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Gravação de crônica de minha autoria para a disciplina de Narrativas Sonoras, na PUC-SP
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Os novos protagonistas da literatura em São Paulo
Já sabia Caetano Veloso sobre as “duras poesias concretas” das esquinas de Sampa. O “labirinto místico” de Criolo carrega uma simbologia incontestável em suas ruas. Liberta alguns, aprisiona outros, violenta, caótica, injusta, bela, feia, cheia e sozinha. A cidade sucinta emoções das mais diversas em cada um de nós, mas, uma coisa é fato: ela inspira a arte. Se tudo pode virar poesia, aqui essa sensação é multiplicada por mil.
Contudo, durante muito tempo, a poesia e o meio literário permaneceram num universo um tanto quanto hermético. Não se conhecia tanto sobre todas as experiências possíveis dentro da cidade já que, mesmo que uma pessoa de fora das periferias tentasse descreve-las de alguma forma, por exemplo, não seria possível entender a sua realidade completamente. Esse tipo de visão, só alguém que sente a experiência na pele poderia passa-la com exatidão.
Mas a boa notícia é que nas últimas duas décadas esse fato tem se alterado. O espaço de visibilidade era sim restrito as elites, mas a criatividade e a inspiração nunca foram.
“O meio artístico e literário é bastante restrito e seleto, e nós estamos fora dele. Estamos fora das grandes editoras e produtoras. Assim, qual seria a chance de o artista independente dar alguma visibilidade para o seu trabalho? Nenhuma. A saída então foi criarmos a nossa própria cena. Não é a toa que os saraus literários apresentaram um crescimento vertiginoso nas duas últimas décadas. Isso reflete a efervescência criativa dos artistas que cada vez mais, demandam espaços para se expressarem. ” disse Débora Garcia, uma das fundadoras do Sarau das Pretas.
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Logo do Sarau das Pretas
O Sarau das Pretas é um dos presentes que o meio literário ganhou com a ascensão de movimentos vindos da periferia. Nasceu em 2016 quando Débora foi convidada pelo SESC Pompéia a fazer uma homenagem ao Dia Internacional da Mulher. “Assim, em nossa primeira edição reunimos um público muito expressivo, em sua maioria mulheres negras. Foi muito simbólico para nós perceber nossas palavras ecoando, reverberando entre nossas iguais. Ao final da atividade, já nos questionaram sobre a data do próximo sarau e nos meses seguintes, recebemos mensagens e incentivos para continuar. “ disse a artista.
           Assim como se deu para o Sarau das Pretas, se deu para muitos outros sarais por toda a cidade. Enfim, o mundo literário se abriu para além da academia e dos intelectuais. O Cooperifa, idealizado pelo artista Sérgio Vaz, é um dos pioneiros no cenário cultural periférico. Completando 16 anos em 2017, os eventos ocorrem no Bar do Zé do Batidão, na Zona Sul de São Paulo.
Robson Luchesi, frequentador dos sarais organizados pelo Cooperifa entre outros, a sete anos, se interessou pela iniciativa porque acha que, antes de qualquer coisa, são espaços para trocas de informação e para fugir um pouco da mesmice do mundo: “Um ponto muito importante é que dos sarais partem outras atividades literárias, musicais, entre outras, nas escolas, praças, em todo canto. Assim é uma manifestação de quem está na periferia do mundo e que não tem, necessariamente, a ver com localização geográfica.”
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 Sarau da Cooperifa
Quando perguntei sobre o caráter de resistência dos sarais, Robson foi incisivo “Não acredito que esse movimento seja de resistência, quem resiste está sempre na defensiva: trata-se de um movimento de enfrentamento, de propor e fazer, de discutir a condição de cada um, as desigualdades sociais, econômicas.”
E completa como um verdadeiro apaixonado pelos eventos “Os sarais atuais são mais do que faróis, são a própria luz nessa escuridão que o mundo convencional, e mais agora, quer impor. “.
Além dos sarais, seus primos mais jovens, os slams, ou campeonatos de spoken word têm pipocado aqui e ali na cidade. Só em São Paulo são mais de 25 que se espalham por todas as regiões. A descrição do que é performance, feita por Paul Zumthor em seu livro “Performance, Recepção, Leitura” explica bem o que são os slams poetry “Na situação performancial, a presença corporal do ouvinte e do intérprete é presença plena, carregada de poderes sensoriais, simultaneamente, em vigília”. Em suma é isso: a junção do poeta e do espectador que, juntos, levam os sentidos ao seu ápice.
