Tumgik
palavrasinfinitas · 4 years
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palavrasinfinitas · 6 years
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Please, let me save you | One-shot
Todos assistiam em silêncio Himiko se acabar em lágrimas. Ver as mortes de Angie e Tenko, as duas pessoas mais queridas para ela, ambas no mesmo dia… Isso acabou com a pobre garota. Por mais que ela enfim tenha demonstrado alguma emoção depois de tanto tempo se fingindo de indiferente, ela agora estava quebrada por dentro e todos percebiam isso.
Mas Shuichi estava distraído. Não é como se ele não se importasse com Himiko — na realidade, todas as mortes para ele foram no mínimo chocantes e ver Himiko assim o deixava muito triste também. Porém, ele não conseguia parar de encarar Kokichi no fundo, que tinha uma expressão estranha e um olhar vidrado que encarava o nada. Isso definitivamente não era normal. Àquela altura, Kokichi já estaria fazendo alguma piada, uma forma até para distrair a atenção de todo mundo daquele clima pesado ao sentirem raiva dele. Mas ao invés disso ele estava quieto, sem mover um único músculo do lugar.
Certo, isso era mesmo estranho. Ele estava antes bem ativo durante o julgamento, até mesmo fazendo aquela brincadeira sem graça ao mentir dizendo ser o assassino. Como sempre, Shuichi teve que esfriar a raiva de todos e provar que ele estava mentindo para proteger o menino. Isso sempre parecia divertir Kokichi, que não se cansava de provocar o jovem detetive de todas as formas possíveis, aparentemente. E já não bastava ele ter se fingido de morto antes também! Shuichi tinha quase sentido seu coração parar naquele instante com o choque da visão, para no fim ser só mais uma mentira. Às vezes isso o tirava mesmo do sério.
...Mas, agora que parava para pensar nisso, Kokichi realmente havia se machucado naquele instante, não havia? Era muito estranho que ele estivesse se sentindo bem já depois daquilo. Porém, durante o julgamento ele parecia normal! Seria apenas sua impressão…?
Lentamente Shuichi se aproximou dele, tocando de leve em seu ombro. O garoto mal se mexeu, dando apenas um sorriso fraco.
— Ah, ei, Shuichi… Mais um caso resolvido, não…? Você realmente… não decepciona... — falou, a voz estando realmente baixa e um tanto falhada. Kokichi era alguém naturalmente já muito pálido, mas agora ele parecia mesmo em um aspecto doentio, sendo possível ver o suor em sua testa e os lábios já sem cor, fazendo o detetive arregalar os olhos com isso.
Fazia quanto tempo já que ele estava assim? Ambos ficam relativamente distantes durante os julgamentos, então Shuichi não estava perto o suficiente para notar qualquer coisa. Mas por que ele fingiu estar bem esse tempo todo? E por que ele continua sem falar nada ainda sobre isso?!
— ...Você vem comigo — disse, agarrando sua mão e o puxando para a saída. O jovem líder o encarou com hesitação, franzindo o cenho.
— Espere, o quê…
— Shuichi, está tudo bem? — Tsumugi perguntou, os encarando com confusão.
— Eu estou indo com o Kokichi para a enfermaria — Shuichi respondeu simplesmente. Todos agora os encaravam, menos Himiko que ainda chorava sozinha, sem nem notar nada ao seu redor.
— Enfermaria? Algo aconteceu? — Kaito indagou, já se movendo para ir junto, preocupado.
— Não, Kaito, você não precisa… — mas se interrompeu ao notar Kokichi caindo para frente, mais do que depressa o agarrando com os braços. Não era apenas sua mão, ele estava todo gelado! Como conseguiu ficar em pé esse tempo todo?!
Kaito se aproximou com rapidez, ajudando a segurar o menino.
— Aqui, abaixe-se — ele o instruiu, ajudando a colocar Kokichi sobre as suas costas. Shuichi nunca se considerou alguém realmente forte, mas o outro garoto era realmente leve e pequeno, então não era tão difícil de carregar. Apesar disso, Kaito foi junto para ter certeza de que o menino não iria cair.
Shuichi estava mesmo ficando nervoso já. Nunca pensou que veria Kokichi tão… indefeso assim. Para ele, o jovem líder era alguém quase intocável, nada conseguindo realmente o atingir. Vê-lo fraco dessa forma estava o fazendo se sentir muito mal, a preocupação corroendo sua mente com pensamentos pessimistas. Trincando os dentes, ele tentava respirar fundo em uma forma de se acalmar.
“Está tudo bem… Kokichi não está morrendo, ele só desmaiou… Não ocorreu nenhum assassinato com ele, foi só um acidente… Monokuma não anunciou nenhum corpo, ninguém mais vai morrer hoje, está tudo bem… Kokichi está bem…”, ficava repetindo para si mesmo, mas já sentia as lágrimas subirem aos olhos.
Já não aguentava mais se sentir assim. A sensação de não saber o que pode acontecer no próximo minuto, o desespero de pensar que alguém querido para ele pode morrer bem diante de seus olhos… Ele estava já tão cansado de tudo isso.
Ele era um detetive. Estava acostumado a ver pessoas mortas e a resolver os seus casos, mas era só isso. Uma vez morta, a pessoa não volta nunca mais. Como detetive, não havia nada que ele pudesse fazer para evitar este destino.
Ele não conseguia salvar ninguém.
Kaito o encarou de canto, engolindo em seco. Sabia que o Shuichi passava às vezes o tempo com esse estranho garoto, mas nunca conseguiu entender o porquê o seu amigo ainda fazia isso. Kaito simplesmente não conseguia gostar de Kokichi, não importava como olhasse, pois alguém como ele não podia ser confiável. Mas nunca imaginou que Shuichi se preocupava com o Kokichi a este ponto. Dava para notar claramente as lágrimas subindo aos seus olhos e o desespero em sua expressão. O quão profunda podia ser a relação de ambos…?
Enfim chegando na enfermaria, mais do que depressa os dois rapazes colocaram Kokichi na cama, que ainda continuava desacordado. Pegando algumas bandagens e remédios, Shuichi passou a tratar a área ferida em sua cabeça com cuidado e em silêncio. 
Após alguns minutos, Kaito pigarreou, sem graça.
— Hã, você quer que eu chame a Maki Roll? Ela é muito boa com primeiros-socorros.
— Não. A Maki não gosta do Kokichi. Ela já tentou matar ele uma vez, esqueceu? — respondeu, parando o que estava fazendo para passar os dedos com delicadeza agora sobre o pescoço do Kokichi por baixo do lenço. Ainda conseguia ver os hematomas lá, ficando irritado com a visão. — Ela não vai tratá-lo bem. Eu gosto dela e quero acreditar que ela seja uma boa pessoa como você diz, mas não vou deixar ela se aproximar do Kokichi nunca mais — disse com dureza. Kaito então fez uma careta, desconcertado.
— Bem, eu não posso dizer que aprovo o que ela fez também. Não gosto de ver ela agindo daquela forma porque eu sei que ela é uma boa pessoa. Mas eu entendo que ela teve os motivos dela, sabe.
— O quê, por ela não conseguir confiar nele?
— ...É.
— ...Tudo bem, eu ENTENDO isso também. Kokichi criou essa fama para si mesmo, conseguindo ganhar a desconfiança de todos os outros, aparentemente — Shuichi suspirou, pegando agora as bandagens ao lado para colocar na cabeça do mais baixo. Para o alívio de Kaito, ele parecia já estar um pouco mais calmo agora que viu que Kokichi estava descansando bem. Mas ainda mantinha o olhar triste em seu rosto. — Eu ainda não entendi o porquê ele fez tudo isso, mas deve ter um motivo, não é? E é justamente por isso que eu tenho que ajudar... Ele não é o vilão que diz ser, Kaito. Eu tenho certeza disso. E vou fazer tudo o que puder como detetive para poder provar.
Kaito o encarou por mais alguns segundos, hesitante. Shuichi não podia estar sério, certo? Kokichi já deixou mais do que óbvio de que não era alguém em que se podia acreditar. Por mais que ele parecesse gostar de Shuichi, ainda assim...
Suspirando, decidiu enfim ceder — afinal, acreditava que a confiança que sentia em Shuichi era maior do que a desconfiança que tinha quanto ao outro. Não significava que iria abaixar a guarda com o pequeno menino, mas, se pudesse deixar Shuichi feliz com isso… Bem, podia se esforçar um pouco em aceitar.
— Tudo bem, eu acredito em você. Afinal, você é o meu sidekick! Se eu não puder contar contigo, em quem mais poderia me apoiar? — Kaito respondeu, batendo no ombro de seu amigo. Ele sorriu também, agradecido.
— Obrigado, Kaito. De verdade.
— Para, você não tem que agradecer nada! Eu vou agora no refeitório pegar algo para vocês dois comerem, nem que seja só algumas barrinhas mesmo. Quer que eu pegue mais alguma coisa?
— Ah, pode pegar o meu livro? Está no meu quarto.
— O que, pretende passar a noite aqui o fazendo companhia? — Kaito brincou, erguendo uma sobrancelha. Imediatamente foi possível ver o rosto de Shuichi corar, fazendo o outro rir. — Eu estou brincando, cara. Eu sei que você está preocupado com ele, relaxa. Eu já volto, ok?
Mesmo depois de Kaito já ter saído, Shuichi continuava olhando para baixo, ainda muito corado. Sim, é claro que estava preocupado. É normal se preocupar com amigos, não? Não tinha nada demais nisso! Faria a mesma coisa se fosse com o Kaito. Mas por algum motivo realmente ficou constrangido, como se tivesse sido pego em algum ato vergonhoso. Mas o que tinha de vergonhoso nisso? Kokichi era só seu amigo. Só isso.
Apesar de que… bem, ele sabia que Kokichi gostava dele, apenas não sabia o que sentia sobre isso. Apesar de todas as brincadeiras e mentiras, o olhar de Kokichi parecia estar sempre nele, com o mais baixo sempre querendo chamar sua atenção de alguma forma.
Além disso, quando ele conseguiu a chave e encontrou Kokichi no hotel… Apesar de tudo, aquilo foi real demais. Mas, quando Kokichi disse que o amava, temeu que fosse apenas mais uma de suas mentiras. E como temeu se machucar com isso… Mas no fim, não conseguiu evitar de desejar que ele não tivesse ido embora. Não queria que tivesse acabado. Lembrava-se bem de como tinha sentido seus joelhos falharem, sem o obedecer enquanto apenas observava consternado Kokichi sair. No fim, se perguntava como poderia ter sido se tivesse acreditado em suas palavras. Se tivesse se deixado levar pelo momento. Deixado ser amado. Tudo poderia ser tão diferente...
Shuichi então viu Kaito entrar novamente com a comida e seu livro, percebendo que não notou o tempo passar enquanto estava perdido em pensamentos. Não havia nem terminado de enfaixar Kokichi! Não podia se distrair assim, caramba!
— Shuichi, está tudo bem? — Kaito perguntou, notando que seu amigo estava ainda mais corado do que quando havia saído. O garoto acenou rapidamente com a cabeça, se atrapalhando levemente com as bandagens enquanto terminava de enrolar ela em Kokichi com pressa.
— S-sim, eu só estou t-terminando isso aqui — ele gaguejou, constrangido. Kaito segurou a vontade de rir, achando engraçada a atitude dele.
— Tudo bem, então. Eu vou deixar essas barrinhas e o seu livro aqui em cima da cômoda, ok? Imagino que você não vá querer treinar hoje comigo e com a Maki Roll, afinal — ele disse com graça. Shuichi apenas deu de ombros, embaraçado.
— Amanhã eu volto a treinar com vocês, pede desculpas para a Maki por mim. Apesar de que eu acho que ela não vai gostar muito de saber que eu não vou por causa do Kokichi... — ele murmurou, ainda sem graça. Não é como se ele se importasse realmente com o que a Maki pensasse, mas ainda se sentia mal por deixá-los na mão.
— Ah, se eu estou conseguindo aceitar isso, então a Maki supera também. E vai ter a minha incrível companhia só para ela! Que pena que você vai perder eu vencendo ela nas abdominais hoje!
— Isso se você não se distrair enquanto admira as estrelas, como sempre.
— Ei, eu sou um futuro astronauta, você não pode me julgar por gostar das estrelas! E é claro que eu faço isso para dar a ela uma chance de ganhar também, sou um cara justo!
— Ah, sim, é claro. Você ganhando da Maki é totalmente possível — Shuichi brincou, revirando os olhos.
— Eu não sei agora se você está aprendendo a mentir com o Kokichi, ou se você realmente tem fé em mim. Acho que vou acreditar na segunda opção — ele respondeu, ambos rindo em seguida.
Morrendo já a risada, Shuichi voltou a ficar sério, encarando agora suas mãos.
— Por sinal, eu não cheguei a perguntar… Como está a Himiko? — indagou, hesitante. Kaito amuou, coçando a cabeça.
— Bem, depois que a Himiko se acalmou, ela acabou desmaiando, acho que de exaustão mesmo. Gonta carregou ela de volta para o quarto, mas deve ficar bem. Realmente não foi fácil para ela, afinal. Acho que… nunca vai ser fácil para nenhum de nós.
Shuichi concordou lentamente, engolindo em seco. O killing game estava destruindo todos por dentro. Sabia bem como Himiko se sentia, pois sentiu o mesmo quando Kaede se foi. E tudo porque ela queria proteger eles… Tudo para poder acabar com o killing game. Mas nada parecia funcionar. E, mesmo sendo detetive, ele também não conseguia encontrar uma resposta.
Se é que havia alguma.
E o desespero de pensar que mais alguém que ama pode ser mais uma vítima também… Esse sentimento nunca o abandonava. Era um medo constante que assombrava-lhe nos pesadelos e quando acordado. Simplesmente não tinha como escapar.
Mas ele não podia ficar pensando nisso, iria enlouquecer. Além disso, ele prometeu a Kaede que não desistiria. Tinha que acreditar que havia esperança, tinha que ter alguma resposta. Precisava ter...
Ouvindo o anúncio de nighttime, Kaito se despediu com um boa noite, enfim saindo. Sem muito o que fazer agora, Shuichi pegou seu livro, tentando se distrair. Mas de minuto em minuto levantava o rosto, esperando ansiosamente ver alguma reação em Kokichi. Porém o garoto continuava desacordado, parecendo em um sono profundo. Shuichi então mordeu o lábio, cada vez mais ansioso.
Por que ele não acordava? O ferimento seria mais sério do que pensava? E se ele fez algo errado na hora de tratar?
Por que ele não acordava?!?
Respirando fundo, voltou a ler o livro. Não podia ficar nervoso, Kokichi estava bem. Era questão de tempo até acordar e Shuichi sabia disso. Só precisava se manter calmo… Mas às vezes era tão difícil.
As horas então passaram. Abrindo os olhos lentamente, Kokichi encarou com confusão o novo ambiente em que se encontrava. As memórias voltavam devagar, enfim se recordando das ações de Shuichi no final do julgamento, franzindo então o cenho. Virando o rosto, notou que o mesmo tinha adormecido sobre um livro que lia, apoiado sobre os braços cruzados na cama. Pensou em acordar ele, mas admitia que achou a visão adorável, considerando o quão sereno ele parecia enquanto dormia. Tinha ficado o tempo todo ao seu lado ali?
Não, não podia ser isso.
Ninguém mais gostava de Kokichi. Não que realmente se importasse, visto que era essa a sua intenção mesmo. Mas então, por que qualquer um deles se importaria se estava bem ou não? Ele era o vilão agora. Já pensaram em matá-lo mais de uma vez. Por que Shuichi perderia seu tempo com ele?
Lembrou-se de quando havia se declarado para o garoto. Parecia tudo um sonho, só que ao mesmo tempo muito real. Porém, lembrava-se bem de como Shuichi havia reagido, pois o garoto obviamente não havia acreditado em suas palavras... Não que pudesse julgar, afinal realmente era um mentiroso. E justamente por ser assim, contar a verdade muitas vezes doía. Mentir então era simplesmente mais fácil, mesmo que para isso tivesse que mentir para si mesmo também, algo que já estava mais do que acostumado a fazer.
Mas, ao mesmo tempo, Kokichi obviamente ainda não havia desistido do detetive. Quando ele quer algo, ele vai até o fim para conseguir. É assim que um verdadeiro líder age, afinal. Era apenas natural que tudo o que desejasse estivesse sob o seu poder!
...Ou talvez isso fosse só mais uma mentira. Não sentia como se quisesse forçar Shuichi a fazer qualquer coisa contra a vontade dele. Por conta de sua personalidade orgulhosa e possessiva, essa era uma sensação bem incomum e frustrante, mas a grande verdade é que ele faria absolutamente tudo pela felicidade de Shuichi, mesmo que tivesse que deixar a sua própria de lado, sendo a primeira pessoa a conseguir tal efeito sobre ele.
Mas, bem, por mais que não fosse forçar nada, ainda valia a tentativa. Não iria ficar criando grandes expectativas, mas, agora que estavam a sós, talvez… só talvez a noite pudesse ficar mais interessante.
Encostando os dedos em sua própria testa, notou as faixas enroladas. Pareciam bagunçadas e estavam um pouco apertadas demais, mas ainda assim apreciou. Fora Shuichi quem fez também?
Esse menino era mesmo um mistério para ele.
Encarando-o novamente, decidiu acordá-lo por fim. Aproximando o rosto do dele, o observou de perto. Ainda dormia como um bebê, seus enormes cílios tremendo levemente. Se perguntou sobre o que ele poderia estar sonhando. Apesar de ter o achado sereno antes, pela sua expressão agora notava que não parecia ser um sonho muito bom.
Depois de o encarar por alguns instantes, sorriu com graça. E então, segurando levemente o nariz do menino adormecido, ele tampou sua respiração.
Não levou mais do que cinco segundos. Shuichi levantou a cabeça com rapidez, assustado com a falta de ar, perdendo o equilíbrio da cadeira e caindo com um baque no chão. Kokichi então começou a gargalhar.
— PFFFF, você tinha que ver a sua cara! — disse entre os risos, olhando zombeteiro para o garoto que se levantava agora com dificuldade. — Sério, você sempre é divertido de alguma forma, não é?
— Há-há, muito engraçado — Shuichi resmungou, já sentando na cadeira novamente, olhando bravo para Kokichi. — Será que dá para você parar de me matar do coração assim?
— Non, non. Essa não é uma opção — respondeu, colocando um dedo sobre os lábios, ainda o olhando com graça. — Inclusive, eu gosto de ver você cuidando assim de mim. Posso me acostumar?
— Não, não pode — Shuichi respondeu em um suspiro. Então virou-se para a cômoda ao lado, deixando seu livro e pegando uma barrinha de cereal, uma garrafa e alguns comprimidos que tinha deixado lá. — Toma isso. Vão ajudar se estiver sentindo dor.
— Ok, está decidido. Eu definitivamente vou me acostumar com você cuidando de mim — brincou, tomando os remédios em seguida. Mas então fez uma careta, olhando ofendido para a garrafa. — Espere, isso é soro? Por que você me deu essa coisa nojenta?
— É isso o que geralmente te dão em hospitais quando você se sente mal, sabe. Você inclusive desmaiou, se não percebeu ainda, então um pouco de sal e açúcar não vão te machucar. E já que você gosta taaanto de mim cuidando de você, com certeza você vai tomar sem reclamar, certo?
— Touché — riu, entornando então a garrafa, sem conseguir evitar de fazer outra careta depois. Aquilo era definitivamente horrível, mais do que depressa comendo a barrinha para tirar o gosto da boca.
Enquanto via ele comendo, Shuichi decidiu ir já direto para o assunto, apontando agora o dedo para ele.
— Posso saber o que diabos aconteceu?
— Hm? Du que focê tá faando? — indagou com a boca cheia, engolindo depois com pressa. — Se é sobre o ferimento, você chegou a ver…
— Não, eu não estou falando sobre o ferimento, estou falando sobre depois disso. Por que você não pediu ajuda? Ninguém levou a sério porque você depois fingiu estar perfeitamente bem.
Para a sua surpresa, Kokichi desviou o rosto para não o encarar.
— ...Não é como se qualquer um fosse me ajudar, de qualquer forma — respondeu simplesmente, dando então de ombros.
Shuichi desviou o rosto também. Trincando os dentes, ele sentiu o punho tremer enquanto apertava o lençol da cama.
— ...Você me considera tão pouco assim? — ele indagou em um sussurro. Isso atraiu a atenção de Kokichi, que passou a analisá-lo com cuidado.
— ...Te considerar pouco? Você realmente pensa isso?
O menino não respondeu, ainda sem o encarar. Kokichi então suspirou também, levantando os joelhos e apoiando o queixo sobre eles, refletindo.
— ...Eu estou sempre te observando, sabe? — começou a dizer, levantando a mão esquerda para encarar o curativo solto em seu dedo anelar. E então sorriu. — Esse lugar e as pessoas daqui muitas vezes são um tédio, mas você sempre chama minha atenção. Tudo o que eu digo e faço é imaginando como você reagiria. Cada provocação é para ver diferentes respostas suas. E todas as vezes você me surpreende. Não importa quantas vezes eu te provoque, você nunca parece desistir de mim. E isso me fascina.
Shuichi voltou a olhá-lo com hesitação.
— ...Te fascina? O que isso deveria significar?
— É bem simples. Significa que você não é nem um pouco entediante. Incrível, não é?
Normalmente quando alguém ouvisse isso, essa pessoa acharia um tanto rude e ficaria ofendida. Como alguém pode demonstrar afeto pelo outro ao compará-lo com o tédio? Isso não é algo que se faça.
Porém, Shuichi sorriu. Estava a tempo demais ao lado de Kokichi para saber o que aquilo significava. Essa é a forma do garoto dizer se alguém o marcou de alguma forma ou não, sendo um sinal tanto de respeito quanto de afeto. E como era difícil o ver falando isso para alguém! Na realidade, a única outra pessoa que Shuichi se lembrava de ter sido chamada assim fora Kaede, uma pessoa na qual Kokichi gostava também, tendo ouvido ele dizer essas mesmas palavras para ela antes da mesma morrer. Era um tanto estranho, mas essa era a forma como o garoto demonstrava seu carinho, afinal.
— ...Você não está mentindo para mim, está? — Shuichi perguntou com receio. Kokichi então revirou os olhos, rindo em seguida.
— Bem, eu poderia te dizer que é mentira, mas aí eu poderia estar mentindo ao falar isso. Como é que se acredita em um mentiroso, afinal? Eu até hoje não entendi o porquê você parece confiar em mim.
— Mas nem tudo o que você diz é mentira. Agora mesmo eu tenho certeza que você estava falando a verdade — afirmou com convicção, para logo em seguida pigarrear. — ...Não é?
— E lá vai você perguntando para o mentiroso de novo! Sério, Shuichi, você é terrível nisso. E ainda se diz ser detetive.
— Bem, eu também não me acho assim tão incrível como todos dizem, mas eu sou realmente um detetive. O problema é que você é naturalmente muito confuso.
— ...Mas então, me investigar é ainda mais interessante, não é? — Kokichi murmurou de forma zombeteira, aproximando o rosto do dele. Shuichi ia recuar, mas no fim ficou parado, encarando-o nos olhos. — Me diz. O que você já descobriu sobre mim?
— Hm… — o outro murmurou, engolindo em seco. Tinha que admitir, estava com dificuldade para pensar ao ver o rosto de Kokichi tão próximo do seu. Seus olhos violetas o observavam com intensidade, sem desviar dos seus por um segundo sequer. Shuichi segurou a vontade de pegar a mecha arroxeada de seu cabelo que estava solta no meio de seu rosto, tentando ao invés disso clarear a mente para poder responder. — B-bem… Você aparentemente é o líder de uma organização secreta, e-e…
— Não, não, essas são as coisas chatas sobre mim. Eu quero saber as interessantes. Você já descobriu alguma, certo?
Shuichi não sabia exatamente ao que ele se referia, mas agora começou a ter uma ideia. Corando fortemente, ele enfim desviou os olhos, embaraçado.
— ...Que você… t-talvez goste... de mim? — murmurou de forma gaguejada, apertando os lábios no fim. Kokichi o encarou por alguns segundos, surpreso. Admitia, tinha provocado mais para poder vê-lo envergonhado, então não esperava que ele fosse realmente falar. Vendo isso, não conseguiu evitar de rir.
— Você parece uma menininha do colegial que acabou de se declarar para o senpai, sabia? — falou com graça, rindo ainda mais ao ver Shuichi corando cada vez mais forte.
— E você às vezes é insuportável.
— Agora já está mais para uma tsundere mesmo. Devo dizer que eu gosto, até.
Shuichi estava prestes a retrucar, mas se calou ao ver Kokichi colocar a mão sobre o seu rosto. Diferente de quando ele havia desmaiado, sua mão agora estava mais quente, com seus dedos pequenos acariciando sua bochecha. O pobre detetive agora sentia que seu rosto iria explodir.
— E então? Vai me rejeitar mais uma vez? — Kokichi indagou, sorrindo. — Você sabe que não tem como escapar de mim, certo? Eu sempre consigo o que eu quero no fim.
— ...Você fala como se eu fosse um objeto seu.
— Não, objeto não. Mas você definitivamente é meu. E eu nunca desisto daquilo que me pertence.
Shuichi queria se afastar. Sempre que ouvia Kokichi dizer coisas como aquela, se sentia extremamente inseguro de ficar perto dele. Mas ele simplesmente não conseguia mais. Ele estava praticamente hipnotizado pelos olhos violetas, que pareciam quase devorá-lo vivo. Por isso, não conseguia reagir enquanto via o rosto do outro se aproximar cada vez mais do seu.
Então Kokichi o beijou.
Para a sua surpresa, fora um beijo leve e lento. Imaginou que Kokichi tentaria o dominar logo de cara, mas seu parceiro não parecia ter pressa enquanto esperava Shuichi relaxar. Apesar de todo o discurso dele o pertencer, Kokichi parecia querer ter certeza de que ele estava a vontade com aquilo tudo, aparentemente. E, agora que parava para pensar nisso, Shuichi percebeu que a mesma coisa aconteceu no dia em que se encontraram no hotel, quando Kokichi se afastou justamente porque notou o quão inseguro o menino estava naquele momento.
Ele realmente se importava com o que Shuichi pensava e sentia. Isso nunca foi uma mentira.
“Salgado”, o garoto pensava enquanto apreciava as sensaç��es que sentia. “Seus lábios estão salgados do soro. Mas ainda tem o hálito de uva de sempre...”
Oh, ele realmente estava se sentindo bem. Admitia que já tinha imaginado muitas vezes como poderia ser o primeiro beijo de ambos, mas estava sendo mais especial do que pensava. Kokichi ainda segurava delicadamente sua bochecha, sendo o mais cuidadoso o possível enquanto movia seus lábios. Quando enfim se afastaram, ele tirou a mão de seu rosto, passando a analisá-lo enquanto esperava ver qualquer reação por parte dele. Para a sua surpresa, Shuichi começou a rir.
— Você é realmente mais cavalheiro do que eu pensava — disse entre os risos.
— Cavalheiro? Você não me chamou disso, não é?! Você vai fazer eu me sentir como o Gonta agora! — ele respondeu com uma careta, fazendo o outro rir mais ainda.
— Só falta você começar a falar em terceira pessoa e então estará idêntico mesmo.
— Espere… Shuichi Saihara zoando alguém?! Você finalmente aprendeu a fazer algo que preste comigo! Agora você só precisa largar o Kaito de uma vez e me aceitar oficialmente como o seu novo parceiro nos casos, assim será perfeito!
— Com você, só se fosse parceiro nos crimes — murmurou entre os risos, apoiando as mãos nas pernas dele. Kokichi ergueu uma sobrancelha com isso.
— Poderia ser também. Qualquer coisa. Se bem que neste exato momento você está sendo um tipo diferente de parceiro bem interessante — respondeu debochado, pegando então as mãos dele e o puxando. — Agora, você não espera que eu deixe você ficar o tempo todo só nessa cadeira, não é? Nosso beijo foi legal e tal, mas você sabe que eu não estou satisfeito só com aquilo, certo?
Shuichi revirou os olhos com graça, permitindo-se erguer para poder sentar ao seu lado na cama. Estava muito nervoso antes, mas agora não conseguia deixar de relaxar ao lado dele. Sabia agora que Kokichi não faria nada com ele se o mesmo não quisesse.
E, bem, admitia… Estava ansioso para ver o que poderia acontecer. Nunca se sentiu assim antes, sendo pura confiança que passou a ter em seu parceiro, deixando seu nervosismo de lado para enfim conseguir aproveitar cada momento.
Kokichi então passou os braços por cima dos ombros dele, o abraçando no pescoço, enquanto Shuichi agora abraçava sua cintura. Os rostos estavam já novamente muito próximos, narizes cruzados enquanto sentiam a respiração do outro sobre suas peles. Logo já estavam se beijando, primeiro lentamente, mas se intensificando bem rápido, com a língua de ambos brincando em suas bocas. Lentamente Shuichi foi caindo sobre ele, ficando ambos deitados um sobre o outro, ainda abraçados enquanto se beijavam com paixão.
Separando enfim seus lábios, Kokichi passou a beijá-lo pelo rosto, se movendo até chegar em sua orelha.
— Você está mais empolgado do que eu pensava — murmurou em um sussurro em seu ouvido, fazendo o outro se arrepiar. Abaixando os braços, passou as suas mãos por dentro do casaco e da camisa do detetive, passeando com seus dedos finos pelas costas nuas do outro, conseguindo sentir bem o corpo que estava arrepiado contra si. — Até mesmo pulou já em cima de mim. Você realmente consegue sempre me surpreender, não é?
— Talvez, se você não me provocasse tanto... — Shuichi começou a dizer contra seu pescoço, fazendo o mais baixo se arrepiar também ao sentir o hálito quente sobre sua pele por trás do lenço. — Você realmente joga sujo às vezes…
— Jogar sujo? Eu sou só um cara ferido e indefeso. Você tem que tomar responsabilidade sobre isso — murmurou com um riso, voltando a beijá-lo pelo rosto para alcançar novamente sua boca. Porém parou, notando que Shuichi havia ficado tenso de repente. — ...Shuichi?
— R-realmente, você está ferido! E-eu devia estar só c-cuidando de você! — o outro murmurou, se apoiando em seguida sobre os cotovelos enquanto o olhava com culpa. — Você tem que repousar, e-eu…
— Ei, ei, ei! É sério que você vai me excitar assim e depois cair fora? — indagou, erguendo mais uma vez a sobrancelha com graça. — Não tínhamos acabado de decidir que seríamos oficialmente parceiros no crime e no sexo?
