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SIM
Gosto estranho o primeiro beijo após o sim, gosto de passado mas seria melhor ao ponto, e não estaria já bem passado? O rápido pensamento de Anelise foi atropelado pela banda que começou a canção deles, que lindo. “Do you Wanna dance?” e os  amantes patinando na pista, Pedro só felicidade, Anelise rindo mas querendo curtir a lembrança do gosto de passado do beijo mas Pedro rodou ela feliz, e mais uma vez lhe escorregou o plano. Estava feliz, sim, mas queria saber porque a boca do amado era presente com gosto de ontem. Gosto até bom, mas tinha notas de prazo expirado e no retrogosto algum vislumbre de deleite. Encaixou a cabeça no colo dele e disfarçou dançando seu morder de lábios se chupando atrás do sabor estranho que se auto-explicasse. Mordeu a língua até sangrar, vai que estava lá, mas não. Mais uma rodada e pausou a procura para ser feliz com Pedro, radiante. Dançando feliz pensou será que não foi parar na outra boca por engano  ou teriam roubado e não percebi?, e teve a ideia da boca do marido, de repente estava lá por trás da língua, e puxou pra junto a cabeça dele que se deliciava com aquele beijo faminto em que Anelise não sentia sabor algum, sua língua frustrada nos quatro cantos da outra. Que foi meu amor Pedro a nota enfim nada cansaço Anelise enfadada. Quanto tempo sua fome aguentaria ser saciada por aquela coisa insípida que recusava já a chamar de beijo já que de beijo só tinha nome? Talvez o sim explicasse. Talvez não digeriu direito a palavra, talvez a tenha presa no esôfago e ela tirava o paladar. Sente que Pedro lhe empurrou o sim goela abaixo e tinha raiva agora mais raiva de si, embora ele a tenha convencido a ser feliz. Dançando, começa achar o marido um tolo que lhe entalou com algo que não digeria. Porém ela foi até ali, não desistiria. Pedro tinha que pagar. Então vai enumerando mentalmente todos os paus e porras que vai meter goela abaixo, esse sim vai ser socado com quantos forem precisos não importa que lhe  firam a garganta. Vai passar o tempo que for arrotando o sim imposto com tudo que for resquício de homem que tiver. E ele nem vai saber, por que é feliz.
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Reisado de Boa Hora - Fé amor e devoção
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Campinho
Tinha um terreno lá. Lá no terreno, há muitos anos de distância, tinha um campo. Tinha muito lixo também. A gente, moleque, jogava bola lá. Outras pessoas jogavam lixo. Quando a bola acertava algum portão ou janela vizinha, jogavam praga também. Talvez algumas pegaram. Ou não. Talvez fosse só a sina de cada um mesmo, e num lapso de meninice na memória podem alguns achar se tratar mesmo das palavras de mal agouro agindo no devido tempo (embora eu ache que o homem que teve a cabeça esmagada por um caminhão que não viu enquanto olhava o celular, pilotando a moto, fosse um castigo um tanto exagerado e tardio por causa de uma vidraça quebrada).
A despeito das mazelas, foi uma época boa para todos que por ali viviam. Mesmo as pegadas de barro escuro no chão da sala e os calções encardidos que perdiam vida útil na esfregação contínua das lavagens – que na época eram o assombro das mães – hoje são singelas lembranças de um passado que a cidade hoje selvagem não deixa se repetir para as crianças do momento.
Era muito bom mesmo.
Um dia, passando por acaso, reconheci o local onde jogávamos. Lá tem um galpão. Foi lá onde parei e fiquei lembrando dessas cenas.
Estava lá parado contemplando o que antes era o campinho. Fechei os olhos e quase ouvi os gritos de toca pra mim passa bola time fora é meu vai tomar no cu ôôôôô varada. Respirei fundo, como a buscar uma lembrança mais profunda e senti o fedor de carniça que tinha o lugar.
Então lembrei que não era só bom.
Eu queria que fosse.
Mas não, não era.
Essa podridão que me veio à mente foi justamente o que puxou aquilo que mudou tudo: ecoou na minha cabeça o choro de um menino.
