta forma que continuarei a ser. Se apego-me demais e não me encantam casos de uma noite, não é culpa minha. Nem tua se é isso que te agrada. A culpa está em escondermos um do outro.
Não posso culpar-te pela inicial falta de honestidade quando a minha também faltou a ti. Eu sabia querer mais da mesma forma que você sabia querer menos. Mas escondemos. Escondemos pelo medo de uma realidade ofuscada, mas no interior bem transparecida. Não pertencemos um ao outro. Não pertencemos agora e nunca pertenceremos.
Culpo-te no entanto por todo o resto. Culpo-te por fazer-se de interessado e desentendido. Culpo-te por roubar de mim boas memórias e estragar boas músicas. Culpo-te por chamar-me de doce e em seguida ir embora. Culpo-te por deixar a porta aberta como se um dia fosse voltar.
Quando o conheci podia descrever-te em uma palavra: furacão. Para mim tua intensidade fazia-te assim. Mas estava errada. O que te faz furacão é tua capacidade chegar sem ser pedido e destruir por onde passa. E ainda que tu fosses previsto, nunca é o estrago de tua partida.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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O Direito para Niklas Luhmann e Hans Kelsen
               Niklas Luhmann foi um sociólogo alemão tido como um dos principais autores de teorias sociais do século XX. Em sua trajetória, escreveu, para além da sociologia, sobre a política, as artes, economia, religião e sistemas de comunicação.
               Preocupado com o estudo dos sistemas, Luhmann fala da sociedade e do Direito como sistemas autopoiéticos - "auto" como aquele que refere-se ao próprio objeto, "poiese" como reprodução, criação. Estes assim classificam-se na medida em que passam por constantes mudanças devido às alterações de seu próprio interior.
"Ela se reorganiza incessantemente por meio de desordens, antagonismos, conflitos que minam sua existência e, ao mesmo tempo, mantêm sua validade." (TRINDADE, 2007, p.72).
               No mesmo apontamento, Luhmann entende o Direito como sistema que a partir de dinamizações dos conceitos adjacentes, causa mudanças em seus próprios entendimentos. Em suma, entende a esfera jurídica como um organismo vivo, constituído de indivíduos em constante mudança. E estes, por sua vez, exercem a constante adição de conceitos pertencentes a outros ramos, a outras ciências.
               Dentro dessa organização sistemática, o Direito é visto como um sistema operativamente fechado e cognitivamente aberto. Em suma, significa que operativamente, ele não pode apropriar-se de estruturas presentes em outros ramos da ciência para regular-se. A autopoiese encaixa-se nesse sentido, fazendo com que o Direito não dependa de nenhum outro sistema para estruturar-se.
               Entretanto, ele pode utilizar-se de conceitos adquiridos através de outras ciências. Dessa forma, conceitos que podem ser auxiliados, por exemplo, pela biologia e filosofia, como a origem da vida, são abrangidos no Direito. Assim, ainda que o entendimento se irá adotá-los ou não seja escolhido por este, é oriundo de outro ramo. Por este motivo pode ser considerado cognitivamente aberto.
               Em contrapartida, existe o pensamento de Hans Kelsen, um jurista e filósofo austríaco cuja reputação é das mais relevantes no âmbito jurídico. Para este, através de sua Teoria Pura do Direito, exclui todos os elementos que não constituem a esfera jurídica propriamente dita. Na medida em que estes obscurecem a essência da ciência jurídica. Não negando no entanto que outros ramos podem ter com ele uma estreita conexão. Uma vez que estudam objetos de extrema semelhança.
               Luhmann acredita que a influência cognitiva de outros sistemas não altera a autonomia jurídica. Este continua livre, podendo escolher a aplicabilidade dos conceitos, adequando-os à sua estrutura. O que este somatório traz é a possibilidade de um maior leque de critérios na tomada de decisões. Todavia, mesmo defendendo sua linha de pensamento, não exclui de sua análise a possibilidade de arbitrariedade dentro dos julgamentos.
               Como saída para este ponto negativo, é marcada a necessidade de uma constituição como elo entre o sistema jurídico e o político. Ela surge como mediadora entre os dois sistemas. Dessa forma entendida pois pode ser modificada pela política, mas dentro dos próprios limites do Direito.
               De acordo com esse entendimento, o sistema jurídico pode ser visto pela política como instrumento de realização de seus próprios objetivos. Enquanto para o Direito, a política deve ser utilizada como fonte auxiliar para tomada de decisões judiciais.
               Luhmann acredita que a política não pode imprimir no Direito todas suas tomadas de decisão. A função desta é justamente adaptar ao ordenamento o que a sociedade provê. Devendo assim estar dinamizando de acordo com os estímulos providenciados, de fato exercendo seu caráter político. Quando isto não ocorre, a política perde sua essência e atua apenas como administradora.
               No entendimento de Hans Kelsen, o direito não pode ter seus elementos envoltos no interesse daqueles que detêm o poder. Confundindo-o com a política, bem como esta, estará nas mãos do poder vigente e só funcionará em sua plenitude durante períodos de estabilidade. Em hipótese alguma o Direito pode deixar de ser aplicado, especialmente em fases de transição, limbo e caos.