— ...Estávamos brincando sobre o crime e não chegamos a falar sobre sexo, sabe...
— Bem, você é quem não percebeu nas entrelinhas. Como um mentiroso profissional, eu também sei disfarçar a verdade — comentou, aumentando o sorriso. Ele então levantou uma de suas mãos, brincando com o polegar sobre o lábio inferior do rapaz acima de si. — Eu já te disse antes: você pode fazer o que quiser comigo. Esqueça ferimentos ou qualquer outra coisa. Nós dois juntos é só o que importa agora — murmurou, puxando-o de volta lentamente pelo queixo com a mão que brincava antes em sua boca.
— Kokichi… Você precisa de c-cuidados… — murmurava, mas seu corpo apenas cedia sem ele nem perceber, sendo logo calado com mais um beijo. Lentamente Kokichi foi desabotoando os botões do casaco de seu parceiro, atrapalhando-se um pouco com os dedos por estar distraído com seus lábios, que não haviam parado de se beijar em momento algum. A mente de Shuichi estava nublada, não conseguindo se concentrar em mais nada além dos toques que sentia. Antes que notasse o seu casaco e sua camisa foram jogados ao lado, agora com o seu torso exposto completamente.
Enfim se separando sem fôlego, Kokichi pôde olhar o corpo dele. Tinha sentido já com os dedos, mas ainda assim gostou muito da visão. Não é como se o outro rapaz tivesse muitos músculos ou coisa do tipo, mas definitivamente não era magro como parecia quando está de roupas, tendo um corpo até que bonito para apreciar. Sabia já que ele treinava todas as noites com o Kaito e com a esquisita da Maki, mas não imaginou que realmente já estivesse ajudando no seu físico. Isso foi uma surpresa bem agradável.
Já Shuichi não sabia mais como agir, segurando a vontade de se tampar com as mãos em uma tentativa de se esconder. Nem mesmo no dia em que o convidaram para ir na piscina ele quis tirar a camisa, então, ver-se agora exposto em um momento tão íntimo era um tanto aflitivo para ele. Por conta disso, não conseguiu evitar de ficar um tanto estático no lugar enquanto via Kokichi passar os dedos pelo seu abdômen, o olhando fascinado como se Shuichi fosse a descoberta mais interessante que teve em muito tempo.
— ...Kokichi? — o garoto murmurou, já bem sem graça. Com relutância o outro garoto desviou os olhos, voltando a encarar seu rosto.
— Oh, desculpe. Onde paramos? — perguntou com um sorriso, rindo então ao ver a expressão de Shuichi. — Ei, não me olhe assim. Só estava apreciando a paisagem.
— A paisagem? Sério?
— Tudo bem, é mentira. Mas, convenhamos, com um cara gato desses bem em cima de mim, não tem como eu não me distrair — respondeu, rindo ainda mais ao ver o rosto do outro ficar extremamente rubro. Bufando, começou a tirar o próprio lenço do pescoço. — Pronto, você se sentirá mais à vontade se eu me juntar a você então?
Isso realmente conseguiu desviar a atenção de Shuichi, que observava agora o garoto debaixo de si atirar de lado seu lenço e começar a desabotoar seu próprio casaco. Lembrou-se que as meninas não quiseram convidar ele para ir na piscina naquele dia, então nunca chegou a ver o jovem líder sem o seu típico traje preto e branco.
Quando ele terminou de desabotoar, Shuichi notou que o garoto andava sem camisa por baixo. Por ele ter correias prendendo seus pulsos e cotovelos, Kokichi decidiu que iria ser simplesmente mais fácil se só deixasse o casaco aberto ao invés de tirá-lo, visto que mesmo assim dava para ver perfeitamente seu corpo — visão essa que definitivamente surpreendeu Shuichi.
Kokichi era realmente magro, mas, considerando que ele possuía só 44 quilos — sim, Shuichi lia com frequência o card dele para ver se alguma informação sobre o garoto atualizava —,  esperava no mínimo ver um corpo extremamente seco, mas não era realmente assim. Provavelmente por conta de sua baixa estatura, o peso até que era bem equilibrado, além do fato do menino ter certas curvas relativamente bonitas em um corpo masculino.
E agora fazia sentido o porquê sua mão se encaixava tão bem ao segurar na cintura dele!
Erguendo mais uma vez a sobrancelha, Kokichi observava com graça o garoto de cima envergonhado enquanto absorvia a visão de seu corpo.
— Parece que a vista aqui te agrada também, afinal — ele murmurou, colocando um dedo sobre o lábio em seguida. — Agora que ambos já conseguimos aproveitar as nossas respectivas paisagens, podemos voltar para a parte boa? — indagou. Vendo então o outro garoto perdido, Kokichi revirou os olhos, bufando. — Tudo bem, regra número um: se você não sabe ainda o que fazer, não tente ficar por cima, querido.
Então, sem aviso nenhum ele levantou o próprio corpo, forçando Shuichi a levantar-se com surpresa também. Colocando-se sobre os joelhos, Kokichi sorria enquanto passava ambas as mãos sobre o torso dele novamente, subindo elas lentamente enquanto apreciava seu corpo com os dedos mais uma vez, mordendo o próprio lábio com excitação. Mas após alguns segundos ele enfim deixou seu torso e passou a segurar seus ombros, beijando em seguida seu pescoço enquanto aos poucos o empurrava de leve para que se deitassem no lado oposto da cama, invertendo então as posições de quem ficava sobre quem.
Sem esperar qualquer reação, Kokichi foi abaixando seus lábios para passar a beijar pelo seu peito e abdômen. Àquela altura Shuichi já estava completamente arrepiado, arfando ao sentir o outro se abaixar cada vez mais enquanto beijava e chupava seu corpo, sem ter pressa nenhuma, sendo possível ver já uma leve marca roxa surgindo aqui e ali por onde passava com seus chupões. Porém, quando estava prestes a alcançar suas calças ele parou, levantando o rosto para encarar os olhos de seu parceiro. Parecia quase como se ele estivesse esperando algum tipo de autorização para poder continuar.
“E ainda diz que não é cavalheiro”, Shuichi pensou, sorrindo para si mesmo.
Mas admitia que não sabia exatamente como dar a tal autorização, por isso tentou pensar rápido. E então, mesmo sentindo que seu rosto iria entrar em combustão com isso, Shuichi começou a tirar seu próprio cinto com dificuldade, fazendo Kokichi segurar a vontade de rir. Não importava como olhasse, aquele detetive era um desastre quando se tratava de sexo. Mas isso tornava tudo ainda mais divertido para o pequeno menino, que observava com graça o rosto do outro pegar fogo.
— Ok, com essa cara você parece que está prestes a vomitar. Isso não é muito romântico — Kokichi riu por fim, apoiando um dedo seu logo acima da cueca agora exposta do outro rapaz, acariciando de leve. Ele já estava obviamente muito excitado, considerando o volume. Shuichi desviou o rosto, mordendo o lábio.
— ...E-está tudo bem… Eu q-quero… também... — ele murmurou, tendo plena consciência do toque que acariciava o seu membro inferior. Isso definitivamente dificultava para pensar e falar.
— Então por que você não tenta olhar para mim enquanto diz isso? É muito mais interessante se você participar também, sabe... E, bem, eu admito que quero poder conseguir ver totalmente as suas expressões. A nossa diversão está só começando — comentou, sorrindo com travessura.
Esse garoto iria enlouquecê-lo. Tanto as provocações de suas palavras quanto as de seus toques o fazia perder completamente o equilíbrio, sentindo sua sanidade se esvair aos poucos. Era uma sensação bizarra de querer se esconder com a vergonha, mas ao mesmo tempo a louca vontade de ver até onde conseguiriam ir. E Kokichi sabia muito bem o quanto estava conseguindo mexer com ele… E, oh, como estava gostando disso!
Sem mais enrolar, Kokichi enfim puxou sua calça e cueca, as tirando de suas pernas enquanto via o membro excitado surgir. Começou seu trabalho devagar, apenas com as mãos, fazendo questão de olhar o tempo todo o rosto de seu parceiro, apreciando cada expressão que ele fazia conforme manuseava seu membro duro. Shuichi arfava,  gemendo de leve enquanto tampava a boca com a mão, tentando controlar sua respiração pesada. Não queria fazer barulho, mas estava cada vez mais difícil de se segurar.
Tendo então já apreciado essa visão, enfim Kokichi colocou na boca para chupar. Não demorou mais do que alguns segundos para que Shuichi começasse a gemer muito mais alto, envergando levemente o corpo enquanto agarrava o lençol da cama com força. Seus olhos já não se mantinham fixos em mais nada e sua mente ia a loucura, com os lábios escancarados já sem conseguir mais fechar. Usando tanto a boca quanto sua língua, Kokichi fazia o menino deitado gemer cada vez mais e mais alto, com ele já nem percebendo o fato de que qualquer um que passasse do lado de fora poderia ouvir — mas, mesmo que por um milagre ele percebesse isso, já era impossível de se controlar naquele ponto. Estava completamente entregue a Kokichi. E é claro que cada reação era apreciada pelo pequeno garoto travesso, que não tinha pressa nenhuma enquanto enchia o outro de prazer.
Mas, quando parecia que Shuichi estava para chegar no seu limite, Kokichi parou. Definitivamente não facilitaria para ele. Afinal, estavam ainda por começar!
Shuichi suava, sua respiração saindo arrastada enquanto via com um olhar um tanto perdido Kokichi se erguer.  Não conseguia pensar direito para ver o que estava acontecendo, seu corpo ainda processando o fato do prazer ter parado. Por tal, demorou para se tocar o que Kokichi pretendia fazer até vê-lo se sentar sobre o seu colo, o olhando com tesão.
— Talvez você possa me ajudar aqui, não? Também quero participar da brincadeira — murmurou, sorrindo tentadoramente enquanto desafivelava as correias presas em suas coxas e seu cinto em sua cintura, deixando a calça agora folgada em si. — E eu imagino que você esteja doido para ver quais expressões eu consigo fazer também… Não quer?
Isso foi a gota d'água. Normalmente Shuichi não saberia o que fazer em uma situação como essa, mas agora agia por puro instinto, um desejo louco por experimentar cada face de Kokichi possível. Com isso ele se sentou, mas, ao invés de se deitar sobre ele novamente, apenas o empurrou para o encosto da cama, deixando as costas do garoto contra a parede enquanto o olhava com desejo. Com as mãos em sua cintura, puxou as calças e a cueca de Kokichi contra si, com o outro garoto agilmente deslizando as pernas para deixar que as peças saíssem, deixando-as cair de lado no chão e ficando apenas com o casaco aberto no corpo.
Shuichi estava cheio de tesão. Mas, apesar da loucura que sentia com o desejo, ainda assim hesitou por um instante, olhando enfim para Kokichi com receio.
— N-não está desconfortável? Podemos tentar outra coisa se quiser… — murmurou, relutante. Kokichi bufou, passando os braços novamente em volta de seu pescoço.
— Shuichi, você está no controle agora. Eu farei absolutamente o que você quiser que eu faça, serei todo seu… Então tente me divertir — respondeu, mordendo o lábio em seguida com o desejo que também sentia.
Mesmo que um pouco receoso, Shuichi passou a segurar a bunda de Kokichi com ambas as mãos, posicionando-o sobre si, com o outro passando a abraçar sua cintura com as pernas. A cabeça e os ombros do pequeno estavam encostados contra a parede, encarando seu parceiro agora em pura expectativa. E então, tendo certeza de que Kokichi estava excitado o suficiente, Shuichi começou a entrar dentro do garoto aos poucos.
Com isso, lentamente a expressão de Kokichi passou a mudar. Primeiro começou a arfar, a respiração já saindo pesada e arrastada enquanto o encarava. Mas não demorou muito para que enfim perdesse a compostura, levantando o queixo para começar a gemer alto, seus olhos violetas já não conseguindo se manter fixos enquanto se reviravam perdidos para o teto, antes de enfim se fecharem com força. Agora quem conseguia apreciar as reações era Shuichi, que via atentamente as mudanças no rosto rubro de seu parceiro conforme se movia dentro dele.
Ainda segurando a bunda do menino, Shuichi se inclinou um pouco mais para a frente para poder facilitar a se movimentar, não conseguindo evitar de gemer também com o prazer que sentia. O ritmo aumentava gradativamente, com ambos os garotos indo a loucura. Ainda abraçando Shuichi no pescoço, Kokichi conseguiu se controlar minimamente para encostar seu nariz no do menino, ambos ofegantes agora enquanto voltavam a se encarar mais uma vez. Por mais incríveis que Shuichi pense que os olhos de Kokichi sejam, o jovem líder também amava se perder no olhar cinza do outro, tão profundo e seguro de se apoiar quanto o próprio Shuichi em si. Definitivamente não se cansaria deles jamais.
Mas logo ambos já não viam mais nada, fechando os olhos enquanto se beijavam, as estocadas ainda acontecendo enquanto se colavam de vez. Mal respiravam, línguas se embaralhando enquanto os corpos se moviam, com Shuichi involuntariamente apertando sua bunda com muita força enquanto Kokichi arranhava suas costas ao ponto de sangrar, além das correias de seus pulsos e cotovelos que se apertavam contra a pele do rapaz. Porém, absolutamente nenhum dos dois sequer notavam nada disso.
O prazer imenso que sentiam era mesmo a única coisa que importava.
Chegando ao clímax, já não conseguiam mais se beijar, pois àquela altura era impossível de segurar os altos gemidos dos dois. Shuichi então foi o primeiro a chegar no seu limite, seu corpo tremendo em fortes espasmos enquanto tinha seu orgasmo. Retirando-se de dentro do pequeno garoto, Shuichi o abraçou na cintura, escondendo o rosto em seu ombro enquanto arfava fortemente. Vendo isso, Kokichi retirou um de seus braços que o abraçava no pescoço para segurar o rosto dele, puxando-o levemente pelo queixo para fazer ele o encarar. E então sorriu com graça.
— Você realmente conseguiu me usar bem, não é…? — murmurou ofegante, levantando o outro braço para poder passar a mão em seu cabelo. — Mas ainda posso continuar a ser usado, sabe. Está pronto para me divertir mais um pouco?
Shuichi o encarou cansado, mas a determinação ainda estava clara em seu olhar. Sabia que Kokichi ainda não tinha tido seu orgasmo, então queria poder dar esse último pico de prazer para ele também. Porém, ao mesmo tempo o olhava com culpa, agora sem graça.
— Isso não é muito justo — começou a dizer, ainda também muito ofegante. — Só eu estou aproveitando aqui, você sempre faz tudo por mim… Você tinha que ter a chance de que eu fizesse algo por ti também.
— Você está brincando? Eu não podia estar me divertindo mais! Além disso, convenhamos, você é terrível com o sexo para tentar masturbar.
— ...Sou? — murmurou, desviando o rosto. Já imaginava isso, mas estava triste por ter decepcionado. Contudo, logo em seguida Kokichi começou a rir.
— E você ainda cai nas minhas mentiras! Achei que você já me conhecesse melhor — riu mais ainda, dando um beijo rápido nele. Isso chamou de novo a atenção do menino, que o encarava com dúvida. — Porém, era verdade quando eu disse que estava me divertindo. Só que eu ainda não estou terminado aqui… Mas podemos continuar como você quiser. É só dizer.
— Mas eu r-realmente queria poder fazer algo por você também… Não é mesmo justo — murmurou envergonhado, apertando os lábios de forma emburrada. Ah, isso era tão típico de um virgem inexperiente! Kokichi definitivamente não aguentava ver aquilo, aumentando o sorriso ainda mais.
Shuichi era só tão adorável!
— ...Tudo bem, então. Vou te guiar — respondeu em um sussurro, indo buscar a mão dele, segurando-a com delicadeza. Vendo suas mãos unidas, Shuichi notou seu curativo no dedo anelar já solto novamente, guardando isso na mente para que fosse amarrar de novo assim que terminassem. Por algum motivo era importante para Kokichi, afinal… Então imaginou que ele iria ficar feliz com isso.
Observou em silêncio o pequeno garoto levar sua mão para debaixo de si mesmo, enfim entendendo o que ele queria. Corando fortemente, Shuichi ergueu seus dedos, os colocando dentro de seu parceiro em pequenos movimentos. Com isso Kokichi voltou a gemer de leve, fechando os olhos enquanto sentia mais uma vez o prazer o dominar.
— ...Está bom assim? Não está machucando…? — Shuichi indagou lentamente, ainda muito corado enquanto observava com cuidado o rosto de seu parceiro.
— Hmm… — Kokichi murmurou de forma quase inaudível, deixando Shuichi sem saber se ele estava tentando dizer algo ou se foi apenas mais um gemido seu. Mas enfim o viu abrir os olhos, o encarando com puro desejo. — ...Mais… M-mais rápido…
Hipnotizado por suas diferentes facetas, ele obedeceu, aumentando o ritmo de seus dedos. Agora que era apenas Kokichi a sentir os toques, Shuichi podia apreciar com calma cada diferente expressão que o outro fazia, não podendo negar que estava gostando muito disso. Conforme aumentava o ritmo, Kokichi se perdia sobre si. Se contorcendo de leve em seu colo, sua respiração saía mais uma vez arrastada junto com seus gemidos, agarrando os ombros de seu parceiro com força, coisa que mais uma vez Shuichi mal percebeu, ainda fascinado com o que via.
Isso porque ver Kokichi perder a compostura assim era surreal. O garoto obviamente tinha complexo de domínio, mas com Shuichi tudo era diferente. É como ele tinha dito no hotel... Kokichi queria ser capturado. Queria Shuichi concentrado totalmente nele e somente nele, uma forma possessiva de agir mas ao mesmo tempo completamente apaixonada.
E era isso o que o detetive fazia nesse instante, sua atenção completamente focada no momento em que compartilhavam. Agora, nada mais conseguiria desviar os olhos dele de Kokichi, que ainda ofegava alto sobre o movimento de seus dedos. Ouvir sua voz a gemer, ver suas expressões mudarem a cada toque seu, sentir seu corpo se contorcer e se apertar sobre si… Havia passado a amar cada detalhe em seu amado.
Ainda completamente hipnotizado, aproximou o rosto dele no de Kokichi, chamando a atenção do garoto para mais um longo beijo, ainda sem parar de masturba-lo. E com isso, o beijo se estendeu até o momento em que o pequeno menino chegou ao seu limite, com ele enfim conseguindo ter seu orgasmo também, espasmos espalhando pelo seu corpo enquanto soltava seu último gemido.
Ambos estavam já exaustos, agora apenas se encarando. Kokichi então sorriu, passando a brincar com uma mecha de cabelo caída no rosto do outro rapaz.
— ...Nada mal, para um virgem — murmurou, rindo enquanto o via fazer uma careta.
— Você sempre tem que estragar o momento, não é?
— Eu sabia que afinal você me conhecia bem! — brincou, beijando sua bochecha corada. E então se afastou levemente, o observando com graça. — Mas, sério, você está grudando. Tem chuveiro aqui?
                                              ( ... )
— ...Você não precisa mais de mim cuidando de você, sabe — Shuichi reclamava enquanto esfregava o shampoo no cabelo de Kokichi, com o garoto sentado em um banco para isso. — Pela empolgação que você estava na cama antes, é óbvio que você já está bem, fora que você conseguiu tomar seu banho bem tranquilo. Por que então eu estou lavando seu cabelo?
— Ei, tem um ferimento grave aí na minha cabeça, sabia? Precisa ser tratado com carinho, seu sem coração!
— E, mesmo tendo um ferimento grave, você ainda assim transou comigo?
— Bem, temos que ver as nossas prioridades — ele murmurou com deboche, balançando as pernas no banco como uma criança. — Mas, ah, é realmente bom ter tirado aquelas bandagens! Estavam esmagando meu crânio.
— Apesar de que eu vou colocar novas assim que terminarmos aqui, é claro.
— Espere, o quê? Mas eu estou bem! — disse, para logo em seguida desviar o olhar, pigarreando. — Quero dizer, agora eu não estou, preciso de cuidados. Mas quando você terminar de lavar meu cabelo eu definitivamente vou estar!
— Certo. E isso nem foi mentira, é claro.
— Claro que não! Odeio mentirosos!
Shuichi revirou os olhos, pegando o próximo shampoo para passar nele.
— Se não liga para bandagens, por que ainda mantém esse curativo no dedo? O machucado dele já sarou faz tempo.
Kokichi levantou a mão para olhar seu dedo anelar. O curativo estava úmido por causa do banho, então tinha que pedir para Shuichi trocar. Vendo ele, não conseguiu evitar de sorrir.
— Eu gosto dele! É como um anel de noivado, não acha?
Ouvindo isso, Shuichi engasgou consigo mesmo. Kokichi então riu.
— O que foi? Parece chocado.
— É por isso que você mantém ele? N-nós não estávamos nem juntos na época!
— Mas eu sempre soube que ficaríamos juntos no fim. Eu já disse, consigo tudo o que eu quero! — respondeu contente. E então suspirou, agora mais pensativo. — Mesmo que por pouco tempo, tive você comigo. É isso o que importa.
Shuichi então parou, confuso. Tinha ouvido mesmo certo?
— ...Por pouco tempo? Já está querendo se livrar de mim? — brincou, forçando um sorriso nervoso.
Kokichi levou ainda alguns segundos para responder, olhando fixamente o curativo em seu dedo. Mas então começou a rir, virando o rosto para o olhar com graça.
— É mentira! Você é realmente fácil de enganar, não é?
Shuichi tentou rir junto também, um tanto sem graça. Às vezes Kokichi realmente o desequilibrava com as coisas que dizia. Mas ter ouvido aquilo o fez mesmo se sentir um pouco mal, uma sensação que sempre tinha quando o pequeno inventava alguma de suas loucuras que o colocava em risco.
Mas, bem, aquele era Kokichi. Se Shuichi se preocupasse todas as vezes que ele dissesse algo como aquilo, não teria paz. Provavelmente seria melhor apenas se acostumar com essas coisas, visto que o menino era sempre assim.
— Hã, c-certo…  — murmurou, ainda um tanto nervoso. Engolindo em seco, decidiu simplesmente então só mudar de assunto. — Por sinal, você tinha mesmo que marcar todo o meu corpo assim? Tem um roxo diferente a cada centímetro em mim. Como você sequer fez isso? — indagou, fingindo-se frustrado.
— Oh, eu sou bem possessivo. Mas devo dizer que fiquei surpreso que eu mesmo tenha saído ileso de marcas. Você podia ter me aproveitado mais!
— ...Bem, sua bunda não está tão ilesa — murmurou para si mesmo, lembrando de quando havia apertado antes ela com força. Mas, mesmo tendo dito isso baixo, Kokichi ouviu, surpreso.
— Espere, o quê? — exclamou, erguendo o corpo de lado para tentar ver. — Ho-ho, você não perdeu tempo mesmo, Shuichi! Sabia que fazia o tipo possessivo também!
— N-não, não faço!
— Oh, você é adorável. Mas, ei, eu estou ficando com frio! Liga a água!
Shuichi suspirou. Obedecendo, massageou  sua cabeça enquanto deixava a água tirar o shampoo. Conseguia sentir o machucado dele com os dedos, realmente tentando ser delicado conforme massageava. Quase conseguia ouvir Kokichi ronronar, apreciando o carinho na cabeça.
Voltando a desligar a água, começou a passar o condicionador. Mas o fazia um tanto distraído, lembrando-se dos momentos íntimos que tiveram a pouco tempo, corando com as memórias. Parecia surreal o que passaram, mas a lembrança de cada toque ainda permanecia fresco em sua mente.
Fora… bom. Muito bom. Com Kokichi, sentia que tudo o que fizesse seria a melhor experiência de todas, cada instante com ele sendo especial. Quando havia se apaixonado tanto assim?
Depois de um tempo considerável que passaram em silêncio, enfim Shuichi tomou coragem para perguntar:
— ...Kokichi? Eu sei que é meio repentino, mas… como foi para você? — indagou lentamente, um tanto hesitante. Tinha medo de ser o único a se sentir assim, mordendo o lábio enquanto aguardava a resposta.
...Resposta essa que não surgiu. Kokichi continuou em silêncio, sem nem sequer virar o rosto para o olhar. Shuichi então engoliu em seco, nervoso.
— ...Foi ruim? Imagino que não tenha sido tudo isso… D-desculpe, eu deveria ter tentado mais… — murmurava, se sentindo extremamente triste agora. Vendo que Kokichi ainda não respondia, começou mesmo a ficar chateado, sentindo que logo as lágrimas começariam a subir, respirando fundo para evitar isso. — T-tudo bem, você pode dizer, e-eu aguento! E-eu… — mas então parou de falar, agora confuso.
Certo, esse silêncio estava estranho já. Deixando seu cabelo, foi até sua frente para o encarar, arregalando então os olhos.
Ele tinha cochilado enquanto massageava sua cabeça!
Sentia agora seu rosto ficar rubro de vergonha. Irritado, beliscou a bochecha dele, fazendo o menino acordar em um susto.
— Ai!!
— Sério que você não ouviu nada do que eu disse?! — perguntou, bravo. Kokichi então piscou, confuso.
— ...Pela sua cara, foi alguma coisa importante. Eu juro que não fui eu, foi o Kaito!
Shuichi suspirou novamente. Era incrível como, mesmo sem saber do que se tratava, instintivamente o menino já mentia. Decidiu só então voltar até a mangueira, enxaguando o condicionador de seu cabelo.
— …Deixa para lá. Para ter dormido assim, acho que você ainda não está mesmo totalmente bem como eu tinha pensado. Quando sair daqui eu quero que você repouse de vez, ok? E vai tomar mais soro também.
— Espere, o quê?! Mas eu estou ótimo, nada derruba o supremo líder aqui! Ainda mais com um membro tão valioso da organização cuidando bem de mim assim!
— Eu já disse que não vou me juntar na sua organização.
— Tsc! Você é muito chato. Mas uma hora irá ceder, você sempre cede para mim.
— Claro, vai sonhando — riu, desligando a mangueira e pegando a toalha para secar sua cabeça.
Terminando, sentou ao lado de Kokichi no banco e começou a lavar o próprio cabelo, com o garoto ao seu lado o observando enquanto fazia um bico.
— Você não quer que eu te lave também? Isso é um tanto decepcionante.
— Por que tudo o que eu escuto vindo de você, de alguma forma soa como se tivesse segundas intenções?
— Oh, você percebeu só agora? — comentou, sorrindo com travessura. — Bem, então é mesmo decepcionante. É mais divertido quando você é ingênuo demais para notar.
Shuichi apenas revirou os olhos novamente, já mais do que acostumado com esse jeito dele. Era como ver uma criança que gostava de mentir e aprontar sempre que pudesse, só que com o Shuichi sendo de uma forma pelo menos umas 100x mais pervertida. Às vezes achava engraçado, outras já era irritante, ou então acabava por se derreter todo com suas palavras… Não importava qual fosse sua reação, todas pareciam agradar Kokichi, que nunca se cansava disso.
Terminando, Shuichi pegou as roupas de ambos, estendendo as de Kokichi para que ele pudesse se trocar. O garoto então fez outro bico, emburrado.
— Já vamos nos trocar? E quanto as nossas paisage— foi interrompido com a sua cueca jogada na sua cara, com Shuichi agora o encarando emburrado também.
— Ok, você está oficialmente proibido de continuar com as piadas pervertidas por hoje. Sério.
— Eu não faço ideia do que esteja falando. Sou apenas um ser inocente de desejos carnais.
— Inocente de desejos carnais logo depois de fazer sexo?!
— O que eu quero dizer é que meus pensamentos são puros! Sua falta de fé em mim me choca — murmurou, fazendo sua falsa cara de choro.
Era mesmo impossível de ter uma conversa séria com ele.
Com os dois trocados, voltaram para o quarto, com Shuichi praticamente o forçando a se sentar na cama para poder enfaixá-lo novamente. Entediado, Kokichi brincava com o curativo pendurado no dedo enquanto pensava.
— Acabou que você não treinou com o idiota e com a máquina assassina ontem, hein? — disse casualmente.
— ...Quando diz idiota e máquina assassina, se refere ao Kaito e a Maki?
— Duh.
— Eu não gosto quando você os chama assim. São meus amigos.
— Bem, literalmente todo mundo já chamou o Kaito de idiota pelo menos uma vez já. E máquina assassina é só a constatação de um fato. Eu ainda tenho os hematomas de quando ela tentou me enforcar, sabe... Inclusive, você poderia ter me dado um chupão no pescoço que eu não teria nem percebido, olha que perda de oportunidade!
— Sem piadas pervertidas, esqueceu?
— Oh, claro, foi mal.
— ...Kaito é o meu melhor amigo desde o início de tudo. E Maki… eu não gostei nem um pouco do que ela fez com você, mas ela está mudando. Kaito jura de dedos cruzados que ela é uma boa pessoa e eu acredito nele. E realmente, eu nunca a vi tão aberta com todos desde que começou a sair com ele. É claro, não vou mais me encontrar com vocês dois ao mesmo tempo, não vou deixar que ela se aproxime de você mais. Contudo... eu quero acreditar em todos. Acreditar que podemos ser unidos aqui.
Kokichi definitivamente não gostou da resposta. Mas continuava com a expressão neutra, ainda brincando com o curativo no dedo.
Shuichi era só… inocente demais.
Ele definitivamente era um péssimo detetive quando suas emoções se envolviam. Por amar tanto Kokichi, ele não conseguia perceber o quanto que todos os outros o odiavam. Kokichi sabia muito bem que Maki ainda não havia desistido de matá-lo, porque ela verdadeiramente acreditava que ele fosse o mastermind agora… E não era apenas ela. Já fora ameaçado por todos os outros, e agora mesmo tinha plena noção de que Miu estava criando uma máquina para tentar acabar com ele de vez — não sabia ainda como se livraria disso, mas não se deixaria ser morto assim também, é claro. Pelo menos não ainda.
Se fosse para morrer, que fizesse realmente alguma diferença. Mas, para conseguir o que queria, precisava de ajuda. O único que conseguia pensar para o ajudar era o próprio Shuichi, mas como com ele sendo tão inocente assim?
...Não, não era apenas isso. Não queria envolvê-lo mais. Não queria vê-lo se colocar em perigo por um plano que talvez nem sequer funcionasse. Ele nunca conseguiria pedir algo como isso para Shuichi.
Faria ele sobreviver, não importava como.