O conceito de slam surgiu nos anos 80 na cidade de Chicago nos Estados Unidos e foi idealizado pelo poeta e construtor civil Mec Kelly Smith. O slam surgiu como um refúgio aos recitais de poesia que eram muito estáticos e permaneciam adormecidos e desconhecidos pelo grande público. Inicialmente os eventos aconteciam num bar de jazz em Chicago, mas no ano de 1986 eles começaram a se espalhar por várias cidades estadunidenses. Cresceu junto e até hoje é primo do hip-hop, isso acontece por causa da natureza poética do rap que os liga e como resultado grande parte dos “slammers” são MCs também.
Slams ou poetry slams são, basicamente, eventos de “spoken words” ou traduzindo, poesias faladas que procuram juntar poesia e performance em clima de competição. Slams ou poetry slams são, basicamente, eventos de “spoken words” ou traduzindo, poesias faladas que procuram juntar poesia e performance em clima de competição.
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Poeta declamando no Slam Resistência na Praça Roosevelt
Para Jéssica Balbino, jornalista e idealizadora do projeto “Margens”, que analisa o movimento da literatura marginal atual, nasceu de um mestrado e hoje já assumiu a forma de um blog, um livro e um documentário, os sarais e slams se tornaram objeto de pesquisa e de paixão.
Balbino conheceu o universo da literatura periférica desde cedo através do hip-hop. “Foi através da cultura hip-hop, com as revistas Literatura Marginal, da Caros Amigos, organizadas pelo Ferréz. Isso foi em 2001/2002. Desde então, me dedico, mesmo que empiricamente, a pesquisar o universo. E a vivenciar também. Passei a ler tudo que saia e eu conseguia ter acesso. A conversar com outros autores. A ler zines que circulavam na época.”
Hoje, com o conhecimento acumulado por anos, a jornalista consegue entender o movimento através de uma visão mais ampla “Os slams e saraus são espaços onde nossa voz é ouvida. Isso já diz muito. É um local onde o microfone – ou o agente que declama – potencializam o que muitos ali querem dizer. O Brasil tem, por característica, ter poesias bastante engajadas socialmente, uma vez que estamos atravessando uma crise, que temos inúmeros problemas sociais, que tivemos 400 anos de escravidão, ditadura e ainda não sabemos ser democracia. Deste modo, quando um poeta vai à frente de uma plateia de 100, 200 ou 400 pessoas e faz sua poesia, isso dialoga com a maioria dos ouvintes ali. “
           Com eventos desse tipo, que usam uma linguagem que acolhe qualquer um que esteja disposto a apreciar, a cultura atingiu um novo público que permanecia à margem desse mundo. Mas como essa disseminação aconteceu? Aqui todos os entrevistados concordam: a internet e, mais especificamente, as redes sociais.
“Um ponto que favorece esta visibilidade são os vídeos. Muitos slams gravam vídeos dos poetas declamando e, em tempos de redes sociais, estes alastram e atingem milhões de pessoas, o que é incrível, porque num país onde a hegemonia da comunicação pertence a alguns grupos endinheirados, termos vídeos de poetas que dialogam sobre problemas sociais atingindo milhões de brasileiros, é um avanço.” diz Balbino sobre o assunto.
Mas não podemos nos das por satisfeitos. É bem verdade que os movimentos conseguiram muita visibilidade e por isso têm sofrido um boom nos últimos anos. Mas a desproporção entre os espaços dados em veículos como a TV, principal meio em que o brasileiro obtém informações, é enorme. “Mas ainda é pouco. A TV está nas nossas casas 24h por dia apoiando políticas que nem sempre beneficiam o povo. Uma poesia de 3 minutos é muito pouco neste contexto, precisamos de mais.” Completa Balbino.
Fato que é que, nenhum desses novos protagonistas da cena literária urbana está pensando em se contentar com o espaço que tem. Cada vez se busca ir mais e mais longe. A primavera dos que sempre ficaram a espreita no mundo cultural só acabou de começar.