Numa noitinha qualquer, ao final do jogo de 30 anos atrás, cada um correu para sua casa para não perder o Chapolin. O menino ficou um pouco mais, procurando um apito de metal que tinha deixado cair do bolso. Saiu chutando a areia da beira do campo paras ver se lograva êxito. Olhando direto para o chão, encontrou o apito. Aos pés de um homem estranho, ninguém das redondezas. Escuro que estava, só conseguiu ver os olhos brilhantes e ameaçadores. Se virou para correr, sendo interrompido pelo pescoço por uma mão forte e fedorenta. Jogava braços e pernas para todos os lados, a fim de se soltar. Em vão. Um braço lhe prendia numa gravata pelas costas, enquanto a outra mão abaixava o calção. Queria gritar, mas só saía um ruído agudo e desesperado, quase inaudível à distância, ainda mais na hora da novela. O menino tinha a dor entalada na garganta, sentindo que algo lhe rasgava por trás e lhe derramava uma coisa morna e viscosa. Quando enfim o monstro lhe soltou – não sem antes lhe dar um soco como advertência para não pedir socorro – caiu no chão e chorou calado, com o ouvido colado no barro, sentindo as vibrações das passadas pesadas do homem que fugia.
Chegou em casa, mãe aflita, tava onde menino, o menino bola num braço apito na outra mão pegadas de barro e um calção com o fundo encharcado de sangue. Quando a mãe viu ô meu deus abraçou o filho que chorou por dias e noites por meses e anos até crescer e trabalhar e sair de casa e casar e ter um filho também.
E por acaso, um dia, parar na frente de um lugar que tinha esquecido e que havia jurado nunca mais voltar, mas demorou reconhecer por que agora tem um galpão no campo… Era mais fácil viver pensando que havia acontecido com outra pessoa. Ou que simplesmente não havia acontecido.
Engatei a primeira, pisei no acelerador e parti.
Tinha que pegar meu filho na escolinha de futebol.
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I
Senta aqui, maninha, vamo brincá. Num quero brincá disso mais não, dói. Dói não, fia, vô fazê divagá pra tu num se machucá mais. Não, num quero, vô contá pro pai. Tapa na cabeça da menina. Pois eu vou pegá tuas boneca tudo e queimar e jogá no rii, vô te batê e vô matá tua mãe, que ela num é a merma mãe minha. A menina chora. Nããããooo, vai matá não, mata mãe não. Mato sim, a culpa é tua que é malcriada. Mais choro da menina. Ueeeeehhhhhh… não… . Pois rumbora brincá agora. (Chorando) Tá b-bo-bom. Anda, maninha, senta aqui. (Gritando) aaaiiiii. Silêncio. Ou quase. A mão fedida do mais velho faz a caçula entalar o grito e ficar ruminando a dor.
II
- Carminha, anda, que teu irmão tá te esperando. Tu tem que ir pra provar se o vestido cabe em ti direitinho.
Carminha, de dentro do quarto, de bruços na cama, corta a sala com a resposta em grito quase abafado:
- Ô, mãe, queria ir não. Carecia roupa nova não.
- Oí, tia,a malagradicida.
O sempre presente irmão instigava a madrasta, mãe de Carminha. “Menino bom demais”, dizia a ignorante às colegas.
Dalva deixa a panela ao fogo, sai com a colher de pau com que mexia a comida rumo ao quarto e Carminha não sabe precisar se sente antes o calor ou a pancada da colher, bem no cangote. Mas a dor de Carminha não tinha mais som.
A-dor-de-Carminha-não-tinha-mais-som.
- Levanta, ordinária!
Carlim olhava meio de trás do portal do quarto, deleitado com a ação da madrasta Dalva.
- Respeita teu irmão, moleca. Eu mando fazer a roupa pro Natal, teu irmão vai contigo lá pra tu provar e tu vem dizer que não vai. Mas vai.
Pááááááá!, no cangote de novo.
Já a caminho irmão e irmã, na estradinha de chão, a mãe observa da porta os dois que se vão. Já a uns cinquenta metros distância, Dalva solta a ordem em forma de grito:
- Carmiiiinhaaaaa! Pega na mão do teu irmão!
Carminha olha devagar para o lado, vendo o sorriso assustador do irmão que lhe toma a mão atendendo a ordem de Dalva.