Terminando de enfaixar sua cabeça, Shuichi se sentou ao seu lado esquerdo, agora pegando sua mão para ver seu curativo.
— Está todo molhado! Não tirou nem para tomar banho?
— Claro que não! Eu não tinha certeza se você ia trocar, não podia ficar sem. É o meu anel de noivado, afinal!
Shuichi não conseguiu deixar de rir. Eram quase adultos praticamente, porém Kokichi novamente parecia uma criança. Mas, tinha que confessar, achava isso adorável nele.
Tirando a pequena fita de pano, ele observou a pequena cicatriz que a faca tinha deixado no seu dedo, acariciando com o seu polegar enquanto refletia.
— Sério, às vezes você é mesmo bem doido. Até hoje eu não entendi o que passou na sua cabeça quando quis brincar com aquela faca.
— Eu não estava brincando, aquilo era um desafio de vida ou morte!
— Mesmo que no fim você tenha feito tudo isso só para fazer a cantada de que você roubou meu coração?
— ...Bem, sim. Foi um longo caminho até chegar na cantada, mas definitivamente valeu a pena por isso. Mas, ainda assim, não subestime meu teste de coragem!
— Claro. Muito corajoso.
— Ei, não tente mentir para um mentiroso, nada legal! Consegui sentir a ironia daqui — resmungou, fazendo bico mais uma vez. Mas então Shuichi pois a mão em sua cabeça, afagando ela com carinho.
— Foi MUITO corajoso. Eu nunca teria conseguido fazer o mesmo que você. Isso não é mentira — comentou, sorrindo. — Apesar de ter quase me matado do coração na hora com todo o sangue, eu sei que você me deixou ganhar porque não queria que eu me machucasse também. Isso é uma das coisas que eu amo em você.
Pela primeira vez Kokichi ficou mudo, sem saber o que falar. Isso fez Shuichi aumentar ainda mais o sorriso, contente. O jovem líder sempre parecia saber exatamente o que responder, então o ver sem palavras por estar embaraçado era algo que não se via com frequência.
Shuichi então começou a amarrar um novo curativo, com o outro garoto o observando em silêncio. Depois de terminado, Kokichi ergueu a mão, encarando agora seu dedo com um sorriso enorme no rosto.
— Bem melhor!
— De nada — Shuichi respondeu com graça, deitando as costas na cama enquanto encarava agora o teto. — Mas, por mais adorável que seja o motivo, você não pode ficar com isso para sempre, sabe.
— Claro que eu posso! Foi você quem fez para mim, é importante — respondeu, deitando-se também ao lado dele na cama. — Não posso jogar fora um presente assim!
— Bem, não foi exatamente um presente. Você meio que estava sangrando horrores na hora, não tive muita escolha.
— Ainda assim!
Shuichi então pegou sua mão mais uma vez, encarando novamente o curativo enquanto pensava. E então voltou a sorrir.
— ...Acho que eu não tenho outra escolha, então. Quando sairmos daqui, vou ter que te dar algo para substituir isso, aparentemente.
Kokichi estava prestes a perguntar, quando enfim entendeu o que ele quis dizer. Sentando-se novamente na cama, o encarou por cima, surpreso.
— Você quer dizer…
— Bem, eu ainda não recebo muito com os trabalhos de detetive que eu faço, mas deve dar. É importante afinal, não é?
Kokichi o olhava embasbacado. Duas vezes seguidas fora deixado sem palavras, perdido enquanto o encarava. Isso por si só já seria uma vitória para Shuichi, considerando que quase nunca conseguia fazê-lo ficar assim.
...Mas não conseguia mais ficar contente com isso. Não enquanto via a expressão aflita que seu parceiro fazia enquanto o encarava com horror.
Vendo isso, ele então se sentou rapidamente na cama também, desviando o olhar enquanto corava.
— D-desculpe, fui precipitado. Acabamos d-de ficar juntos e já estou sugerindo te dar uma aliança… E-eu não deveria ter falado isso, d-desculpe... — murmurou sem graça, esfregando a cabeça com o nervosismo, já não conseguindo mais o encarar.
Isso fez Kokichi despertar. Percebendo o que fez, ele mais do que depressa pegou suas mãos, sorrindo então.
— N-não, não é isso! Isso é ótimo, isso… Isso é sempre tudo o que eu quis ouvir — disse, parecendo feliz. — É tudo… o que eu precisava ouvir.
Mas não era. Apenas mais uma mentira.
Ele não precisava ouvir isso. Ele não podia ouvir isso. Mas como sempre Shuichi o surpreendia, o pegando com a guarda baixa quando menos esperava.
Era para tudo ser TÃO mais fácil! Tudo o que tinha que fazer era realizar seu plano e então com isso fazer Shuichi sair desse jogo maldito. Tudo o que precisava era… morrer. Simples assim.
Por que Shuichi não facilitava as coisas?!
Saírem dali juntos, vivendo depois uma vida feliz de casal? Oh, seria ótimo. Na realidade, não era exagero dizer que seria o seu maior sonho.
Mas era ingenuidade demais.
Estavam presos ali até que alguém tomasse a atitude certa. E quem mais faria isso? Por mais que todos continuem com aquele discurso tolo deles de que fariam tudo pela amizade que tinham, sabia que não passavam de um bando de hipócritas que valorizavam a própria vida acima de qualquer outra coisa. Nenhum deles teriam sequer a mínima coragem de fazer um décimo do que ele estava planejando.
Isso porque Kokichi era diferente. Assim como sempre protegeu sua organização, ele agora protegeria a pessoa que se tornou mais importante para si. Se para conseguir o que queria ele precisava se sacrificar, então que seja.
Não iria ser um brinquedo nas mãos de ninguém. Não iria continuar participando daquela merda só para poder entreter desconhecidos.
E definitivamente não deixaria Shuichi continuar naquele inferno de jogo.
Mas não podia deixar que ele descobrisse sobre isso. Dando o melhor sorriso que conseguiu, Kokichi segurou sua bochecha, puxando seu rosto para o beijar. Quando se separaram, continuou sorrindo.
E então começou.
— Eu estou feliz com isso.
Mentira.
— É claro que iremos sair daqui.
Mentira.
— Vamos construir as nossas vidas fora deste lugar. Juntos.
Mentira.
Mas por trás de toda mentira existe um fundo de verdade. Os sentimentos que sente por Shuichi que o fez mentir assim são definitivamente reais.
Porque mentir é isso. Existe uma única verdade, mas infinitas possibilidades com a mentira. Com ela, você pode magoar, alegrar, irritar, convencer… inclusive proteger.
Iria terminar com tudo. Iria ganhar aquele jogo. Iria salvar aquele que passou a amar.
A última e maior mentira de todas ainda estava para acontecer.
Shuichi agora o encarava com muita dúvida, sem saber o que pensar. Aquela reação dele foi extremamente estranha, definitivamente não sendo a que esperava quando falou da aliança. Por mais feliz que ele parecesse estar agora, aquela sua primeira expressão aflita… Aquilo não foi normal.
Algo estava errado… Muito errado.
Mas, antes que pudesse dizer qualquer coisa, ouviu alguém bater na porta. Virando-se, viu Miu entrar, com ela então olhando enfezada para eles.
— O que os dois virgens estão fazendo ainda aqui? Se mudaram para a enfermaria, foi?
— O quê, suas drogas acabaram? — Kokichi perguntou, sorrindo com ironia. — Bem que eu estranhei que você estava esperta demais ultimamente. Estava sentindo falta já da boa e velha inútil que você é.
— I-inútil?! Você está falando com uma gênia e provavelmente com a garota mais gostosa que você já viu na sua vida. Por que você não vai se foder sozinho em algum canto e para de encher a porra do meu saco?!
— Ok, chega — Shuichi cortou antes que Kokichi pudesse responder. Se deixasse, os dois ficariam se ofendendo ali durante todo o resto da madrugada. Ele então cruzou os braços, olhando irritado agora para ela. — O que você quer, Miu?
— Kaito mandou te chamar. Parece que a Himiko sumiu, ou qualquer merda do tipo. Gonta ouviu ela exclamar sozinha sobre algo que tinha que mudar, e então viu ela correndo que nem uma louca por aí. Agora aqueles virgens estão desesperados tentando encontrar ela, como se qualquer um deles tivesse a mínima chance com uma garota de verdade — respondeu com graça, fazendo Shuichi suspirar. Miu obviamente entendeu a situação toda errada.
Mas isso não podia ter acontecido em pior hora. Virando-se para Kokichi, o encarou com muita dúvida no olhar. Não que não se preocupasse com Himiko, mas, entre tantos momentos para acontecer aquilo…
— ...Avisa que eu já vou — ele enfim murmurou. A garota então bufou na porta.
— O quê, virei a porra de um pombo-correio agora?
— Miu. Por favor.
— ...Tá, tanto faz. Só espero que vocês troquem esses lençóis depois de terem se pegado a noite toda aqui — resmungou, saindo de lá enquanto deixava Shuichi vermelho de vergonha e Kokichi agora a gargalhar.
— Shuichi, você podia ter deixado um pouco menos óbvio!
— E-eu?! Eu não fiz nada!
— Está na sua cara. Você não podia estar parecendo mais gay — comentou entre os risos, fazendo o outro ficar ainda mais rubro.
— A minha cara é a mesma de sempre!
— Eu sei, eu sei, estou zoando contigo — falou com graça. Mas então amuou, sorrindo agora de canto. — Vai lá ajudar a maga de araque. Eu vou ficar bem.
— Mas…
— Ei, eu estou com o meu super kit de soro nojento aqui comigo! E, tenho que admitir, eu estou mesmo cansado, dormir um pouco não me faria mal. Então pode ir sem se preocupar, é sério.
Shuichi o olhou ainda por alguns segundos, hesitante. Kokichi nunca demonstrava qualquer tipo de fraqueza quando está sério, então, para dizer isso, ou ele estava mesmo verdadeiramente cansado, ou estava mentindo. Como podia não se preocupar?! Isso fora o estranho momento que tiveram antes sobre a aliança. Precisava esclarecer isso com ele com urgência.
Mas não podia deixar Himiko na mão. Respirando fundo, Shuichi o encarou com muita seriedade.
— ...Nós não terminamos ainda aquela nossa conversa — disse, apontando agora o dedo para ele. — Eu vou tentar não demorar, então nem tente fugir daqui. Você tem mesmo que repousar!
— Seu desejo é uma ordem — respondeu, fazendo uma continência. E então sorriu. — Vai lá salvar o dia, detetive.
Shuichi ainda continuou parado por alguns instantes, duvidoso. Pensou em dizer algo, mas desistiu, apenas levantando-se e indo até a saída. Mas não conseguiu evitar de parar na porta, olhando uma última vez para ele com receio.
— ...Eu juro que não demoro. Me promete que vai mesmo me esperar aqui?
— Claro! Não se preocupe.
Ainda que relutante, ele enfim saiu. Suspirando, Kokichi se encostou contra a cabeceira da cama, encarando o teto com tédio. Agora sozinho, ele não conseguiu evitar de pensar o quão estranha a enfermaria era estando silenciosa daquele jeito. Ele realmente não conseguia gostar de ficar assim, afinal.
...Bem, talvez também já fosse hora de parar de brincar de casinha. Afinal, a vida real não é tão inocente assim.
Estava na hora de começar o show.
— ...Eu sei que você já voltou a me observar. Vai mesmo continuar escondido aí? — indagou inexpressivo.
Esperou alguns segundos, mas nada apareceu. Será que ele ainda não havia notado, afinal? Seria bom demais para ser verdade.
Mas, como tinha pensado, infelizmente não demorou para que logo uma silhueta de um urso surgisse ao seu lado.
— ...Foi muita coragem sua desarmar as câmeras da enfermaria comigo aqui — Monokuma murmurou. Kokichi nem sequer piscou, apenas virando o rosto para o observar com tédio.
— Desculpe se estraguei a graça dos seus telespectadores — comentou, sorrindo com deboche em seguida. — Por mais divertido que o killing game seja, eu também gosto de encontrar outras fontes de diversão. Suas câmeras teriam arruinado, infelizmente. Mas nem mesmo o Shuichi notou o que eu fiz, então eu diria que sou mesmo um profissional, não acha?
— ...A sua sorte é que eu gosto de você, Kokichi Ouma — o urso falou, o analisando com o sorriso assustador de sempre no rosto. — Diferente dos outros, você realmente passou a apreciar o killing game e isso tem sido interessante de se ver. Por isso, te darei o benefício da dúvida.
— Oh? Me sinto honrado.
— Contudo, isso foi simplesmente uma afronta demais. Sinto em te dizer, mas eu já tomei providências para que esse seu truque não vá funcionar novamente. Espero que possamos nos divertir juntos, afinal! Mas, se algo como isso acontecer mais uma vez, creio que eu terei que tomar algumas atitudes.
— Não se preocupe. Eu quero me divertir tanto quanto você — murmurou, sorrindo. É claro que não iria comentar que isso o que ele fez não era nada comparado com as eletrobombs que pediu para Miu criar —  antes dela começar a querer o matar, é claro —, além do controle que o dá domínio sobre os Exisals. Isso sim iria estragar toda a diversão.
Porque, oh, Kokichi é um mentiroso. E não apenas com o Monokuma, como também para com todos os outros… Incluindo Shuichi, é claro. Ninguém seria exceção em suas mentiras.
Pois a verdade é que em momento algum pretendeu ficar ali e desistir de seu plano. Pelo contrário, tudo estava apenas para começar. A sua maior mentira, tão grande que iria enganar o mundo todo.
Iria salvar Shuichi. Nem que para isso tivesse que arrastar outros junto consigo mesmo para a morte.
— Mas e então? Você vem... ou não? — Monokuma perguntou, já o esperando na porta. O sorriso de Kokichi apenas aumentou, o olhando de forma maligna.
— ...Você sabe que sim — respondeu, arrancando as faixas em sua cabeça com aspereza e o seguindo até a saída.
E que a reviravolta comece.
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palavrasinfinitas · 6 years
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The True Lab / The Experiments
(Nome ainda a ser decidido)
Resumo e sinopse do AU:
O país está em uma grande guerra. As pessoas estão começando a se revoltar, culpando o governo por todas as infelicidades que estavam ocorrendo. Tolos. Eles não entendiam que para ter poder, sacrifícios são necessários?
Mas ELE sabe disso muito bem. Sendo considerado um dos maiores gênios da ciência do mundo, o governo deu a ele a liberdade para fazer o que quisesse para trazer-lhes a vitória. Armas. Doenças. Radiação. Ainda não eram o suficiente. As pessoas eram o verdadeiro problema. Precisavam de um forte exército se queriam o real domínio do poder. E isso o deu uma ideia. Se humanos em si eram fracos, que tal se fossem transformados em algo... diferente? Oh. É uma ideia no mínimo... Interessante.
...
As pessoas começaram a desaparecer e a culpa pelos sumiços eram colocados na guerra. Mas não era bem assim. Existe um certo laboratório cujo o nome não é dito. Lá, os experimentos para o exército perfeito são criados. As pessoas sequestradas eram transformadas em cobaias e suas formas físicas eram alteradas. Considerando o que poderiam fazer para torná-los seres evoluídos, testes com a mistura de animais começaram a surgir.
Os experimentos estavam apenas começando.
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Personagens:
Frisk
Frisk é um jovem médico curioso, especializado no ramo comportamental. Em geral, ele atuava como psiquiatra em um hospício, mas foi convidado pelo governo a trabalhar em um certo laboratório. Por ser um local tão secreto, sua curiosidade falou mais alto, aceitando então o convite. Quando enfim descobriu sobre os experimentos humanos, ficou horrorizado, mas, ao mesmo tempo... fascinado.
Chara Chara é apenas uma pequena garota, sendo uma das cobaias mais recentes no laboratório. Por não terem começado os experimentos nela há muito tempo, as mudanças em seu corpo ainda eram poucas, sendo possível ver apenas o crescimento de pequenos chifres e de uma cauda de um preto profundo, além de seus olhos terem se tornado em um intenso escarlate. Considerando a sua a aparência e a sua personalidade hostil, ela passou a ser conhecida no laboratório como "o demônio". A única pessoa que ela deixa se aproximar dela é um garoto chamado Asriel, sendo uma outra cobaia do local no qual ela parece sentir certa afeição. Asriel Assim como Chara, Asriel é apenas uma criança, porém está no laboratório há muito mais tempo. Por tal, as mudanças em seu corpo já eram bem avançadas: ele era todo coberto por pelos, tendo crescido orelhas e um grande focinho de cabra. Mesmo com o sofrimento de todos os experimentos, ele mantinha seu coração gentil.
Asgore e Toriel
Asgore era o antigo prefeito de uma grande cidade do país, mas foi contra os testes que o governo fazia. Com medo de que ele revelasse ao povo sobre os experimentos, o prenderam como forma de calar sua boca. Quando viram que ele não mudaria de ideia, decidiram levar ele e toda sua família ao laboratório. Sua esposa, Toriel, tentou esconder o filho deles, Asriel, mas acabaram encontrando a todos e os levando para lá juntos.
Assim como seu filho, ambos começaram a desenvolver características de cabra. Undyne Undyne era uma ex-militar, que se juntou ao grupo rebelde como revolta contra o governo. Porém acabou sendo capturada, enfim condenada a execução. Ou pelo menos foi isso o que anunciaram, mas na realidade ela foi levada a este laboratório para se tornar mais uma cobaia. Quando os experimentos começaram, ela acabou desenvolvendo traços de peixe. Quando as guelras surgiram, ela foi colocada dentro de um enorme tanque de água, na qual ela ainda tenta até hoje fugir. Alphys Alphys era uma das cientistas do laboratório, mas que se sentia horrorizada com tudo o que faziam. Esse sentimento se intensificou quando a colocaram para fazer os testes em Undyne, pessoa na qual ela acabou criando uma enorme afeição, eventualmente surgindo a paixão. Não aguentando mais a ver sofrer, Alphys tentou ajudar ela a fugir, mas foi pega no ato. Como castigo por sua traição, eles a tornaram mais uma cobaia no laboratório.
Quando os experimentos iniciaram, começou a surgir características de répteis nela. Logo sua pele se tornou amarelada, esticando seu rosto e tronco, a tornando um tanto corcunda, além de garras começarem a surgir.
Mettaton
Mettaton foi criado por Alphys na época em que ela ainda trabalhava no laboratório, como uma forma de tentar convencer o governo de que não precisavam de vidas humanas para criarem um forte exército. Apesar da ideia ter sido negada, pelo alto nível de inteligência artificial criado na máquina, decidiram fazer uso dele, o tornando um tipo de segurança para impedir possíveis fugas do local.
Sans e Papyrus
Os dois são os maiores mistérios do laboratório. Eram irmãos e foram os primeiros raptados a se tornarem cobaias no lugar. Como na época a pesquisa ainda estava no começo e era bem básica, a tentativa de transformá-los em animais falhou. Ao invés disso, algo bizarro aconteceu: a carne de ambos começou a secar e os ossos começaram a ficar por cima da pele, os transformando em esqueletos. Mas, apesar da compressão de órgãos, o organismo ainda funcionava, então de alguma forma eles se mantinham vivos.
Apesar de serem considerado falhas, eles foram mantidos no laboratório para que estudassem o funcionamento do corpo deles. Dependendo do que descobrissem, talvez o exército de animais não fosse a única coisa que conseguiriam criar.
Gaster
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palavrasinfinitas · 6 years
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— Asriel. Ei, eu estou falando com você, idiota!
— Eu sei e eu não ligo! Me deixa em paz! — o menino exclamou bravo, fazendo Chara bufar com impaciência.
— Sou eu que estou ferida, mas é você quem está quase desmaiando aí! Precisamos de CO-MI-DA! — ela foi dizendo a palavra pausadamente, como se estivesse explicando para uma criança. — E água também, visto que por algum motivo a água dessa estúpida cachoeira é horrível. Quando você vai deixar de ser orgulhoso e admitir que precisa sair daqui!?
Asriel riu de forma sem graça.
— Você me falando sobre orgulho? Não sabia que gostava de piadas assim.
— Pare de brincar, isso é sério! Mesmo ferida eu consigo aguentar por um bom tempo ainda, mas você não está acostumado a passar fome e sede assim!
Asriel então olhou para ela, a expressão dura sendo substituída rapidamente pela surpresa, sorrindo levemente enquanto erguia uma sobrancelha.
— Você está tão preocupada assim comigo? Não esperava um lado tão adorável seu.
Chara, que naturalmente parecia ter um rosto bem corado, conseguiu corar ainda mais, sendo difícil para o menino dizer se era por irritação ou vergonha. Independentemente do que fosse, ele tinha que admitir que a visão era fofa.
— Eu só não quero ter que ficar acudindo ninguém, só isso.
Ele então voltou a amuar, bufando.
— Eu estou ótimo! É você quem está sendo tratada aqui, não eu — ele murmurou, desviando o rosto. A garota trincou os dentes, se irritando com esse seu gesto.
— Então por que você não diz isso enquanto me olha? Você é um péssimo mentiroso — comentou, estressada. Definitivamente não estava acostumada a ter que ficar cuidando dos outros assim e, por isso, sentia que perdia cada vez mais a paciência.
Até que ela se deu conta de algo, sua expressão voltando a se tornar neutra com isso.
Era tudo tão óbvio agora.
— Asriel, olhe para mim.
O menino continuava com o rosto desviado, emburrado.
— Eu disse… Olhe. Para. Mim. — ela foi murmurando as palavras devagar, fazendo um arrepio de medo subir pela espinha de Asriel com o tom medonho em sua voz. Não precisava esperar para saber que definitivamente ele se arrependeria se não a obedecesse.
Ela era realmente boa quando se tratava de ameaças, aparentemente.
Ele lentamente olhou para ela, engolindo em seco. Para a sua surpresa, o anjo estava sorrindo. Porém, era um sorriso irônico que não demonstrava alegria alguma, o encarando de forma intensa.
— Vai, admita. Você está com medo que eu fuja e continue o genocídio, não é?
— O q-quê? É claro que não! — ele respondeu rapidamente, virando o corpo agora para ela. — V-você mesma disse que não conseguiria lutar nesse estado!
— Você acha que consegue me enganar assim, não é? Eu não nasci ontem, Asriel. Está mais do que na cara que você está sofrendo, mas ainda assim você se recusa a me deixar sozinha aqui. Não que eu te culpe por isso, é claro.
— N-não! Eu… eu… — mas ele não sabia o que dizer, apenas a encarando aturdido. A grande verdade é que ele não queria admitir isso nem sequer para si mesmo, tentando se convencer de que ficaria ali apenas para mantê-la segura. Porém, no fundo… bem no fundo ele não sabia se realmente deveria confiar nela ainda. E, quanto mais pensava nisso, mais as memórias das semanas anteriores voltavam a sua mente. O medo dos demônios de serem mortos, o sofrimento dos feridos, aqueles que morreram em seus braços sem que ele conseguisse salvar a tempo… Por mais que ele enterrasse as memórias para tentar acreditar em Chara, de alguma forma elas sempre voltavam.
Ele então olhou para baixo, não tendo coragem de encarar o anjo a sua frente. Vendo isso, a menina riu de forma seca. Tudo tão previsível.
Essa era a realidade, afinal.
— Vou dormir. Faça o que você quiser — declarou, encostando a cabeça na parede e fechando os olhos. Se Asriel preferia passar fome e sede, então era problema dele.  Ela não era a sua babá ou qualquer coisa do tipo, então por que se importar? Mesmo com o ferimento, tinha plena confiança de que conseguiria aguentar ainda por um bom tempo, então não fazia diferença para ela. Absolutamente nenhuma.
Ou pelo menos era isso o que pensava.
Asriel não voltou a olhar ainda para ela, assumindo uma expressão triste enquanto encarava as próprias mãos. Tinha decidido que iria salvá-la, não? Desde o início sabia sobre os crimes dela e mesmo assim tentava o seu melhor para mudá-la. E estava mesmo passando a verdadeiramente apreciar o tempo que passavam ali, sentindo que gostava cada vez mais e mais dela. Então, por que ainda era tão difícil?
Depois de um tempo ele enfim a encarou de canto, notando que Chara tinha de fato caído no sono. Parece que ela ainda confiava nele a este ponto, apesar de tudo… Pelo menos nisso ele não tinha estragado. Mas ele nunca conseguiria ajudar ela se continuasse na defensiva assim! Era um idiota mesmo.
O jovem demônio fez uma careta enquanto sentia seu estômago doer com o vazio dentro dele e sua garganta que arranhava com a sede. É claro, Asriel podia aproveitar que ela estava dormindo para ir buscar água e comida, mas obviamente não faria isso. A conhecia já bem o suficiente para saber que, por mais que não fosse denunciar ela e apenas pegasse os suprimentos mesmo, a menina nunca mais voltaria a confiar nele se saísse escondido assim. Mesmo ela tendo dito para ele fazer o que quisesse, não queria arriscar. Teria que esperar ela acordar e então pensar no que fazer.
Já tinha estragado demais as coisas.
Porém, não era bem assim. O pobre menino não parecia se dar conta disso, mas não era apenas Chara que precisava que alguém viesse com atitudes. Ele tinha a necessidade e uma verdadeira esperança de ver a mudança dentro dela, algo que pudesse aliviar o peso em sua alma e fazer com que seus olhos a vissem como realmente deveria ser.
Ele precisava ver alguém que pudesse confiar com a sua vida.
Não demorou muito para que ele sentisse seus olhos pesarem, deitando-se no chão com a visão já um tanto embaçada. Estava realmente cansado. Talvez dormir um pouco também não fosse assim tão ruim…
 (...)
 — Asriel. Ei, Asriel — Chara o chamava, franzindo o cenho. Ela então pegou uma pequena pedra ao lado, acertando-o no rosto em cheio, fazendo ele acordar em um salto.
— O q-que você está fazendo?! — o garoto exclamou, a olhando com confusão. Ela revirou os olhos.
— Você não estava me respondendo. Eu falei que você ia acabar desmaiando, idiota.
— Eu estava só... dormindo. E, sério, você precisa mesmo parar de me chamar de idiota assim...
— Mas eu acabei de falar que você não estava me respondendo — ela comentou, ignorando o pedido dele. O menino suspirou, voltando a fechar os olhos.
— Chara, eu queria conversar direito com você, eu juro... Mas eu só… quero descansar um pouco antes, ok...? — ele murmurou, já voltando a cair na inconsciência. A menina franziu novamente o cenho, o observando de forma aborrecida.
Do que mais ela poderia o chamar além de idiota? Ele estava obviamente com desidratação crônica já, além da falta de nutrientes. Mas, bem, não é como se ele estivesse morrendo ou qualquer coisa do tipo, é claro. Por mais incerto que o tempo fosse no submundo, ela tinha certeza que não havia passado tanto tempo assim ao ponto de ser algo realmente sério. Pelo o conhecimento que tinha, sabia que demônios eram bem menos resistentes do que os anjos, mas imaginava que ele ainda não deveria estar em um estado tão preocupante assim. Quando despertasse completamente deveria voltar de novo a sua forma habitual de agir, até porque por enquanto os desmaios pareciam ser só uma consequência normal, não realmente crítica. Quer dizer, isso tudo pelo menos na visão de Chara, que estava acostumada com essas coisas. Porém, ela tinha que admitir que estava já a incomodando o ver frágil daquela forma, por mais que sempre o considerasse assim.
Ela apertou os lábios, pensativa. Por fim, tomando uma decisão, ela respirou fundo algumas vezes enquanto tentava se apoiar na parede.
E então se levantou.
Definitivamente uma sensação extremamente desconfortável. Seu corpo inteiro doía, o que era completamente compreensível considerando todo o tempo que ficou sentada na mesma posição. Seu ferimento começou a latejar mais do que nunca, mas ela apenas ignorou tudo, pegando a mochila de Asriel e indo até a saída da cachoeira.
Porém ela parou, olhando para trás. Talvez… só talvez não fosse uma má ideia pegar aquilo também. Não que ela pretendesse usar, é claro. Mas definitivamente se sentiria mais confortável se estivesse com ela em mãos. Voltou então para procurar, por um instante temendo que Asriel tivesse jogado fora, mas não demorou muito para achar logo abaixo de uma pedra do lugar.
Sua faca. Como sempre, se encaixava com perfeição em suas mãos.
Chara ficou ainda alguns segundos a encarando, estranhamente parecendo um pouco hesitante. Depois de alguns instantes ela suspirou.
Virando-se para a pedra, guardou a faca lá novamente.
Deveria ter se contaminado com a bobice dele para estar fazendo algo como aquilo. Não tinha sentido nenhum para ela, mas ainda assim apenas continuou, enfim saindo da caverna e passando por baixo da água que caía, se ensopando toda no processo.
Deveria ter se contaminado com a bobice dele para estar fazendo algo como aquilo. Não tinha sentido nenhum para ela, mas ainda assim continuou, passando por baixo da água que caía, se ensopando toda no processo.
Ótimo, pensou. Isso era tudo o que precisava para completar o seu dia de merda.
E então continuou seu caminho.
 (...)
 — ...C-Chara? Chara, cadê v-você?! — Asriel exclamou assustado após despertar, percebendo em pânico que o lugar que ela costumava se sentar estava agora vazio. Ela realmente…?
— Eu estou aqui — a menina falou bem ao seu lado, fazendo ele saltar de novo com o susto.
— C-como você está se mexendo assim?! O seu ferimento, ele—
— Ele está ótimo, obrigada. E eu já te disse que consigo sair a hora que eu quiser, não?
— Mas você não deveria se mexer assim! — ele exclamou com sua voz rouca, se virando em sua direção com preocupação genuína, imediatamente indo analisar o ventre dela com as mãos tremendo. — O seu ferimento pode abrir de novo!
— Asriel—
— Se começar a sangrar mais uma vez, talvez você não aguente!
— Asri—
— Acho que é melhor eu trocar as ataduras e checar—
— ASRIEL, DÁ PARA VOCÊ PARAR!? — ela gritou, irritada com suas interrupções. Ele então realmente parou, a encarando agora com espanto. — Se eu não estivesse bem você saberia, te garanto. Agora para de encher a porra do meu saco e pega logo essa porcaria — ela grunhiu, pegando algo ao lado e oferecendo para ele. O demônio abaixou o olhar, percebendo se tratar de uma garrafa de água cheia. Ele então voltou o olhar para ela, confusão óbvia em sua face.
— Hã...
— Vai, pergunta logo — ela murmurou, revirando os olhos novamente. Este gesto parecia ser já um hábito dela, afinal.