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Ato do Dia das Mulheres - 8 de março de 2016 (part. 2)
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Ato do Dia das Mulheres - 8 de março de 2016
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VT: Cracolandia
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Slams: O “esporte” da poesia falada
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“Pra eles mulher preta tem que viver no “Shhh”... Mas eu.. Eu vou gritar. Porque eu tenho é muita raiva. Raiva dessas que faz o estômago revirar. Porque ou a gente aprende a brigar ou a gente perde o tempo todo. Esse negócio de calmaria é pra quem tem grana pra terapia. Coisa pra quem não perde mais de uma irmã todo dia. Eu sinto é raiva, nojo, ódio. Porque tristeza estagna, não sai do lugar. Mas ódio move e dá vontade de lutar”. Ryane Leão dispensou o microfone para recitar sua poesia na competição do Slam do Grito na última terça-feira (18). É que as vezes a emoção é muito grande ao recitar o tipo de poesia que reina nos slams: da resistência, da vida real.
Para quem observa de longe, sem participar, a emoção é tão grande quanto. A plateia é extremamente ativa e viaja junto com o artista pelo universo poético. É o tipo de lugar em que a você sente a positividade, que vem das pessoas que recitam poesias por livre e espontânea paixão, presente no ar. Existe toda uma aura de liberdade e diversidade. A batalha de poesia que aconteceu num bar no bairro do Ipiranga e foi organizada pelo Slam do Grito em conjunto com o Slam da Guilhermina, é apenas uma das muitas que acontecem em todo o Brasil, principalmente em São Paulo. Mas afinal de contas, o que são os slams? E porque tem surgido tantos nos últimos tempos?
O conceito de slam surgiu nos anos 80 na cidade de Chicago nos Estados Unidos e foi idealizado pelo poeta e construtor civil Mec Kelly Smith. O slam surgiu como um refúgio aos recitais de poesia que eram muito estáticos e permaneciam adormecidos e desconhecidos pelo grande público. Inicialmente os eventos aconteciam num bar de jazz em Chicago, mas no ano de 1986 eles começaram a se espalhar por várias cidades estadunidenses. Cresceu junto e até hoje é primo do hip-hop, isso acontece por causa da natureza poética do rap que os liga e como resultado grande parte dos “slammers” são MCs também.
Slams ou poetry slams são, basicamente, eventos de “spoken words” ou traduzindo, poesias faladas que procuram juntar poesia e performance em clima de competição. É reconhecido como o esporte da poesia falada e como todo esporte tem regras muito bem estipuladas. Primeiro de tudo a poesia deve ser autoral e o tema fica a escolha do slammer. São proibidos qualquer tipo de adereços ou auxílios visuais ou musicais com o intuito de deixar as rainhas da noite brilharem: as palavras e a performance. Os poetas não podem ultrapassar o tempo de 3 minutos se não penalidades são aplicadas pelos juízes. Outro ponto interessante dos slams: eles pregam que qualquer pessoa é capaz de opinar sobre arte, então os juízes são escolhidos espontaneamente no momento do evento. Os escolhidos dão notas de 0.0 a 10.0 para as apresentações, tendo como critério o conteúdo e a performance.
No Brasil a primeira batalha de Slam que aconteceu no território nacional foi o ZAP! Slam ou Zona Autônoma da Palavra. Roberta Estrela D’Alva após uma viagem aos EUA, trouxe a cultura do slam para o Brasil no ano de 2008 em ação conjunta com o Núcleo Bartolomeu de Depoimentos. Atriz, musicista, poeta e apresentadora do programa de TV “Manos e Minas” na TV Cultura, Estrela D’Alva mantém até hoje os eventos do ZAP! que acontecem nas segundas quintas-feiras de todo mês.  
Logo após o surgimento do primeiro slam brasileiro os seguintes rapidamente se formaram, sendo que o segundo a ser criado foi o Slam da Guilhermina pelo poeta Emerson Alcade. O evento acontece na praça pública ao lado do metrô Guilhermina-Esperança na Zona Leste de São Paulo, toda última sexta-feira do mês e trouxe novos ares para a cultura que muitas vezes faz falta na região. Por acontecer ao lado do metrô e em praça pública se torna ainda mais acessível para todos que quiserem participar ou apenas apreciar.    
Lucas Afonso, 24, slammer, MC e fundador do Slam da Ponta que acontece em Itaquera, também na Zona Leste de SP, conheceu o ZAP! Slam em 2013 e a partir daí não parou mais de frequentar os eventos. Hoje, já conquistou títulos: foi campeão do Slam BR, campeonato nacional de poesia falada em 2015 e em 2016 foi até a semifinal da Copa do Mundo de Poesias na França.