               Para ele, diferentemente de outras ciências, o Direito tem a característica de comunicar-se com os que o estudam e integram. Definindo ele próprio o que representa, dando uma auto-explicação do que deve ser entendido e aplicado. Assim, enquanto Luhmann o entende como sistema operativamente fechado e cognitivamente aberto, Kelsen entende como operativa e cognitivamente fechados.
               Realizando um balanceamento em determinado nível, Niklas Luhmann julga o Direito de forma distinta do que é visto nos tribunais. Enquanto todas as decisões deveriam ser baseadas em fundamentos jurídicos, apenas auxiliadas por outros ramos, a realidade é uma reconstrução jurídica de forma a confrontar o texto constitucional por embasamento não-jurídico.
                 O que o judiciário tem feito não é a leitura constitucional sobre a luz da política, mas o julgamento diretamente sob o entendimento particular justificado não apenas pela política como também por preferências pessoais, ao exemplo de orientações religiosas. Nem tudo que a política proporciona deve ser aproveitado pelo Direito e é nessa medida que uma constituição regularia o que deve ou não ser de acordo com entendimentos da esfera jurídica.
               No entendimento atual do Direito brasileiro, a Teoria Pura de Kelsen torna-se inviável em face da própria constituição abrir espaço para interpretações demasiadamente subjetivas. Os princípios abstratos descritos por esta possuem tanto valor quanto as próprias regras.  Ao exemplo desta parcialidade exercida pelo Poder Judiciário brasileiro, um dos casos de maior relevância para sociedade brasileira, o julgamento da ex-presidente Dilma Rousseff contou com voto de encontro à própria regra em razão do princípio da proporcionalidade.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Max Weber e os tipos de Dominação Legítima
Introdução:
               Max Weber (1864-1920) foi um dos principais pensadores a tratar do que hoje entendemos como Sociologia. Entretanto, suas contribuições envolveram também os campos da Filosofia, Economia, Direito, História e Política. Em seus trabalhos, percebe-se a influência dos ideiais de Karl Marx e Émile Durkheim, ainda que nem sempre de acordo em todos os pontos.
               Em meio a suas diversas obras, escreveu Economia e Sociedade, onde trata de conceitos como as formas de economia, de direito, de dominação e de religião. Nesta mesma criação, trata a sociologia como aquela que compreende, interpreta e explica a ação do homem, a ação social. Devendo esta sempre possuir um sentido relacionado ao comportamento e convívio com outras pessoas, não um reflexo instintivo.
               Em outra parte da mesma produção, fala sobre a ordem legítima, uma formulação relacionada com os conceitos de poder e dominação. Poder é aquela influência coercitiva que um autor possui sobre os demais. Este, mesmo que contra vontade do outro, pode impor a sua. É válido ressaltar que nesse caso a obediência não se dá por um respeito reconhecido, mas por um respeito forçado. Sempre com medo das consequências no descumprimento.
               O que difere o poder da dominação é justamente a legitimidade antes mencionada. Enquanto no primeiro caso ela não é necessária, no segundo caso é essencial para manutenção da dominação. Uma vez que a obediência fundamenta-se no respeito e reconhecimento para com aquele detentor do poder. A dominação não possui um caráter individualista, o que é melhor para si. Ela buscará o melhor para um amplo grupo de pessoas na qual o indivídio se insere.
               Entretanto, o que levaria o homem a contribuir e aceitar o estado de subordinado em razão de seu dominante? O que o mantém respeitando as ordens e costumes deste ainda que delas discorde? Para Weber, existem três tipos de dominação que explicam a motivação dessa obediência.
 i. Dominação Legal-Racional:
               Esta dominação legitima-se na crença de que a lei exerce o papel mais estável e de maior patamar dentro de uma sociedade. É a lei quem deverá estabelecer como agir perante os indivíduos e como estes deverão retribuir.  Por não possuir um caráter físico, ela utilizar-se-á de meios para manutenção de seu efetivo poder, instruindo governantes para esse papel.
               A pessoa escolhida para o exercício do poder não é detentora deste, serve apenas de instrumento para regular as manifestações da legislação da forma que ela mesmo previr. Assim, o exercício de suas funções não segue a pessoa, mas o cargo que ela ocupa. Ou seja, pouco importa quem está no comando porque ela deverá agir estritamente de acordo com a burocracia.
               Um exemplo de aplicação deste tipo de dominação é a instauração da Magna Carta realizada por João Sem-Terra:
               Durante um período de transição onde o modo de produção feudal começa a apresentar seus sinais de esgotamento, uma das figuras de suma relevância para o Direito torna-se rei da Inglaterra. João Sem-Terra sucede o trono deixado pelo rei Ricardo Coração de Leão no ano de 1199.  Por conta dos diversos fracassos durante seu reinado, os barões ingleses o pressionaram a assinar em 10 de junho de 1215 a Magna Carta, documento que limitava o poderio dos reis e instaurava o hoje conhecido como devido processo legal.
               Com as normas previstas na Magna Carta em vigor, não mais era relevante se o rei queria exercer seu poder de forma ilimitada ou quem seria seu sucessor. Pois estavam assegurados os direitos e deveres dos indivíduos através daquele documento.