— ...Onde foi que você arranjou isso? — ele perguntou lentamente, pegando a garrafa com receio.
— Com o Papai Noel, parece que fui mesmo uma boa mocinha. Próxima pergunta?
— Uma boa mocinha? Estamos falando da mesma pessoa? — ele perguntou, não conseguindo evitar de rir levemente. Porém ele voltou a ficar sério, ainda muito confuso. — Fale a verdade Chara, por favor.
O menino então começou a beber a água em seguida. A garganta ainda doía, mas sentia uma enorme sensação de alívio o preencher, acabando com a água da garrafa em segundos.
— Foi naquela vilazinha chata de neve. Parece estar abandonada agora, aparentemente — ela murmurou enquanto ele devolvia a garrafa, dando depois de ombros. — Provavelmente por causa dos ataques que eu tinha feito antes de te conhecer, sei lá. Por sinal, também peguei comida, só para você saber mesmo. E dessa vez algo melhor do que biscoitos, acho — comentou, apontando para a mochila dele ao lado, agora aparentemente cheia mais uma vez.
— Mas… você fez isso por mim — ele disse quase em um sussurro, uma mistura enorme de sentimentos o preenchendo. — Você voltou. E… fez isso por mim — repetiu, ainda um tanto desacreditado. Ela então corou mais uma vez, quase engasgando consigo mesma.
— Não foi exatamente assim, ok!? — falou depressa, desviando o rosto. — É só que você fica muito chato quando está passando necessidade, não aguentava mais te ver resmungando aí. Só isso.
Asriel então riu, fazendo algo que definitivamente a surpreendeu.
Ele a abraçou.
Por instinto a menina quase o jogou longe, mas conseguiu se impedir, apenas ficando estática no lugar, agora sem saber como reagir. Por mais que estivesse se acostumando com o toque de Asriel, aquilo era proximidade demais.
Mas ele não conseguiu resistir! Não tinha como explicar o tamanho que era o alívio que sentia agora, sorrindo com alegria enquanto a abraçava.
— Chara… Me desc... — ele então parou, afastando levemente o rosto para encará-la. — Espere, você está ensopada! Você foi até uma cidade de neve estando toda molhada e usando nada mais do que um vestido curto!?
— ...Talvez.
— Chara!
— Eu estou bem — resmungou. Aos poucos ela foi relaxando o corpo, tentando não ficar tão tensa com o abraço. Mas ainda assim ela se sentia perdida, apenas dando alguns tapinhas no topo da cabeça dele ao invés de devolver o abraço de fato. — Sério, come logo, você está mesmo muito chato já.
Ele então escondeu o rosto em seu ombro, rindo levemente. Chara não parecia estar querendo ouvir qualquer tipo de pedido de desculpas, por isso ele deixou para lá. Ao invés disso, iria aproveitar o momento descontraído que estava tendo com ela, pois estava sendo mesmo algo precioso.
A menina virou o rosto, resmungando baixinho para si, tentando fazer com que ele não notasse sua face que agora estava tão vermelha que parecia que ia explodir. Asriel não parecia se dar conta disso, mas a respiração dele fazia cócegas no pescoço do anjo e, quando ele começou a rir sobre a sua pele, um arrepio percorreu todo o seu corpo. Ela agradecia internamente por suas asas estarem tão fracas, pois com certeza estariam se agitando agora com o seu nervosismo.
Depois de alguns instantes ele se separou dela, com a menina logo em seguida pegando a mochila ao lado e entregando a ele, sem o encarar por ainda estar tentando esconder o rosto vermelho.
— Olha, você pode estar relativamente alerta agora, mas pode voltar a se sentir mal a qualquer instante. Só come logo, vai.
Ele assentiu, retirando o conteúdo de dentro da mochila. Diferente dele que apenas pegou as besteiras que tinha no armário de sua casa, ela pareceu se concentrar em pegar comidas instantâneas, o que era bem mais esperto. Ele então se levantou com dificuldade, quase caindo de lado com a tontura repentina.
— O que você está fazendo? Você não consegue se levantar ainda assim — Chara indagou, franzindo as sobrancelhas.
— E-eu vou fazer a fogueira — ele murmurou pesadamente, se apoiando na parede enquanto esperava sua visão voltar a se ajustar, sentindo as pernas fracas.
— Fogueira? Para quê?
Agora quem franziu as sobrancelhas foi ele, a olhando com confusão enquanto voltava a manter uma posição estável.
— Espere, você pretendia comer cru?
— É só um monte de massa e grãos, não vai te matar.
— Bem, eu não estou afim de comer isso cru, então eu passo. Além do mais, você realmente precisa se secar, sabe. Uma fogueira viria a calhar.
— Mas você sequer sabe acender fogo?
— Só veja — ele sorriu, com graça. Lentamente recolheu alguns gravetos do lugar, os colocando em uma pilha no chão, para logo em seguida pegar um pouco da água da cachoeira em um pote que tinha trazido quando chegou ali. A tontura ainda não tinha passado totalmente, mas ele se mantinha firme enquanto arrumava tudo.
Chara apenas o assistia, entediada. Por algum motivo ela não estava sentindo muita fome, então não estava relativamente empolgada com o processo. Mas era um pouco divertido ver o demônio assim tão concentrado, só esperava que ele não voltasse a desmaiar no meio dessa agitação toda.
Quando o menino terminou, ele empurrou levemente a asa dela para se sentar ao seu lado, sorrindo com empolgação.
— E então, como vai ser agora? — o anjo perguntou. Asriel então ergueu uma mão, aproximando dos gravetos logo em frente.
— Vai ser assim — respondeu, fazendo fogo surgir em suas mãos com sua magia, rapidamente se espalhando para a madeira. Parecia ser um fogo bem forte, porque os galhos nem estavam realmente secos, mas foi questão de segundos para acender. Verdadeiramente impressionante.
Mas logo em seguida Asriel caiu para o lado, sendo pego rapidamente pela menina que suspirou.
— Então era isso o que você pretendia. Se eu soubesse que você ia usar magia, teria te avisado da óbvia consequência que ia ter. Você não consegue usar magia para me curar direito nem sequer quando está bem alimentado, imagina quando está fraco assim  — ela comentou, rindo em seguida. — Mas tenho que admitir que é interessante. Bem mais forte do que eu esperava que a sua magia fosse, sendo sincera.
— É… Heh… — ele murmurou fracamente, porém parecia portar uma expressão orgulhosa. Chara apenas bufou, dando tapinhas novamente em sua cabeça que agora se apoiava em seu ombro. Então ela o colocou deitado no chão, como sempre sem muita delicadeza, o ouvindo resmungar baixinho, fazendo-a rir mais uma vez. Porém, pegando a tigela com água, ela franziu o cenho.
— Essa daqui não é a água horrível da cachoeira? O que você quer fazer com isso?
— Ferver… Passa a ser potável — ele murmurou, ainda um tanto grogue. Chara então o olhou pasma.
— Você sabia disso e ainda assim passou sede!?
— O gosto continua meio ruim... Talvez com a comida não dê para notar — respondeu simplesmente. Chara então o deu um cascudo de leve, fazendo-o choramingar. — Ai, maldade!
— A culpa é sua por ser tão mané.
— Achei que você também soubesse, considerando toda sua experiência — ele murmurou, voltando a se sentar com dificuldade. Ela deu de ombros enquanto colocava a água para ferver.
— Ok, eu sei que eu disse que eu fui treinada, mas a grande verdade é que este treinamento foi feito por um bando de idiotas presunçosos. Eles apenas me pegaram quando criança e me torturaram de várias formas possíveis com o objetivo de me deixar resistente ao máximo, mas eles mesmo nunca conseguiriam sobreviver como eu. Já disse, os anjos nasceram para serem superiores, mas isso não é sinônimo de força ou inteligência. Não dúvido nada de que eles nem deveriam saber isso da água também.
— Mas isso não faz sentido, eles nos destruíram na guerra!
— Uma guerra de centenas de anos atrás. Depois que passaram a dominar a superfície, os anjos deixaram há muito tempo de se importar em tentar fazer algo com as próprias mãos, por isso deixam o trabalho sujo para gente como eu. Os anjos já são naturalmente poderosos por conta de suas asas, mas, sinceramente, se não fosse essa bondadezinha tola de vocês, eu não duvidaria que os demônios conseguissem ganhar atualmente.
Asriel engoliu em seco, nervoso. Era muita coisa para digerir, afinal. Mas não é como se saber disso fizesse uma grande diferença, é claro. Eles estavam presos no submundo e não havia nada que pudessem fazer quanto a isso.
...Ou havia?
De novo, aquela sensação de que estava perdendo um detalhe importantíssimo. Mas o que poderia ser? Tinha certeza que Chara era a resposta que procurava, mas ainda não conseguia entender. Contudo, ele decidiu refletir sobre isso mais tarde. Agora estava com fome demais para ficar pensando assim!
Depois da comida estar feita, o demônio praticamente mergulhou nela, de tanta que era seu apetite. Estava um pouco amargo por conta do gosto da água, mas o alívio de comer algo compensava tudo! Porém, Chara encarava sua própria tigela de comida com dúvida, repentinamente se sentindo extremamente enjoada.
Bem, isso definitivamente não era um bom sinal.
Ela olhou para baixo, encarando por alguns segundos o ferimento em seu ventre, que continuava com uma aparência bem doentia. Logo em seguida olhou para Asriel, que continuava a comer com uma empolgação revigorada. Ele parecia tão tranquilo e satisfeito…
O anjo então suspirou, apenas se forçando a comer também. Falaria sobre isso depois, apesar de que provavelmente ele mesmo notaria eventualmente. Afinal, era algo que já não tinha mais como evitar. Não que ela já não esperasse por isso, é claro. Se fosse no passado, ela simplesmente não se importaria nem um pouco, mas por algum motivo agora ela sentia ser tão… decepcionante.
Depois que se alimentaram, ficaram lado a lado diante da fogueira, que ainda queimava fortemente. Asriel então olhou para Chara de canto, curioso.
— Ei, o que foi? Você parece estar bem perdida em pensamentos.
A menina não respondeu imediatamente, parecendo estar mesmo bem reflexiva. E então suspirou mais uma vez.
— ...Eu estava pensando sobre você — enfim murmurou. Observando agora o anjo, o garoto não conseguiu deixar de notar em como as labaredas refletiam sobre seus fortes olhos escarlates, além da luz da fogueira que deixavam suas bochechas ainda mais coradas. Apesar da aparência suja e bagunçada, para ele essa era uma das visões mais bonitas que já teve dela, se sentindo um tanto encantado com isso.
— Sobre mim?
— Na verdade, sobre nós dois aqui, acho — ela dizia, ainda encarando as chamas intensamente. — É tudo tão diferente. Eu… eu sinto que realmente gosto de ficar aqui assim. Mais do que já gostei de qualquer outra coisa na minha vida.
E enfim admitiu algo em voz alta! Nem Asriel esperava por isso, a olhando surpreso e um tanto emocionado. Ele então encarou as chamas também, abraçando as próprias pernas e apoiando o queixo nos joelhos enquanto pensava.
— Chara… Você já gostou de alguém antes?
Agora quem encarou com surpresa foi ela, não esperando essa pergunta.
— Não, nunca.
— Mas… você gosta de mim?
De novo a menina não respondeu imediatamente, sentindo suas bochechas já voltarem a arder, fato que ela xingava internamente. Asriel riu baixinho, meio embaraçado.
— Desculpe, nem faz tanto tempo assim que nos conhecemos — ele murmurou, fechando os olhos enquanto sentia o calor do fogo sobre a sua pele, o pelo de seu corpo refletindo a luz alaranjada. — Mas é que eu também passei a realmente amar nosso tempo juntos. Eu sinto que não me importaria nem um pouco de simplesmente passar o resto da eternidade aqui com você. Não sei se já senti isso por mais alguém.
— Mesmo com a sua família e amigos aqui? — ela perguntou, não conseguindo evitar a curiosidade. Ele sorriu sem jeito, se sentindo cada vez mais embaraçado com o que dizia.
— Todos eles são muito importantes para mim. Mas… nunca foi dessa forma. O que eu sinto por você e por esses momentos que passamos juntos parece ser algo único. Um carinho especial e muito precioso. Não é estranho?
— ...Bastante — ela murmurou, rindo levemente. — Mas… acho que me sinto da mesma forma.
Asriel então abriu os olhos, observando a menina com certa dúvida. Lentamente ele abaixou o braço, segurando a mão dela que estava apoiada no chão. Ambos se encaravam intensamente agora, sendo possível ouvir apenas o crepitar da fogueira sobre a forte batida de seus corações.
E então ele a beijou.
Considerando que Asriel tinha a forma meio animal, o beijo era um pouco estranho, além do fato de que Chara realmente não sabia como agir, ficando mais uma vez um tanto estática no lugar. Mas tudo isso eram apenas detalhes que não faziam a mínima diferença para qualquer um dos dois, que já não percebiam mais nada a sua volta além do beijo que compartilhavam.
Naquele exato instante, naqueles poucos segundos, nada mais no mundo importava para eles.
Demoraram ainda um pouco para se separarem, enfim se encarando sem fôlego. Continuavam muito próximos, sendo possível sentir a respiração do outro em seu próprios rostos, que estavam extremamente corados sob a luz da fogueira. Asriel então encostou a sua testa na dela, com os lábios quase se tocando mais uma vez.
— ...Por favor, fique comigo — ele sussurrou, fechando os olhos. Chara fechou os olhos também, permitindo-se sentir o momento com ele.
Nunca na sua vida imaginou que passaria por algo como isso, sempre pensando que o romance era algo para pessoas de mente fraca e dependentes. Mas não havia nada de errado com isso, certo? Ela podia aproveitar pelo menos agora, não?
Ela… podia ser feliz com alguém, não podia?
A menina sorriu sobre os lábios dele. Não demorou para que se puxassem para mais um beijo, seguido de muitos outros logo depois, ambos agora com os corpos colados sob a luz da fogueira, como se sentissem uma necessidade vital pelo contato com o outro. Todo o receio que ela sentia antes com a proximidade entre eles ia sumindo com cada toque que trocavam, deixando-se levar por este momento tão especial. Por Chara estar ferida, Asriel tentava ser o mais delicado o possível, mas os beijos ficavam cada vez mais longos e apaixonados, o desejo pelo outro crescendo cada vez mais.
Apesar da mente de Chara estar um tanto nublada pelo calor do momento, ela lembrou-se rapidamente da promessa que Asriel tinha feito sobre mudar a sua visão de mundo, se dando conta que tinha de fato perdido o desafio, afinal.
E pela primeira vez ela gostou de ser a perdedora.
Talvez fosse mesmo possível eles viverem uma nova realidade. Juntos.
   ...Ou pelo menos é o que sentiam naquele instante.
Mas a dor estava apenas por começar.
(Próximo capítulo ainda em desenvolvimento)
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— O que você fez?! VAI, FALE! — Chara gritou, agarrando o colarinho de Asriel com força. Ele engoliu em seco, sentindo o suor escorrer frio.
— Hã, C-Chara...? T-trégua, esqueceu? — ele murmurou, sorrindo nervoso. A menina o fuzilou com o olhar, seus olhos de um profundo escarlate como sangue o encarando com raiva. Mas depois de alguns segundos ela o soltou, exasperada.
— Você acha que eu sou idiota, não é!? Eu não sei que truquezinho você usou, mas é melhor confessar!
Asriel bufou, segurando a vontade de rir. Este era provavelmente o jogo da velha mais mortal que já brincou até hoje, tendo sugerido isso para que pudessem passar o tempo. Mas, depois de perder sete partidas seguidas, ela definitivamente começava a levar para o pessoal.
— Chara, isso é só um jogo — disse, não conseguindo evitar de rir no fim. Ela estreitou os olhos, claramente ainda muito irritada.
— Mas não faz sentido! Eu quem deveria ganhar, a minha estratégia é a mais lógica!
— Começar pelo meio?
— É óbvio! O meio é o lugar que te dá o maior acesso para todas as outras áreas, deveria ser fácil te cercar por lá!
— Chara, você não tinha que me cercar, não é esse o objetivo do jogo. Já expliquei as regras várias vezes para você!
Ela revirou os olhos, impaciente.
— Eu sei a porcaria das regras! Mas eu já falei, é tudo uma questão de estratégia! É preciso escolher o melhor lugar no campo e encurralar o inimigo se quiser vencer qualquer coisa, assim você não teria como se mover mais e eu venceria! Por que eu não consigo?!
— Você faz soar como se estivéssemos lutando ou qualquer coisa do tipo — ele disse, erguendo uma sobrancelha. Agora quem bufou foi ela, com graça.
— Se estivéssemos em uma luta, você definitivamente não teria a mínima chance contra mim. Eu varreria esse chão com a sua cara tranquilamente.
Asriel suspirou, passando a mão por cima do tabuleiro improvisado, apagando as marcas que fizera com um graveto no chão.
— “Encurralar” nem sempre é a melhor estratégia. Entender o que a outra pessoa está pensando é importante também — respondeu simplesmente, deitando-se no chão enquanto encarava o teto. — Você não era a única que estava jogando, sabe. Eu posso pensar em minhas próprias estratégias, que inclusive seguem as regras.
— Eu estava seguindo as regras.
— Não, você não entendeu nada do jogo — ele comentou, rindo novamente. — Mas deixa. Foi divertido de qualquer forma, não foi?
— ...Bem, considerando o tédio que é ficar aqui, eu acho que sim — ela respondeu, dando de ombros. Estava sentada no mesmo lugar de sempre, sem ter conseguido sair de fato ainda dali. Era vergonhoso estar tão fraca assim, mas com o tempo parou de se preocupar com o que o demônio a sua frente pensava. Sua cara de bobo nunca parece realmente julgá-la de qualquer forma, afinal. Provavelmente era a primeira pessoa que encontrou até aquele dia que não a exigia que fosse sempre forte, fato que ela achava bizarro e curioso ao mesmo tempo.
Eles estavam já no segundo dia dentro daquela caverna... Ou seria o terceiro? Talvez mais? Com o tempo sendo tão incerto no submundo, nenhum dos dois tinham muita certeza do quanto já passaram ali dentro. Chara não parecia particularmente preocupada com seu ferimento, mas várias vezes Asriel não conseguia deixar de olhar preocupado para o seu ventre, percebendo que não havia avançado tanto assim. Não que o tempo que passaram ali seja o suficiente, feridas como essa demoram muito para melhorarem realmente, mas, considerando que constantemente tentava aplicar o pouco da magia que ainda tinha, era preocupante ele ainda estar naquele estado.
— Você não quer tentar se esticar um pouco? Talvez já esteja conseguindo se mover melhor agora — ele sugeriu, levemente esperançoso que seus pensamentos estivessem errados. Mas Chara riu.
— Se eu conseguisse realmente me mexer tão facilmente, eu já teria caído fora a muito tempo. Eu conheço meu corpo e sei o que consigo ou não fazer — respondeu simplesmente. Ele então se sentou mais uma vez, a encarando com curiosidade, se dando conta de algo que não tinha percebido até aquele momento.
— Espere. Se você está mesmo tão imobilizada assim, como pretendia fugir antes?
A menina pegou uma garrafa de água ao lado, mas não bebeu ao notar o tanto que tinha. Os suprimentos simples que Asriel tinha trazido antes pareciam estar se esgotando em uma velocidade grande demais para o bem deles, pelo o que ela percebeu. Decidiu não comentar isso ainda, apenas deixando a garrafa de lado e olhando para ele enquanto conversava.
— Não é difícil eu forçar meu corpo a fazer algo. Fui treinada para sobreviver, afinal. Ficar verdadeiramente imobilizada muitas vezes significa a morte e isso está fora de questão. Foi assim que eu consegui fugir depois da luta contra aquele esqueleto, inclusive. Simplesmente me forcei a continuar até que encontrasse um lugar que parecesse seguro, que foi este aqui — ela explicava, observando com interesse as diferentes expressões que o rapaz fazia enquanto ouvia. — Provavelmente não conseguiria lutar, mas, se eu precisar, posso tentar sair a hora que eu quiser. Só que, bem, isso era... antes. Atualmente eu já não tenho tanto problema em ficar aqui, acho. Isto é, considerando as consequências que eu com certeza sentiria depois, agora a decisão que me parece mais óbvia é ser paciente. Eu sei que meu ferimento é grave, sabe. Se tenho a oportunidade de tentar tratar ele, prefiro só esperar e ver se é possível mesmo.
O rapaz estava chocado. Tinha certeza que ela mal dava atenção para o ferimento, mas o anjo parecia ter plena noção de sua situação. Isso o fez engolir em seco, incrédulo.
— Mas... como? Você parece tão natural falando e agindo, nem parece estar realmente machucada! Como você aguenta?!
Ouvindo isso, Chara riu. Ele era realmente ingênuo.
— Eu já te disse que fui treinada, não? E quando digo isso, quero dizer de todas as formas possíveis. Fui obrigada a passar por experiências tão terríveis que sua mente inocente nem sequer conseguiria imaginar. Privada de necessidades básicas como sono, comida e água, além de ser torturada com os mais diferentes meios e ferramentas. Tudo isso para no fim ficar apta a lutar... E obviamente para conseguir matar e sobreviver sem sofrer com qualquer inconveniência inútil, como este ferimento aqui. É claro que, quanto mais tempo eu fico parada, mais difícil é para aguentar, inclusive é por isso que acabei ficando morrendo de sono antes. Mas isso também é só porque é você quem está aqui, então me senti segura o suficiente para dormir. Em geral, conseguindo ou não descansar, eu me manteria firme até o último segundo, que é quando meu corpo chegaria ao seu limite e enfim eu morresse. É para isso que fui treinada.
Asriel a encarava de olhos arregalados, sentindo seu corpo ficar trêmulo. Nem percebeu que dessa vez as lágrimas realmente escorriam, não conseguindo tirar os olhos dela.
— Chara... I-isso...
— Isso é apenas o natural — ela o interrompeu, desviando o olhar. Por mais que não ligasse realmente para o que estava contando a ele, por algum motivo não gostava de vê-lo daquele jeito, franzindo o cenho com a visão. — Somos anjos, nascemos para sermos superiores. E eu nasci para ser forte. E é isso o que eu sou.
Asriel não conseguiu responder, sentindo soluços escapar pela sua boca, cobrindo o rosto com as mãos. Isso fez Chara voltar a encará-lo com uma confusão enorme em sua face.
— ...Por que está chorando tanto? Não foi você quem passou por tudo isso — ela perguntou com receio, olhar acompanhando as lágrimas que escorriam entre os pelos dele. O menino apenas balançou a cabeça, consternado.
Bem, isso definitivamente era uma situação desconfortável. O que as pessoas geralmente faziam quando viam alguma outra triste? Chara não fazia a mínima ideia, o encarando de forma aturdida.
Então, sem saber muito o que fazer, ela o socou.
— O quê...! — Asriel exclamou, espantado demais para terminar sua sentença, erguendo o rosto e a encarando com uma expressão pasma.
— Ah, agora sua cara parece mais agradável — ela comentou, sorrindo. — Você é mesmo um bebê chorão, não é?
— Espere, o q-quê?! Não, não sou!
— É, é sim. Um bebê chorão frágil e inocente que não sabe lidar com a realidade. Sério Asriel, você realmente achou que todas as pessoas vivem em um mar de rosas? O mundo não é e nunca foi justo. O fato de você e todos os outros demônios estarem presos no submundo é uma prova disso, não?
— M-mas eu não sou infeliz ou q-qualquer coisa do tipo! Porém, v-você... isso é uma vida t-triste demais — ele respondeu de forma trêmula, esfregando os olhos.
— Bem, aí é como você enxerga isso. Para mim era só algo normal. Além do mais, estou muito bem agora... Quer dizer, quase bem — se corrigiu, fazendo uma careta ao lembrar de seu ferimento. — Enfim, o que eu quero dizer é que estou viva e sigo em frente. Para que sofrer mais com algo que já passou?
Asriel então riu fracamente enquanto ainda esfregava o rosto, parecendo estar já bem mais calmo. Notando isso o anjo se sentiu relaxar, não notando até então o quão tenso seu corpo estava com o momento.
— Isso se chama empatia, Chara. Não é tão estranho quanto pensa.
— Eu sei o que é empatia, idiota. Só que é uma enorme perda de tempo! Você não pode fazer nada por mim e eu não posso fazer nada por você. Qual é o sentido então?
— Mas quem disse isso? Podemos sim fazer algo — ele murmurou, se erguendo para se sentar agora ao seu lado, colocando com cuidado a grande asa dela sobre o seu colo. Era extremamente fofa, não conseguindo evitar de ficar passando a mão por cima. Apesar de estranhar o gesto, Chara não pareceu realmente se importar, então ele apenas continuou, apreciando a maciez.
— Tipo o quê? — ela perguntou, curiosa. Parecia estar mesmo começando a se acostumar já com o toque dele, observando distraidamente a mão que fazia-lhe carinho. Tinha que admitir que era bem confortável.
— Tipo isso. Podemos estar agora aqui um pelo outro — ele respondeu, sorrindo. — Não parece bom?
— Parece... estranho — ela foi sincera, olhando agora para ele. — É a primeira vez que passo um tempo tão amigável com alguém. É mesmo normal assim?
— Você pode fazer se tornar algo normal para você. É só fazer essa ser a sua realidade.
— Mas não existe mais de uma realidade. É tudo um ciclo, no fim todos passando por suas próprias injustiças, se quiser chamar assim. Eu com todas as minhas experiências, você preso aqui em baixo... Essa é a realidade.
— Eu já tinha te dito isso! Não somos iguais — falou, se referindo a uma das primeiras conversas que teve com ela quando a conheceu. Parecia que fazia tanto tempo já! — Se não somos iguais, então temos realidades diferentes. Mas nada nos impede de criar uma própria nossa, não acha?
— Eu... não sei se eu entendi o que quis dizer.
Ele então parou de fazer o carinho, olhando agora intensamente para ela.
— O que eu quero dizer, Chara, é que você não precisa mais viver na base de matar ou morrer.             Você pode viver aqui no submundo, comigo.
Ela o encarou por alguns segundos, para gargalhar em seguida.
— Você ficou completamente louco, não? Você tem noção de quantos demônios eu já matei!? Espera mesmo que eles me perdoem assim!?
— Eu irei falar com eles. Os convencerei. E, mesmo que por alguma chance eles ainda assim não te aceitem, não permitirei que qualquer um deles faça algo contra você. Eu irei te proteger.
               ...Ele tinha dito que iria protegê-la!?
Isso definitivamente era uma novidade. Todos sempre desejaram matar ela, até mesmo aqueles que faziam os pedidos, nunca a considerando alguém de real confiança. Além disso, sempre fora a mais forte de todos, por isso inclusive era o ceifeiro. Por que diabos iria precisar ser protegida!? Porém, lá estava ele, sugerindo exatamente isso. Sua expressão era firme, seus olhos castanhos a encarando profundamente.
Mas não era assim que as coisas funcionavam.
Ela desviou o rosto, encostando a cabeça contra a parede para encarar o teto, deixando sua expressão ser a mais neutra o possível. Respirou fundo algumas vezes, não tendo dúvidas do que deveria fazer.
Ela não tinha outra escolha.
— Acha que sou tão fraca assim para precisar de sua proteção?
— N-não, não foi isso o qu—
— Se eu precisasse de um bebê chorão para cuidar de mim, não faria o que faço hoje. Seria uma menina patética acompanhada por uma pessoa mais patética ainda. Se sou tão forte agora, é porque não precisei depender de ninguém. E isso inclui um peso morto como você.
Asriel a olhou pasmo, absorvendo suas palavras com uma expressão chocada. A menina não devolveu o olhar, mantendo o rosto virado para o teto, fingindo tédio.
Apenas o natural acontecendo, como sempre.
Depois de ter ouvido aquilo, Chara pensava que ele fosse começar a chorar de novo, ou então simplesmente se levantasse e fosse para o outro lado da caverna, novamente ofendido. Mas, para a sua surpresa, ele não fez nada disso.
Asriel voltou a fazer carinho em sua asa, encarando algum ponto aleatório da caverna de forma perdida. Isso fez com que ela realmente o encarasse agora, abismada. Percebendo como ela o olhava, ele sorriu de forma triste.
— O soco que você me deu ainda está doendo, sabia? Você realmente não se segurou nele, hein.
— ...Na verdade, eu me segurei bastante — ela respondeu devagar, ainda confusa. — Você não estaria mais nem sentindo o seu braço se tivesse sido com força real, isso se não quebrasse.
— Mesmo com esse seu ferimento aí?
— Sim, talvez.
Ele riu levemente, não muito surpreso com a resposta. E então suspirou, um tanto melancólico.
— Desculpe. Eu fui precipitado demais... Acho que sou mesmo um bobo. Eu deveria saber que não é tão fácil mudar a realidade de alguém assim. Apesar de que minha opinião continua a mesma.
— Então você é realmente um bobo.
— Imaginei.
— ...Ou talvez nem tanto assim. Quer dizer, pelo menos não tanto quanto eu achava antes — ela murmurou, chutando a terra do chão da caverna com a ponta do pé, pensativa.
Vendo como Asriel agia, agora estava claro que não seriam mais simples ofensas que conseguiria abalar a vontade dele, fato que até impressionou Chara de certa forma. Parece que tinha mesmo subestimado a bondade desse demônio, afinal.
— Você realmente pensa isso? Vindo de você, parece um elogio e tanto! — ele comentou, claramente fingindo estar chocado. Ela então revirou os olhos.
— Pode não ser tão bobo assim, mas é definitivamente ingênuo. Eu sou uma assassina, Asriel. E já te disse que não é você quem vai conseguir me mudar do nada.
— Isso é um desafio? — ele perguntou com graça, erguendo a sobrancelha novamente. Ouvindo isso ela estreitou os olhos, desacreditada.
— Você está brincando, certo?
— Não sei o porquê está tão incerta. Você sempre pareceu adorar desafios.
Chara então gargalhou mais uma vez, divertida. Ele definitivamente nunca iria parar de surpreendê-la.
— Então você acha realmente que vai conseguir mudar minha visão sobre o mundo? Essa eu vou querer ver.
— Depois desse tempo que passamos juntos, você ainda acha que sou alguém que desiste assim tão fácil? Eu já me decidi. Não importa quanto tempo leve, eu irei te salvar, Chara. Eu juro.
— ...Você é realmente mais do que só um bebê chorão, afinal — ela murmurou, enfim mantendo o sorriso também. — Interessante. Tudo bem, eu aceito o seu desafio. Vamos ver como você se sai com essa sua bondadezinha, minha pequena presa.