- Tá tremendo por quê, maninha? Tem medo não. Mais ali assim na frente tem um matinho. Nós vamo entrar lá pra brincar um pouquinho.
III
No matinho, Carminha deitada no capim, vestido levantado na cintura, mão de Carlim na boca, Carlim entre ela e mais uma vez sua dor não falava.
O sol brilhava na bunda de Carlim, as nádegas se abriam e fechavam por conta do movimento que fazia sobre a irmã.
Era um dia bonito, inclusive para o bicho que foi chamado atenção pelo reflexo anal e resolveu marcar seus dentes ali naquela carne. Bicho sem nome, estranho, parecia que nem existia. Talvez só na cabeça de Carminha.
A dor de Carlim tinha som. AAAHHHHHHH
O infeliz cai para o lado, constatando os dois que o bicho era venenoso. Nem deu pra ver direito, fugiu depois de cumprida sua missão. Carlim estrebucha. Perde movimentos. Chama pela maninha. “Ajuda…”. A maninha levanta. Olha tranquila o irmão. Percebe-o nu, ainda. Imóvel. Vulnerável. Calado. Vira o rosto um pouco mais para o lado e avista um pedaço de vingança em forma de madeira. Calmamente, se abaixa, recolhe o objeto e deita ao lado do irmão agonizante. Em silêncio, aproxima a madeira do rosto de Carlim, e vê um pânico inédito nos olhos dele. Chega perto de seu rosto. Olha no fundo de seus olhos agora tão medrosos. Vira-o de lado. Passa o pau de leve na bunda dele. Sente o corpo estremecer. Dessa vez, o dele. Encosta boca em sua orelha, e enquanto sua vingança vai rasgando Carlim lentamente, ela fala baixinho:
- Vamo brincá?
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Das Tripas Coração - conclusão
XXXIV
“AÊÊÊ Eliane! Feliz aniversário!!!!!!”, soa estridente no alto-falante do carro da mensagem.
Eliane em choque, perplexa.
XXXV
Todos param o que estão fazendo, se recompõem e puxam flores, que apontam na direção de Eliane, enquanto do alto do edifício moradores derramam uma chuva de pétalas no local. Enquanto a multidão entoa parabéns pra você, os restos de Lana vão se juntando e dando novamente forma à jovem antes estraçalhada. O alto-falante estoura “Como uma Deusa”, a música preferida da aniversariante. Todos vão em direção a ela, enquanto a mesma dá passos curtos para trás, de surpresa, felicidade e medo.
XXXVI
Reconhece então, rosto a rosto, ex-alunos de várias épocas diferentes, quando era professora. Era um surpresa organizada pelas turmas, o locutor explica no alto-falante.
O rosto dela se acalma. O sorriso aparece ao ver o padre tirando a batina e fazendo surgir um palhaço.
XXXVII
Mas ninguém sabia que coração de Dona Eliane já andava fraco nas pilastras das suas pontes de safena. Caiu morta no chão enquanto a Rosana cantava “… e as coisas que você me diz me levam ao além…”
Bem na hora que chegou a pessoa com o bolo.
FIM
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Das Tripas Coração - pag. 8
XXX
Dona Eliane resolve descer e ver de perto o que está acontecendo por que nada daquilo faz sentido. É seu aniversário, merda, ela pensou.
XXXI
Lá chegando, não processa toda a informação que vê:
*um homem ensanguentado que chuta o saco de outro com nariz ensanguentado (ouve alguém dizer que o agressor tem um olho e uma orelha de uma pessoa nos bolsos)
*um policial com um 38 enfiado na boca de um padre
*uma multidão de fiéis apontando crucifixos como armas para o policial
*paramédicos tentando separar a briga dos dois homens ensanguentados*
motorista do gavetão do IML tentando tirar restos do que parecem ser vísceras humanas do pneu do carro
*um carro de mensagens ao vivo que buzina tentando cortar a multidão
*um olho de mulher jovem que a olha diretamente, movendo-se de acordo com seu movimento
XXXII
“Que inferno é esse, senhor?”, grita Dona Eliane.
XXXIII
Então, no auge de seu desespero, percebido por todos, que de repente congelam na direção dela em reação ao seu grito, começam a sorrir. Insanamente.