Lucas sempre esteve ligado à arte “Minha mãe cantava e tocava violão, então desde o útero eu tenho contato com a arte. O contato com a literatura, com a poesia veio na escola, ainda no ensino fundamental. A literatura que me apresentaram na escola, nem sempre me agradava. Um divisor de águas na minha vida, foi quando percebi que as letras de RAP também eram poesia. Na poesia, encontrei o meu canal de expressão. Descobri uma forma de ser protagonista da minha verdade”. E completa: “ O poeta do Jd. São Carlos, que só tem ensino médio numa escola estadual, disputou um torneio de poesias com poetas que falam três, quatro idiomas. Isso é grandioso pra mim. Eu sempre fui muito otimista com o meu trabalho, mas não imaginava que a poesia poderia me levar tão longe, tão cedo”.
Assim como Lucas, os eventos de slam atraíram e atraem mais e mais pessoas. É fácil entender porque as competições se tornaram tão populares. Os slams deram vida à um campo da arte contemporânea que permanecia adormecido e por causa da sua dinamicidade conseguiu envolver um público que mantinha certa distância da poesia. Mas esse não foi o único motivo do slam ter conquistado tanta popularidade. A diversidade e a inclusão são elementos mandatórios nesses eventos em que pessoas de todas as orientações sexuais, gêneros, classes sociais e crenças se juntam, em comunhão, para contemplar e apreciar as rimas desses artistas. Nesse momento a protagonista passa a ser a poesia. É uma forma de democratizar a poesia que ficou ligada por muito tempo aos acadêmicos e dar acesso a uma prática cultural que é pouco incentivada nas quebradas.
  “Acredito que o papel dos slams de poesia e dos saraus, seja proporcionar a possibilidade do sujeito de ser ouvido. O acesso à cultura, ainda é muito restrito para quem vive às margens. O bairro de São Miguel, onde fica o Jd. São Carlos, tem aproximadamente 400.000 habitantes, uma biblioteca pública, uma casa de cultura. Como surge poeta, como surge artista numa região assim? É aí que vejo a importância de pessoas criarem os slams, os saraus, as rodas de samba, as rodas de capoeira, os eventos de graffiti, entre outros movimentos. Nos dá uma possibilidade de nos tornarmos protagonistas, de nos sentirmos importantes, de nos sentirmos belos e saber que o fazemos também tem sua importância”, diz Lucas.
Em seu projeto “Margens”, a pesquisadora Jéssica Balbino estuda, entre outras coisas, a repercussão e a existência dos eventos de poetry slam, afirmando que o slam contribui na autorrepresentação de minorias como mulheres, negros, os mais variados gêneros e moradores de periferia em geral. “Para competir no slam, a pessoa não precisa ter livro publicado, ser rapper, ser artista, nada. Vale para donas de casa, taxistas, vendedores, etc. No sarau também, claro. Existe algo de: todos podemos fazer poesia. Todos podemos usar a palavra para nos manifestarmos. Não há necessidade de um livro publicado para validar o ofício de poeta e/ou slammer” diz em entrevista ao jornal Nexo.  
Com o tempo surgiram novas iniciativas no slam, como por exemplo, um slam exclusivo para mulheres cis e trans chamado “Slam das Minas”. Pioneiro como um espaço apenas feminino nos eventos de poesia falada o Slam das Minas surgiu primeiro no Distrito Federal, mas sentindo falta desse tipo de espaço em São Paulo slammers como Luz Ribeiro, primeira mulher campeã do Slam BR e Mel Duarte, campeã do Rio Poetry Slam em 2016, primeira competição internacional de slam na América do Sul, trouxeram esse conceito para a metrópole.
Ainda em entrevista ao Nexo, Balbino afirma “As mulheres ainda publicam menos. Porém, nos últimos cinco anos, isso vem mudando. Identifiquei um número bem maior de mulheres na cena, publicando seus livros, se identificando como poetas, participando de saraus e de slams”.