Agora foi ele quem revirou os olhos, ignorando a última parte. Parece que teria realmente muita tarefa pela frente.
Não seria mesmo fácil.
(Próximo capítulo)
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As horas continuavam passando, ambos sem falar qualquer palavra. Toda vez que Chara olhava para ele, o menino devolvia o olhar de forma irritada, como se a desafiasse a tentar algo. Por mais interessante e divertido que o desafio parecesse, isso fez o anjo ficar ainda mais curioso quanto a ele, percebendo que o medo que antes via em seu olhar havia sumido. E não é como se ele só tivesse parado de temê-la do nada, parecia mais como se ele tivesse se esquecido que deveria sentir medo. O que ela tinha dito havia o ofendido a este ponto?
Asriel era um mistério para ela.
Com o tempo Chara simplesmente desistiu de observá-lo, encarando um ponto qualquer da caverna. Tinha que admitir que estava cansada demais para comprar uma briga apenas por diversão e seria tolice de sua parte por sequer tentar em seu atual estado. O lado positivo de seu ferimento é que a dor a impedia de dormir, sendo um alerta constante de onde estava. Porém, conforme as horas passavam, mesmo a dor já não lhe incomodava tanto, seus olhos ficando mais e mais pesados, implorando por descanso. Percebendo isso, ela apertou os punhos com impaciência, cravando as unhas na pele e se forçando a ficar acordada. Mas, apesar da frustração, ainda assim tentou ser sutil, porém isso não passou despercebido por Asriel, que enfim tirou a expressão dura do rosto, a olhando levemente preocupado.
— ...Você precisa dormir. Está ainda se recuperando de um ferimento muito grave — ele murmurou, hesitante. Isso fez com que quem ficasse irritado agora fosse ela, que o fuzilou com o olhar.
Mesmo depois de tudo o que fez e de obviamente o ofender, ele ainda se preocupava? O quão longe essa bondade patética dele poderia ir!?
— Eu estou bem — ela respondeu de forma rude, ainda de punhos cerrados. — Não preciso da sua piedade idiota.
Uau, ele pensou. Cansada ela ficava ainda mais difícil de lidar, aparentemente.
Mas, por mais irritado que ele estivesse, não podia deixá-la daquele jeito. O ferimento era grave demais, precisava descansar ou ela acabaria se matando sozinha assim! Pensando nisso, Asriel respirou fundo, tomando uma decisão. Ele se levantou e foi devagar até onde ela estava, empurrando a sua asa com delicadeza para que pudesse se sentar.
— O que está fazendo? — ela perguntou, o olhando com confusão.
— Se eu estiver aqui do seu lado e tentar fazer qualquer coisa, mesmo dormindo você perceberia, certo? Isto é, considerando toda a experiência que você tem e tal.
— ...Sim, perceberia — respondeu com desconfiança, estreitando os olhos.
— Então você pode dormir sem se preocupar. Não farei nada e nem irei a lugar algum, é sério. A melhor parte é que não preciso nem sequer prometer, pois com certeza você saberá se eu tentar qualquer coisa, não é?
Os olhos cansados de Chara o encararam com genuína surpresa, sem acreditar no que ele estava fazendo. Tinha que ser um truque, não era possível!
— Por quê?! Se eu caísse no sono, seria a oportunidade perfeita para você chamar ajuda sem que eu fugisse, mas estando do meu lado não conseguiria! Você é assim tão tolo!?
Ele bufou, revirando os olhos.
— “Oh, mas obrigada, Asriel! Eu realmente precisava disso, vai ser uma ajuda e tanto!” — dizia com graça enquanto tentava imitar a voz dela, fazendo-a franzir o cenho. Vendo sua expressão ele riu, descontraído. — Desculpa, mas é tão difícil assim só agradecer?
Ela continuou o encarando, ainda pasma. Não era possível. Simplesmente não era possível. Ele não poderia ser bom a este nível.
Mas, caramba, não sabia mais no que acreditava quando se tratava desse demônio! Por que ele tinha que ser tão confuso?!
Ela engoliu em seco, desviando o rosto.
— Eu... eu só não consigo entender — murmurou em voz baixa, deixando o menino surpreso com o que notou.
Pela primeira vez, ela parecia estar quase que indefesa. Se tratando dela, talvez fosse mesmo uma palavra muito forte para usar, mas era a impressão que teve ao notar seu olhar perdido, procurando um sentido para o que estava acontecendo.
Ele então sorriu, enfim um pouco de esperança crescendo dentro de si.
— Eu já te disse, não? Vou ficar do seu lado e garantir que não faça besteiras. E uma dessas besteiras é você acabar consigo mesma por causa de uma coisa boba como deixar de dormir — ele murmurou com gentileza, tentando transmitir calma em sua voz. — Se eu me dispus a tratar de seus ferimentos, farei isso direito. Não posso simplesmente permitir que minha paciente faça mal a si mesma dessa forma!
Ela ainda estava desacreditada, voltando a olhar para ele com muito receio. Vendo isso, Asriel suspirou, abaixando o braço e indo segurar a mão machucada dela, a deixando mais surpresa ainda.
— Se está tão desconfiada, então podemos ficar assim, o que acha? Não é possível que mesmo segurando a minha mão você ainda acha que eu conseguiria fazer qualquer coisa! Será que podemos fazer uma trégua?
Depois de alguns segundos, Chara começou a olhar lentamente para baixo, observando as mãos deles unidas. Era bem quente e os pelos dele contra sua pele eram realmente macios... Definitivamente uma das sensações mais confortáveis que conseguia se lembrar de já ter tido.
Então era isso o que se sentia ao segurar a mão de outra pessoa, ela pensou. Não poderia negar que tinha gostado.
Mas também nunca admitiria isso em voz alta, é claro.
— ...Certo. Uma trégua. Talvez não seja má ideia — ela murmurou, sem perceber que continuava a encarar profundamente a mão dele segurando a sua, ainda assimilando o momento. — Acho que posso acreditar em você dessa vez. Mas só dessa vez.
Como resposta ele apenas sorriu, apertando a mão dela de forma gentil. Parecia um grande progresso! Será que até mesmo ela poderia ceder a bondade?
Se tinha alguém que era capaz disso, esse alguém era Asriel. E ele estava mais do que disposto a conseguir.
Ainda sentindo o aperto gentil em sua mão, Chara encostou a cabeça contra a parede, enfim fechando os olhos para conseguir descansar. Não passou nem alguns minutos quando ele começou a ouvir ela ressonar levemente ao seu lado, seu peito subindo e descendo de forma tranquila, dando a certeza que tinha de fato caído no sono. Vendo-a dormir, ela parecia realmente pacífica. Era uma visão tão serena e delicada... Aos olhos do rapaz, ela nunca esteve tão bela quanto agora, não conseguindo evitar de admirá-la com fascínio.
Quando percebeu o que estava fazendo, ele corou fortemente, desviando o olhar com rapidez. Chara continuava sendo uma assassina, repetia para si mesmo. Estava atrás de sua melhor amiga. Ele não podia se deixar levar daquela forma.
Ainda sentindo o rosto arder, lentamente voltou seu olhar para ela, vendo que ainda se mantinha tranquila enquanto dormia. Parecia mesmo estar precisando desse descanso, afinal. Ele então se encostou contra a parede também, tomando cuidado para não apertar suas asas, encarando agora o teto da caverna. Dormir um pouco também não o faria mal, talvez. Porém, estava perdido demais em pensamentos para conseguir relaxar, revendo sobre sua situação e o que faria a partir dali. Mas, admitia, o que mais pensava mesmo era sobre ela.
Chara era um mistério para ele também.
Sentindo o toque quente dela em sua mão, ele ficou com uma expressão triste, se lembrando das terríveis informações que tinha descoberto sobre a menina. Matar ou morrer... Como alguém poderia viver dessa forma?
Não, isso não era viver. Isso era sobreviver.
Mas agora ele entendia. Chara não precisava de alguém que viesse com palavras bondosas. Não, não era isso. Ela precisava de alguém que mostrasse com atitudes.
E é o que faria. Ele mostraria para ela o que era ter uma vida de verdade, nem que seja a última coisa que faça.
(Próximo capítulo)
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Chara abriu os olhos lentamente, ainda se sentindo levemente tonta enquanto olhava ao redor, demorando para se lembrar o que tinha acontecido. Quando finalmente a memória retornou, ela tentou se sentar rapidamente, mas voltou a cair no chão ao perceber que não conseguia manter firmeza em seus braços.
Mas que incômodo. Que raio de ceifeiro ela era se seria morta por suas vítimas? Quase teve vontade de rir, mas com a cara contra o chão era difícil.
— ...Você não deveria se levantar ainda. O seu ferimento é muito grave — ela ouviu alguém dizer ao seu lado, sendo uma voz baixa e levemente trêmula. E então sentiu seus braços serem pegos, sendo delicadamente levantada para que pudesse apoiar as costas contra a parede e se manter sentada. Com isso, enfim conseguiu enxergar de quem era a voz que falou com ela, estreitando os olhos quando o viu.
Era um garoto, mas tinha a aparência de uma pequena cabra. Ele usava roupas simples, mas era difícil de ver como eram por estarem muito ensanguentadas, fato que o anjo achou curioso, considerando que ele não parecia estar ferido. Olhando para o lado e vendo o balde com água e os panos ensanguentados espalhados ao seu redor, a conclusão mais óbvia que conseguiu chegar é que todo aquele sangue de fato era seu. E era estranho ver tanto espalhado assim que não fossem os de suas vítimas, por vezes se esquecendo que também conseguia sangrar tanto quanto elas. Mas não deixava de ser uma visão interessante.
A grande questão era: como ainda estava viva?
Ela olhou para o menino, curiosa.
— Foi você quem me salvou? — perguntou simplesmente. Ele não a encarava, suas mãos trêmulas recolhendo os panos ensanguentados para levar de volta a água. Depois de alguns longos minutos, ele enfim ergueu a cabeça para a sua direção, cerrando os punhos.
— Você... realmente matou todos aqueles demônios, não foi? — ele perguntou com aspereza, ignorando a pergunta que ela fez. Não que a resposta dele importasse, a situação era realmente óbvia.
O garoto esperava que, como todo suposto vilão, ela confessasse todos os crimes que fez e então desse qualquer tipo de risada maligna em seguida. Mas, para a sua surpresa, ela apenas concordou normalmente com a cabeça, sua expressão sem mudar em momento algum.
...Matar era assim tão natural para ela?
Ele se afastou, mais trêmulo do que nunca. Vendo isso, Chara sorriu.
— O quê? Vai me dizer que você já não sabia disso quando veio me curar? — ela indagou com a voz fraca, mas com uma mistura de divertimento e curiosidade legítima em seus olhos escarlates. — Afinal, por que fez isso? Teria salvo muitas vidas se tivesse me deixado morrer.
— Eu não sou como você para ver e deixar uma pessoa sangrar até a morte! — o garoto exclamou com raiva, não conseguindo controlar suas emoções. — Além do mais, não pense que eu vou simplesmente permitir que saia daqui para continuar com o seu genocídio! Vou ajudá-la a se recuperar apenas o suficiente para que consiga se manter em pé e ter um julgamento justo. Só isso.
Chara o encarou ainda por alguns segundos, para no fim dar de ombros.
— Bem, faça o que quiser. Não é como se eu tivesse muitas opções.
Mas isso não era mesmo verdade. No momento em que ela conseguisse se recuperar o suficiente para se mover, sairia dali após ver o sangue desse demônio ser jorrado aos seus pés, assim como foi com todos os outros.
Nada mais do que o normal.
E então ambos ficaram em silêncio, cada um perdido em seus próprios pensamentos. O garoto manteve suas mãos ocupadas enquanto arrumava o local, assim não precisaria encarar o anjo assassino ao seu lado. E tinha bastante coisa para fazer, considerando a bagunça que o lugar se tornou.
É claro, ele tentou usar sua magia para conseguir curar a menina, mas ele já não tinha muita por ter feito os primeiros socorros em Sans antes, além do ferimento dela ser realmente grave. Por isso, por mais que tivesse realmente se esforçado, o estado dela continuava muito preocupante. Quando notou isso, saíra desesperado em busca de qualquer coisa que pudesse usar no tratamento, voltando com pressa para que pudesse salvar ela, se esquecendo do mais essencial que era pedir ajuda. Mas ele não conseguiu evitar! Ela estava morrendo, não tinha tempo para tentar procurar qualquer outra pessoa! Se não a tratasse na hora, ela não resistiria! Ele jamais se perdoaria se tivesse deixado alguém morrer sendo que ele podia fazer algo por ela, por mais horrível que essa pessoa seja.
Agora estavam ali, sozinhos. Ele engoliu em seco, tentando ignorar o olhar intenso que o encarava de lado, sendo um vermelho tão forte e profundo quanto o do sangue que espalhava com sua faca. Mas era estranho, pois, ao mesmo tempo que ele conseguia sentir seu espírito assassino, ele também sentia um interesse a mais vindo dela.
...Agora que parava para pensar nisso, ela parecia estar mesmo a analisá-lo por inteiro com o olhar. Isso o deu calafrios, fazendo-o se virar irritado em sua direção.
— O que é que vê de tão interessante em mim para ficar me analisando tanto?!
Chara riu, achando engraçado a tentativa dele de manter uma expressão dura enquanto suas mãos tremiam. Ela então desviou o rosto, sorrindo de canto.
— Desculpe, mas não é como se tivessem muitas outras coisas interessantes aqui nesta caverna para encarar — respondeu simplesmente. Então fechou os olhos, encostando a cabeça contra a parede de forma tranquila, como se fosse dormir. — Assim é melhor para você?
O menino não respondeu, percebendo surpreso que ela realmente tentou fazer algo para deixá-lo mais confortável em sua presença. Não esperava uma atitude compreensiva assim vindo dela.
Mas ele não podia se esquecer de quem ela era realmente.
Uma assassina.
Apesar de estar tratando seu ferimento, ele não conseguia se forçar a encará-la, se concentrando apenas no tratamento e em nada mais. Porém, agora ele começou a observá-la de verdade pela primeira vez, não conseguindo evitar a curiosidade de entender melhor aquele anjo.
Assim como Frisk, ela era extremamente bela. Ao contrário dos demônios que eram todos muito diferentes um do outro, os anjos realmente eram todos iguais quanto ao físico, porém com algumas sutis diferenças. A pele deste anjo era naturalmente bem pálida, agora um tanto mais doentia por conta da enorme perda de sangue que teve, porém, por algum motivo suas bochechas conseguiam ser bem coradas, algo até um pouco fofo, considerando sua personalidade assassina. Ela estava descalça e usava um vestido preto com aspecto sombrio, além de ter asas enormes e majestosas que cobria todo o chão ao seu redor, apesar de não conseguirem se mover por ainda estarem muito fracas. Como os de Frisk, seus cabelos também batiam na altura de seu queixo, porém eram lisos e mais claros, de um acobreado muito bonito que combinava bem com a cor profunda de seus olhos.
Mas, esses mesmos olhos... ela poderia estar com eles fechados agora, mas o garoto jamais se esqueceria da terrível cor que possuíam. Era como ver a sua própria morte dentro deles.
Ele desviou o rosto, engolindo novamente em seco. Não podia se deixar distrair, não na presença dela. Contudo, admitia que não conseguiu deixar de se impressionar com a dureza da menina, que se mantinha tranquila ao lado. Afinal, ela deveria estar sentindo muita dor por conta do ferimento, porém sua expressão era relaxada, quase como se estivesse mesmo dormindo. Mas, apesar dela parecer estar realmente precisando descansar, algo lhe dizia que ela estava sim muito bem acordada, de alguma forma conseguindo prestar bastante atenção em tudo o que acontecia ainda a sua volta, deixando-o tenso.
As horas se passaram, com ela já tendo aberto os olhos novamente enquanto encarava um ponto qualquer da caverna, parecendo entediada. Nenhum dos dois falava, ele ainda muito desconfiado para isso e ela apenas não se importando mesmo. Depois de todo esse tempo, ele enfim a encarou, hesitante.
— ...É melhor você comer alguma coisa — ele murmurou, quebrando o silêncio do lugar, chamando a atenção dela que voltou a observá-lo com o mesmo olhar intenso de antes. Vendo isso, ele mais uma vez desviou o rosto de forma nervosa, pegando alguns sacos de lanches que tinha deixado ao lado dentro de uma enorme mochila. — Eu tinha trazido isso, você pode comer. Não é o tipo de comida mais adequada para alguém que está em recuperação, mas acho que é melhor do que nada.
Ele estendeu um pacote de bolachas para ela, ainda sem encará-la. Vendo o tamanho que a mochila estava, mostrava como ele realmente parecia ter se garantido em mantimentos que durassem um bom tempo, apesar de quase tudo parecer ser guloseimas como aquela, o que era um tanto engraçado. A menina então pegou o alimento estendido, se sentindo cada vez mais curiosa.
— Achei que você apenas não queria me deixar morrer. Considerando que agora meu ferimento já está bem estancado e provavelmente não morrerei mais tão facilmente, não consigo evitar de pensar no porquê você ainda está aqui cuidando de mim — ela comentou, enfiando uma bolacha na boca em seguida. Era enjoativamente doce, mas já era algo. E admitia que gostou muito do recheio de chocolate.
Por alguns segundos ele não falou nada, apenas abrindo um pacote para si e comendo alguns biscoitos salgados. Então jogou uma garrafa de água em sua direção, na qual ela pegou com facilidade.
— E você tem algum palpite do porquê ainda estou aqui? — ele respondeu com outra pergunta, olhando enfim diretamente em seus olhos. A menina deu de ombros, dando um gole em sua água.
— Nada que venha na cabeça me parece motivo o suficiente. Sinceramente, você em si não me faz o menor sentido.
Para a surpresa dela, ele riu. Era uma risada fraca e triste, refletindo em seu olhar cansado.
— Mas é claro que você não entende. O que uma vida significa para você?
Parecia uma pergunta retórica, mas ela realmente parou para ponderar em uma resposta, colocando o dedo indicador nos lábios de forma pensativa.
— Um conjunto de funções executivas e orgânicas, com processos de sinapses que transmitem impulsos nervosos através de nossa rede neural. Eu poderia entrar em detalhes sobre todo o nosso processo biológico, mas acho que não é necessário.
Ele a encarava, sem acreditar no que estava ouvindo. Ao notar sua expressão ela ergueu uma sobrancelha, não entendendo o porquê ele parecia estar tão consternado.
— O que foi? Disse algo errado?
— Você... quando você mata, é isso o que você pensa sobre a vida de suas vítimas?
Ela mordiscou outra bolacha, ainda entediada. Não que os anjos em geral fossem empáticos, mas ainda conseguia se lembrar de ter tido esse tipo de conversa antes. Uma grande perda de tempo.
— E deveria pensar em algo diferente? Anjo ou demônio, são todos carne e sangue. Eu incluída, é claro. O que te comove nos outros nada mais é do que um monte de funções moldadas, tão simples quanto parece. Mas não acha interessante o quão frágil isso consegue ser? Um único golpe e está tudo acabado, o sangue sendo tudo o que resta além da casca vazia que você se torna. Se vencer, você vive. Se perder, você morre. É apenas o natural.
O menino estava chocado, olhando agora para o chão com tristeza. Depois de ouvir isso, sentia que finalmente começava a compreendê-la melhor, percebendo como sua mente enxergava o mundo.
E o quão solitária a vida dela deveria ser.
Ele respirou fundo, se virando totalmente agora para encarar o anjo.
— ...Acho que não conseguimos nos apresentar ainda, não é? Eu sou o Asriel. Qual é o seu nome? — ele perguntou, fazendo-a estranhar essa nova atitude dele.
— ...Chara — respondeu, pela primeira vez um tanto hesitante. O que ele pretendia ao se apresentar assim, afinal?
— Chara... É um nome bem diferente. Eu gostei — ele comentou, sorrindo. — Chara, você me acha igual a você?
— Não. Você é um demônio.
— Fora isso.
Ela comeu mais algumas bolachas enquanto pensava. Não sabia o que ele pretendia, mas também não parecia nada demais responder.
— No sentido biológico, sim. Se estiver se referindo a princípios, são obviamente divergentes. Não que faça qualquer real diferença no fim.
— Mas não são apenas nossos princípios — ele começou a dizer, brincando distraidamente com um biscoito seco em suas mãos enquanto falava. — Nossas experiências são também muito diferentes. Nossa história. Nossos atributos. Nossa personalidade. Nossos desejos... Não somos iguais.
Asriel escolhia as palavras com cuidado, sem tirar os olhos dela. Surpreendentemente a menina ouvia com paciência, seus olhos escarlates fixos em seu rosto, expressão neutra demais para que ele pudesse ter certeza o que ela pensava. Mas agora ele tentava não ficar mais nervoso com o seu olhar, se mantendo firme.
— Eu não entendo muito disso de funções que você diz, mas o que eu posso dizer com certeza é que não nascemos neste mundo sem motivo. Cada um segue de sua própria maneira, e descobrimos melhor sobre nós mesmos a cada dia que se passa. Através de nossas próprias experiências, saberes e interesses... Isso o que nos faz tão únicos no mundo. Isso o que faz cada vida valer a pena.
As pessoas sempre diziam o quão bom Asriel era com as palavras, aparentemente sempre sabendo qual era a coisa certa a se dizer. E, admitia, era isso o que esperava agora também. Porém, Chara não parecia estar particularmente comovida com seu discurso, parecendo continuar bem entediada.
— Bem, essa é uma forma de ver as coisas, acho — ela disse por fim, fazendo uma careta ao notar que já estava na última bolacha do pacote. Nem notou que já tinha comido tantas! — De novo, não é como se importasse realmente.
Vendo-a comer a última bolacha, Asriel jogou para ela um pacote de biscoitos salgados, no qual ela pegou sem muita empolgação. Parecia realmente preferir o chocolate.
— Isso é tudo o que tem para comentar? — ele perguntou, franzindo o cenho.
— Sinceramente, eu não sei o que você espera que eu diga. Não é como se eu fosse me arrepender de minhas ações só por causa dessas poucas palavras motivacionais que você me deu — ela respondeu, ainda olhando com decepção para o biscoito em suas mãos. — Passei minha vida inteira na base de matar ou morrer. Não é você quem vai mudar isso do nada.
Asriel amuou, comendo seu biscoito em silêncio. Mas após alguns segundos voltou a murmurar, hesitante:
— Quando você diz a vida inteira... é literalmente sua vida inteira? Isso é tudo o que você sempre fez, matar?
Chara segurou o bocejo, querendo que ele não notasse. Por não ter realmente dormido em momento algum e por estar fraca pelo ferimento, os olhos dela começavam a ficar pesados, seu corpo praticamente implorando para que ela descansasse. Porém ela ignorava, tentando se concentrar na conversa. Afinal, não podia demonstrar tanta fragilidade na frente do inimigo assim, por mais ferida que estivesse.
Ela deu mais uma vez de ombros, se forçando a comer um biscoito também.
— Em geral, sim. Viram potencial em mim, então me ensinaram a lutar. Logo, me ensinaram a matar. E, agora, isso passou a ser o meu trabalho.
— Espere... matar é o seu trabalho? O que quer dizer com isso?
O anjo o encarou profundamente, pensando se respondia ou não. Não é como se fosse segredo também, então não deveria ser qualquer problema.  Além disso, conversar com ele era uma boa forma de passar o tempo, conseguindo se manter acordada enquanto falava. Então, até que ela estava apreciando um pouco o tempo que passavam juntos, apesar de que nunca iria admitir isso em voz alta.
Ela comeu mais alguns biscoitos, chegando à conclusão que não deveria ser nada demais só falar de uma vez.
— Eu sou o ceifeiro divino. É um cargo hierárquico bem alto, sabia? Sou respeitada e temida por milhares de anjos — falou, obviamente satisfeita com essa última parte, sorrindo com graça ao lembrar de seus tolos seguidores. Eram um incômodo, mas mostrava para todos a sua grandeza.
E, se havia algo que Chara tinha, era poder sobre os outros.
— Eles me dão um alvo e eu o elimino — continuou, tranquilamente. — É claro, só se eu achar interessante o suficiente, até porque eu não gosto de perder meu tempo com pedidos inúteis. De qualquer forma, é um trabalho simples, mas que precisa ser feito com perfeição. Não há espaço para falhas.
— Espere... Então você está aqui pelo trabalho também? Te ordenaram a matar Frisk?!
— Sim, ela é o alvo que me deram. E um dos grandes, inclusive.
— Mas por quê?! Eles arrancaram as asas dela e a jogaram no submundo, isso já não era castigo o suficiente!?
O anjo segurou mais um bocejo, deixando enfim o saco de biscoitos de lado.
— Não cabe a mim julgar as motivações dos pedidos. Bem, por mais que eu goste da caçada, geralmente eu não perderia meu tempo ao descer no submundo só por um anjinho sem asas qualquer. Mas, se eu soubesse que os demônios no caminho seriam um desafio tão grande assim, eu não teria nem pensado duas vezes antes de descer. E realmente tem sido divertido, apesar do resultado da última luta — ela comentou, bufando ao lembrar do ferimento em seu ventre. Ainda doía horrores, porém não dava a mínima atenção para isso. Contudo, tinha que admitir que aquele maldito esqueleto definitivamente a pegou de jeito dessa vez. Mas, ah, isso não ficaria assim. Não ficaria mesmo.
Ela pigarreou, tentando voltar a se concentrar para terminar o que dizia.
— No fim, quando eu descobri sobre a tola personalidade pacifista da menina, eu achei o trabalho bem... interessante. Então acabei aceitando, é claro. E de fato tem sido tão interessante quanto eu imaginava.
Asriel não respondeu mais, seu corpo ficando tenso com o que acabara de descobrir. E o que verdadeiramente o chocou não foi particularmente a parte do quão divertido isso era para ela, até porque já conhecia a opinião da menina sobre essas suas “caçadas”, então não era uma surpresa realmente. Não, esse não era o único problema ali. Todos pensam que Chara é só um anjo insano que desceu no submundo para se divertir atrás de Frisk, porém, depois do que escutou, era óbvio que havia um motivo por trás disso. Tinha algo que ele estava perdendo, algo extremamente importante. Mas o que era? O que poderia fazer os anjos se preocuparem tanto ao ponto de mandar um assassino atrás de Frisk?!
Chara o olhou com graça, sorrindo de canto.
— Está pensando em ir contar isso para essa sua amiga, não? — ela perguntou inocentemente, alisando com a mão nua uma de suas asas jogadas ao chão, que ainda mal se mexia. — Pode ir, não farei nada demais. Não posso me mover direito ainda, vê? E estou exausta. Praticamente de mãos atadas.
— Acha que sou tão bobo assim!? Você não me sugeriria isso se estivesse tão indefesa como diz!
— Ei, você até mesmo me desarmou. O que eu poderia fazer demais?
Espere, ele pensou. Como ela sabia que estava desarmada? Em momento algum notou ela procurando sua faca!
— ...Não consigo confiar em você — murmurou com aspereza, se levantando e indo até a parede oposta da caverna, encostando as costas contra ela enquanto encarava o anjo com seriedade. — Por isso, ficarei ao seu lado e garantirei que não faça besteiras.
Isso fez Chara rir, achando a situação engraçada demais para levar a sério.
— Você sabe que uma hora terá que sair, certo? Não podemos sobreviver apenas de biscoitos. Ou pretende me levar junto com você em um passeio por aí?
Asriel trincou os dentes, irritado. Agora ela estava mesmo começando a zombar dele.
— Não é apenas mais você, eles devem estar me procurando agora também. Uma hora encontrarão essa passagem e você terá o julgamento que merece.
— Você pode afirmar isso com certeza? Sabe de alguém que conhece esse esconderijo aqui além de você? — ela perguntou, ainda o olhando com graça. Ele então desviou o rosto novamente, ignorando sua pergunta. Mas era óbvia a resposta.
De qualquer forma, o tempo ali seria longo. Muito longo. Por tal, não tinham outra escolha a não ser se aguentarem naquele enclausuramento.
Afinal, não sairiam dali tão cedo.
(Próximo capítulo)
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Capítulo 4: A ilusão dos inocentes
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Uma aberração.
No mínimo a reencarnação do pecado.
Como algo assim existia? Como eles permitiram que um... monstro como este fugisse dessa forma?
E como ela conseguiu esconder seu poder por tanto tempo?
Os fez de idiotas. Deveria pensar que era melhor do que eles. Ah, sua confiança deveria ser tão grande que esperou esse tempo todo para enfim decidir fugir.
Mas eles não deixariam isso barato. Era um risco grande demais deixa-la livre. Era preciso tomar uma atitude.
Estava na hora de mostrar para essa pecadora e para esses demônios o quão inferiores eles realmente eram.
...
...
...
— Oh, essa é uma ideia maravilhosa. Será no mínimo divertido — ela respondeu com um sorriso doce. Seus olhos escarlates como o sangue mais fresco os encararam profundamente, de forma quase faminta. — Sentem-se e aproveitem o dia de vocês. O sol e a brisa estão agradáveis hoje. Agora, não se preocupem com mais nada...
...Eu darei um jeito nela.
HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA HISTÓRIA
FIM DO CAPÍTULO:
— E então? Acha que consegue? — ele perguntou, ficando em pé ao lado do anjo que estava sentado na beira do abismo, balançando as pernas sobre o vazio de forma divertida. Seu vestido preto como a noite mais sombria balançava com a brisa, junto de seus curtos cabelos castanhos, quase ruivos, que sobrevoavam em frente a seus profundos olhos escarlates.
Ela fechou os olhos e levantou o queixo, sentindo o sol contra sua pele clara, respirando fundo o ar morno com um sorriso satisfeito no rosto. Estava um dia muito agradável de fato. Não que isso realmente importasse para a menina.
A verdadeira diversão ainda estava por vir.
O homem estreitou os olhos. Ela poderia ser o ceifeiro divino, um cargo hierárquico extremamente alto que tinha o respeito e a admiração de muitos, mas ainda assim ela era realmente estranha. Nunca era fácil dizer se a menina era de fato confiável ou não, mas dessa vez não tinham outra escolha a não ser deixar o trabalho em suas mãos. Afinal, a força dela é algo que ninguém nunca poderia questionar.
Depois do que pareceu longos minutos ela enfim abre os olhos, encarando o céu azul com o sorriso ainda em face. E então começou a rir de forma seca.
— Quem você pensa que eu sou? Não me faça essas perguntas idiotas esperando que eu as leve a sério — disse simplesmente, enfim se colocando de pé. — Você precisa dizer a coisa certa se quer uma resposta sincera.