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A Dona da Conversa essa semana é Vanessa Krongold @vanessakrongold . Cantora e compositora, esteve à frente dos Maybees, uma das mais influentes bandas da cena indie do início dos anos 2000. "Picture Perfect", o segundo álbum, inclusive completa 20 anos agora. Após o encerramento das atividades dos Maybees, remanescentes do grupo formaram a Ludov, agora com canções em português, com mesmo apelo pop mas com a facilidade de alcance permitida pelo uso do idioma pátrio. O EP "Dois a Rodar" marca o início dessa nova fase. Após alguns álbuns sempre elogiados, a vocalista alça seu vôo solo com o single "À Queima-Roupa", lançado recentemente. Uma mostra de que muita coisa boa vem por aí. Sobre isso e muito mais, iremos bater um papo, por que ela é A Dona da Conversa. Sábado, 07/11, às 17h, no perfil do @tinindoetrincando #vanessakrongold #aqueimaroupa #ludov #maybees https://www.instagram.com/p/CHIuFQCD4ny/?igshid=16svflmdgua5y
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Enquanto os homens exercem Seus podres poderes Motos e fuscas avançam Os sinais vermelhos E perdem os verdes Somos uns boçais Queria querer gritar Setecentas mil vezes Como são lindos Como são lindos os burgueses E os japoneses Mas tudo é muito mais Será que nunca faremos senão confirmar A incompetência da América católica Que sempre precisará de ridículos tiranos Será, será, que será? Que será, que será? Será que esta minha estúpida retórica Terá que soar, terá que se ouvir Por mais zil anos Enquanto os homens exercem Seus podres poderes Índios e padres e bichas Negros e mulheres E adolescentes Fazem o carnaval Queria querer cantar afinado com eles Silenciar em respeito ao seu transe num êxtase Ser indecente Mas tudo é muito mau Ou então cada paisano e cada capataz Com sua burrice fará jorrar sangue demais Nos pantanais, nas cidades Caatingas e nos gerais Será que apenas os hermetismos pascoais E os tons, os mil tons Seus sons e seus dons geniais Nos salvam, nos salvarão Dessas trevas e nada mais Enquanto os homens exercem Seus podres poderes Morrer e matar de fome De raiva e de sede São tantas vezes Gestos naturais Eu quero aproximar o meu cantar vagabundo Daqueles que velam pela alegria do mundo Indo e mais fundo Tins e bens e tais @caetanoveloso sempre https://www.instagram.com/p/CG0NPKzDaa6/?igshid=4gawzpkcp0rs
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A Dona da Conversa essa semana é a poderosa Alessandra Colasanti @alessandra_colasanti . Mais plural impossível: escritora, roteirista, atriz, mãe. Entre outras atividades, escreveu nos programas "Esquenta" e "Adnight"; foi roteirista de série "Desnude"; como atriz, está no elenco da série "O Mecanismo". Atualmente apresenta os programas "Portal U_topia" e "Museu Virtual da Internet Surreal". Nas redes sociais, seus textos tem dado uma nova perspectiva da maternidade para todas as pessoas. Essa conversa não será nada menos que enriquecedora. Anota aí pra não correr o risco de esquecer: sábado, 24/10, 17h, no perfil do @tinindoetrincando #alessandracolasanti #portalutopia https://www.instagram.com/p/CGiieiBjgmh/?igshid=78m6ofv2bqsd
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O Dia do Fogo
É incrível como não paro de aprender a cada vez que converso com meu pai sobre qualquer assunto que seja. Já disse em outra ocasião que basta uma palavra, frase ou tema, e pronto: lá vem mais uma história de sua infância e/ou juventude. No último sábado, ele me dava uma carona para uma radiola na periferia (melhor programa desse fim de semana). Calor em Teresina é assunto recorrente quando não se tem assunto e se quer desenvolver um diálogo, e essa é uma das maneiras que instigo meu velho a falar. Do calor, logo ele lembrou da cena uma pessoa queimando lixo na porta de casa. Com todos os palavrões que conseguia lembrar, disse o quão absurdo era aquela atitude, e logo entramos na pauta da Amazônia em chamas. Depois de falarmos sobre vários aspectos dessa tragédia, ele lembrou de como na sua cidade, no seu tempo de garoto, até as queimadas eram responsáveis. E falou do Dia do Fogo.