Hoje, os slams de spoken words estão experimentando um momento de ascensão na cena cultural urbana, tendo mais de 25 só aqui na capital paulistana e totalizando mais de 30 em todo o país. “A internet é um instrumento que cria uma extensão para esse movimento. Vou citar por exemplo o Slam Resistência, que faz vídeos dos poetas se apresentando e postam no Facebook. Tem vários vídeos com milhões de visualizações. Isso ajuda a criar discussões, reflexões em torno de assuntos que dificilmente seriam pautados em programas de TV, por exemplo” diz Afonso.
A tomada de espaços públicos por parte desses movimentos culturais que se estendem desde o centro até as periferias de São Paulo e outras cidades representam um protagonismo artístico diferenciado. São as minorias que se levantam e ganharam tal proporção que praticamente forçaram os meios midiáticos a ouvirem sua voz e dar visibilidade para esses protagonistas da cena cultural que não pertencem a elite e que viram esse espaço artístico ser restringido a eles repetidamente.
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Veganos: além da não ingestão de comidas com carne
"O veganismo é uma forma de viver que busca excluir, na medida do possível e do praticável, todas as formas de exploração e de crueldade contra animais, seja para a alimentação, para o vestuário ou para qualquer outra finalidade". Essa é a definição dada pela The Vegan Society para a ideologia que move as pessoas que se denominam veganos ou veganas. A organização britânica é a mais antiga no que diz respeito ao movimento, sendo que, um de seus fundadores, Donald Watson, foi o responsável pela criação do termo e suas atribuições a mais de 70 anos atrás.
O estilo de vida vegano tem recebido cada vez mais e mais adeptos e tem sofrido um boom mundialmente nos últimos anos. Só no Reino Unido, por exemplo, houve um aumento de 350% no número de pessoas veganas na última década. Mas o que muitas pessoas não sabem é que a ideologia desse grupo vai muito além de apenas não comer carne e derivados de outros animais.
Uma pessoa que se denomina vegana é aquela que luta pela liberdade dos animais em todas as frentes possíveis. Isso inclui, portanto, tanto os animais racionais, nós, seres humanos, quanto os ditos irracionais, os não-humanos. Assim, alguém que adota esse estilo de vida não só não consome qualquer produto que tenha sido testado em animais, por exemplo, como também qualquer produto que tenha sido manufaturado por empresas que usam mão de obra escrava.
Difere profundamente, portanto, do vegetarianismo, que não inclui como característica taxativa não ir a lugares que utilizam animais como entretenimento, por exemplo, ou em usar roupas feitas de couro, seda ou lã. No vegetarianismo a única restrição é o consumo de carne de qualquer tipo, de peixe, branca ou vermelha. Assim, todo vegano é obrigatoriamente vegetariano, mas nem todo vegetariano é vegano. Evelyn Nogueira, 20, é vegetariana: “A indústria de carnes, principalmente no Brasil é exacerbada. Animais são mortos de forma cruel, e muitas vezes até sem necessidade para saciar humanos”.
           Mas Evelyn pretende aprofundar ainda mais sua luta “A vontade de aderir o veganismo é, sobretudo, pela crueldade animal, mas também muitas vezes são temos noção do que estamos colocando dentro do nosso corpo” e ainda exemplifica “Consumimos leite de vaca com pus, uma vez que as tetas ficam inflamadas devido à produção de leite ininterrupta, um animal em decomposição, uma vez que está morto e eventualmente sua carne vai apodrecer, além de muitas outras coisas que não temos dimensão”.
           Porém muitas pessoas não têm conhecimento desse tipo de informação como Evelyn. Muitos não sabem, por exemplo, que a carne de peixe também é restrita, porque animais aquáticos, apesar de não emitirem som, também têm sistema nervoso suficiente para que possam sentir dor ao serem pescados ou cortados quando ainda vivos.
           Porém o veganismo vai além dessas formas de exploração animal mais “óbvias”, digamos. Quem adere a esse movimento não consome também ovos, leite ou mel. A maior parte das pessoas não veem problemas no consumo desse tipo de produto, uma vez que acreditam que, por não estar matando o animal literalmente, ele não sofre. Contudo, a realidade que nem todos ficam sabendo é bem diferente.
           Para a produção de leite a vaca necessariamente precisa estar prenha ou ser mãe. O que acontece na indústria comum é que, para que essa produção ocorra em maior número e mais rapidamente, essas vacas são inseminadas artificialmente e continuamente para que a produção de leite seja ininterrupta. Sua expectativa de vida que num ciclo normal seria de 20 anos, se encurta para apenas 8 anos devido às gestações forçadas e inflamações e infecções a partir desse processo.