               Outro exemplo de maior abordagem atualmente é o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, um dos três instrumentos da Declaração Universal dos Direitos Humanos:
               Em 23 de março de 1976 entrou em vigor o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, um instrumento da Declaração Universal dos Direitos Humanos que foi assinado e ratificado pela maior parte dos Estados e possui valor legal em todos estes. Em seu conteúdo são abordados o Direito à Autodeterminação e os Direitos de primeira geração (liberdades individuais, acesso à justiça e participação política).
               Este instrumento regula não apenas no âmbito estatal como universal. Ele traz garantias e obrigações que deixam claro o exercício da dominação legal na medida em que não possui uma figura representativa e vai de encontro a diversas questões de cunho consuetudinário em países de outra tomada governamental.
 ii. Dominação Tradicional:
               Este tipo de dominação legitima-se nos próprios costumes de um grupo de indivíduos. A obediência dá-se na medida em que não é pensado na origem ou em quem aplica aquele entendimento, mas na crença geral de que aquele é o certo pois assim é no que perdura o tempo. O senhor, o que encontra-se no governo, não forma os costumes ou tenta modificá-lo. Aceita-o o como é e mantem sua dispersão. Quando não o faz, põe em risco sua própria posição dentro do sistema.
               Entre as dominações, esta apresenta-se mais forte e estável na medida em que não se separa da identidade do grupo de indivíduos. Neste ponto, o pensamento de Weber encontra-se com o de Durkheim, uma vez que independente de qualquer estrutura ou instituição, a coercitividade ocorre pela própria reprovação social.
               Apesar de ser uma dominação íntegra, possui melhor funcionamento em comunidades isoladas. Assim seus integrantes não possuem contato com comunidades culturalmente distintas e o choque de realidades não ocorre. O entendimento de que outros grupos podem organizar-se de forma diferente e ainda funcionar pacificamente é conturbador para homogeneidade na crença de que um sistema funciona perfeitamente em sua imutabilidade.
               Um exemplo de comunidade cujo isolamento se dá de forma extrema é a dos habitantes da Ilha Sentinela do Norte, no Oceano Índico:
               Desde a época de colonização das índias, os sentineleses possuem desprezo completo por todo tipo de conexão realizado por povos de outras culturas. Sendo os visitantes até mesmo recebidos com violência. Sabe-se que mesmo vivendo sem contato frequente com outras ilhas e o dialeto ser único, o sistema de organização segue o entendimento da maioria de outras tribos indígenas.
               O sistema de dominação vigente em grande parte das tribos indígenas segue o entendimento de que é na caça, pesca e agricultura de subsistência que a economia é mantida. Bem como o político é detido nas mãos dos homens mais velhos, seguidos pelos mais novos e no último dos casos as mulheres.
               Outro exemplo é a monarquia absolutista vigente na Arábia Saudita:
               É determinado no governo saudita que o país deverá ser governado pelos filhos e netos do rei Abd Al Aziz Al Saud. Mesmo com outros países, especialmente os de maior influência, realizando pressões para que seja criada uma legislação de acordo com os direitos humanos, o país continua mostrando seu desprezo.
               Ainda que não seja realizada uma dominação de cunho positivo para sociedade vista de forma ampla, o governo saudita caracteriza-se como uma Dominação Tradicional. As medidas tomadas, mesmo que absurdas no ponto de vista ocidente, seguem o costume de acordo com a Sharia,  costumes sagrados do islamismo.
 iii. Dominação Carismática:
               Essa dominação possui sua legitimidade de acordo com o apreço dos indivíduos que devem ser dominados para com seu dominante. O poder deste não encontra-se previsto em tradições ou na lei, apenas na própria figura carismática. Dessa forma, diferente dos outros tipos de dominação, esta torna-se vulnerável na medida em que apenas durará tanto quanto o carisma do líder transparecer.
               Na Dominação Carismática, não é necessário que o líder possua alguma experiência no campo em que atua, ou ter cargo dentro da estrutura de um Estado. Este atua por si, apenas utilizando-se de suas habilidades de convencimento para reger regras e tomar decisões.
               Este tipo de dominação demonstra seus efeitos desde os primórdios da humanidade. Desta forma organizavam-se os primeiros grupos sociais e continuaram por assim fazer em casos ao longo de toda História. Em alguns momentos por si, em outros acompanhado de legitimação positiva, através de lei. Entretanto, essa nunca sobressaía se comparada ao puro carisma.
               Vale ressaltar que o carisma abordado neste tipo de dominação difere-se do carisma com significado trabalhado no cotidiano, o carisma virtuoso de empatia bondosa com os demais. O carisma neste caso representa apenas o poder de convencimento exercido pelo líder. Do contrário, na maioria das vezes, este apresenta-se como uma figura autoritária, despótica, firme.
               Este tipo de dominação ocorre principalmente em momentos de insatisfação popular. Em desacordo com o governo vigente, surgem figuras que servem de ícone para dar início a um processo de revolução e instauração de uma nova unidade confirmada nas decisões deste que assume a posição de líder.
               Em exemplo, podemos utilizar o maior bando de cangaceiros do Brasil, liderado por Lampião:
               Virgulino Ferreira da Silva, conhecido como Lampião, nasceu em 1897 no estado de Pernambuco. Dezoito anos depois, ao acusar o empregado de seu vizinho de roubar seus gados e não obter nenhum reembolso, ele e dois de seus irmãos começaram a efetuar roubos na propriedade deste. Por tal motivo, começaram a ser perseguidos por policiais.
