Tumgik
fabianahistoria · 2 years
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Eu passei anos em um relacionamento abusivo, onde eu era atacada tanto pelo abusador quanto pelos seus amigos e seus familiares. Eu vim de outro estado muito jovem e estava isolada. Não que isso influencie em nada. Eu pedia ajuda por telefone mas o máximo que eu ouvia era “casamento é assim mesmo”, ou “fulano é como um filho pra mim, você sempre foi difícil” ou então “foi você quem quis casar, agora aguente as consequências” e também “é normal alguns tapas em um relacionamento”. Eu fui condicionada a pensar que estava errada. Ele me provocava ao ponto de eu ter uma reação onde ele poderia apontar pra mim na frente de todos e mostrar que ele era a vítima e eu a problemática. Eu era a vilã.
Tivemos três filhos. Em cada gravidez ele me tratava mal pois achava que eu estava grávida de outra pessoa. Na primeira, era de um amigo dele pois durante uma festa de casamento eu fui levar a sobrinha dele no banheiro e esse tal de amigo não estava perto. Na segunda gravidez eu tinha ido em um evento de anime com uma amiga e seu primo então eu fiquei grávida do cara. Na terceira é que ele viajava muito para Manaus e provavelmente eu tive algum encontro com um homem qualquer.
Adjetivos como “juquinha” e “jequinha” faziam parte do dia a dia, assim como louca, difícil, problemática, infantil. Eu era forçada a ser amiga dos amigos dele e os receber bem, não importando o dia ou hora. Ele trazia pessoas desconhecidas em casa durante as noites da semana para tratar de negócio e eu tinha que ser a anfitriã. Pessoas que eu nem conhecia. Um certa vez um deles colocou a mão no meu pescoço e disse que eu era linda. Depois desse dia eu ficava escondida no meu quarto com meus filhos.
Eu nunca fui uma pessoa social. Desde a adolescência eu gostava de ficar no meu quarto assistindo filme, ouvindo uma música ou lendo um livro. Nunca senti a necessidade de ir para a casa de alguém ou trazer amigas em casa. Eu sempre fui feliz assim. Minha mãe sabia e até me deu de presente um walkman. Amava aquele aparelho. Uma tia paterna me deu um toca fitas. Gravava muitas músicas, especialmente antigas. Anos 60, 70, 80. Uma vez sai a noite com minhas irmãs e primos. Meia noite liguei pra casa, pedindo pros meus pais me buscar. O pessoal me levou pra casa e com uma promessa que eu nunca mais sairia com eles.
Trabalhei em um hospital depois de terminar o ensino médio. Nunca gostei de socializar com pessoas do trabalho. Não achava certo pessoas que trabalham juntas saírem pra beber, ficarem louconas, ter atitudes estranhas e depois agir como se nada tinha acontecido durante a semana.
Por isso depois que eu casei tudo veio pra cima de mim como uma avalanche. Eu era a problemática por não gostar de ver ninguém, de não ir na casa de alguém sem avisar, de querer ficar sozinha um pouco. Quando eu conseguia ele sempre mandava alguém atrás de mim para conversar e dizer que minha atitude era errada. Eu tinha que me socializar. Eu chegava a passar mal. Dores de cabeça. Ia para o banheiro vomitar. Retocava a maquiagem e voltava com um sorriso falso no rosto e uma bebida na mão. Era mais fácil me socializar estando bêbada.
Família de ex namoradas eram algo comum. Cartas antigas delas também. A ex noiva que trabalhava pra ele. Eu tinha que aceitar. Nessa época eu não sabia o que era triangulação. Mais tarde falo sobre isso. Fora que os familiares dele exaltavam muitas ex e me falavam que se eu não me comportasse ele me largaria por uma melhor e mais bonita. Me falaram isso até da minha irmã caçula. Se ele tivesse a conhecido primeiro ele teria casado com ela. Até ele me falou isso.
Perdi as vezes onde eu era humilhada pelos amigos e familiares dele. Especialmente uma mulher. Uma vez pedi que ela não falasse de certo modo comigo e a resposta foi que Ginko Biloba era bom pra pessoas estressadas e problemáticas. Lembro quando comprei uma manta de lã para dar para o bebê dela. Na minha frente ela pegou e jogou de lado, dizendo que lã não era material para um bebê usar. Dei uma desculpa e fui ao banheiro chorar.
No meu casamento tapas eram comum, assim como outras injurias. Puta, prostituta. As vezes essas palavras apareciam. Uma vez ele gritou com a minha mãe no telefone, falando que eu era uma putinha e provavelmente ela também era. Uma vez a mãe dele viajou com a minha mãe e meus filhos. A minha mãe era a “empregada dela”. Quando minha mãe pediu respeito ficou por meses sendo taxada de pessoa horrível e encrenqueira. Engraçado, quando minha mãe faleceu, o cara foi até Brasília e pagou uma lápide para o tumulo dela. E já eramos divorciados a anos.