           As galinhas poedeiras ou que botam ovos também são exploradas. Elas têm seu bico arrancado, sem anestesia, para que não machuquem umas às outras devido as situações de stress a que são submetidas. Ficam enclausuradas em locais com em média, 0,2 m². Dessa forma, muitas delas não chegam nem ao menos a conhecer a luz do sol ou a poder andar livremente.
A preservação desses animais foi o principal motivo para Heloisa Salles, 19, ter se tornado vegana a quatro anos atrás. “Eu tomei essa decisão depois de assistir o documentário “A carne é fraca”, que fala sobre a realidade e o sofrimento dos animais nos matadouros. Ele me chocou de uma maneira bem profunda, e eu percebi como é injusto o que estamos fazendo com eles, depois disso prometi a mim mesma que nunca mais financiaria isso”.
           Heloisa, diferentemente do que acontece na maioria dos casos, não passou pela fase do vegetarianismo antes de migrar para o veganismo. “Minha transição foi diretamente para o veganismo, foi literalmente do dia pra noite. Como eu já estava bem decidida sobre virar vegana, a transição foi bem natural e tranquila. Além disso, eu sempre comi muitos legumes, verduras e frutas”.
O entendimento e o respeito a quem adere esse estilo de vida ainda é raro na maioria dos casos. Isso acontece devido a alguns tabus que circundam o veganismo. Uma constatação muito decorrente de pessoas que não conhecem todo o cuidado por trás dessa ideologia, é de que o veganismo faria mal para a saúde, tendo em vista que a carne supostamente seria a única fonte de proteínas. Porém, na realidade, todas as proteínas encontradas na carne podem ser encontradas também em vegetais. Esse foi o principal motivo que levou o Ministério da Saúde do Brasil reconhecer e aprovar o vegetarianismo como uma forma de se alimentar saudável.
           Outro mito muito ligado ao veganismo é de que é um hábito alimentar que sairia muito caro. Comprando apenas vegetais e preparando sua própria comida ser vegano não é um estilo de vida caro a ser mantido, podendo inclusive, sair mais barato do que pra quem consome carne normalmente. O veganismo oferece uma larga gama de comidas que podem ser consumidas. Verduras, frutas, grãos, elementos principais de muitos pratos culinários são opções.
           Muitos ainda taxam o vegetarianismo e mais ainda o veganismo como um modismo. ”Às vezes as pessoas estão tão acostumadas a comer só carne que ficam surpresas quando alguém escolhe não comer” diz Evelyn, Heloisa passou pelo mesmo problema “O que foi difícil foi a intolerância das pessoas, tanto dentro de casa, quanto fora. Muitas pessoas não entendiam e achavam que era modismo. Ninguém me perguntava sobre, apenas me ofendiam, isso me chateava bastante”.
           Elas ainda concordam em outro ponto: a dificuldade de achar lugares com pratos que dispensem carne ou no caso de Heloisa, qualquer alimento de origem animal. “Quando saio com meus amigos eu já como antes em casa, pois sei que a probabilidade de não ter opções veganas é BEM grande” diz Helo.
           Mas, cada vez mais, essa dificuldade tem diminuído. Hoje existem diversas iniciativas que ajudam pessoas veganas a encontrarem restaurantes que sirvam esse tipo de comida. O número desses restaurantes não para de crescer para atender a esse público em ascensão.
           Páginas online como a “Rota Veg” informam os principais restaurantes, pizzarias e confeitarias que servem esse tipo de comida e ainda lojas em que os produtos são veganos. Ao digitarmos “restaurantes veganos sp”, por exemplo, as pesquisas são infindáveis e existem listas que citam os principais e melhores restaurantes veganos em sites como o do “Catraca Livre”, “Hypeness” e “Veja”, além de muitas outras.