               Durante uma dessas fugas, morre a mãe de Lampião, e em seguida seu pai, através de um tiroteio contra a polícia. Jurando vingança, Lampião formou um bando a princípio com seus dois irmãos, primos e amigos. Efetuando roubos a comerciantes e fazendeiros, estes permaneciam com parte do roubos e a outra distribuía entre os pobres. Com o passar dos anos, o bando somou cerca de 30 a 100 pessoas, mas o número variava de acordo com o prestígio do líder.
              Lampião não possuía prestígio por seu cargo ou porque o tempo o fazia assim. Apenas desenvolvia papel de líder por suas próprias habilidades de convencimento e confiança de seus apóstolos. Por vencer todas as batalhas contra a polícia até a última que gerou sua morte, ele era visto como uma figura quase divina cujas habilidades de liderança militar eram excepcionais. Por este motivo, era simples acreditar que seguir seu bando era uma das mais viáveis opções.
               Outro exemplo de dominação carismática foi a exercida por Gandhi:
               Mohandas Karamchand Gandhi (1869-1948) foi um advogado, líder espiritual e pacifista indiano que através de um princípio chamado satyagraha incentivava o protesto de forma pacífica. Lutou pelo o direito dos povos, sobretudo camponeses e operários mais pobres, contra a dominação britânica sobre a Índia e a rivalidade entre hindus e muçulmanos.
               Através jejuns intermináveis, Gandhi atraiu a atenção de grandes massas que o seguiam e por diversas vezes foi preso pelo governo por iniciativa de revolução. Seu poder de convencimento não advinha de sua formação como advogado ou sua representatividade espiritual, mas de sua própria personalidade, sua coragem e habilidade retórica. Suas frases de efeito até hoje são utilizadas em discursos de diversos temas.
 Max Weber e A Onda:
               Em 2008, é lançado na Alemanha Die Welle, um filme dirigido por Dennis Gansel com base no livro homônimo de Todd Strasser. O filme obteve reconhecimento mundial pela forma que abrange um tema visto de outra abrangência na atualidade.
               Uma escola alemã oferece cursos de uma semana sobre variados temas para complementar a carga horária. Entre dois destes cursos estão o de Anarquia e o de Autocracia. Rainer Wenger, um professor com aparência e atitude jovem, surpreende-se ao descobrir que em desacordo com o pensado, não dará aulas sobre anarquia, tema que possui demasiado conhecimento, mas de autocracia.
               Logo no início de sua primeira aula, Rainer pede exemplos de governos autocratas e quando um aluno responde ser o Terceiro Reich, todos os outros exprimem reações descontentes pelo assunto ser continuamente retratado. No entendimento dos alunos, o tema foi abordado tantas vezes de forma negativa que a instauração de uma nova ditadura seria impossível.
               Instigado por este entendimento e visando reafirmar a facilidade com que sistemas totalitários podem ser instaurados mediante insatisfação popular, o professor Rainer decide realizar um experimento social. Através de medidas simples, inicialmente pede que organizem-se em fileiras retas e sentem-se em duplas com alguém que antes não possuíam contato. Vale ressaltar que essa disposição é realizada pelo próprio professor que une alunos com boas notas e alunos com notas menores e apenas essa medida já faz com que alunos melhorem seus rendimentos.
               Em seguida, assumindo a figura de líder, o professor pede que ao invés de Rainer, seu primeiro nome, seja chamado de Herr Wenger, Senhor Wenger, seu sobrenome. E toda vez que a este um aluno quiser dirigir sua palavra, deverá ficar de pé e dizer também para toda classe. A organização e formalidade imediatamente instauram-se, bem como o respeito exacerbado com este.
               As próximas medidas são a utilização de um uniforme, representado por uma camisa social branca, a divulgação do grupo agora denominado A Onda, a criação de uma logomarca para identificação e a instauração de um tipo de cumprimento específico.
               A individualidade de cada membro da classe agora confunde-se com a dos outros. As tribos, antes notadas já através das aparências, agora não mais são obstáculos para convivência. Todos os membros da Onda defendem-se e interagem igualmente. Entretanto, começam a desenvolver repulsa por indivíduos que dela não participam.
               Tomando proporções inesperadas, a Onda reflete não apenas dentro da comunidade escolar como fora dela. A ideia passa a guiar a vida de seus membros e a personalidade de cada indivíduo confunde-se com a preferência da massa adquirida através da vontade do líder.
               Ressaltando que  o movimento não interfere apenas na vida dos alunos como do próprio Wenger. A detenção do poder em suas mãos o torna individualista e este não percebe as proporções que seu experimento toma. Mesmo através dos constantes avisos por parte dos alunos que, receosos, abandonam a Onda, bem como de sua própria esposa, também professora no mesmo colégio.
               Rainer não possui qualquer entendimento de liderança política. A legitimação de sua dominação sobre os alunos se dá apenas pela concordância de sentimentos. Este, através de discursos de incentivo e interação com os alunos, os torna instigados pelo mesmo sentimento de união. Conforme os próprios retratam, a Onda é maior que eles mesmos. Fazer parte desta executa em todos uma emoção inenarrável e incompreensível. Os seguidores tomados por esse sentimento são capazes de agir conforme a vontade do líder sem ao menos questionarem a validade da ação.