Eu fui aprendendo a ficar quieta. A não falar muito. Comecei a jogar jogos, tanto de console quanto de PC. Os mundos eram uma saida para mim. E acabei entrando na bebida também. Só assim conseguia dormir. E nem vou entrar nas vezes que o cara usou bebida pra conseguir algo comigo... Eu tinha um circulo pequeno de amigos fãs de Senhor dos Anéis. Ia na casa deles ou chamava eles na minha casa pra falar da série e assistir algo referente. Meu menino mais velho me acompanhava. Tive que me afastar. Segundo ele eu era amante do marido da minha amiga.
Comecei a fazer uma faculdade de Design Gráfico e acabei virando Representante da turma. Não podia ligar e conversar com ninguém porque eu “provavelmente estava conversando com macho”. Uma vez fui de manhã conversar com a coordenadora do meu curso sobre um trabalho. Quando cheguei em casa a moça que me ajudava me disse que ele havia falado que eu fui atrás de homem.
Mas durante a faculdade eu me sentia bem. Eu adorava aquilo. Quando uma aula era cancelada eu nem voltava pra casa, ficava na biblioteca lendo. Recebi um diploma e fui a melhor aluna do curso. Ganhei até uma pós graduação por isso. Mas era pra estudar a noite. Eu não podia.
Algum tempo depois eu tentei me matar e ele me levou ao hospital. Quando voltamos pra casa, eu ainda estava grogue da medicação. E ele se aproveitou disso. Fez algo horrível comigo. E foi ai que comecei a sentir raiva e nojo dele. Tudo isso que eu passei por anos. Eu não conseguia mais olhar para a cara dele. Então pedi o divorcio. E dois anos depois, quando ele saiu de casa, ele viajou para Brasília para ficar com meus parentes. Até a minha vó que morava em Anapolis ele visitou. E chorava. Ele era a vítima. Eu? O carrasco.
E eu comecei a achar que era mesmo. Só foi anos depois, quando comecei um tratamento no CAPS, e contando tudo isso, é que eu fui informada que as coisas não eram bem assim. Eu fui uma vítima. Sofri gaslighting. Abusos tanto emocionais quanto físicos e sexuais. E nem foi por causa do casamento que eu fui atrás de ajuda.
Talvez eu continue essa história. Ou não. Não me importo com a opinião mais de ninguém ao meu respeito. Acredita quem quiser.
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fabianahistoria · 2 years
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Eu sei que não sou perfeita. Sei que cometi muitos erros e que magoei pessoas durante minha caminhada. Mas nada foi proposital. E carrego cada erro, cada mal que fiz, cada sofrimento que proporcionei, no meu coração. E sofro diariamente por isso.
Mas nenhum sofrimento deve ser eterno. Passei anos deitada em uma cama, anos tendo pesadelos, anos afundando tudo isso na bebida. Até que comecei um tratamento no início do ano. E eu pude começar a entender que eu não sou perfeita. Ninguém é. Todos tem direito a uma nova estrada para poder caminhar e ser feliz. Em crescer e aprender com seus erros.
Aos poucos estou me reerguendo e aceitando o que eu sou. Nunca vou ser a pessoa que vai até a sua casa, que te recebe na minha. Que vai em festas, que se socializa diariamente. Que tem muitos amigos. E eu aprendi que está tudo bem eu ser assim. Se eu estou feliz e bem é o que importa. E o mais importante é que ninguém é prejudicado por mim por eu ser assim.
Por que eu resolvi te convidar a ler um pouco o que eu passei? Não sei. Aprendi a não mais esperar de ninguém ajuda, apoio. A única pessoa que me ajudava, me ouvia e me amava incondicionalmente se foi esse ano. Foi lutar por mim ao lado de Deus. E por causa dela e dos meus filhos eu sei que não estou sozinha.
Meu intuito não é acusar ninguém. É só desabafar. Anos e anos sendo moldada, pedindo ajuda até ter minha voz calada. Anos e anos tentando se fazer compreendida mas sendo abafada. Sendo julgada, difamada, sem poder me defender. Tudo acumulou ao ponto de eu explodir não uma vez mas várias. Pequenas explosões onde afetava pessoas próximas a mim, que acabei até magoando e outras grandes também chamadas de tentativas de suicídio ou último pedido de socorro.