O Dia do Fogo era o dia em que os proprietários de roça (como meu avô paterno) fariam a queima do mato na roça e nas suas proximidades, para preparar o terreno para o plantio. Mas não era simplesmente acordar num belo dia, ir ao mato e incendiar a região. Na noite anterior, havia a Reunião da Queima. Era o momento onde seria coordenada toda ação: onde iniciar, onde terminar, como espantar os animais para longe das áreas do fogo, como não deixá-lo se alastrar pela região e como fazer isso no menor tempo possível. No interior do Brasil há uma relativização do tempo e do progresso para quem lá vive ou pode experienciar uma temporada e acompanhar a dinâmica do local. Eu imagino meu pai criança observando os adultos resolvendo esses detalhes, como uma grande reunião de um povoado indígena ancestral. Você já imaginou os barões do agronegócio sentando para deliberar sobre impacto ambiental e conservação da fauna? Eu não consigo. Mas isso acontecia com o homem do campo. Talvez ainda aconteça em algum lugar. E esse mesmo homem do campo talvez nunca tenha sequer ouvido a expressão “impacto ambiental”, mas sabia muito bem o que significava. Por isso a Reunião da Queima era importante.
Chegava então o Dia do Fogo. O mais experiente do grupo andava a conduzir o restante, sondando o terreno. Definiam um perímetro para o trabalho. Feito isso, abriam uma linha de terra separando a área que seria queimada da área que seria conservada, onde o vácuo seria uma espécie de escudo invisível. Em seguida, observavam a direção do vento, para evitar que labaredas atingissem outra parte da vegetação e provocassem um desastre, já que não haviam bombeiros na região. Inciavam a queima a favor do vento, para que ele conduzisse as chamas para a outra extremidade do terreno. E como parar essas chamas se o vento resolvesse soprar mais forte? Como sempre, a sabedoria popular: o Contra-fogo.
O Contra-fogo era feito na outra extremidade, no sentido contrário ao vento e às outras chamas, de modo que se voassem faíscas seriam engolidas pelo próprio fogo, anulando-as e impedindo-as de seguir adiante, deixando intacto o restante da vegetação e em paz os animais da área. Por que na temporada seguinte, quando a parte roçada estivesse se reestabelecendo após a colheita, e os animais tivessem se encarregado de semear e adubar a terra com suas fezes, já poderiam avançar para o território a seguir, sem grandes prejuízos para nenhuma das criaturas, fossem pessoas, animais ou plantas. Havia um jeito de minimizar qualquer dano.
Há sempre algo de poético e saudoso quando meu pai, homem técnico, não dado às letras, narra episódios assim.
O fogo é um fenômeno da natureza, uma das coisas que foi fundamental para nosso desenvolvimento. Infelizmente, nas mãos do capital incendiário, virou sinônimo de destruição. E querem culpar o caboclo e o indígena pelas queimadas na Amazônia. Essas pessoas jamais fariam isso.
Por que existe o Dia do Fogo.
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Adorei o meu kilt. Pelos olhos de Valentina https://www.instagram.com/p/CGcf4kLDuwh/?igshid=17a4irphejixb
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O Inominável Assusta
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Hoje tive uma surpresa ao abrir meu instagram. Fui denunciado por infringir as normas de conduta da rede social.
O motivo? Esta imagem imoral, ofensiva e indecente, que fere os princípios da família tradicional brasileira: dois dedos ligados pelo fluido de excitação da mulher.
A imagem em questão ilustra um conto erótico que escrevi sobre sexo virtual durante a pandemia. De alguma forma, este post do dia 14/06/20, caiu no crivo da patrulha conservadora. Para falar a verdade, nem sei de onde partiu isso. Mas imagino que o texto (esse sim, bem explícito) provocou um incômodo bem menor do que a foto. Talvez nem tenha sido lido. Geralmente essas denúncias vem de quem não lê, aquela turma que adora uma fake news ou uma manchete tendenciosa que satisfaça seus anseios conservadores.
Esse grupo que não se compadece de casos de estupro, de violência doméstica, que naturaliza todo tipo de agressão, que se excita com armas e usa sua religião para justificar todo tipo de atrocidade, não aceita uma imagem que represente o exercício da sexualidade da mulher.