               Ainda que o movimento tenha iniciado-se em meio escolar onde a figura hierarquicamente superior do professor manifeste-se através de tradição, a Onda não está relacionada a esta. Senhor Wenger não possui essa figura pois assim limita os poderes da escola, mas porque dentro da Onda ele possui outro papel. Como se o professor e o líder não estivessem constantes na mesma pessoa, mas em duas.
               Assim como o ocorrido no Terceiro Reich, Hitler para além de sua legitimação legal possuía legitimação carismática. Eram os discursos de perfeita retórica que traziam à tona o nacionalismo alemão e garantiam que os ideais nazistas, por mais absurdos, fossem aplicados.
               Nos regimes de dominação carismática é vista a mesma emoção sentida por brasileiros que em período de Olimpíada e Copa do Mundo esquecem todos os problemas relacionados ou não ao descontentamento político. As vontades são suprimidas, ainda que involuntariamente, pela admiração pessoal ao líder e seu discurso.
               Dessa forma, o tipo de poder identificado no filme é o manifestado pelo carisma. A figura de liderança do Herr Wenger solidifica-se na Onda através da Dominação Carismática de seus alunos.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Durkheim e o Fato Social
I. Introdução
               Émile Durkheim, dentre tantas outras ocupações, foi um sociólogo francês responsável pela sintetização de estudos sobre a influência de uma sociedade na vida do indivíduo que a integra. As atitudes tomadas a partir desta influição ele nomeou "Fato Social", decisões tomadas pelo humano não a partir de sua vontade, mas da influência tácida ou expressa do meio onde vive.
               Ressalta-se que nem todas as ações efetuadas pelo indivíduo são consideradas fatos sociais. Para isso, devem atender aos critérios de coercitividade, exterioridade e generalidade. Coercitividade revelada na obrigatoriedade de cumprir determinadas normas impostas por uma comunidade, seja pela espontaneidade (efetuadas de forma mais orgânica pelos membros desta) ou legal (prevista pela lei). Exterioridade na medida em que o indivíduo não exerce influências imediatas nos padrões, uma vez que já existiam antes de seu nascimento e continuarão existindo após sua morte. Competindo a este apenas o conhecimento e cumprimento. A generalidade dá-se na aplicação das normas, uma vez que não cabem apenas a uma pessoa, mas todos os componentes do grupo.
               Considerando o fato social como ação realizada pelo indivíduo, a instituição social é o meio que a regula. É aquela que age de encontro à implantação de mudanças com o objetivo de manter a ordem e a estabilidade. Quando não se dispõe de maneira clara e concisa, tem-se o estado de anomia, total limbo no conceito de organização.
 II. Direito como Fato Social
               Ao realizar breve busca do significado da palavra "Direito"como substantivo, encontra-se enorme leque de resultados:
"Significado de Direito         substantivo masculino
Reunião das regras e leis que mantêm ou regulam a vida em sociedade.
Ciência que estuda essas normas, leis e regras, em seu aspecto geral ou particular.
Reunião dessas leis e normas que vigoram num país.
Aquilo que é garantido ao indivíduo por razão da lei ou dos hábitos sociais: direito de frequentar qualquer escola.
Permissão legal: direito de pesca.
Prerrogativa legal para impor ou para obedecer uma medida a alguém.
Que expressa justiça; correto."
< https://www.dicio.com.br/direito/>. Acesso em: 20/09/2017.
               Dessa forma, considerando a complexidade de significâncias que a palavra "direito" comporta, é na mesma proporção que se exprime a complexidade de defini-lo ou não como Fato Social. Podendo até mesmo confundir-se com a Instituição Social também estudada por Durkheim.
               Considerando Fato Social como aquele regulador da forma que o cidadão deve se portar, é exatamente esse posto que o Direito assume. Através dos parâmetros do que é melhor para o bem-comum e manutenção da ordem, ele é responsável por catalogar os ditames do que é certo ou errado, do que se deve ou não fazer. Assumindo o papel de reunir os apontamentos sociais de maior relevância, age nas esferas da organização do Estado, atos de proteção à vida, negócios jurídicos, etc.
               Sobre os requisitos que distinguem mera ação e fato social, deve-se analisar a coercitividade, exterioridade e generalidade conforme dito anteriormente. É inegável a função coercitiva que exerce o Estado a partir das normas ditadas pelo Direito. Quanto à generalidade, o próprio Artigo 5º da Constituição da República institui o princípio da igualdade. Entretanto, no que tange à exterioridade, existe uma dualidade. Ainda que as regras existam anteriormente ao nascimento do indivíduo, é real a possibilidade de efetuar mudanças, uma vez que a própria legislação exerce essa previsão. Assim como também podem ser criados novos regimentos, sem qualquer antecedente a ser modificado.
 III. "V de Vingança" e a influência de Durkheim
                O filme referido retrata a projeção fictícia de uma Inglaterra dominada pelo medo. Após uma grande guerra, a liderança do país é assumida por um partido extremamente conservador cuja promessa é a proteção contra ataques biológicos, uma premissa utiliada apenas para tomada do poder e uso desmedido de fundos monetários.