O homem suspirou. Olhou então para dentro do abismo, sentindo apenas repulsa.
— ...Elimine ela de uma vez por todas. Mate qualquer um que se colocar em seu caminho. Essa é sua ordem.
Foi então que ela começou a rir de verdade. Seu riso ecoava pelo local, mas não realmente com graça. Era uma risada amarga, mas parecendo quase insana. Depois que começou a se acalmar, ela enfim o encarou, fazendo com que ele recuasse alguns passos com o seu olhar.
O olhar de um verdadeiro predador.
— Interessante — ela respondeu ainda risonha, o sorriso se alargando cada vez mais. E então tombou a cabeça, o olhar se tornando cada vez mais e mais nocivo, parecendo devorá-lo vivo.
Era a morte em pessoa.
— ...Mas desde quando são vocês que estão no controle?
O homem a encarou aflito, o medo o dominando. O que essa louca pretendia fazer?!
Com isso ela se voltou novamente para a beira do abismo, rindo novamente, agora de forma alegre.
— Estou só brincando, é claro. Nossos objetivos afinal são os mesmos, não são? — ela perguntou tranquilamente. Dizendo isso, ela abriu suas enormes e majestosas asas ao máximo, agitando-as ansiosamente ao redor do abismo.
Estava pronta.
“Um mundo de bondade, uh...” — pensou com graça.
Oh, isso definitivamente seria divertido.
— Não se preocupem com mais nada agora. Farei o meu trabalho como o prometido. E eu realmente estava esperando por isso...
...Está na hora de acabar com toda essa tola esperança. 
         E, com essas palavras, ela se jogou no breu.
Chara estava a caminho.
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Capítulo 3: Uma grande família
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Ela os seguiu até chegar em longos corredores de um forte violeta, que parecia uma cor padrão para as Ruínas. Quando alcançaram o fim, ficaram em frente à uma enorme porta da mesma cor. Mesmo fechada, conseguia sentir a brisa gelada que vinha do outro lado e, por estar apenas com um simples vestido, não conseguiu evitar de se abraçar por culpa do frio. Toriel notou seu desconforto, franzindo o cenho.
— Não podemos deixar você sair assim! — exclamou indignada, se agachando de frente para Frisk. Ela então encostou a palma da mão na testa da menina, que repentinamente começou a se sentir mais quente por dentro.
— O que você fez? — a menina perguntou impressionada, percebendo que já não sentia mais tanto o frio como antes.
— Oh, eu diria que isso é uma mistura de magia de cura com magia de fogo. Apenas uma forma a mais que descobri de como usar elas — respondeu, piscando um olho com graça.
— Caramba! Será que um dia consigo também fazer algo assim? — Asriel perguntou, também admirado.
— Sem pressa, querido. Tudo tem seu tempo, e você ainda deve descobrir como usar suas magias de uma maneira única sua — Toriel respondeu, sorrindo. Depois voltou a se virar para o anjo que ainda a encarava impressionada. — Bem, isso deve te ajudar a não congelar, mas ainda sentirá um pouco de frio, tirando que aos poucos ela começará a perder o efeito. O melhor mesmo é que eu te carregue, pelo menos assim não vai precisar pisar com os pés descalços. Venha, a cidade não é muito longe, não devemos demorar muito. Lá poderemos pegar algumas roupas quentes para ti!
Apesar de um pouco sem graça, Frisk se deixou ser pega. Toriel a puxou com delicadeza e a colocou em suas costas, segurando as pernas que a rodeavam pelos dois lados do corpo, enquanto os braços a abraçavam com cuidado no pescoço. O vestido definitivamente não facilitava, mas de alguma forma conseguiu se manter segura. Asriel então se colocou na frente para abrir a porta, revelando uma paisagem que deixou Frisk encantada.
Era uma imensidão de neve que se estendia para todos os lados. Havia um caminho enorme seguindo em uma única direção reta, rodeado por árvores tão grandes que a menina mal conseguia enxergar seu topo. Agora a brisa gelada lhe fazia o total sentido. Toriel estava certa, apesar de quente por dentro o vento ainda lhe dava calafrios. Mas mesmo assim não conseguia deixar de sorrir com a vista.
— Isso é lindo! Como pode haver neve no submundo? — a menina indagou, ainda maravilhada.
— O que, não vivemos apenas em cavernas! O submundo se adaptou para cada tipo de demônio, então aqueles que gostam do frio vivem por aqui. E ainda há muitos outros lugares diferentes para ver, você vai adorar! — Asriel respondeu empolgado, obviamente orgulhoso do lugar em que vivem. Toriel sorriu tristemente.
— Fizemos o nosso melhor para transformar o submundo em um lugar confortável para todos. Você logo deve encontrar o melhor lugar para ti também, minha criança. Mas por enquanto devemos ir para Snowdin, vamos conseguir algumas roupas para você lá.
— Vocês vivem nessa cidade também? — Frisk perguntou depois de já começarem a andar.
— Oh, não, vivemos no fim do submundo, perto da barreira dos anjos — Asriel respondeu, risonho. Era realmente divertido para ele ver as reações surpresas que a garota tinha com o submundo.
— Mas por que vocês moram tão distantes?
Ambos deram de ombros.
— É mais fácil para cuidar dos outros demônios e ficar de olho na barreira, só isso. Como rainha, acho que é importante — Toriel respondeu simplesmente.
Frisk acenou com a cabeça concordando, até que enfim se deu conta do que ela disse, quase se engasgando no processo.
— E-espere, rainha? Mas você não era a guardiã?!
— Mas não são as mesmas coisas? — ela perguntou, achando graça também da surpresa da menina. — Minha criança, nós não apenas simplesmente mandamos no submundo ou coisa do tipo. Nós o ajudamos a proteger a todos que aqui vivem.
Frisk ainda estava surpresa. Ela olhou para Asriel que obviamente tentava segurar o riso.
— Então você é tipo o príncipe?
— Não tipo, eu sou o príncipe. Mas é como minha mãe disse, nós somos demônios como qualquer outro aqui, não pense diferente disso. Apenas faremos de tudo para mantermos todos seguros e felizes!
Isso era completamente novo para a menina. Com os anjos, a hierarquia era extremamente rígida e nunca que alguém de baixo conseguiria ficar interagindo com os governantes assim. Ver uma rainha e um príncipe andando por aí e conversando tranquilamente com estranhos assim, além de ir pessoalmente ajudar quando alguém precisa... Isso era completamente insano.
Além disso, ela estava sendo carregada pela rainha. Pela RAINHA!
Ela sentia que nunca conseguiria parar de se surpreender neste seu novo lar.
Continuaram andando e conversando, a menina ainda um tanto quanto chocada com as novas informações, mas já conseguindo relaxar mais na companhia de pessoas que já se tornavam tão queridas para ela. Depois de um tempinho, passaram por uma ponte de madeira, encontrando uma pequena barraca também de madeira logo em seguida.
— Papyrus? Você está aí? — Toriel perguntou, olhando para dentro da barraca. Estava vazia.
— V-vocês estão procurando a-alguém? — Frisk perguntou, já começando a bater os dentes com o frio. Como previsto, a magia que a mantinha aquecida aos poucos começava a perder o efeito, mas ela tentava não demonstrar seu desconforto. Porém Toriel notou, a olhando com preocupação.
— Sim, este é o posto de um amigo nosso. Depois de mostrar que realmente era esforçado e o quanto desejava se juntar a guarda real, eu o deixei entrar e então o coloquei como vigia aqui. E é estranho, ele realmente leva o trabalho a sério...
— Oh, parece que vocês estão em uma situação bem osso, hein — disse uma voz próxima, assustando os três. Ao olharem para cima, notaram a presença de uma quarta pessoa que se encontrava sentada de forma relaxada em cima do telhado do posto, os observando com graça.
A aparência era completamente diferente dos outros dois demônios. Enquanto Toriel e Asriel pareciam com duas cabras, este era feito apenas de ossos, sendo um esqueleto vivo. Mas, apesar de ser feito de ossos, de alguma forma sua face conseguia demonstrar expressões perfeitamente bem, além dele piscar e fazer qualquer outra coisa que um rosto normal fazia, o que era bizarro e ao mesmo tempo curioso. Ele usava uma jaqueta azul com um capuz branco, porém sobre uma bermuda preta e pantufas rosas, o que fez o anjo pensar que talvez ele não devesse sentir tanto frio. Seus olhos — ou seriam órbitas? — eram de uma escuridão profunda, com dois pontos brancos brilhantes que deveriam ser suas íris. Apesar da expressão que sorria com graça, ele parecia analisar o anjo com cuidado.
Frisk tinha absoluta certeza de que um segundo atrás ele não estava lá. Como foi parar em cima do telhado tão rápido sem que ninguém notasse?
— Sans! Onde está o Papyrus? — a mulher perguntou, sorrindo com carinho para o esqueleto. Pela forma que ela o olhava, pareciam ser grandes amigos. Já Asriel revirou os olhos, resmungando alguma coisa sobre comediante ou algo do tipo, mas Frisk não ouviu direito por ter sido baixo. Será que não se davam tão bem assim?
Sans desviou os olhos de Frisk, olhando também com carinho para Toriel.
— Ele queria mostrar uma nova ideia de ataque para a Undyne e me pediu para manter uma órbita por aqui — ele respondeu, ainda brincando. Então voltou a olhar para o anjo, ainda analisando-a com cuidado, apesar de manter o sorriso tranquilo. — Tori, acho que tem um anjo nas suas costas, sabe. Não é um tipo de mochila que se vê todo dia.
— Oh, essa é a Frisk. É uma longa história, mas ela é uma amiga que irá morar conosco a partir de hoje. Ela é uma boa pessoa, dou minha palavra nisso.
O esqueleto ficou alguns segundos em silêncio. Apesar de estar sorrindo, na realidade sua expressão conseguia ser bem neutra, então era difícil para a menina dizer o que ele realmente estava pensando, a deixando um pouco desconfortável. Ele então pulou do telhado e caiu no chão fofo de neve com um leve baque, pousando ao lado de Asriel. Apesar de parecer ser um pouco mais velho do que o jovem príncipe, ele era pelo menos um palmo mais baixo, o que a garota achou um pouco engraçado.
— Bem, neste caso, bem-vinda ao submundo, kiddo. Eu sou Sans, o esqueleto. Vamos, aprenda a cumprimentar um novo amigo — disse, estendendo a mão. Ela ainda estava abraçando Toriel no pescoço, mas conseguiu soltar uma para ir apertar a mão dele. Quando Asriel notou isso, franziu as sobrancelhas.
— Não Fris—
Mas era tarde demais. Quando ela apertou a mão do esqueleto, um som alto repercutiu pelo lugar, parecido com... gases?
Sans e Toriel começaram a gargalhar com a brincadeira. Asriel gemeu, desgostoso.
— Você tinha que fazer isso, não é — o jovem reclamou, fazendo com que Sans risse mais.
— Desculpe, mas a velha pegadinha da almofada de pum nunca perde a graça — ele disse ainda entre risos, piscando zombeteiro em seguida. Frisk não conseguiu evitar de rir também, apesar do riso sair estranho pelos seus dentes que batiam com o frio. Isso chamou a atenção de Toriel, que voltou a olhar com preocupação para a menina.
— Ah, caramba, eu tinha esperança que Papyrus talvez tivesse algum cobertor ou roupas no posto, mas parece estar vazio. Devemos seguir então, Frisk precisa vestir roupas quentes com urgência — ela lamentou. Sans olhou para a garota, coçando o topo da cabeça.
— Bem, esqueletos não sentem muito frio mesmo. Então, pode ficar com isso — disse, tirando seu casaco azul e entregando a Frisk, ficando com a camiseta cinza que estava usando por baixo. — Odiaria te ver congelar até os ossos.
O anjo riu, descendo das costas de Toriel para vestir a blusa. Ao colocar os pés na neve, sentiu um calafrio gelado percorrer toda a sua espinha.
— Aqui — disse ele novamente, tirando as pantufas e deixando na frente dela, agora ficando apenas de meias na neve.
— N-não p-precisa, não quero t-te deixar sem n-nada tamb-bém — ela gaguejou, se abraçando agora com a blusa que lhe caía de forma larga. O sorriso de Sans aumentou.
— Ei, não se preocupe, será apenas isso. Para tirar o resto você teria que me pagar um jantar primeiro — ele comentou divertido, fazendo com que Asriel corasse fortemente ao lado e Frisk gargalhasse com vontade, apesar de ainda sentir estar congelando.
— Sans! Olhe os modos — Toriel repreendeu, mas obviamente tentava segurar o riso também.
— Desculpe, desculpe. Mas é sério, pegue, depois que conseguir mais roupas você me devolve — disse de forma incentivadora. Frisk mais do que depressa enfiou o calçado nos pés, que surpreendentemente estava um tanto quanto quente, coisa que também tinha notado com a blusa. Como isso era possível sendo ele feito de ossos e aparentemente nem sequer sentindo muito frio, ela não sabia, mas se sentiu agradecida.
— O-obrigada — gaguejou com um sorriso. Apesar de estar melhor agasalhada, ainda iria demorar realmente para esquentar, tirando que as pernas continuavam de fora. Mas definitivamente já era uma melhora gigantesca.
— Imagine, estou à serviços. Como pode ver, sou um cara bem ocupado e que leva o trabalho a sério...
— Trabalho que na realidade é do Papyrus — Asriel murmurou, revirando novamente os olhos.
— ...Mas já está na hora do meu intervalo, então posso dar uma carona para vocês até Snowdin — ele continuou, ignorando Asriel que ainda resmungava de fundo. — É claro, só se quiserem. Eu conheço um bom atalho, sabem como é.
— Oh, isso seria ótimo — Toriel disse contente. Ambos então deram as mãos e entenderam as que estavam livres para os outros dois, com Asriel pegando a de Toriel sem muita empolgação. Frisk, curiosa como era, pegou a de Sans, ansiosa para ver o que pretendiam fazer.
E então o mundo girou.
Foi questão de segundo. O cenário, antes cheio de árvores ao fundo, agora estava rodeado por casas, com um grande pinheiro no centro do lugar que possuía vários presentes em sua base. Diversos demônios circulavam ao redor, nenhum muito surpreso com o surgimento repentino deles, continuando seus caminhos normalmente. Ainda um pouco zonza com a repentina mudança de visão, ela olhou para Toriel e Sans um tanto atordoada. O esqueleto deu de ombros.
— Eu falei que tinha um atalho — disse simplesmente, olhando-a de forma zombeteira. Asriel cambaleou até a parede de uma casa ao lado, se apoiando nela de cabeça baixa, parecendo enjoado.
— Odeio seus atalhos... — ele gemeu. Toriel, que parecia perfeitamente bem, deu umas palmadinhas solidárias nas costas do filho.
— Vamos Asri, é importante. É pelo bem de Frisk — ela comentou gentilmente.
Isso pareceu convencer a jovem cabra, que aos poucos foi voltando a se manter reto. Toriel então se voltou para a menina, que observava o novo lugar que se encontravam com interesse. Enquanto isso, Sans se mantinha ao lado dela, ninguém realmente notando ele a observando de canto com receio.
— Minha criança, tem uma loja aqui próxima, podemos comprar algumas roupas para você lá. Vamos indo?
— Espere, eu n-não quero também g-gastar o dinheiro d-de vocês a-assim — a menina comentou, ainda gaguejando um pouco. Tanto Toriel quanto Asriel sorriram.
— Não se preocupe, se você se sentir mal por isso então pode nos devolver depois, quando conseguir manter uma vida mais estável por aqui. Mas por enquanto nossa prioridade é te deixar confortável — a mulher disse, segurando o ombro dela com carinho.
— É, e de preferência com roupas do seu tamanho — Asriel brincou, se referindo ao casaco de Sans que estava obviamente largo nela. O esqueleto então também riu, puxando o capuz para cobrir a cabeça da menina.
— Não sei não, talvez não seja assim tão bom esquentar a cabeça com isso — ele respondeu com um sorriso ainda maior, fazendo com que Toriel e Frisk se acabassem de rir. Até mesmo Asriel não conseguiu segurar o riso dessa vez, apesar de obviamente ainda não gostar da sessão piadas dele.
Foram até uma loja próxima de uma coelha com pelos roxos. Ela não pareceu reconhecer que Frisk era um anjo também, então ninguém fez questão de comentar. Enquanto ia experimentando diferentes peças de roupas, Toriel se aproximou com uma mochila que estava pendurada a venda.
— Você deveria pegar uma camiseta, bermudas e chinelos também, até porque tem regiões no submundo que são bem quentes. Leve aqui nessa mochila tudo contigo até conseguir se estabilizar em algum lugar, será só por enquanto mesmo.
Frisk agradeceu, indo com ela até o caixa para que pudessem pagar tudo o que pegaram. Depois de pago, foi vestir as roupas de inverno que escolheu: uma blusa de um azul claro, com duas listras rosas no meio, unida de calças também azuis e botas de um marrom escuro. Não era sua intenção combinar com Asriel em questão das listras, mas admitia que achou engraçado. E finalmente conseguiu roupas para se manter minimamente aquecida!
Mas, depois de estar já devidamente trocada e de sair da cabine, olhou para seu antigo vestido, voltando a ficar triste. Eram mesmo muitos traumas em uma única peça de roupa. Ver os rasgos e o sangue seco escorrido pelo tecido a deixou nauseada, tanto pela visão quanto pelas memórias do momento que lhe invadiam fortemente. Foi então que notou a mão de Asriel pousar em seu ombro, virando o rosto para ele e notando que a olhava tristemente, mas ainda com o sorriso gentil no rosto.
— Pode deixar que eu cuido disso agora. Você não vai precisar mais — murmurou, delicadamente tirando a roupa de suas mãos. Ela nem sequer se mexeu, apenas observando sem palavras o vestido indo parar nas mãos dele, que o dobrou com cuidado. — Sabe, não podemos mudar o passado e nem as memórias que possuímos dele, mas... podemos sempre pensar no que vivemos no presente e no que poderemos viver ainda no futuro. Então, se você realmente tentar, pode ter e viver o melhor deste mundo aqui e agora. Só que não precisará mais tentar sozinha. Estaremos aqui com você.
Frisk ainda o encarou por alguns segundos, absorvendo suas palavras. Assim como antes, surpreendentemente Asriel parecia sempre saber a coisa certa a se dizer, novamente a deixando um tanto emocionada. Ela então sorriu docemente com isso.
— ...Obrigada — murmurou simplesmente, recebendo como resposta um aperto gentil em seu ombro e uma piscadela.
— É este sorriso que eu tanto queria voltar a colocar no seu rosto! Vamos, temos ainda muitas coisas para fazer! — disse, se empolgando já de novo. Ela não conseguiu evitar de rir com isso, se sentindo já muito mais leve.
Frisk acenou com a cabeça, concordando. Porém, ela se lembrou das outras peças de roupas que carregava e pediu para Asriel esperar enquanto ela se dirigia até o Sans para devolvê-las. O esqueleto então as vestiu de volta, como sempre de uma forma bem preguiçosa.
Ele tinha escutado a conversa dela com Asriel, mas decidiu não comentar. Até porque, não parecia ser necessário dizer qualquer outra coisa.
Além disso, ele ainda estava incerto sobre o que pensar sobre ela.
— Bem, que pena, admito que estava curtindo meu cosplay em ti — ele comentou, fazendo com que ela risse com graça.
— Mas, então, ainda não estou adequada para levar o esqueleto para um jantar? — ela perguntou, se referindo a fala dele no momento em que tinha lhe emprestado as pantufas, aproveitando essa oportunidade para seus divertidos flertes. O sorriso dele aumentou.
— Boa o suficiente, eu diria. E, depois de um convite desses, não gostaria de lhe deixar ossolitária assim — ele respondeu, ambos rindo juntos em seguida. Ao fundo foi possível ouvir Asriel xingar.
— Frisk, não o incentive!
— Desculpe, kiddo. Imagino que, para você, ouvir minhas piadas deve ser dolorosso — Sans zombou, agora todos da loja rindo com a conversa. Frisk jurava que a qualquer segundo Asriel teria um ataque.
Ela então olhou para Sans, querendo ver a reação dele com o descontentamento de Asriel para saber o que ele deveria pensar disso, a deixando surpresa com o que percebeu. Ao contrário do que imaginou, ele não apenas olhava com graça para Asriel, mas também com o mesmo carinho que olhava para Toriel. Isso fez com que a menina se sentisse ainda mais curiosa para tentar entender o relacionamento de todos ali melhor, mas sabia que ainda teria tempo para isso, então apenas tentou aproveitar o momento junto de todos. Mas uma coisa ela tinha mesmo certeza agora: os demônios eram definitivamente todos uma grande família de fato.
E ela estava tão feliz. Tão feliz em saber que existia um mundo que ia além de mentiras e julgamentos, de pura hierarquia e preconceitos. Parecia um sonho, só que era real.
Mas só seria ideal mesmo se fossem todos livres. E era para isso que ela lutaria.
    Mas pobre Frisk.
Mesmo depois de todas as injustiças que passou. Mesmo depois de perder as asas da forma mais brutal o possível. Mesmo depois de jogarem-na fora como um lixo.
...Mesmo depois de tudo, ainda tinha uma visão iludida do mundo.
Ainda tinha esperança.
Determinação.
        ...Mal ela sabia o quão vingativos os anjos poderiam realmente ser.
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Capítulo 2: A verdade
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Asriel e Frisk andavam lentamente por corredores acabados. Pelo o que a pequena cabra tinha contado, aquele lugar era chamado de Ruínas, o que fazia muito sentido ao considerar a ambientação destruída. Enquanto andavam, iam conversando baixinho entre si, ambos ainda um pouco tímidos. Porém, mesmo ambos falando baixo, era possível escutar suas vozes ecoando pelo espaço vazio.
— Eu estava colhendo flores quando a encontrei — ele explicava enquanto a puxava levemente pela mão para o interior do submundo. Mesmo apreensiva, ela o seguia sem se queixar. — As mesmas que haviam amortecido sua queda, sabe.
— Então foram as flores que me salvaram? — ela perguntou, lembrando-se da cama de flores em que estivera deitada até conhecer Asriel. Ela estava tão terrivelmente angustiada que nem tinha prestado atenção ao seu redor naquela hora. Mas, pensando agora, conseguia se lembrar bem de ter visto aquelas lindas pétalas douradas com o seu sangue a escorrer por elas, se sentindo mal por tê-las deixado em tal pobre estado.
— Sim, foram! Não apenas as flores, mas o submundo inteiro nos protege de alguma forma. Apesar de ser meio claustrofóbico aqui em baixo, é um lugar que nos acolheu quando estávamos mais desamparados. Se estamos vivos até hoje, é porque o submundo cuidou de nós!
— Entendo... — a menina murmurou, triste. Se os anjos não tivessem os expulsados da superfície, eles não precisariam depender deste lugar para sobreviverem. Asriel talvez não entendesse por ter nascido e crescido ali, mas o submundo nada mais era do que uma prisão. Porém, ao mesmo tempo era reconfortante pensar que o lugar cuidava deles, de alguma forma.
Estava tão perdida em pensamentos que não notou que ele continuava a falar, mais do que rapidamente voltando sua atenção para a conversa.
— ...e então eu te vi cair. Eu realmente me assustei na hora, sabe? Mesmo com as flores para amortecer, a queda era realmente muito grande. Mas eu já deveria ter imaginado que o submundo iria te proteger também!
— Mas... por que ele salvaria alguém como eu? — ela indagou sem o encarar. Ele então parou, a olhando com confusão.
— E por que não te salvaria?
— Porque... eu sou um deles — disse por fim, encarando os próprios pés. Asriel se remexeu no lugar, inquieto.
— Como assim “um deles”?
Ela agora o encarou, ainda hesitante.
— Um deles... Um anjo.
Asriel franziu o cenho para, logo em seguida, arregalar os olhos de surpresa.
— Espere, você é um anjo!?
Agora quem franzia o cenho era ela, confusa.
— Você cuidou dos ferimentos de minhas asas e mesmo assim não percebeu?
— E-eu não tinha ligado uma coisa com a outra! É-é claro que eu sabia que você não era um demônio, m-mas achei que pudesse ser alguma outra espécie da superfície o-ou algo do tipo...
— Outra espécie? O que eu poderia ser, uma planta? — ela indagou, rindo de forma sem graça. Ele enrubesceu fortemente, extremamente constrangido.
— É que... eu nunca tinha imaginado um anjo sem suas asas... — murmurou em voz baixa.
Imediatamente se arrependeu de suas palavras ao ver a expressão de Frisk. Sua face se encheu de dor, com ela voltando a encarar o chão, consternada.
— D-d-desculpe!! N-não foi isso o que eu quis dizer! É s-só que—
— Está tudo bem — o interrompeu com um sorriso no rosto que não demonstrava alegria alguma. — Eu também não conheço nenhum outro anjo assim. Provavelmente eu já não tenho mais o direito de me chamar dessa forma.
— Não diga isso! — ele exclamou, segurando o rosto da morena e a obrigando a encará-lo. Os olhos do rapaz estavam cheios de lágrimas, que ele a todo custo se segurava para não derramar. — Isso não é verdade! Não são asas que determinarão quem você é, e sim você mesma!
— Eu mesma... — ela repetiu para absorver suas palavras, engolindo em seco. — Mas o que eu mesma poderia fazer agora se não me restou mais nada?
Ele então sorriu carinhosamente.
— Viver. Você ainda pode viver.
Ela o fitou enquanto absorvia mais suas palavras, sem saber como reagir. Em toda sua vida, jamais alguém sugeriu algo assim para ela, sendo uma novidade que ela não sabia o que pensar.
— Você... gostaria que eu vivesse? — ela sussurrou, insegura.
Mas que pergunta boba. Eles mal se conheciam, por que Asriel iria querer algo assim?
Não sabia se queria realmente escutar a resposta.
Porém, o sorriso do demônio apenas aumentou.
— Mas é claro! Somos amigos agora, não somos?
— Amigos... — ela repetiu, olhos também começando a ficarem marejados pelas lágrimas, o sorriso gentil voltando para sua face. — ...Sim. Somos amigos.            
Ele apertou sua mão, transmitindo confiança. A menina enxugou o rosto com a outra mão livre, ainda sem tirar o sorriso.
Vendo Asriel, definitivamente havia esperanças para um mundo de bondade.
Ele voltou a puxá-la pela mão, rindo.
— Mas eu realmente deveria ter adivinhado que você era um anjo! Tinham me dito já o quão bonitos eles er… — ele se interrompeu ao perceber o que acabará de dizer, corando novamente com força.
— Oh, então você me acha bonita? — ela indagou com graça. Ele virou o rosto para o outro lado, sentindo que suas bochechas iam pegar fogo.
— ...T-talvez… — murmurou por fim, fazendo com que Frisk risse. Ele era no mínimo adorável.
Mas não é como se Asriel estivesse mentindo. Com o rosto ainda pegando fogo, ele olhou de soslaio para a menina ao seu lado. Ela estava descalça, usando nada mais do que um vestido de um puro branco, agora infelizmente rasgado nas costas e manchado com seu sangue seco. Porém, isso nada abalava em sua beleza. Ela tinha uma linda pele morena que parecia até mesmo brilhar, como se uma fraca aura a envolvesse. Seus cabelos levemente ondulados caíam soltos na altura de seu queixo, sendo de um bonito castanho escuro como o chocolate mais amargo, combinando perfeitamente com o sorriso doce em seus lábios finos.
E os olhos dourados… compará-los com duas das pedras mais preciosas seria ainda pouco. Não haveriam palavras suficientes que pudessem explicar a incrível beleza deles.
— Os anjos… todos eles tem os olhos assim? — ele perguntou, ainda com um pouco de vergonha. Ela voltou a rir, achando graça de sua timidez.
— Não, claro que não. As lendas dizem que a cor de nossos olhos refletem na essência de nossas almas. A maioria dos anjos possuem olhos cinzas, mas eu sinceramente não sei o que significa. Eu nunca encontrei ninguém com a mesma cor que a minha… Não sei se isso é algo bom ou não — murmurou, pensativa no final.
— Bem, se é este o caso, sua alma então deve ser maravilhosa — ele comentou, rindo, com ela acompanhando o riso em seguida.
— Posso eu te fazer uma pergunta agora?
— Claro!
— Quantos anos você tem? — ela indagou, curiosa. Definitivamente começava a ficar cada vez mais a vontade perto de seu novo amigo.
Com o rosto ainda levemente corado, ele apenas deu de ombros.
— Eu não sei.
— Não sabe? — perguntou, surpresa. Como alguém podia não saber a própria idade?
— O tempo aqui no submundo é… estranho. Não sabemos quando é dia ou noite, muito menos as horas. Quando tentam construir um relógio, os ponteiros vão a loucura. Me disseram que no início eles até tentavam contar seguindo seus próprios relógios biológicos internos, mas com o tempo isso se mostrou impossível também por ser algo muito incerto.
— Mas e quanto aquele buraco enorme ali atrás? Vocês não conseguem montar um posto de vigia para observar pelo céu?
Ele coçou a cabeça, tentando se lembrar das explicações que os outros demônios já haviam lhe dado.
— Na verdade, aquilo ali nunca deixa de mostrar o céu noturno. Pelo o que eu saiba, os anjos nos aprisionaram aqui de uma forma que nunca mais víssemos a luz do dia.
Frisk se sentiu terrivelmente triste com o que ouviu. Privá-los da luz do dia era extremamente cruel. Asriel então sorriu, sem graça.
— Sabe, não é tão horrível assim. Eu sempre fui apaixonado pelas estrelas, então eu gosto às vezes de observar elas, por mais que talvez não sejam as reais — comentou, gentil.
Tão inocente…
— Então você não tem nem noção de sua idade? — ela perguntou, tentando voltar a animar a conversa.
— Nós passamos a separar por fases, de acordo com nossas aparências. Eu provavelmente estou na minha adolescência ainda.
— Isso é muito abrangente, não?
— Bem, é tudo o que conseguimos pensar — disse, dando novamente de ombros. — Mas e você, quantos anos tem?
— Eu tenho 17 — ela respondeu, sorrindo. — Inclusive, nós dois parecemos ter a mesma idade! Será que você não tem 17 também?
— Será? Seria muita coincidência…
— Ou o destino — ela brincou, dando uma piscadinha em seguida, como sempre uma grande flertadora. Os outros anjos não gostavam quando ela agia dessa forma, mas era tão divertido! E ficava ainda mais engraçado ao ver o rosto do pobre rapaz quase entrar em combustão.