Mas por quê o gozo feminino (ou a referência a ele) perturba?
Pensei, pensei, pensei. Não cheguei a uma conclusão, mas tenho uma teoria.
Geralmente aquilo que desconhecemos nos assusta. O que não tem nome nos causa medo.
Então arrisco a dizer que a substância sem nome do gozo da mulher mete medo. O homem tem gala, tem porra, tem leitinho, o escambau de apelidos para o produto da sua ejaculação. Dei um google rápido para procurar o equivalente da mulher. Encontrei “fluido de excitação”. Como assim? Nenhum nome popular, apelido? Então quer dizer que, além de não ter o direito de gozar sem ser julgada, à mulher também não foi permitido criar uma palavra que representasse a materialização de seu êxtase? “Fluido de excitação” não contempla a maravilha do orgasmo. É hermético, rígido. Masculino. Faz jus ao patriarcado que quer controlar e oprimir tudo, até a língua.
O desconhecido feminino (que é muito além do que em vão supõem os homens) assusta tanto que o único meio de controlá-lo foi torná-lo sujo, errado, pecaminoso, tudo baseado numa moral hipócrita. E esses mesmos que tentam controlar o corpo feminino há séculos são os mesmos que nunca entenderam o que é uma relação sexual. Não há hierarquia no sexo. Há comunhão. O homem padrão usa o corpo da mulher para lhe masturbar de forma subserviente. Ele não conhece o próprio corpo. Talvez nem o próprio desejo (mais uma vez o desconhecido assustando). Tampouco conhece ou se permite aprender sobre o corpo da mulher. E sobre seu prazer. Seu clímax, seu ápice. É tão grandioso esse indecifrável desconhecido feminino que não tem nome. O farto de não se ter permitido dar-lhe uma alcunha só mostrou o quanto está além dessa ignorância misógina.
Então eu penso que além de violentas, as pessoas são ignorantes e se sentem confortáveis assim. Mas suas armas não vão matar o sexo. Não vão matar o prazer. Não vão matar a pulsão de felicidade. As ideias não serão mais caladas. Não sem luta.
O inominável assusta.
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Das Tripas Coração - pag. 7
XXIV
Os alto-falantes do carro gritavam “Dona Eliane, nesse dia especial…”
Péssimo presente esse que Eliane ganhou.
XXV
A massa religiosa permanece, a muito custo e algumas armas apontadas, mais ou menos parada no local. Sem ter a visão do que tem adiante da procissão, o motorista do carro de som avança com o  presente dos amigos para Dona Eliane estourando os tímpanos dos presentes. E acelera.
XXVI
Com a confusão, João consegue se soltar policial, vai pra cima de Ronaldo, ainda sujo do vômito, mas já sem tanto efeito das doses industriais de cocaína que inalou.
XXVII
Chute no saco de Ronaldo.
XXVIII
“O Senhor irá derramar sua ira sobre vocês, bando de hereges”, grita o padre.
“Padre, vai tomar no cu”, sai em alto e bom som doas alto-falantes que carregavam o presente de Dona Eliane, enquanto era parado em três dos fiéis na multidão.
XXIX
Dois tiros nos alto-falantes e um no pneu amenizam a situação.
E Dona Eliane, da janela do apartamento, sem entender nada.
Lana, menos ainda.
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Conto: Profissão de Fé
A missa costumava terminar sempre às nove e meia da noite, mas somente para os fiéis. A equipe da liturgia demorava um pouco mais para ir embora por que Padre Pedro já queria a igreja limpa para a missa de domingo às sete da matina. A equipe de acólitos trabalhava com a parte mais pesada, varrer e lavar chão e higienizar banheiros, tudo na rapidez da juventude cristã que só tem o sábado para pecar. Na arrumação do material do altar e conferência do dízimo ficavam apenas Padre Pedro e Regina, uma espécie de sacristã não-oficial que após enviuvar aos 30 não se permitiu mais deitar com homem nenhum para não manchar sua imagem de mulher decente. Já se iam cinco anos desde que se cobriu de castidade. Meteu-se no trabalho da paróquia o máximo que pôde. Vivendo da pensão gorda do falecido, tinha tempo de sobra para se dedicar aos trabalhos de Deus. Pelo menos era no que se apoiava quando lhe subiam os calores noturnos nas noites solitárias naquela casa enorme senhor tira essa coisa de mim.
