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Ethiane Benedicta
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ethianebenedicta-blog · 8 years ago
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Retângulo em verde-musgo-quase-preto de bordas irregulares.
Numa tarde típica, chego em casa por volta das 15 horas e me deparo com, na sala de jantar, minha mãe dando aula a um de seus alunos. Fato recorrente na minha casa. Ele tem por volta de 6 ou 7 anos e, agitado, me cumprimenta. Naturalmente nos vemos algumas vezes, quando nossos horários coincidem. É necessário contar antes de mais nada que a criança possui naturalmente um lado sensível, ligado ao visual, desenvolvido. Interessado nas minhas produções, ficou ciente através da minha mãe, sua professora, que fotografo, pinto e ocasionalmente modelo (semanas antes já o tinha apresentado peças em gesso que secavam num móvel ao alcance de sua vista). Uma das situações que mais chamou minha atenção foi o fato de que, após ter entrado no meu quarto - em que exponho nas paredes boa parte das coisas que produzo -, perguntou o porquê, depois de observar um pouco, de não estarem em outro lugar, para que mais pessoas vissem. Voltando para o dia em questão, ele veio me mostrar animado a pintura que concluíra: um grande retângulo em verde musgo quase preto, de bordas irregulares, que representava para ele, ao ser questionado, um mundo sem salvação, tomado pela poluição. Era uma atividade proposta pela escola. Algumas coisas passaram pela minha cabeça naquela tarde: talvez ele precisasse de apoio antes de aulas de reforço. Como seria incrível que crianças como essa vivessem em uma sociedade mais sensível, aberta a outras possibilidades que não apenas as que somos coagidos a privilegiar: matemática, ciências, português e, mais pra frente: química, física, biologia, etc. Obviamente, aquilo me comoveu até mais do que gostaria. Incentivei sua produção dentro do meu alcance citando Rothko, falando sobre arte, abstração e expressão, não necessariamente nesta ordem. Passei o resto da tarde imersa num misto de sensações - das quais muitas foram novidade -, entretanto uma se pronunciava: o lecionar. De repente me vi trilhando o caminho certo, e no momento sou apenas gratidão pelos pequenos grandes acontecimentos reveladores da vida.
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ethianebenedicta-blog · 8 years ago
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George Love, paisagens e liberdade criativa
Claudia Andujar e George Love lançam, em 1978, um livro revolucionário de fotografias sobre a Amazônia, trazendo a tona reflexões sobre o papel social assumido pelo índio na civilização ocidental. Papel esse que vai de um completo descaso, permeando por estereótipos quando pensamos no modelo capitalista em que vivemos. Optaram por utilizar, portanto, simbolicamente as pontas dos negativos. Love, fotógrafo americano e membro da Associação dos Heliógrafos dos EUA até então, se une ao trabalho de Claudia trazendo uma linguagem única e experimental. Via a fotografia como pura expressão e não apenas como registro da realidade. Foi quando optou por sobrevoar a Amazônia, produzindo imagens etéreas com cores fantasiosas, que parecem registros de sonhos.
Com as várias mudanças culturais que trouxe o início do século XX, a fotografia procurou distanciar-se da estética pictórica para aproximar-se de uma linguagem moderna. Uma série de clubes e associações que se caracterizavam por uma liberdade criativa, desconstruída de seu referente, muitas vezes abstrata e experimental, tornaram-se muito difundidos na primeira metade do século XX. Esse movimento revolucionário teve seu ápice em dois polos: Europa e Estados Unidos, país de origem do George Love.
Love muda-se para São Paulo em 1966, onde trabalha como fotógrafo em revistas como Realidade, Claudia e Quatro Rodas. É possível perceber, em alguns dos seus trabalhos, suas impressões pessoais sobre o ato fotográfico caminhando em direções opostas à dita “fotografia como espelho do real”. Mesmo inserido socialmente em um contexto em que se pensava a fotografia como testemunho do real, fortemente influenciado pelo fotojornalismo do entre guerras, Love inventava e reinventava o ato fotográfico provando que este esta além do testemunho do real. Reconhecendo o potencial simbólico da imagem fotográfica, materializava sentidos e sentimentos através da escolha, transformando, fragmentando e desconstruindo seu referente.
