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#Josoeph Rookwood
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A colheita por Josoeph Rookwood
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Os meus olhos seguem a manada de ovelhas que pasta cuidadosamente numa das montanhas que rodeiam o Distrito 10. É feriado, mas de qualquer maneira não quero estar lá. O receio; o medo; a estranha sensação que o estômago vai sair-nos pela boca; tudo isso juntou-se hoje ao meu lado, e de quem é a culpa? Capital. Abano a cabeça suavemente, de olhos fechados, para o lado esquerdo e depois para o lado direito. Espero que estes sentimentos acabem por passar. A minha visão está fraca demais para conseguir ver as ovelhas que já se afastaram o suficiente para deixar de ouvir o cão a ladrar. O sono que não destruí na noite passada começa-me agora a penetrar no cérebro. Preciso de descanso, mas mal fecho os olhos os pesadelos de uma arena em chamas devoram-me. Retiro de uma bolsa simples de coro o que mais parece um apito de madeira. Possuí dois furos estreitos na lateral, para deixar sair o ar, e uma "cova" no topo. Este instrumento foi construído por mim, na noite passada. Depois de estudar, consegui perceber o que chama realmente a atenção às ovelhas: um desagradável ruído agudo, que pode-se confundir com o barulho de um aeronave da Capital. Inspiro com força, enchendo os meus pulmões de ar. Assim que sopro para o interior do tubo, o ruído estende-se pelo ar. Assim que o eco se propaganda-se no interior das árvores, o som é substituído por diversos passos e chocalhos de metal. Aos poucos, o latido de um cão e finalmente uma mancha branca aparece no meio de ervas daninhas. Abro novamente o saco de couro e arrumo delicadamente o apito no seu interior. O saco não têm mais do que alguns bolsos para guardar coisas que encontro caídas no chão, para mais construções. O Sol começa a queimar-me a pele. Esse é o sinal que aquele lugar não se tornou mais seguro. Em breve, os pacificadores vão aparecer na minha casa e esperam-me encontrar-me lá como um bom menino, a almoçar.
Desapareço com o rebanho no meio de uma cerca de madeira. Com passos breves, entro em casa. Uma moradia larga mas baixa, com três quartos. A cozinha está ligada a uma luxuosa sala de estar e à farmácia do Distrito - ao qual os meus pais dedicam o seu tempo e vida. Quando entra-se na cozinha, pelas traseiras, encontra-se um alçapão velho e as escadas para o andar de cima. A energia é algo que apenas se pode ter de vez em quando, porém, as velas são abundantes em cima dos moveis e dos locais onde a superfície é plana. - Mãe? Mãe cheguei a casa. - Grito com a voz rouca. Estou imundo, e é certamente certo que a minha mãe vá reparar nisso. As mãos de uma mulher baixa, gorda e com o cabelo delicado e grisalho tocam-me no ombro. Recebo diversos avisos para estar a horas em casa e os perigos de passear o rebanho sem proteção, mas nenhum outro é tão doloroso como o puxão de orelhas que levo por ter sujado a entrada com lama. Sou depositado no meu quarto - uma área quadrada, com uma janela que dá para as ruas, onde o Sol bate logo pela manhã. As paredes tomam o tom de um castanho muito claro, e a mobília velha é a mais básica que pode existir no mercado. A cama raramente está feita; os lençóis são mudados uma vez por semana, e só aí é que encontro o meu quarto arrumado. À direita da porta, encontra-se uma secretária de madeira, cheia de utêncilios de metal e armas ou brinquedos feitos em madeira. Atrás do roupeiro, um "alvo" pintado por mim é escondido, e serve-me de treino para quando atiro as facas que crio. Gosto de testa-las. 
Tomo um banho rápido. A água potável só é disponível no andar de baixo, por tanto, tenho que me enfiar numa banheira de chumbo com água fria. Lavo a cara diversas vezes, sentindo-me ainda com vontade de vomitar o meu estômago. Nunca fecho os olhos. Não quero. Mas preciso. Preciso de descansar e eu sei disso, mas não quero. Não quero ver a minha morte face a um Profissional. Lembro-me do vencedor do Ano Passado. Ele matou metade dos tributos na arena. Metade... Como é que alguém consegue viver com esse número na cabeça? Afundo-me debaixo de água e volto à tona para respirar. A banheira não é funda; por tanto os meus pés ficam de fora quando mergulho. Assim que termino o banho, encontro a minha cama feita e uma camisa branca sobre a cama. A acompanhar o conjunto, umas calças normais cinza e uns sapatos que devem ser, obviamente, do meu pai. A minha mãe não aparece pelo quarto a dentro para me pentear, como fazia nas anteriores colheitas. Em vez disso, sou eu a pentear-me sozinho. Em frente a um espelho de tamanho reduzido, com o símbolo de Panem cravada numa rocha pregada à parede, consigo colocar o meu cabelo um pouco mais formal. A seguir, ajeito as mangas da camisa para as colocar até aos cotovelos. Está na hora... Do assassinato de dois adolescentes. 
Sou posto fora de casa pela minha mãe e arrastado até à Praça Central. A Casa da Justiça está bastante bonita hoje, porém continua com aquele ar cinzento que têm todos os anos. Os rostos das pessoas estende-se por todo o distrito. Não consigo distrair-me de uma garota que chorava agarrada à irmã. Ela, não deve ter menos de doze anos e a pequena deve ter pelo menos uns cinco. Como é que alguém fica feliz com isto...? Aguardo na longa fila, mantendo o meu olhar vidrado na minha mãe e no meu pai. Sinto o nervosismo deles... Tal como o meu. Sou filho único, e só os tenho a eles. Uma gota de sangue vivo aparece-me no dedo, e é destruída no registo, numa folha normal de papel com o meu nome. "Isto... É apenas um programa de televisão.", penso tentando abafar os gritos da garota que ecoavam na minha cabeça. Sou levado para uma das filas de rapazes de trás, vendo apenas o palco. À frente, sentado, o único vencedor do Distrito 10, Levenn; Matou um profissional final usando a água como refugio. Porém não deixa de ser um assassino. Por fim todos se calam. Os nervos aumentam e as garotas apertam as mãos. - Boa sorte Dianna... - Murmuro com a cabeça baixa. Dianna, a garota que eu sempre tivera uma paixão secreta e que talvez nunca fosse dizer-lhe. Gritos. Choros. Mães destroçadas. Não conseguia olha-la; ela subiu ao palco naturalmente, mas soube que não era Dianna. Que o meu apelo tinha sido ouvido. O meu coração para assim que ouço a voz rouca do apresentador do Distrito 10 a gritar: "E agora os meninos..."
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