Ali, envolvida no trabalho final do sábado, era o único momento em que ficava sozinha com um homem, desde que Raimundo falecera. Em sua cabeça era até pecado se referir assim a Padre Pedro, como se fosse ele um homem qualquer, do mundo. Homem santo desses, pensava. Para ela, ainda existia a separação entre sexo e batina. Para o santo padre, também. Na prática, sim. Na teoria, nem tanto. O celibato é uma escolha, uma condição que garante que os arautos do Senhor não sucumbam aos prazeres da carne e que a santa mãe igreja não pague pensão alimentícia às suas filhas e filhos bastardos. Isso não anulava as reações fisiológicas que aconteciam tanto no padre quanto na fiel.
Passava das dez e meia quando os acólitos pediram a benção ao padre e saíram atrás de matéria-prima para confissão e penitência do dia seguintevão com deus, meus filhos. Eles eram muito jovens para notar a discrepância entre a organização do material de celebração e o tempo que se levava para fazer isso. A passos de tartaruga, inconscientemente ou não, Regina e o padre ganhavam tempo lustrando os cálices uma, duas, três vezes, alinhando os jornais litúrgicos mais que o necessário e quando davam por si já estavam a sós, faltando apenas conferir a coleta do dízimo. Como dinheiro é dinheiro, depois que os jovens auxiliares saíam, achavam mais seguro trancar todas as portas e em seguida se isolarem na sacristia para conferência do apurado. Pouco importava que as pessoas comentassem coisas a respeito do trabalho dos dois, sabiam que estavam fazendo o trabalho de deus e em momento algum viam um ao outro como potenciais parceiros sexuais senhor tira essa coisa de mim exceto no momento em que Regina se abaixou para pegar um dos maços de notas que caiu ao chão e sua saia mais curta que de costume deixou à mostra um pequeno triângulo vermelho entre o branco do tecido e o canela da pele que resultou em algum desajuste que fez Padre Pedro se contorcer na cadeira como quisesse esconder algo senhor. Regina, notando que o olhar do padre sem querer estava parado entre suas pernas, desequilibrou-se ao tentar levantar ao que logo Pedro lhe deu a mão. O peso dela fez com que o corpo dele fosse um pouco mais em sua direção e pararam por um instante a uma distância não experimentada antes, insegura até. Mas logo cada um senta em seu lugar e evitam trocar olhares senhor e continuam a contagem. O bocejo de Regina lembra Pedro que já deve ser tarde e resolve acelerar o trabalho e nesse acelerar trocando notas e maços rapidamente as mãos de ambos se tocam e fica difícil não se olharem e Pedro se contorce na cadeira e Regina confere se a saia não subiu mais um pouco e pedem desculpas em uníssono e o alarme do celular de Regina toca às onze e meia horário de tomar seu anticoncepcional. Ela não transava com ninguém, mas nunca se sabe vai que a gente senta num lugar sujo e pega bucho e sentiu os calores antes da hora certa, ali nem teria como resolver caso ficasse mais intenso, e Pedro estava mais perto para vê-la escrevendo no livro caixa e sentiu dela o doce da lavanda, único perfume que se permitia usar, mulher direita que era. Vendo que a fiel, sua fiel, a mais dedicada, suava um pouco mais que o normal, pergunta tudo bem, Regina? E ela só hum-rum e ambos senhor tira essa coisa de mim e se aprumam para sair. Já é quase meia-noite quando chegam à porta lateral da igreja que é a saída depois que tudo está fechado e onde há pontos cegos das câmeras. A tranca sempre emperra um pouco, e Regina tem certa dificuldade para abrir a porta mas Pedro, solícito, encosta-se levemente por trás dela e suspende pelo trinco para enfim a chave girar e liberar suas saídas. Sem fazer esforço para esconder algo, deixa-se encostar um pouco na bunda de Regina essa mulher está me tentando, senhor e Regina sua e estremece ao toque que sente atrás o que Pedro está fazendo, senhor?. Ela sabe que a calcinha está úmida mas também sabe que não deveria estar por que está na igreja com o Pedro, Padre Pedro, Regina mas se for só coisa de sua cabeça maldosa de mulher sozinha, pensa, estou ficando safada, senhor? E Pedro afasta-se estou perto demais mas ela também não recuou e abriu a porta devagar para ver se a rua estava segura para saírem àquela hora. Para ajudar a conferir, Pedro põe a cabecinha de leve sobre o ombro de Regina e respira atrás de sua orelha encostando sem querer mais uma vez uma ponta de si na bunda dela e nem faz ideia, ou faz, que o triângulo vermelho está molhado e as pernas dela tremem ao seu toque. Puxa-a, enfim, pela cintura, abraçando-lhe por trás padre o que é isso como assim o que é isso e enfia a mão por baixo da saia branca e sente úmido o triângulo vermelho e bate a porta padre me solta para com isso Regina foi você quem provocou
mas padre, eu errei
amanhã você se confessa e me pede perdão por que hoje
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Das Tripas Coração - pag. 6
XX
O tiro não acertou ninguém. O policial atirou para dispersar a multidão. O padre disse que o excomungaria, mas quando o Cabo Freitas enfiou o cano do 38 em sua boca, resolveu suspender a punição.