               Para manutenção do poder com confiança por parte da população inglesa, o partido cria - obviamente em sigilo - um vírus capaz de terríveis consequências, bem como a cura para tal. Para que esta fosse comprovadamente eficiente, o partido apriveitou-se de seus inimigos políticos como cobaias. Através de um centro de detenção denominado Larkhill, os revolucionários eram presos, torturados e testados sem qualquer preocupação com as consequências. Levando-os a morte na maioria das vezes.
               Como uma reviravolta, ocorre um acidente que explode todo LDC (Larkhill Detention Center). Matando não apenas os prisioneiros como a maior parte dos funcionários. Entretanto, em meio às chamas surge uma silhueta humana completamente desfigurada. Este é V. Devido a intensidade das torturas ele não mais recorda seu nome, identificando-se assim pois o número de sua sala era 5 - em romanos, V. Sua presença assusta ainda mais todos os presentes, uma vez que não demonstra qualquer sinal de dor ou sofrimento, mesmo tendo todo seu corpo inteiramente queimado.
               Contudo, antes do incidente ocorrer, o vírus já encontrava-se pronto e os membros do partido utilizam-se dele na dispersão em locais públicos para o maior alcance, massacrando milhares de pessoas. Tomada pelo irrefutável medo cada vez mais instigado pela mídia, a população desesperada vê em seus governantes a única saída. Estes, manipuladores sem qualquer escrúpulo, então lançam a cura. Falsamente comprovando ter valido a pena toda confiança no partido, representado em maior patamar pelo alto chanceler Sutler.
               Nesse momento ressurge V, agora com seu corpo escondido por roupas escuras, capa e máscara (por conta das queimaduras), involto pelo sentimento de vingança. Conforme suas próprias palavras, seu objetivo é "varrer esses vermes venais e virulentos da vanguarda do vício que permitem a viciosa e voraz violação da vontade”.
               A partir desta frase já torna-se possível a conexão com a ideia de fato social trabalhada por Durkheim. Nesse momento não fica claro quem V chama por "vermes virulentos": o Estado, a sociedade ou os "homens-dedo" (guardas de suma relevância dentro do partido). O que fica determinado é a certeza de que estes são responsáveis pelas normas proibitivas que levam o indivíduo para longe de sua própria natureza, seu arbítrio.
               Entretanto, em outro momento da trama, quando V reproduz um anúncio pedindo que todo povo inglês junte-se para derrubar o partido, ele deixa claro quem é o responsável por essas proibições desmedidas:
"A verdade é que há algo terrivelmente errado com este país, não há? Crueldade e injustiça, intolerância e depressão. E onde uma vez você teve a liberdade de objetar, pensar e falar, você agora tem os censores e os sistemas de escutas que exigem sua conformidade e que solicitam sua submissão. Como isto aconteceu? Quem é o responsável? Certamente há aqueles mais responsáveis que outros, e serão repreendidos. Mas a verdade seja dita outra vez, se você estiver procurando o culpado, você necessita olhar somente em um espelho."
               Se em outro momento da história o rei Luís XIV pôde dizer "L'État c'est moi", na visão de V é o povo quem deve dizer isto. O Estado é o povo, o Estado só existe no povo. A sociedade só está presa em uma falsa noção de realidade porque assim ela determina. As ameaças não são nada mais que instrumentos utilizados por ela mesma na medida em que é do povo que o Estado se forma.  
               O Estado não é um ente natural, se ele existe e possui suas falhas, é porque o homem, ainda que representado pela parte de um todo, não possui a sensibilidade de compreender até onde a limitação pode ser positiva. Até onde de fato visa o bem comum. V tenta surtir na população o entendimento de que a situação somente será alterada a partir do momento em que todos, coletivamente, mudarem a forma de enxergar a realidade. E, principalmente, entenderem que ordem não é sinônimo de totalitarismo.
               William James, filósofo e um dos fundadores da psicologia moderna disse: "Há várias medidas para medir a vontade humana. A mais exata e a mais segura é a que se exprime por esta questão: de que esforço és capaz?".  Na visão de V, a única saída para circunstância que a Inglaterra se encontra é de extremo esforço e dimensão. Assim como a Revolução Francesa instigou o espírito revolucionário pela queda de Bastilha - antes símbolo do absolutismo francês, a destruição do parlamento inglês representaria também o fim da era totalitária inglesa.
               Diferente da visão negativa de anomalia apurada por Durkheim, V não aparenta enxergá-la como absoluto sinal de desorganização. Do contrário, ele acredita apenas deste estado de limbo político surgir o real sentimento de união de um povo. Não porque um regulamento jurídico ou social perdura, mas porque existe a identificação com a identidade nacional.
               Desta forma, ainda que V não tenha vivido o suficiente para enxergar as maiores mudanças propriamente, seu objetivo de destronar os tiranos do partido político vigente e levar a verdade sobre manipulação da vontade popular foi cumprido.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Servidão por Dívida
              O relatório a seguir é uma breve exposição do subtema "Servidão por Dívida" apresentado durante a palestra sobre trabalho escravo ocorrida no dia 10 de agosto de 2017 durante a Semana Jurídica produzida pelo Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Católica de Petrópolis.
               Ao pesar sobre escravidão, duas definições são atingidas de imediato: aquela onde, por conta da vanglória à raça branca, negros africanos eram capturados, acorrentados e levados a outras regiões para conceder trabalho sem remuneração - sob pena de morte e/ou tortura quando negavam-se - ou aquela efetuada por maias, gregos, egípcios e romanos quando seus inimigos perdiam para estes na guerra.