A terapia cognitiva comportamental é algo interessante. Quando procurei o CAPS atrás de ajuda nunca esperava que encontraria um apoio especial. Entendi que além de Asperger eu também tinha um Transtorno de Personalidade Dependente. A medicação ela não age sozinha. E a terapia ajuda, e muito.
Claro que tudo começou quando eu tinha uns sete anos e com o abuso que eu sofri por parte de alguém da família. Nesse momento aprendi a nunca dizer não. A guardar tudo pra mim. Os bullyings e ataques que sofri nas escolas, a não pedir ajuda a um adulto com medo de ser culpada. A sempre ter um nó na garganta, um embrulho no estômago.
Me mantinha através dos meus sonhos e de meus mundos de fantasia. Eles eram perfeitos. E eram alimentados por livros e séries diferentes. O que reforçava a visão que o mundo tinha de mim, de que eu era uma aberração. Não sabia conversar, não sabia me expressar, não levava amigos em casa, não saia pra baladas. E realmente nunca vi problemas nisso, eu me sentia bem e hoje eu ainda me sinto bem sendo assim.
Por esse tempo fui tendo o rótulo de ser uma pessoa difícil. Hoje em dia eu seria uma pessoa que tem todo o direito de falar o que pensa. Mas naquela época não. Eu mal saia do meu quarto. Era do quarto pra escola e depois pro trabalho. O pouco que saia? Quando eu via alguém traindo ou tratando mal outra pessoa. Mas ao falar a respeito eu não prestava.
Quando sai de casa casada, não sabia que eu ainda passaria por coisas que teriam um grande impacto no futuro na minha saúde mental. Eu fui “recrutada” como alguém jovem que pode ser moldada pra ser a esposa perfeita. Que aceita tudo, que apoia tudo. Que aguenta tudo.
Fui aprender sobre Transtorno de Personalidade Narcisista durante a terapia. Nunca imaginaria que eu poderia ter sido uma sobrevivente. De que alguém em vestes de rei mas de coração podre, poderia ser assim. Alguém que pro mundo é perfeito, é a vítima. E que eu sairia como o algoz. O demônio.
Pesquisem a respeito desse transtorno. Sim, tem CID. Reconhecido por médicos. E não, não estou exagerando ou criando teorias de conspiração. É fato. É ciência.
E como essas pessoas conseguem até afastar familiares dos sobreviventes. Campanhas de difamação, choros falsos. Eles sabem escolher a dedo as pessoas onde vão sugar tudo. Pessoas solitárias, incompreendidas. Com histórico de abusos. E tiram tudo dessas pessoas, sugam tudo até deixar elas em pedaços onde mais nada resta a não ser a opção que o sobrevivente tem de acabar com a dor. Não é se matar por se matar. É acabar com a dor. Porque já não temos mais voz pois ninguém acredita na gente.
Eles conseguem provocar ao ponto de fazer com que a gente surte para mostrar que eles tem razão a nosso respeito.
Pra vcs terem ideia, fiquei sabendo da morte da minha mãe, a única que estava do meu lado, por intermédio dessa pessoa. Minha família falou com ele primeiro antes de me informar. Por quê? Eu não tinha ido ajudar minha mãe enquanto ela estava doente. Eu estava doente e ainda estou. Mas a semente que essa pessoa plantou na mente dos meus familiares foi regada com sucesso quando a pessoa apareceu lá depois do funeral e foi acolhida por minha família. Pagou até uma lápide pro túmulo da minha mãe.
Você não sabe o quanto é ruim ouvir de pessoas que deviam te apoiar que o seu abusador, a pessoa que abusou de vc fisicamente, psicologicamente e até sexualmente, é uma pessoa boa.
Mas não guardo raiva. Não guardo rancor. Só não fazem mais parte da minha vida. Escolheram o caminho deles e eu não estou nele. O narcisista sim, mas eu não. E não fico triste mais com isso, aprendi a lição.
Vou tratar sempre bem, quando eu estiver curada, se precisarem de mim vou dar apoio. Mas se não quiserem falar comigo nunca mais não farão falta. Brasília morreu pra mim quando minha mãe morreu.
Eles sabem tudo o que aconteceu. Só decidiram não acreditar e tomar o lado de outra pessoa que não tem o mesmo sangue que eles.
O motivo de eu escrever isso? Faz parte da terapia. Eu tenho que contar, eu tenho que ter esse direito. Mas não espero nada. Não quero acusações, não quero julgamento. Só quero que vc veja que eu não sou a vilã, o demônio, a bruxa má.
Essa foi só uma introdução. A história resumida vai no próximo link.
E preciso tirar isso do peito para começar 2022 bem. Meus filhos precisam de mim. Meu menino precisa de mim.
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