XXI
João guardou o olho de Lana no bolso para não perdê-la de vista. Com um soco derrubou uma velha beata que pisou e levaria na sola uma das orelhas de Lana. Velha no chão, tirou a orelha de Lana dos pés da outra. Guardou no bolso. Se algum dia Lana não lhe deu ouvidos, esse dia enfim chegou.
XXII
Os fiéis apontaram suas armas – crucifixos, na verdade – na direção de João e exigia que o Cabo Freitas o prendessem por agredir a senhora e atrapalhar a procissão. Ronaldo ria insano. A única que parecia acompanhar tudo mais serena era Lana.
XXIII
Difícil barrar uma multidão ávida por ser salva. Os fiéis –também os infiéis – queria continuar sua marcha, mas o IML precisava parar as pessoas senão nada sobraria para a perícia. Mas Lana já tinha se espalhado por muita gente. Mais gente do que João conseguia bater. Mais gente do que a polícia poderia prender. E ficou pior quando o carro das mensagens ao vivo tentava passar pelo cruzamento da Rua angélica.
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O CÉU DE QUINO
Por vezes me perguntei o motivo de Mafalda ser tão atemporal. Da puberdade para a adolescência, que foi quando tive o primeiro contato com a eterna personagem/filha de Quino, não conseguia ter a dimensão  do impacto que ela provocava em mim. Anos depois, já na universidade, eu entenderia que Mafalda tem toda uma carga filosófica e social que nos chega de uma maneira muito sutil e que transcende barreiras sociais, econômicas e de gênero, dentre outras. Como nós, homens, fomos moldados nas forjas do patriarcado, até gostar da Mafalda era um ato que poderia ser reprovado no grupo dos “machos”. Que bom é poder ter idade e discernimento para se escolher o que se quer ser e a forma como se quer fazer isso. Depois que minha percepção captou a personagem para além do humor e para além daquele gueto “alfa”, meu mundo se abriu. Eu passei a vê-lo com os olhos da garotinha de laço na cabeça, cheia de questionamentos.
A antologia da Mafalda que tenho é uma das coisas mais legais da minha biblioteca. Já li e reli. Leio hoje, lerei sempre. Estar em contato com ela me mantém em contato com a criança que eu fui e que ainda habita por aqui e que ás vezes esquece de existir. Dessa forma é que entendo por que que as crianças de ontem e de hoje se identificam tanto com ela: por que ela não deixa o espírito curioso da infância descansar dentro de nós.
Quino, já com saúde debilitada, deixou este mundo e para o mesmo várias lições que talvez nem o próprio artista tenha tido dimensão do alcance. Tudo através da visão dessa personagem tão maravilhosa, que não pode ter sido concebida senão por alguém que tinha em si sua criança interior viva, pulsando energia e vontade de descobrir e aprender.
Há uma crença de que cada um de nós tem seu próprio céu, de acordo com seu gosto. Então posso até imaginar que, como um Gepeto sobrenatural, Quino finalmente está no seu paraíso, num banco numa rua, sentado ao lado de sua amada Mafalda.
A minha criança interior me permite imaginar isso.
Gracias, Quino.
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