Quando falamos em fotografia de paisagem, faz parte do imaginário coletivo figuras como Ansel Adams (1902-1984), também estadunidense e um dos responsáveis pela fundação do grupo f/64. Em busca de uma arte fotograficamente pura, atrelado ao domínio da técnica, produzia imagens geralmente em grande plano, extremamente nítidas, alcançadas por uma alta profundidade de campo [1]. Love, em sua série de paisagens aéreas, presente no livro Amazônia, trás uma abstração própria que o distancia do referente e o aproxima ainda mais do tema fotografado. Transformando suas imagens em obras que transmitem sensações. Ao optar por se afastar da nitidez, o artista controla os sentidos [2]. A inclinação da imagem, seu horizonte que seria tecnicamente reprovado por muitos fotógrafos, faz com que o observador transcenda, permitindo que sobrevoe a Amazônia pelos olhos de George Love. É possível imaginar, através das cores azuladas da imagem, como seria atravessar as nuvens frias [3]. É um mergulho nos sonhos. A vastidão é representada pelas árvores transformadas em união de pontos, que por sua vez criam textura, se estendendo até sermos lembrados, através da vinheta, de seu fim [4]. Capturando planos mais fechados, Love mostra quase detalhes de uma Amazônia magnífica, rica em seu sentido mais amplo, porém interrompida, retalhada, desfragmentada. Seja mostrando a quebra de um relevo, seja utilizando pontas de negativos, ou na união de ambos [5].
De contextos histórico-sociais diferentes, George Love e Ansel Adams fotografaram paisagens. Produziram imagens com e sem nitidez. Ambos fizeram uso da técnica a seu favor, um transcende outro se aproxima de seu referente. Procuram preservar a linguagem de seu suporte, ou bebem de outras fontes, se ligando a outros campos. Impressionaram àqueles que leram suas mensagens, comoveram, instigaram, e refletiram sobre seu processo criativo.
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1. The Tetons and the Snake River, 1942. Ansel Adams.
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2. Amazônia, 1978.
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3. Amazônia, 1978.
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4. Amazônia, 1978.
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5. Amazônia, 1978.
. Frames do vídeo (Fotolivro ‘Amazônia’) disponível aqui.
. Mais sobre o fotolivro aqui.
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ethianebenedicta-blog · 8 years ago
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Estágio e outros pensamentos
Se tem uma coisa que tem me incomodado ultimamente é a obrigatoriedade do estágio supervisionado. Cadeira comum nos cursos de graduação, mas que sempre julguei controversa quando aplicamos a realidade de um bacharel em fotografia. 
O que leva alguém a fazer um bacharel em fotografia? Por que não um tecnólogo? Ou até mesmo, porque procurar essa área específica e não outras, como publicidade ou jornalismo? Já cheguei a, inclusive, cogitar a segunda opção.
Estudar imagem, em especial a fotográfica, era e ainda é meu objetivo nessa graduação. Nessa trajetória de mais de dois anos na academia me deparei com os mais diversos perfis: fotógrafos estabelecidos e recentes no mercado, outros que rapidamente encontraram seu nicho, outros que preferiam a prática a teoria, outros que preferiam teoria a prática. Alguns produziam constantemente, projetos atrás de projetos. Outros passaram a maior parte do curso sem produzir e alguns não produzem. E não querem produzir. Afinal, quantas imagens fotográficas existem esperando para serem descobertas, estudadas, apropriadas e/ou ressignificadas? Entretanto, ao colocarmos os pés no quinto período somos pressionados a nos inserirmos no mercado profissional. Será que todos os cursos deveriam ter que se encaixar nessas especificações?
Temos também outros pontos que vale salientar. O mercado é difícil, principalmente onde estudo e vivo. As vagas, quando são abertas, são mínimas e há uma preferência para que os homens as ocupem. E não há apoio da instituição, o que nos força, na maioria das vezes, a escolher situações incabíveis de trabalho (como ter a opção de disputar com outros cursos uma única vaga de estágio em fotografia na própria instituição particular em que estuda, sem direito a nenhuma espécie de remuneração ou auxílio), visto que temos três cadeiras a cumprir e que sem elas se resume a zero as chances de se formar.
O bacharel em fotografia é privilegiado por ser amplo, na teoria. É um curso de comunicação social com um pé nas artes. Mas na prática é comum ver profissionais de outras áreas fazendo o trabalho que faria o fotógrafo, naturalmente mais capacitado. Enquanto nós, estudantes de fotografia, não conseguimos estágios em museus e galerias por preferirem os licenciandos ou graduandos em artes e/ou museologia. Também é difícil conseguirmos estágio em comunicação e/ou design pela mesma razão. 
Por fim, ficamos restritos a manipulação da câmera, que somos forçados também a possuir, e nada menos que uma “profissional”. Indo de encontro ao que muitos nos contam desde os primórdios: a fotografia vai além da câmera, além do seu suporte.
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