               Entretanto, a realidade contemporânea abrange o termo com maior escala. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, trabalho escravo é aquele degradande onde ocorre a privação de liberdade, seja ela nas mais diversas magnitudes.
               De acordo com o Ministério do Trabalho, de 2003 a 2011, foram resgatadas mais de 30 mil pessoas em situações de trabalho escravo. Os casos concentram-se nas indústrias de madeira, carvão e minério, construção civil e lavouras de cana, algodão e soja. Além dos casos onde o tipo de serviço torna-se física e moralmente ainda mais degradantes, como o turismo sexual praticado no Nordeste.
               Uma frequente questão conduzida pela população é de onde surgem os meios que traduzem uma oportunidade de trabalho ao estado de escravidão. Além dos casos menos comuns - como os de sequestro e ameaça imediata à vida-, a explicação está em uma característica especial brasileira conhecida como "Servidão por Dívidas".
               Em 2015,  a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - Aspectos das Relações de Trabalho e Sindicalização,  divulgada pelo IBGE, informou que dos 51,7 milhões de empregados no setor privado, 2,9 possuiam algum tipo de dívida com o empregador que os impossibilitava de declinar o vínculo empregatício. A números práticos, cerca de 1,5 milhões de brasileiros encontravam-se nessas condições pelo último senso.
               Em casos de servidão por dívidas, usualmente a mando de fazendeiros, aliciadores conhecidos como "gatos" digirem-se a regiões distantes dos locais de prestação de serviços e oferecem à população local oportunidades de emprego com ótimas condições. Geralmente efetuam pagamentos adiantados às famílias e oferecem moradia, alimentação, vestuário e ferramentas de trabalho aos futuros empregados. Por conta da alta taxa de desemprego, ou apenas oportunidades que não se equiparam às oferecidas pelos aliciadores,  os trabalhadores iludem-se e sem titubear encaminham-se imediatamente junto aos "gatos".
               Entretanto, ao chegar nas regiões de prestação do serviço, deparam-se com circunstâncias de extrema discrepância do descrito. Ao contrário do que se pensava, todos os  gastos com o trabalhador são imediatamente debitados do mesmo. E isso a partir do preço estipulado pelo empregador, sem considerar o disposto no mercado.
               Dessa forma, a pessoa nunca se vê livre da dívida contraída. Uma vez que, quando pensa tê-la liquidado, mais cobranças são feitas e os irrisórios salários diminuidos para que nunca seja suficiente. Por conta dos empregadores serem vistos como donos das regiões, quando os trabalhadores têm atitudes contrárias, sofrem as mais diversas violências físicas e chegam a ser duramente torturados, em alguns casos levando à morte.
               A prática é tão recorrente que tomou destaque nos meios internacionais e foi tratada em segundo plano no filme de grande público denominado "Bem-vindo à Selva", dirigido por Peter Berg, tendo como fundo o cenário amazônico de uma mineradora.
               Ainda que o governo possua iniciativas contra a recorrência da servidão por dívidas, as medidas nunca parecem suficientes. Além das investigações, em 2004 foi realizado um cadastro dos empregadores punidos por exploração do trabalho e estes tiveram seus financiamentos federais cortados por um ou dois anos. Contudo, não se pode equiparar a prática deferida com a punição recebida.
               Por conta da falta de soluções a longo prazo, os trabalhadores antes escravizados procuram reatar laços com os aliciadores. Sem alternativas eficazes, mais vale trabalhar sem a dignidade de ser livre a perecer sobre o desalento do desemprego.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Yin-Yang
Hoje peguei-me pensando em você. Servia um punhado de café na minha xícara de leite e ri comigo relembrando quando disse-me só gostar de café preto. Eu só bebo pingado. Chega a ser engraçado nosso nível de divergência. Meus cabelos são loiros e lisos, os teus pretos e encaracolados. Eu não paro de sorrir e de ti não ouvi uma gargalhada. Minhas mãos estão sempre frias e as tuas quentes até mesmo na madrugada. Nunca conversamos muito. O silêncio confortável provavelmente vinha da mútua vontade de continuarmos juntos. E as palavras apenas nos afastavam. Aliás, em uma das poucas conversas duradouras descobri que no seu braço encontrava-se um sol. Nas minhas costas era tatuado um floco de neve.
Continua...
Assim como nós. 
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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Você é um romântico incurável. Tão romântico que todo o amor do mundo real jamais estará à altura do seu romantismo. Está é sua tragédia, dentre tantas outras.
Nuestros Amores
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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DOS TIPOS DE CARAVELAS
     Eu demorei, mas finalmente entendi. Você dizia-se preparado, mas eu insistia em perguntar se estava confortável. Talvez fosse minha intuição falando mais alto, meu subconsciente preparando-se para sua partida, ou minha racionalidade acreditando não ser possível alguém como você, tão metodicamente encantador com você, estar apaixonado e no mesmo ritmo que eu. É, você não estava.