           Quando perguntei se sentiram mudanças na sua saúde depois de adotarem um estilo de vida livre de carnes, ambas, Helo e Ev, responderam prontamente. “Muito! A carne vermelha, principalmente, em excesso faz muito mal para o corpo. Precisamos lembrar que são animais mortos que estão sendo ingeridos, não tem como ser saudável. Ainda é complicado fugir de vegetais com transgênicos, mas sinto uma grande diferença” diz Evelyn. “Sim, me senti muito melhor e mais disposta. Eu tinha dores no estomago, dor de cabeça, rinite bem forte, e várias outras coisas, mas depois de um tempo sendo vegana eu comecei a perceber que tudo isso melhorou. Também não me sinto inchada ou com indigestão depois de alguma refeição, o que ocorria bastante antes de ser vegana”, segundo Helo.
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Resenha Crítica - “A Cidade do Futuro” de Cláudio Marques e Marília Hughes
O filme “A Cidade do Futuro” é o segundo longa-metragem dirigido pelos baianos Cláudio Marques e Marília Hughes. A dupla, que já tinha trabalhado na direção do premiado “Depois da Chuva”, estreou “A Cidade do Futuro” no festival Olhar de Cinema em Curitiba. O longa conta a história de três jovens que formam uma família inusitada em uma pequena comunidade no sertão da Bahia.
“A Cidade do Futuro” foi, no mínimo, uma ação corajosa. Na época em que estreou, o mundo acompanhava um dos maiores massacres nos Estados Unidos, que resultou na morte de mais de cinquenta pessoas numa boate gay em Orlando, no estado da Flórida. Em tempos de conservadorismo, a importância do filme passa para outro nível, representando um ato de amor.
O cenário é a Serra do Ramalho, cidade do oeste baiano, no Vale do São Francisco. No período da ditadura militar, muitas famílias eram obrigadas a acatar as ordens de militares que as expulsavam de suas cidades em nome de um suposto progresso na região: a construção da barragem de Sobradinho, na Bahia. A comunidade em Serra do Ramalho foi criada pelo governo militar em 1970, durante o assentamento desses milhares de pessoas deslocadas, na época foi chamada de “cidade do futuro”. O que era para ser um documentário sobre a cidade acabou se tornando um filme de ficção sobre Milla, Gilmar e Igor, uma família nada tradicional, que representa uma afronta aos valores conservadores que se intensificam na cidade afastada dos centros urbanos.
Marques e Hughes captam bem a energia jovem e inquietante do trio que movimenta a pacata cidade de Serra do Ramalho, um ambiente hostil para aquela família improvável. A atriz Milla Suzart e os atores Igor Santos e Gilmar Araújo moram de fato em Serra do Ramalho e os personagens recebem seus nomes. Milla está grávida de Gilmar, seu melhor amigo, e Igor é amante de Gilmar que acaba virando também o pai do bebê que vai nascer.
Eles decidem arcar com as consequências de suas escolhas, construindo como base da identidade da família o amor, a partir da ideia de que a felicidade e a tolerância deveriam reger a sociedade. Por esse motivo são vítimas de repressão por boa parte da comunidade local e inclusive de suas famílias. Busca-se simbolizar que o conceito de família é flutuante e mutável na prática, contrastando a história dos três protagonistas à símbolos que aparecem algumas vezes durante o filme, como quadros representando cenas da Bíblia e manequins em uma loja, que formam famílias compostas por um homem, uma mulher e uma criança.
O filme deixa transparecer o quanto os planos políticos afetam a particularidade das vidas e que não apenas fazem as pessoas se deslocarem fisicamente, mas também deslocarem suas histórias e seus planos. Em cenas do filme Milla nega ter que aceitar que são obrigados a ir embora do lugar em que nasceram, assim como seus pais fizeram quando obrigados pela construção da hidrelétrica. A parte documental do filme fica por parte das gravações de depoimentos das pessoas que foram deslocadas para aquela área na época da relocação devido a construção de Sobradinho.
A espontaneidade está bastante presente, mesmo nos momentos mais tensos. Os personagens vão ganhando força por suas pequenas lutas cotidianas. Além disso, a trilha sonora chama a atenção, fomentando inclusive belas sequencias durante a produção, dialogando com a música local sertaneja, mas com um quê moderno através do sertanejo universitário.
A mensagem que o filme deixa é de combate a essa intolerância que parece ter ganhado novas formas e contextos na atualidade, partindo da intolerância da ditadura militar para os pais de Milla, Gilmar e Igor e partindo para a intolerância cultural para o trio. Durante o filme sentimos a dor dos personagens em cada momento que são agredidos. Fica no ar o sonho da possibilidade de da libertação das amarras tradicionais que a sociedade impõe.
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