— Asriel? Você está aqui, querido? — chamou repentinamente uma voz feminina ao fundo, fazendo as orelhas da jovem cabra se agitarem com o reconhecimento. Ele então olhou com empolgação para Frisk, a puxando até a origem da voz.
— Mãe, estou aqui! — ele exclamou alegre, virando o corredor que os separavam, revelando a nova criatura.
Assim como Asriel, esse demônio também tinha a aparência de uma cabra, porém na forma de uma mulher adulta. Ela era bem alta, usando um vestido longo de um lindo púrpura, possuindo um símbolo no meio que Frisk não reconhecia. Além disso, assim como o filho, ela possuía um olhar extremamente gentil, portando um sorriso carinhoso na face. Porém, quando avistou a menina, sua expressão mudou para uma mistura de surpresa e choque.
— ...Um anjo! — exclamou de olhos arregalados.
A mulher sabia o quão terríveis eles poderiam ser e, vendo um agora ao lado de seu filho dessa forma... essa era definitivamente uma visão que ela não estava esperando e que não sabia o que pensar.
Contudo, olhando para aqueles lindos olhos dourados da menina, não conseguiu enxergar nada além de inocência e bondade.
— N-não, espere! — o menino começou a balbuciar, desespero repentino tomando conta de si. — E-ela não é má, é sério! Ela é minha amiga!
A mulher analisou o pequeno anjo que segurava fortemente a mão de seu filho. A morena a olhava com receio, mas, ao mesmo tempo, com determinação clara na face. O demônio então sorriu, se abaixando para poder encará-la de frente.
— Qual é o seu nome, minha criança?
— É Frisk, senhora... — ela respondeu, hesitante.
— Oh, é um nome bonito — comentou, sendo surpreendentemente a mesma fala de Asriel. — Eu sou Toriel, a guardiã do submundo. Frisk, você se importa se eu te perguntar o que faz aqui? Por favor, é importante.
Frisk engoliu em seco, nervosa. Assim como com Asriel, a menina não sentia maldade na velha mulher, mas não queria particularmente ter que falar sobre o que aconteceu. Era doloroso demais lembrar. Porém, se teria que viver a partir dali com os demônios, precisava confiar neles e encarar seu novo futuro. Por isso, mesmo que se sentindo ainda um tanto desconfortável, Frisk começou a contar sua história. Asriel, que ainda não tinha escutado nada daquilo, ouvia tudo chocado, lágrimas já subindo em seus olhos novamente, como sempre sendo muito emotivo. Já Toriel era uma pessoa bem controlada e experiente, então escutava a história pacientemente, mas sem conseguir evitar a tristeza em seu olhar.
Depois que a garota terminou, alguns segundos de silêncio se instauraram no lugar. Após ter escutado tantas informações, Toriel precisava tomar uma decisão. Respirando fundo, ela sorriu gentilmente para o anjo.
— Eu não consigo nem imaginar o quanto você deve ter sofrido, minha criança. E eu sei que pode parecer estranho para você, considerando a opinião que os anjos possuem sobre nós, mas eu quero que saiba que poderá viver conosco aqui sem problema nenhum. Somos todos uma família, afinal.
Uma família.
Isso era completamente insano. Frisk estava lutando pela segunda chance dos demônios, acreditando que poderia deixá-los bons, mas aparentemente isso nunca foi necessário. Eles pareciam já naturalmente bondosos. Mas, então, por que tudo isso aconteceu com eles? O que eles fizeram para merecerem serem castigados em um destino tão cruel? A menina se sentia perdida, sem saber exatamente no que acreditar.
Teriam os anjos realmente a enganado então? Mas, se foi... por quê?
Uma vida rodeada de mentiras. Inúmeros sentimentos começaram a lhe invadir, a deixando atordoada. Teve então de respirar fundo, tentando clarear a mente.
— Eu... eu realmente estou confusa agora — disse sinceramente, engolindo em seco. Mas ainda assim sorriu, olhando para as duas gentis criaturas a sua frente com firmeza. — Porém, meu objetivo não mudou. Eu só quero que todos possam viver juntos e em paz. Então... eu amaria poder ficar ao lado de vocês — falou por fim. Ainda se sentia tensa, seus pensamentos um tanto quando conflituosos, mas precisava continuar.
Precisava ser determinada.
Ambos devolveram o sorriso, aliviados. Dando as mãos para os dois, Frisk os seguiu pelas profundezas das Ruínas.
Este seria apenas o começo.
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Capítulo 1: O castigo do anjo pecador
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“Dor... tanta dor...”
Frisk lentamente abre os olhos, enxergando de forma embaçada o céu noturno através de um enorme buraco em um nível bem mais acima, brindando-a com visão majestosa das estrelas, apesar de tão distantes. Suas lembranças vinham devagar, ela sem conseguir se mexer direito por conta da enorme dor que sentia. Conforme as memórias chegavam, seus olhos de um magnífico dourado iam se arregalando com terror, virando aos poucos a cabeça para o lado para poder confirmar seus temores. Frisk rezava, no fundo de sua alma, que tudo não tivesse passado de um pesadelo. Mas, ao checar por cima de seu ombro, teve certeza.
Suas asas. Elas sumiram.
Não. Elas foram arrancadas.
Sentia as lágrimas escorrerem pelo seu rosto e soluços escaparem por seus lábios finos. Seu corpo tremia, imediatamente se sentindo terrivelmente com frio e extremamente exposta, fracamente levantando seus braços para abraçar a si mesma, deitando em uma posição fetal.
As asas são o que compõe os anjos. Sem elas, não eram nada. Nem sequer poderiam dizer que existiam.
Agora não passava de uma casca vazia.
Ficou um tempo ainda ali, largada aos soluços. Tinha vontade de gritar, de sair correndo sem direção, apenas para ver se conseguiria fugir daquele pesadelo. Mas ficou ali, deitada, apenas a chorar. Não conseguia se mexer direito pela gigantesca dor que sentia em suas costas e, agora, sofria também ao sentir sua alma se partir com seu desespero.
Até que avistou uma criatura que começava a se aproximar. Com isso arfou, olhos enfim se arregalando ao máximo, o medo pelo desconhecido crescendo cada vez mais. Ela estava tão aflita com sua condição física que acabou por se esquecer de todos os outros acontecimentos.
Frisk se encontrava agora no submundo. Fora abandonada por todos e fadada a sobreviver entre os demônios.
Sua respiração começou a sair pesada, o pavor tomando completamente conta de si. Sem suas asas, jamais conseguiria se defender. Com todos esses sentimentos angustiantes, palavras que ela ao todo custo havia refutado começaram a voltar a sua mente para lhe atormentar.
“Os demônios são criaturas vis. Eles eram o mal do mundo, mas, com a intervenção divina dos anjos, eles foram expulsos para seu devido lugar”, disse uma vez seu pai para a menina. Ela apenas havia o encarado, seus olhos dourados brilhando em determinação.
“Isso pode até ser verdade, mas nós podemos mudar eles! Não importa o quão mal eles tenham sido, todos merecem mais uma chance! Eu acredito que até mesmo as criaturas mais vis podem ser boas se realmente tentarem!”, Frisk lembrou de ter respondido com um enorme sorriso no rosto, esperança clara na sua face. Seu pai sempre a olhara de forma dura, aparentemente a vendo como uma decepção, mas dessa vez o olhar dele a havia chocado, desfazendo totalmente seu sorriso para uma expressão horrorizada.
Ele a olhara com tal desgosto que era quase como se ela estivesse contaminada de alguma forma.
Ela então falou com outros anjos, acreditando que pelo menos alguém pensaria como ela. Conversou com sua mãe, seu irmão, com anjos aleatórios que encontrava... todos a encararam com o mesmíssimo olhar de repulsa.
Até que foi denunciada e acusada de heresia.
Ninguém a defendeu. Ninguém tentou sequer ver seu lado. Durante todo o julgamento, sua família via tudo de forma impassível. Todos, com seus olhos de um profundo cinza como o céu mais nublado, apenas assistiam o veredicto a declarar culpada e suas asas serem cruelmente arrancadas. Já praticamente sem consciência pela profunda dor que sentiu, foi jogada nos confins do submundo sem piedade. Lembrava-se muito bem que sua última visão fora a de seus conhecidos dando as costas e indo embora.
Não se importavam com uma traidora.
E eis que chegou a situação atual. Agora, ao ver a criatura se aproximar, sentia o seu pecado rastejar em suas costas maltratadas. Mas, mesmo assim... mesmo com toda a dor física e psicológica, mesmo com toda a tristeza e desespero... mesmo assim ela não conseguia se arrepender. Seu gentil coração verdadeiramente mantinha as esperanças. Ela só queria que todos vivessem juntos e em paz, mas sem suas asas estava indefesa e nada poderia mudar no mundo se morresse ali.
Ela engoliu em seco, fechando os olhos com força, as lágrimas ainda escorrendo pela face. Os passos então pararam ao seu lado, deixando o corpo da menina tenso enquanto esperava o que quer que estivesse para acontecer. Foi então que sentiu o toque no seu ombro, fazendo-a gritar e se rastejar com força para longe, sentindo o coração na boca com o seu pavor. Imediatamente se arrependeu, arquejando e se encolhendo com a enorme dor em suas costas que veio em seguida.
— V-você está bem?! — perguntou a criatura, tendo dado uns passos para trás pelo susto que levou com a repentina ação da menina. Recompondo a compostura, ele voltou a se aproximar com passos hesitantes. — E-eu vi você caindo e fiquei preocupado...
A morena respirou fundo várias vezes, tentando aliviar a dor e ao mesmo tempo se acalmar. Ainda encolhida pelo esforço que fez, ela encarou de canto a criatura, a enxergando bem pela primeira vez. Nunca entraram em detalhes quanto a aparência dos demônios para ela, mas definitivamente Frisk não esperava encontrar alguém assim tão… diferente.
Ele era um menino, porém sua aparência era a de uma pequena cabra, com pelos brancos cobrindo todo o seu corpo. Ele vestia uma camiseta verde com várias listras amarelas, além de uma calça marrom terra. Portava uma expressão decidida no rosto, mas era possível ver suas mãos tremerem.
Ele estava com medo dela. Mas, se ainda tentava se aproximar, era porque queria realmente ajudar.
Isso definitivamente não batia com o que tinham lhe ensinado sobre os demônios.
— S-se estiver ferida, eu posso ajudar... — ele murmurou, ainda se aproximando lentamente, a olhando com hesitação.
Frisk estava chocada. A criatura era jovem, talvez tivessem até a mesma idade, porém isso não importa quando se trata de gentileza. Na verdade, ele parecia ter realmente uma personalidade bondosa, o que não fazia o menor sentido. Seria ele uma exceção entre os terríveis demônios que tanto tinha ouvido falar?
Vendo isso, mesmo com tanta dor, ela não conseguiu evitar de sorrir.
— E-eu... — começou a murmurar roucamente, tentando evitar demonstrar toda a dor que realmente sentia — ...e-eu estou bem... E-eu...
Mas, mesmo com essas palavras, as lágrimas ainda escorriam.
Doía tanto...
Ele então se agachou ao seu lado, a encarando com genuína preocupação.
— ...Você me permite? — o menino perguntou com hesitação, tocando mais uma vez em seu ombro com gentileza. O anjo não sabia o que a pequena cabra pretendia, mas, no fundo de sua alma, sentia que poderia confiar nele.
Com um sorriso e um aceno positivo, ela o deu passagem para que a examinasse. Quando terminou de dar uma rápida conferida em sua frente, ele a virou de costas, arfando logo em seguida com o que viu.
As costas dela estavam completamente ensanguentadas, com seu vestido, antes de um branco puro, agora escarlate com seu sangue. Ele também havia sido estraçalhado atrás, de forma a exibir dois rasgos enormes e profundos em sua pele que atravessava toda sua coluna de forma cruel. Aquilo obviamente deveria ter sido causado por outra pessoa, pois era específico demais para um simples acidente.
E como ela sequer poderia dizer que estava bem em tais condições?!
— I-isso é grave!!! — ele exclamou, sua expressão tomando um ar desesperado. — N-não se preocupe, eu irei te ajudar!
E ela acreditou nele.
Com um leve brilho alaranjado envolvendo suas mãos, a pequena criatura cobriu os ferimentos com a palma virada para baixo, assumindo um semblante concentrado e ao mesmo tempo aflito, temendo que fossem ferimentos graves demais para que sua magia desse conta. Porém, para seu enorme alívio, os rasgos nas costas da menina começaram a se fechar, apesar de que em forma lenta e dolorosa. Frisk se manteve de punhos fechados e dentes cerrados, tentando evitar soltar um grito. Depois do que pareceu uma eternidade, o demônio a liberou, com ela soltando um suspiro de alívio.
— Eu consegui curar o ferimento, porém você ficou com duas terríveis cicatrizes nas costas... Eu sinto muito mesmo — ele murmurou com tristeza. Cansada pelo esforço que a cura a tomou, a menina lentamente se sentou, erguendo o braço atrás de suas costas para sentir as tais cicatrizes com seus dedos.
Então era isso. As asas realmente se foram.
Ela abaixou o braço e encarou as próprias mãos. O que ela era agora?
Foi então que viu a mão da criatura ficar sobre a sua, erguendo o rosto para encarar os olhos de um gentil castanho que ele possuía.
— Não tivemos a chance de nos conhecer ainda! Meu nome é Asriel. E o seu?
— F-Frisk...
— Frisk? É um nome bonito — ele afirmou, sorrindo com carinho. — Você deve ter passado por coisas difíceis, Frisk. Mas, se você quiser... podíamos ser amigos!
Ela o encarou novamente, embasbacada. Ele realmente se importava tanto com ela a este ponto? Tinham acabado de se conhecer! Mas, de alguma forma, ela sentia que ele estava sendo sincero com seu desejo de amizade.
Amigo... será que algum dia ela já teve realmente algum?
— Eu adoraria — respondeu por fim, um sorriso feliz e sincero em sua face.
Ela estava confusa ainda, é claro. Afinal, como poderia existir uma criatura boa no submundo, se os demônios eram tão terríveis assim?
Mas isso fez com que a esperança crescesse dentro de si. Mas não apenas isso.
Frisk estava cheia de determinação.
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palavrasinfinitas · 7 years
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CAPÍTULO II: Alguém pode dar férias para essa lunática, por favor?
— VAI ENTRAR EM COMBUSTÃO!!! — Helena gritou, sacudindo os ombros do pobre rapaz assustado. Sophia respirou fundo, cansada.
Eles estavam novamente no velho apartamento, mas, diferente de antes, estava agora com que Helena gostava de chamar de “atmosfera astral” — uma cortina de veludo (puída como tudo ali, mas ainda era bonitinha), o tapete do xamã (que nada mais era que um tapete normal que Sophia comprou em uma de suas tão queridas promoções), os incensos espirituais (era meio difícil de respirar por causa deles), entre outras coisas parecidas.
E, como sempre, Helena estava parecendo uma louca.
Era sempre a mesma coisa. E o pior de tudo é que a menina não estava fingindo, atuando de alguma forma para parecer que tinha tido uma visão; ela verdadeiramente acreditava que tinha visto algo. E, por isso, sempre ficava desesperada dessa forma.
— VOCÊ TEM QUE IR LÁ AGORA! SUA CASA DEPENDE DE VOCÊ! VAI, DEPRESSA!!!
E, como o esperado, o menino saiu correndo. Helena se encostou novamente em sua poltrona desgastada, tendo um sorriso aliviado no rosto.
— Espero que ele consiga chegar a tempo — ela murmurou, satisfeita. Sophia se aproximou, cautelosa.
— Tudo bem, deixa eu ver se eu entendi direito. Você viu através da sua leitura nas folhas de chá que a casa dele pegaria fogo?
— Estava claro! Ele teria problemas em sua casa, além de mostrar perigo com chamas! O que mais poderia ser?
— Sei lá. O gás da casa acabar e ele não conseguir criar chamas? Acender um cigarro e se queimar com o isqueiro? Os problemas em sua casa poderia ser simplesmente algum problema familiar pessoal dele, ou talvez ele queira reformar e não tenha dinheiro suficiente, vai saber  — respondeu simplesmente. Iria dizer também que a visão provavelmente é que deveria estar completamente errada como sempre, mas decidiu não estragar ainda mais com as expectativas de sua amiga, que agora a encarava com surpresa.
— Eu... não tinha pensado nessas possibilidades.
— Percebi.
— M-mas, bem, se for realmente o que eu previ, então ele vai conseguir salvar a casa! Você viu, ele também ficou preocupado, até saiu correndo para poder checar!
Sophia segurou a vontade de dar um suspiro, olhando cansada para sua amiga. Ela realmente precisava dormir, mas o dia estava sendo tão longo quanto esperava.
— Helena, eu realmente não queria acabar com suas expectativas, mas eu não creio que ele tenha saído correndo por causa de sua visão.
A ruiva bufou, como se a ideia fosse um absurdo.
— E pelo o que teria sido então?!
Dessa vez Sophia não conseguiu segurar o suspiro. Como alguém poderia ser tão inocente assim?!
— Por causa de você, Helena! Ele ficou com medo de VOCÊ!
A pequena a olhou chocada. 
— Espere, o quê?! O que eu fiz de errado?! Você fala como se eu tivesse traumatizado ele ou algo do tipo!
Sophia se aproximou, agarrando os ombros da menina que agora a encarava com confusão.
— O que você está fazendo?
— Me diga, Helena — ela dizia, enquanto começava a balançar os ombros da outra de forma intensa — se eu fizesse isso e COMEÇASSE A GRITAR ABSURDOS NO SEU OUVIDO — continuou, com sua voz aumentando cada vez mais — COMO VOCÊ REAGIRIA?
— PARA COM ISSO — a outra exclamou, empurrando sua amiga para que saísse de cima. Depois de alguns segundos, Helena a encarou horrorizada. — Espere aí. Foi assim que eu fiquei fazendo com ele?
— Acho que um pouquinho pior.
Silêncio. A ruiva olhou para baixo, ainda chocada. Teria sido realmente assim tão ruim?
— Eu só queria ajudar... — ela disse em um sussurro.
— Eu sei. Eu sei... — a outra respondeu em um sussurro também, olhando tristemente para sua amiga.
As coisas eram tão difíceis às vezes...
— Ele não vai voltar, não é? — Helena perguntou após mais um tempo em silêncio.
— Provavelmente não — a outra respondeu, sentando-se, enfim, na poltrona da frente enquanto esfregava os olhos, cansada.
— Mas ele nem pagou...
— O quê?! — Sophia exclamou, incrédula. — Você não cobrou ele?!
— Eu ia cobrar no fim, mas aí teve esse negócio da casa dele... — ela murmurou enquanto esfregava o braço, ainda olhando para baixo.
A morena teve que conter sua vontade de rir. Ela queria ficar brava, mas, olhando para a carinha triste de sua amiga, era simplesmente impossível. Rir parecia naturalmente mais adequado.
— Vem cá — chamou, rindo levemente enfim. Helena se levantou de forma arrastada, ainda sem encarar nos olhos, sentando-se no chão ao lado da poltrona de Sophia, encostando sua cabeça no joelho dela. A morena então começou a fazer cafuné em seus cabelos, em uma tentativa de consolo.
— Por que eu não consigo fazer nada certo? — a pequena perguntou em um murmuro.
— Isso é uma coisa que eu não posso te responder, Lena. Eu não tenho nenhum manual de instruções dizendo o que você deveria fazer ou não para que as suas previsões deem certo. Mas eu ainda posso fazer cafuné e ser uma ótima amiga, que tal?
Helena riu também. Era simplesmente difícil não relaxar ao lado da morena.
— Acho que isso por enquanto serve — respondeu. Depois de alguns segundos em silêncio, ela finalmente olha para Sophia, dando um sorriso leve. — Sabe, eu acho... eu acho que férias viriam realmente a calhar.
Sophia parou de fazer o cafuné, a encarando agora com surpresa.
— Jura? Então quer dizer que você topa?
— É. Praia. Uhu.
Sophia saltou do sofá, ajoelhando-se no chão para dar um abraço alegre na outra, quase a esmagando com seus longos braços. Imediatamente já começou a tagarelar sobre as milhares de coisas que elas poderiam fazer juntas lá, como sempre muito empolgada.
Parecia que o misticismo teria que esperar até o fim das férias mesmo. Mas talvez não fosse de todo o ruim, afinal. Relaxar poderia realmente fazer bem para ambas.
Ou pelo menos é o que Helena esperava.
                                                           (...)
 — Você sabe aonde eu deixei o protetor solar? — Sophia perguntou, jogando as roupas da mala para o alto em uma tentativa de encontrar o que procurava.
— Não, não sei, e acho que é a terceira vez que eu já te respondo isso. Nós podemos comprar outro lá, Sophi. Dá para você parar de bagunçar as roupas que eu levei uma vida para arrumar?
— Você só pode estar brincando! — a outra exclamou, ignorando o pedido que foi feito. — Tem noção do quanto vai custar comprar isso na própria praia? Eles vão cobrar nosso rim e ainda vai ser para uma marca vagabunda!
— Pare de exagerar. Você que é sempre complexada por preços baixos.
— Mas é claro, o dinheiro que rendemos nessa casa mal dá para nos mantermos. Eu apenas penso no futuro, só isso.
Helena suspirou, se encostando na parede enquanto abria uma lata de cerveja.
— Por favor, não fale mais de futuro perto de mim — murmurou, dando vários goles de uma vez na bebida em suas mãos. Sophia parou de remexer nas coisas, encarando a mais baixa.
— O que, temos novos tabus agora? O futuro sempre foi tudo para você.
— Mas eu aparentemente não sou nada para o futuro, tanto que o destino faz piada da minha cara. Vamos mudar de assunto, por favor?
Sophia ainda a encarou por mais alguns segundos, digerindo as coisas que acabou de ouvir. Helena realmente estava querendo esquecer toda essa história de vidente?
Parecia bom demais para ser verdade.
É claro, Sophia sempre apoiaria sua amiga, não importava no quê. Mas era fato que Helena estava acabando com sua saúde com toda essa história de futuro. Por mais que quisesse apoiar, ela não conseguia deixar de ficar preocupada... Afinal, a morena também pensava muito no futuro, mas de uma forma diferente e muito mais realista.
Se Helena queria esquecer isso tudo, não seria Sophia quem impediria.
— ...Certo. Vamos deixar para comprar o protetor na praia mesmo — disse por fim, virando-se para pegar as roupas que bagunçou enquanto tentava esconder o sorriso.
Não importava como, ela faria de tudo para que essa viagem desse certo.
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palavrasinfinitas · 7 years
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CAPÍTULO I: A difícil escolha entre o misticismo e a promoção de sábado
“Há muito tempo, existia uma mulher que possuía um dom muito especial. Ela conseguia ver além da mera existência humana, interpretar os movimentos do universo e enxergar os padrões que guiavam o destino de todos. Sua conexão astral e espiritual eram tão fortes, que nada mais era uma surpresa para ela; o destino e o futuro dançavam na palma de sua mão, conseguindo moldar o fluxo da vida como bem quisesse. Aqueles que queriam acreditar no inacreditável, tornaram esta mulher a sua deusa.
Porém, muitos pensaram que aquilo era errado. Achando se tratar de alguma força maligna, começaram a perseguir ela e a todos os seus seguidores. Não muito tempo depois, conseguiram captura-la, levando-a para a guilhotina. Suas últimas palavras foram —”
— “Vocês ainda irão se arrepender quando o futuro se condenar e blá blá blá” — Sophia interrompeu, olhando distraidamente pela janela. — Eu já ouvi essa história umas 500 vezes antes. Será que eu posso ir agora? Eu realmente não queria perder a promoção.
Helena respirou fundo, frustrada. Estavam no velho apartamento de três cômodos das duas, um lugar barato e praticamente caindo aos pedaços, com alguns poucos móveis espalhados aqui e ali. Cruzando os braços, Helena se encostou contra sua poltrona já puída, encarando sua melhor amiga com irritação.
— Tenho quase certeza que ela não falou “blá blá blá”. Você precisa levar essa história mais a sério, ela pode ser essencial para entendermos tudo! Até porque, o que é mais importante: sua promoção, ou me ajudar a desvendar os mistérios do misticismo que ronda o destino?
Sophia desviou os olhos da janela, voltando-os para sua amiga, pensando se deveria responder com sinceridade ou não. Por fim deu de ombros.
— Minha promoção só dura até às 09h, sendo que a loja fica meio longe daqui. Além do mais, estou morrendo de sono por você ter me arrancado da cama. Você tem noção de que horas são? Acho que o misticismo pode esperar até mais tarde.
Helena bateu com força a palma de sua mão na mesa de centro, derrubando algumas de suas cartas de tarô e uma lata de cerveja vazia da noite anterior no chão.
— Sophia, isso não é uma brincadeira! Você tem noção de quantas coisas poderíamos descobrir?! Poderíamos até sermos famosas!
— Olha — a menina começou a dizer, já se levantando de sua poltrona também puída — eu não me importo de te ajudar, de verdade. Mas estamos nessa já faz quantas semanas? E não chegamos a lugar nenhum. Eu já deixei de fazer muitas atividades da faculdade por conta disso, sabia?
— Mas vai valer a pena! Se conseguirmos pelo menos—
— EI, DÁ PARA VOCÊS FICAREM QUIETAS?! — o vizinho interrompeu, sua voz atravessando as paredes gastas do apartamento. — SÃO CINCO DA MANHÃ AINDA, ESTAMOS QUERENDO DORMIR!
As duas encararam a parede com a tinta descascada, surpresas com a voz repentina do vizinho. Depois de alguns segundos tensos, Helena suspirou.
— Tudo bem. Vamos lá atrás da sua promoção.
                                                         (...)
 Helena encarava o nada enquanto aguardava Sophia terminar de encher o carrinho da loja de forma empolgada. As duas eram bem diferentes fisicamente; Helena era baixinha, com o cabelo tingido de vermelho com a raiz castanha já surgindo, tendo uma pele clara e cheia de sardas, além de olhos escuros não muito interessantes. Já Sophia era alta, de pele morena e cabelos curtos e encaracolados, possuindo olhos ainda mais escuros que os de sua amiga, nada muito especial. Não era atoa que as pessoas costumavam chama-las de Tom e Jerry, coisa que irritava Helena profundamente. Óbvio que seria ela o ratinho.
Estava tão distraída em pensamentos que não notou que Sophia estava tentando falar alguma coisa.
— E então? — a morena voltou a perguntar, levantando uma sobrancelha.
— Hã... mas é claro — Helena chutou uma resposta, forçando um sorriso. A outra suspirou.
— Entre o azul e o amarelo, você me diz “claro”. Você está mesmo bem?
A jovem mordeu o lábio, encarando o carrinho já cheio.
— Eu acho que só estou... cansada.
— Bem, eu também estou, até porque estamos há horas acordadas. Por que não damos uma pausa nesse seu “plano espiritual” todo? Eu sei que é importante para você, mas está acabando com sua saúde.
— Você não entende, Sophia. As pessoas veem isso tudo como uma piada... elas ME veem como uma piada. Eu quero provar que elas estão erradas!
— ...Você jamais seria uma piada para mim — Sophia disse, largando os produtos para segurar os ombros de sua amiga. — Eu sempre vou te apoiar, Helena, mas eu me preocupo contigo. Você está deixando de viver por causa disso.
Helena olhou para baixo, sem graça. Por fim sorriu, voltando a encarar a mais alta.
— Acho que eu tenho uma amiga boa demais — brincou. Sophia riu, passando o braço por cima do ombro da mais baixa.
— Está na hora de esfriarmos a cabeça já. Que tal investirmos naquela viagem que eu tanto te mostrei?
— Aquela para a praia? Não sei não... Teríamos que usar todas as nossas economias nisso, sendo que você tem a sua faculdade e o trabalho...
— Relaxa — Sophia disse, balançando a mão de forma despreocupada. — Eu me viro. Agora vamos pensar em você. E então?
Helena observou o sorriso empolgado da outra, sem conseguir conter a risada.
— Eu vou pensar — disse por fim. Sua amiga fez um beicinho triste.
— Bem, você pensar já é um progresso. Mas eu ainda acho que realmente deveríamos descansar um pouco nessa viagem.
— E eu acho que prefiro este.
— Este o quê? — Sophia perguntou com confusão, seguindo com o olhar para onde Helena apontava. — Oh, sim, o amarelo, tinha me esquecido. Eu acho que prefiro este também.
— Não se preocupe, Sophi, eu estou ótima. Vai, vamos continuar suas compras, ainda temos um dia longo pela frente.
— Temos? Hoje é sábado, então estou bem tranquila do trabalho e da facu — a morena murmurou, distraída ainda com a peça amarela em suas mãos.
— E aí é que está a diferença entre nós duas. Eu nunca paro, nem mesmo de sábado! — Helena comentou já mais alegre, chamando a atenção de Sophia, que olhava agora desconfiada para ela.
— Não me diga que...
— É. Eu arranjei um cliente para essa tarde, ele quer que eu leia seu futuro! Não é incrível?
Helena estava começando a ficar tão empolgada que não notou o esforço que Sophia fazia para manter o sorriso.
Seria definitivamente um longo dia...
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palavrasinfinitas · 7 years
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Capítulo I - A pequena covarde
Frisk olhou para baixo, não conseguindo ver absolutamente nada. 
A mais profunda e negra escuridão.
Engoliu em seco. Mesmo com 14 anos, sempre fora covarde e tinha consciência disso. No orfanato, as crianças arranjam todos os tipos de insetos – os mais asquerosos possíveis, diga-se por passagem – para esconderem em suas roupas, pulam do meio de arbustos para lhe assustar, trancam-na no quarto depois de retirarem a lâmpada e trancarem as janelas, entre muitas outras coisas. Por isso, sua vida sempre fora puro terror.
Mas não mais. Frisk se cansou de viver na base do medo. Para tentar superar sua covardia, ela resolveu ir ao local que mais temia de todos: o topo do Monte Ebott. Na escola, aprendeu que os humanos e os monstros haviam guerreado, mas, no fim, os humanos saíram vitoriosos. Após sua derrota, os monstros foram aprisionados no interior da montanha, vivendo no subterrâneo até os dias de hoje. A única forma de se entrar lá é pulando dentro de um enorme buraco, que se encontra exatamente onde a garota está.
Ela tremia, não conseguindo retirar os olhos do interior do monte, procurando por qualquer sinal de vida.
Nada além de escuridão.