     Tento não pensar muito em ti, no que vivemos. Mas, sem querer ou perceber, pego-me lembrando dos teus olhos cinza, verdes e outrora azuis. E quase choro ao passar por um carro como aquele que costumava ser a nossa casa. Revivo tua pele macia acariciando minhas mãos enquanto nossos braços dispunham-se entrelaçados. Isolados pelos vidros embaçados por conta de nossas respirações.
     Não consegui acabar aquela série que prometemos assistir juntos. Tenho medo que eu seja a Hannah Baker e você o meu único “porquê”. Não consigo ouvir aquela música que apresentara-me. Sempre lembro da rua risada quando confundi-me e cantei: “É você que tem a boca tão gigante e os olhos tão gostosos”. Não consigo assistir “A 5ª Onda” que tanto queria. Meus olhos dispersam-se ao lembrar que, quando tentamos assistir, foi a última vez que te vi.
     Em Grey’s Anatomy, a Meredith diz que nunca lembramos do último beijo apaixonado pois não esperamos que seja o último. Mas eu devia esperar. Eu devia saber que seria nosso último beijo. Eu deveria ter percebido que você estava absorto e eu inteiramente perdida em ti.
     Chamava-me de “caravelinha”, mas certo dia percebi que falávamos de objetos diferentes. Você referia-se àquele barco. Aquele que superficialmente navega pelo oceano. Estando ali apenas como um meio. Partindo sempre de um início e buscando sempre um fim.
     Mas eu não. Pensava naquele animal que condiciona toda vida ao oceano. Aquele que apesar de estar viajando, caçando e protegendo-se, era intrinsecamente ligado ao mar. Sabendo que, independente das frustrações e mudanças ao longo da vida, ele estaria ali.
      Eu chamava-te de “meu oceano”.
     Talvez você não soubesse a significância que tinha para mim. E apesar da ciência de que poderíamos não ficar juntos para sempre, pedia todas as noites que sim. Pois não sabia que não era oceano, mas chuva de verão. Aquela que vem, inunda o pavimento, muda a rotina e vai-se na mesma rapidez.
     Eu deveria saber.
     Mas talvez eu sempre soube. Soube que sua partida seria tão súbita quanto a chegada. E a sua tão constante presença fosse uma forma de vivermos intensamente e não deixarmos por metades. De fazer tua passagem tão importante quanto a mais longa estadia.
     Henry Miller disse que o melhor jeito de esquecer uma mulher é transformá-la em literatura. Honestamente, eu não queria esquecer-te. Mas apagar você doerá menos que culpar-te. Porque você partiu antes de mim. E como diria Anavitória: “Nem me deixou barco frágil pr’eu me salvar do naufrágio que foi te dar meu coração”.
     Você sabia que não sentia, mas eu sequer preparava-me para solidão. E, no final das contas, “oceano” era a vida; você, a caravela que seguia; e eu, a que perdida contemplava a imensidão.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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EU QUERO PARTILHAR, EU QUERO PARTILHAR A VIDA BOA (TODA) COM VOCÊ
     Uma das maiores belezas da vida é saber reconhecer os erros e não temer admiti-los. Eu errei. E agora admito.
     Ontem mesmo, ou algum dia qualquer - sempre digo que o tempo é relativo quando estou com você, conversávamos sobre essa música. Disse-te que ao contrário da letra original, não queria apenas passar a vida boa, e sim a vida toda com você. Enganei-me.
     Acreditei querer passar a vida sob quaisquer circunstâncias ao teu lado, mas não. O que quero contigo é sim viver a vida boa. Porque apesar dos momentos difíceis que iremos enfrentar, quero que nossas vidas valham a pena. Quero que olhe para trás e diga: “fui e sou feliz”.
     Quero estar contigo quando conseguir sua BMW lá pelos 30 anos. Quando chegar à beira das Falésias de Moher e cantar o tirolês - só para ter certeza que está ali mesmo. Quando, no mais frio inverno, você deitar ao lado da lareira e me disser “ainda te amo”.
     Também não me esqueço de que quero estar contigo quando nosso saldo bancário chegar ao fim. Quando não tivermos tempo de sair para jantar. Ou quando pensarmos “por que a vida precisa ser assim?”.
     Mas se em algum momento condiciono tua vida a não ser boa, faço teus dias não merecerem ser vividos, deixe-me ir. E saiba que serei eternamente grata pelo tempo que me fez feliz.
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queijocomgoiaba · 8 years ago
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SOBRE A SAUDADE
     Agora são 18:19. Às 11 eu te vi e desde às 10 comecei a sentir tua falta. Quando dizemos estas palavras pretendemos narrar sobre a falta do abraço, do beijo... Mas não é isto. Sinto falta de ti. Não do que pode me proporcionar.
     Claro, sinto falta do carinho que fazemos em nossos rostos ou da involuntária disputa para ver quem coloca primeiro o cabelo do outro atrás da orelha. Só que maior ainda é minha saudade da tua presença. Saudade de saber que você está ali.
     E independente do pandemônio que ocorre fora da nossa bolha de amor e carinho, sei que por alguns segundos somos eu e você. No nosso próprio mundinho de felicidade e insegurança do que a vida pode nos proporcionar. E mesmo sem saber o que o futuro aguarda para nós, ou ainda se haverá um futuro, serei eternamente grata pela intensidade que vivemos nosso presente.
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queijocomgoiaba · 9 years ago
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queijocomgoiaba · 9 years ago
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