Seus olhos começaram a acumular lágrimas. Não se sentia mais corajosa – pelo contrário, queria sair correndo dali o mais rápido possível.
Ela não havia percebido, mas dois garotos que viviam juntos com ela no orfanato tinham-na seguido. Com sorrisos travessos no rosto, começaram a se aproximar lentamente, tomando cuidado para que ela não percebesse. Quando estavam próximos o suficiente, os dois se prepararam e, após um sinal de mãos, berraram:
 – BUH!
Frisk gritou, aterrorizada. No susto seu pé escorregou e ela caiu para trás. De repente, já não sentia peso nenhum, apenas o vento batendo em suas costas, percebendo com horror que estava despencando no vazio da montanha. Conseguia escutar os outros dois gritando por seu nome, mas não era capaz de fazer mais nada além de berrar em desespero. Por culpa do breu não havia enxergado o chão, então o alcançou antes de perceber.
E, depois, mais nada.
(...)
- FRISK! RESPONDE, CARA!
- E agora?! A dona vai nos matar!
- Você consegue ver ela?!
- Não! Está muito escuro!
- Isso não faz nem sentido! A queda não parece ser tão grande assim, como pode ter esse breu lá dentro?!
- Sei lá! Deve ser coisa dos monstros... Uh, peraí, vou buscar uma lanterna!
- Pega uma para mim também!
Frisk acordou meio zonza, não se recordando imediatamente do que havia acontecido. Tentou abrir os olhos, mas continuava não enxergando nada. Quando começou a escutar os garotos acima, foi que as lembranças lhe voltaram.
Ela começou a gritar.
- E-ei, o que foi?! O que está acontecendo?! Você está bem?! – perguntava o garoto que havia ficado, mas Frisk estava tão aterrorizada que não notou suas perguntas. Aos poucos ela parou de gritar e tudo o que o menino conseguia escutar eram seus soluços.
Cerca de meia hora depois seu companheiro chega com as lanternas e várias pilhas.
- Você pediu por ajuda? – perguntou o outro, apreensivo.
- N-não tive coragem... Por culpa nossa ela caiu aí, a dona ia brigar com a gente...
- Mas, CARA, como diabos vamos tirar ela dali?!
- D-deve ter outro caminho! Não é possível que essa seja a única entrada...
- Mas você conhece as lendas, ninguém jamais saiu...– murmurou pesadamente. Os dois engoliram em seco, ficando por alguns segundos em silêncio. – D-de qualquer forma, vamos tentar ver se ela está bem. Me passe uma das lanternas – pediu, melancólico. Após arrumarem as pilhas, ligaram e apontaram para baixo. O que viram foi um chão coberto de flores negras e, acima dessas flores, estava Frisk encolhida, sem mover um único músculo. Provavelmente as flores haviam amortecido sua queda, pois, em geral, ela parecia bem.
- F-Frisk! Olhe para cima!
- Não adianta, ela não escuta! Ali, pegue aquilo! – disse, apontando para um graveto no chão. – Tente atacar perto dela para chamar-lhe atenção!
- Você está doido?! E se eu acertar ela?!
- Olha o tamanho do lugar, você não é tão bom assim de mira! É só para ela perceber a gente aqui!
Ele atacou, acertando-lhe a canela, criando um pequeno corte no local. Frisk pulou e berrou de susto, olhando para todos os lados por pensar se tratar de algum monstro. Após alguns segundos ela olhou para cima e os avistou.
- Cara, como você consegue tal feito? Olha o tamanho do lugar e você me acerta ela!
- T-ta, desculpe! O importante é que agora ela está nos vendo, não é? EI, FRISK, ESTÁ TUDO BEM? – gritou para dentro do buraco, ignorando o olhar exasperado do outro. Lentamente Frisk movimenta sua cabeça em sinal positivo. – Ah, ok, que bom! Uh, você está vendo alguma coisa aí?
Ela olhou para os lados, mas tudo o que viu foi pura escuridão. Recomeçou a chorar.
- P-para de chorar, você é uma covarde mesmo, hein! Aqui, pegue! – falou, lançando sua lanterna e meia dúzia de pilhas lá dentro, que também tiveram a queda amortecida pelas flores negras. Frisk estava com receio de enfiar a mão no meio delas, mas, visto que não havia acontecido nada quando havia caído, acabou por tomar coragem para tatear entre suas pétalas, pegando a lanterna e as pilhas em seguida. Ao ligá-la, rodeou sua luz pelas paredes, até que percebeu uma entrada. Lançou a luz para dentro dela, mas não conseguiu ver nada além de mais escuridão. - T-tem uma entrada aqui! N-não consigo ver o q-que tem dentro dela! – gritou de forma gaguejada para os garotos no topo do monte, conseguindo soltar a voz por fim. Eles se olharam nervosamente. - Hã, acho melhor não entrar... Deve ser lá que os monstros vivem...– disse um deles com voz fraca, sem perceber o quão aterrorizantes suas palavras soaram para Frisk. Ela tremia da cabeça aos pés, fazendo com que a pequena luz de sua lanterna dançasse nas paredes. – A-ah, não se preocupe! Nós dois vamos chamar ajuda lá no orfanato, tenho certeza que alguém vai conseguir te resgatar! Frisk os encarou horrorizada. Eles iriam deixá-la sozinha mesmo? – Não! Não me deixem sozinha aqui, por favor! Fique pelo menos um de vocês... – sua voz ia diminuindo gradativamente, pois logo percebeu que não adiantava pedir. Eles também estavam aterrorizados. - N-não se preocupe, nós já voltamos! Vai ser rápido, prometemos! – disse o outro, para em seguida sair correndo do local junto com seu companheiro. Frisk caiu de joelhos sobre as flores, ainda olhando para onde eles estavam segundos atrás. Apesar de sempre mexerem com ela, não esperava que fossem abandoná-la assim. Afinal, viviam juntos há anos! Como puderam fazer isso? Além disso, a culpa dela estar ali era deles! Não era? Ela encarou suas mãos, uma ainda segurando a pequena lanterna de forma trêmula. Mesmo que quisesse os culpar, ela não conseguiria, simplesmente não fazia parte de sua natureza tal ato. Ao invés disso, tudo o que conseguia pensar é que, se não tivesse sido egoísta por querer ser mais corajosa, nada disso estaria acontecendo. Estava tão distraída em pensamentos deprimentes que não percebeu qualquer movimento a sua volta. Pelo menos até sentir um toque no seu ombro. Deu um pulo para trás, girando o feixe da lanterna desesperadamente pelo local. Nada. Ela sentia o ar lhe escapando pelos pulmões, o desespero não permitindo que respirasse direito. Colocou a mão no peito e tentou respirar fundo, em uma tentativa fútil de se acalmar. Não percebeu a raiz lhe envolvendo o tornozelo até que a puxasse com tudo. Sentia seu corpo sendo arrastado em uma velocidade surpreendente pelo áspero chão frio do lugar, e sem perceber soltou a lanterna. Suas mãos tentavam agarrar qualquer coisa, mas tal ação apenas fez com que suas unhas se quebrassem dolorosamente, esfolando os dedos e os deixando em carne viva, que, junto com os diversos outros cortes que se abriam pelo corpo, deixavam rastros de sangue pelo caminho. Seu grito era angustiante e, graças ao eco do local, ele poderia ser ouvido a uma enorme distância. A raiz a puxou pela entrada, mas ela conseguiu agarrar a tempo o batente, sem conseguir evitar de soltar um urro pela dor que sentiu pelos seus dedos maltratados. Por alguns segundos ocorreu uma prova de força, até que a raiz apertou ainda mais forte seu tornozelo, em uma tentativa de fazer com que ela soltasse. Este foi o máximo da pobre garota, chegando quase a desmaiar de tanta dor, com a sensação de que seu osso se partiria em dois, já não sentindo mais o pé. Por fim o inevitável aconteceu, ela não aguentou mais e, já sem forças, soltou o batente, sendo arrastada para dentro da escuridão. Enquanto desciam a montanha, os dois garotos ouviram seu grito, fazendo com que congelassem imediatamente. Após uma longa entreolhada, eles voltaram ao topo do Monte... ...mas, quando apontaram a luz lá dentro, tudo o que viram foi a lanterna abandonada e o rastro de sangue.
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palavrasinfinitas · 7 years
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Sinopse: GloomTale
Gloom: melancolia, tristeza, obscuridade... Trevas.
Porém, assim como tudo, gloom também é um acrônimo. Sua outra forma de o ver, seu nome não dito: a generalização do lúrido opressivo de ordem máxima.
A guerra contra os humanos? Sim, isso foi terrível. Mas, mesmo depois de terem sido aprisionados no interior de uma montanha, os monstros continuaram unidos, sem nunca perderem a esperança.
Até que a escuridão chegou. Sendo profunda e amarga, ela provou que a esperança que todos tanto se agarravam não passava de uma piada sem graça, nada mais do que uma triste ilusão. Com ela veio o próprio apocalipse no subsolo e não havia nada que pudessem fazer. Estavam condenados.
Ou pelo menos era o que muitos achavam, mas nem todos concordavam com isso. Precisavam encontrar uma solução, tinha que ter algo que pudessem fazer! Mas foram abandonados por aquele que mais dependiam e confiavam. Assim, chegaram ao seu limite. Uma nova guerra no subsolo se deu início, fazendo com que os monstros fossem obrigados a escolher um lado e lutar contra as pessoas que lhe eram mais queridas. Não estavam mais cegos apenas pelo o gloom, mas também pela raiva e o desespero.
Até que Frisk caiu. Covarde e indefesa... Ela mudaria tudo.
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palavrasinfinitas · 8 years
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Confidência
MC estava deitada no sofá de “seu” novo apartamento, encarando o teto de forma pensativa. Estava um tanto hesitante quanto a continuar com aquela festa maluca da RFA, mas algo dentro dela dizia que deveria ficar. Não sabia muito bem que sensação era aquela, mas, por mais que sua mente gritasse dizendo que ela deveria cair fora, mais seu coração pesava.
...Coração? Definitivamente ela não deveria escutar ele.
E ainda havia Zen, para dificultar ainda mais sua vida. Ela nunca foi de julgar as pessoas antes de realmente conhecê-las, mas experiências passadas provaram que pessoas como ele não são confiáveis. Ninguém que se ama acima de todas as coisas conseguiria se importar com algo além dele mesmo.
Egoístas e manipuladores.
A  morena é a prova viva de que gente como ele seguem essas características, já que sofreu demais com este tipo de coisa. Afinal, se sua vida estava um caos hoje, era por culpa daquela certa pessoa.
MC trincou os dentes, sua visão começando a borrar com as lágrimas. Mais do que rapidamente ela se sentou, esfregando os olhos com raiva. De jeito nenhum iria sair derrubada mais uma vez. Ela decidiu seguir em frente e é isso o que faria.
De repente seu celular começou a tocar. Uma ligação? Ao pegar, viu a foto de Seven – a forma como chamam o 707 – aparecendo na tela, o que é bem estranho. Obviamente decidiu atender.
- Rrrrrrr... Rrrrrrrr... Sua conta bancária foi invadida por uma divertida pegadinha!
MC riu, divertida. De todos, Seven foi o que ela mais se identificou, estando os dois brincando o tempo inteiro entre si e com os outros membros.
E já fazia quanto tempo que ela não ria assim?
- Eu sinto muito por estragar os grandes planos malignos de Seven Zero Seven, mas eu não tenho conta bancária. Entretanto, estou aberta a doações! Tipo um trilhão de dólares, acho que isso seria perfeito!
Ele riu do outro lado da linha também – Infelizmente eu já gastei o trilhão de dólares que eu pretendia te dar com o meu último carro. E não me arrependo!
- Traição!
Continuaram brincando e rindo, apenas aproveitando o momento descontraído. Quando as brincadeiras esfriaram, repentinamente Seven solta uma risada que soou um tanto quanto forçada, fazendo MC estranhar.
- Mas, naaaah, você não precisaria de dinheiro, que eu sei! – ele brincou, fazendo ela rir novamente.
- Quem dera eu estivesse mentindo, uma conta no banco viria bem a calhar agora!
- É claro que você tem! Só é uma pena ela estar congelada, não?
Silêncio.
Ele suspirou – Eu não estava brincando quando disse que investiguei você, precisava ter certeza de que se tratava de alguém de confiança. E, sinceramente, eu ainda não sei responder isso muito bem.
MC engoliu em seco, olhos arregalados encarando o nada – Co...c-como você descobriu isso?
- Ei, não subestime minhas habilidades de hacker! Além do mais, seu rosto é bem reconhecido praticamente na América inteira. De fato, levando em consideração suas circunstâncias, Coréia é um ótimo lugar para se esconder!
- ISSO NÃO TEM GRAÇA, SEVEN! – MC gritou repentinamente, fazendo o silêncio voltar a reinar. Depois de alguns segundos tensos, ele voltou a suspirar.
- Desculpe. Hora errada para piadas.
- Sim, muito errada.
- Entretanto, não me leve a mal, não estou te ameaçando e nem nada do tipo. Pelo contrário, eu sou a última pessoa que pode realmente julgar o passado de alguém. – Ele comentou um tanto quanto melancólico, deixando a garota intrigada. Mas a situação estava tensa demais para ela se preocupar com isso – Eu só apenas fiquei curioso para saber o que levou uma pessoa nessa sua situação a entrar na RFA.
MC ficou tanto tempo em silêncio que Seven começou a achar que ela nem estava mais na linha. Quando ele estava prestes a desligar, foi possível escutar um soluço vindo da morena, pegando ele de surpresa. – E-eu... eu também não sei. Para ser bem sincera, eu n-não sei nem o que eu devo fazer com a minha vida. Q-quando esse incidente da RFA aconteceu, eu... eu só achei que... bem...
- ... achou que...?
Ela fungou – E-eu achei... que o destino finalmente fez algo bom para mim. Sabe, eu deixei de acreditar em qualquer tipo de força maior desde que todas essas coisas aconteceram comigo, mas, quando eu entrei na RFA, eu senti que... era para mim estar aqui.
Seven engasgou. Ele definitivamente não esperava uma resposta dessas.
- Seven, por favor, não conte quem eu sou para os outros membros, nem para V! Por favor, eu te imploro!
A voz de Seven abaixou, quase inaudível – M-mas eu tenho que contar para o V–
- Não, por favor! – Ela o cortou, falando atropeladamente – Eles não acreditarão em mim, por favor, não conte, por favor!!!
Seven ponderou. Ele havia recebido ordem direta de V para investigar a morena, e simplesmente mentir assim não era típico dele. Entretanto...
- Está bem, não vou contar. Pode não parecer, mas sou um cara religioso, e suas palavras me tocaram! Estou veeeerdadeiramente chorando por dentro, não duvide.
Ela soltou um risinho, aliviada. – Não duvido! Obrigada, Seven Zero Seven!
- Ei, não use meu codinome assim atoa! Ele é para casos especiais, como para passar trote para os outros!
- Prefere abusador de gatos?
- Eu não abuso gatos! É um absurdo Jumin me acusar de abusar a Elly! Eu só gosto de abraçar... e correr em volta... e abraçar... e correr envolta com ela nos braços...
MC gargalhou, enxugando os olhos que agora lacrimejavam de tanto rir. O clima descontraído voltou, e ficaram por mais um tempo brincando assim. No fim ele explicou que os outros membros passariam a ligar para ela, então não deveria estranhar tanto.
Seven então pigarreou – Hey, posso te fazer uma pergunta?
- Uh, acho que sim. Se bem que estou surpresa de você não saber ainda a resposta.
- Oooh, infelizmente os meus poderes de hacker não incluem invadir a mente humana. Ainda!
- Imagino!
- Mas não é nada demais, eu só queria saber o que você achou dos membros. Está se enturmando bem?
- Acho que sim... bem, pelo menos com quase todos. Eu admito que estou com um pouco de dificuldade de gostar de Zen...
- É, eu percebi pelo chat, por isso perguntei. Mas, hey, mesmo ele sendo narcisista, sexista, egocêntrico... uh, esqueci de algo? Ah, sim, convencido, presunçoso–
- Seven.
- Ah, desculpe, me empolguei – ele pigarreou novamente – Hã, bem, mesmo com tudo isso, ele é um cara legal. E, acredite se quiser, mas ele tem muita coisa em comum com você. E não apenas o óbvio, de, bem... – Mc pigarreou forçadamente, fazendo ele rir – Ok, você entendeu. Mas eu acho melhor ele mesmo te contar essas coisas, se quiser. Enfim, acho que já nos demoramos muito nessa chamada. Infelizmente parece que meu trote não funcionou muito bem, então estarei me retirando.
- Mais sorte na próxima!
- Alguém então ousa desafiar Seven Zero Seven?! O defensor da justiça jamais desistirá! Então, estou indo! Bye bye!
Após a ligação acabar, MC se levantou para tomar um banho, tentando se acalmar. Com essa conversa, ela percebeu que ainda estava emocionalmente fraca demais. Se queria realmente seguir em frente, precisaria esquecer o passado.
Deitada na banheira, sentiu toda sua tensão indo embora, e na água quente seus músculos relaxaram por completo. Bocejando, começou a refletir sobre a nova informação que acabou de receber de Seven. É claro, havia uma coisa que ela e Zen de fato tinham e muito em comum – mas isso era passado. As coisas mudaram. Mas, apesar disso, ela entendia o ponto do ruivo... Entretanto, todo o resto que o albino possuía, a garota não se identificava em nada, e reprovava absurdamente. Sua personalidade com toda a certeza refletia em um caráter horrível, e definitivamente não era alguém em que se pudesse confiar.
Teria ela se enganado?
Acabou adormecendo, e, quando deu por si, a água já estava fria. Olhando o horário no celular, notou que a madrugada já tinha avançado muito. Se espreguiçando, ela levantou e retirou a água da banheira, colocando em seguida um roupão limpo guardado no armário – de Rika, talvez? Ela não sabia dizer. Indo para o quarto, ela se jogou na cama, sentindo a maciez do colchão no corpo. Já deitada, olhou novamente o celular, se deparando com algumas mensagens de Yoosung, fazendo ela abrir um enorme sorriso.
 Yoosung ★: Você já jantou? Não pule suas refeições!
 A morena riu. A preocupação que eles tinham quanto a sua alimentação era impressionante.
 Yoosung ★: Oh, acho que você não está online. Mas espero que tenha comido bem, se alimentar é importante!
Yoosung ★: Enfim, Zen veio conversar comigo hoje.
 No mesmo instante em que ela leu isso, seu enorme sorriso caiu.
Por que diabos eles começaram a falar tanto sobre o Zen com ela?!
 Yoosung ★: Bem, espero que não esteja brava com ele... Sabe, ele é bem narcisista, mas é um cara legal, e realmente se importa com a gente!
Yoosung ★: E então, o que você acha? Tente dar uma chance!
 Ela refletiu novamente. Devia admitir que tratou ele realmente muito mal, mas suas ações foram espontâneas. Afinal, ao se deparar com uma personalidade daquelas, a ira surgiu imediatamente dentro de si. Entretanto, essa já era a segunda vez no mesmo dia que iam falar com ela sobre o astro. Se a forma como ela o tratou incomodou tanto eles, então é porque ele devia ser realmente querido.
A RFA é uma verdadeira família, aparentemente.
 MC: Não pulei minhas refeições lol.
MC: Desculpe, estou estressada com algumas coisas. Tentarei dar uma chance para ele.
MC: Obrigada pela preocupação. Espero que não esteja jogando LOLOL, você precisa dormir! Boa noite.
 Antes mesmo de bloquear o aparelho, a resposta de Yoosung chegou.
 Yoosung ★: T-T Mas eu não consigo parar, estou quase conseguindo me tornar líder da guild!
Yoosung ★: Ahem, desculpe, tentarei parar... Daqui algumas horas. Enfim, durma bem!
 Ela revirou os olhos, o sorriso voltando para o rosto. Bloqueando o aparelho, ela se acomodou na cama. Quase adormecendo, seus pensamentos rodavam lentamente sua mente.
Talvez, apenas talvez... Zen fosse realmente diferente do que pensava.
Decidiu dar a chance prometida.
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palavrasinfinitas · 8 years
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O grande narcisista
MC se acomodou no pequeno sofá do apartamento, tentando entender o porquê estava fazendo isso. Unknown disse que estava apenas tentando encontrar o dono do celular, e pediu que ela fosse até este endereço. Agora, tem algumas questões para se levar em consideração de tudo o que aconteceu. Não é que a morena não quisesse ajudar, é justamente o contrário, ela não se importa nem um pouco de ajudar o próximo. Porém, um desconhecido, que, por sinal, nem sequer se encontrava no mesmo país que ela, achou um celular perdido e decidiu procurar o dono. Não queria pedir ajuda da polícia porque sua religião dizia que ele mesmo deveria fazer algo, mas pede ajuda para uma mulher aleatória… Isso definitivamente não era confiável. Em sã consciência, MC nunca aceitaria isso, e simplesmente recomendaria que ele fosse em algum posto de polícia e deixaria isso para lá. Entretanto… ela não estava exatamente em sã consciência naquele momento.
Odiada pelo mundo inteiro, talvez até mesmo pelos deuses, não tinha onde morar e seu dinheiro estava acabando.
Ela simplesmente se deixou ir.
Por mais culpada que ela estivesse por invadir a casa de alguém daquela forma, não poderia mentir na questão de conforto, pois é de fato uma casa bem aconchegante. Considerando que ela estava completamente desamparada, talvez seguir o que ele falou tenha sido realmente para o melhor, mesmo que fosse apenas uma estádia passageira.
Enquanto pensava em possíveis desculpas para dar aos donos do apartamento do porquê ela estava lá, MC abria o aplicativo que lhe foi apresentado. Na mesma hora uma sala de chat se iniciou, com diversas mensagens chegando tão rapidamente que a deixou um pouco atordoada.
O que estava acontecendo, afinal?!
Era possível ver os nomes de usuários de cada um deles. 707, Jumin Han, Jaehee Kang, Yoosung ★, e por fim ZEN… Todos digitavam rapidamente, empolgados, parecendo que já eram bem conhecidos um do outro. Quando a notaram, o tumulto foi gigantesco. 707 aparentemente descobriu rapidamente quem ela era – o que a deixou meio nervosa, visto que sua identidade era tão facilmente descoberta. Com isso, pensou em se retirar, mas esperou para ver se ele revelaria mais alguma coisa, mas ele aparentemente estava mais interessado em brincar com os outros. Jumin parecia ser sério, até começar a falar sobre gatos, no qual sua personalidade mudava completamente, deixando-a com vontade de rir mesmo sem conhece-lo ainda. Jaehee parecia ser mais séria ainda, exigindo que ela se revelasse, deixando MC um tanto quanto nervosa, sem saber o que responder – mas ela parecia ser alguém até gentil, então aos poucos a jovem foi se acostumando. Yoosung parecia bem mais inocente, revelando de cara uma foto sua, sem perceber que a morena poderia muito bem ser alguém com más intenções, mas ela ainda assim achou fofo. E por fim havia um tal de Zen.
De todos, foi o que a MC menos gostou.
Presunçoso. Sexista. Convencido.
Narcisista.
Essa foi a opinião geral que a garota teve sobre ele – absolutamente tudo o que ela mais odeia em uma pessoa. E aparentemente ele é ator…
Que ótimo. Tudo o que MC não queria encontrar.
Logo descobriu que este aplicativo é para a realização de festas beneficentes, e o apartamento em que ela se encontrava pertencia a coordenadora da festa – e aparentemente a casa não estava sendo ocupada, o que a deixou levemente aliviada por ainda estar se sentindo culpada pela invasão. Não que este fato diminua seu “crime”, é claro.
Um tal de V entrou no chat, e então as coisas começaram a ficar realmente estranhas. Aparentemente a morena estar no apartamento não foi uma coincidência, pois uma mulher já falecida chamada Rika – a tal coordenadora da festa – planejou tudo, e era para MC substituir ela. Eles propuseram que MC se mudasse por um curto período para este mesmo apartamento em que se encontrava, e arranjasse os convidados necessários para que a festa acontecesse. Por fim perguntaram se ela topava.
Bem. Ou era isso, ou era morar na rua.
Ela topou.
E foi assim que entrou para a RFA.
Terminado o chat, ela foi para a página inicial do app. Logo, um a um dos membros foram enviando mensagens de boas-vindas, na qual ela respondia de bom-humor.
Fazia muito tempo que não conversava assim tranquilamente com alguém.
Foi então que recebeu mensagem de Zen. Ela engoliu em seco, não sabendo muito bem o que faria. Não queria ser mal-educada, mas… a simples existência dele a irritava. Sem perceber, acabou sendo seca em suas respostas, parecendo ter deixado ele um tanto quanto chateado. Ela suspirou, fechando o aplicativo e se levantando para lavar o rosto na sua “nova casa”.
Droga. Ela não foi para a Coréia para passar pela mesma coisa que passava em sua terra natal.
Já era tarde. Zen foi até a geladeira e pegou mais uma cerveja, sendo já sua terceira. Sentando na ponta do sofá, abriu o aplicativo, enviando uma mensagem privada para um de seus companheiros, Yoosung. O jovem podia ser ingênuo e só saber de jogar videogame, mas Zen gostava dele. E estava precisando conversar com alguém sobre algo que o vem incomodando.
ZEN: Hey, você acha que a MC por acaso não gostou muito de mim?
Para sua surpresa, o loiro o respondeu rapidamente.
Yoosung ★: Quê?! Claro que gostou, ela se enturmou bem aqui na RFA!
Zen amuou, dando um gole em sua cerveja. Seria apenas sua imaginação?
ZEN: Como ela age com você?
Yoosung ★: Hmm… normal, eu acho. Ela é muito simpática e uma ótima ouvinte, e sempre responde parecendo muito interessada.
Exatamente a impressão oposta que Zen teve.
ZEN: Me pergunto se eu posso ter dito algo que a ofendeu…
Yoosung ★: Nah, deve ser só imaginação sua. Mas talvez se você deixasse de ser tão narcisista, ela gostaria mais de você, haha!
ZEN: Mas o que eu posso fazer se sou perfeito? Os anjos esculpiram meu corpo a mão, não tenho culpa por isso.
Yoosung ★: … e é exatamente sobre isso que eu estou falando!
ZEN: ;;Bem, não se pode mudar quem é, da mesma forma que não se pode mudar a perfeição. Vou descansar, tenho um dia cheio amanhã.
Yoosung ★: Oh sim, o seu teste para o novo papel! Espero que dê tudo certo para você!
ZEN: Obrigado! Eu treinei muito para isso, tenho certeza que dará! Além do mais, como poderiam negar alguém tão bonito como eu?
Yoosung ★: Tão narcisista;;;
Yoosung ★: Bem, estarei aqui torcendo por ti! Tenha uma boa noite!
ZEN: Boa noite.
Zen fechou o aplicativo, terminando de virar a cerveja. Talvez não fosse uma boa ideia ingerir tanto álcool um dia antes do teste para o novo papel, mas o nervosismo faz isso com as pessoas. Além do mais, estava incomodando ele a forma como a MC o vem tratando. Talvez fosse apenas sua impressão – e ele realmente torcia para que fosse o caso – mas não queria que ela o visse como uma pessoa ruim. Está bem, ele admite, talvez tenha dado em cima dela indiretamente, mas não pensou que ela fosse se ofender ou qualquer coisa do tipo. Seria realmente o seu narcisismo que estaria a afastando?
Mas ele é perfeito! Não tem culpa por apenas falar a realidade.
Mas, ainda assim, ele queria se aproximar dela, mesmo que fosse apenas na amizade. Todos os membros da RFA é como se fossem membros de sua família, e até mesmo o Jumin ele atura por isso. Por mais afastado que ele anda, ainda assim se importa com todos eles, e é muito grato a Rika e ao V por todo o apoio que eles deram em sua vida, então aquele aplicativo com todos os seus chats são muito importantes para ele.
Decidiu tentar novamente puxar assunto com ela. Se havia algum mal-entendido entre os dois, Zen gostaria de tirar a limpo imediatamente. Quem sabe eles não conseguiriam finalmente se entender?
Decidiu fazer isso nos chats mesmo. Apesar de serem questões pessoais, ele não estava confiante o suficiente para conversar em privado com ela. Por mais incrível que ele fosse, tudo tinha limites.
Entrando, percebeu que ela estava online, para sua sorte. Respirando fundo, ele abriu o chat.
ZEN entrou na sala de chat.
… silêncio. Ela não falava nada.
Ele resolveu tomar a iniciativa. Pensou como faria isso, e decidiu ser cordial.
ZEN: Boa noite, my lady! Acordada ainda? Está bem tarde já!
Ele aguardou ansiosamente, segundos se arrastando até que, por fim, a resposta veio:
MC: Sim, não consigo dormir.
Ele analisou a resposta, ponderando suas palavras. Como deveria reagir? Deveria parecer Interessado? Deveria dar algum conselho?
Decidiu apenas ser sincero.
ZEN: Eu entendo como é isso. As noites conseguem ser bem difíceis para mim também.
Dessa vez, a demora para vir a resposta foi maior. Teria ele dito algo errado?
MC: … também sofre com pesadelos?
A pergunta o pegou desprevenido. Ele encarou as palavras aturdido, pensando se deveria concordar e assim arranjar algo em comum com ela, para, quem sabe, finalmente poderem se dar minimamente bem. Mas sentiu que deveria apenas ser honesto.
ZEN: Bem, algumas vezes eu passo a madrugada inteira lendo minhas falas e ensaiando… Mas muitas vezes meus pensamentos inquietos que me impedem de dormir. Há muito em minha mente para refletir.
MC: Problemas pessoais?
ZEN: Sim e não. Não necessariamente são problemas… mas apenas algumas coisas que ocupam minha mente.
MC: Eu… acho que entendo isso.
Continuaram conversando, e as respostas vinham cada vez mais rápidas de ambas as partes, quase naturais. Ele estava satisfeito. Será que finalmente poderiam se dar bem?
MC: Eu… passei por muitas dificuldades recentemente, e por isso ando meio estressada. Mas, mesmo que faça apenas algumas horas, até que venho me divertido bastante aqui na RFA, haha!
ZEN: Fico feliz por isso! É claro, com alguém aqui tendo a beleza esculpida pelos deuses, não tinha como ser diferente!
Mesmo sendo apenas um chat que ocorre através de palavras vazias, foi possível notar o clima mudar. O que antes parecia estar sendo algo descontraído, passou a ficar tenso, pesando cada vez mais.
MC: …
MC: … ah, sim. Beleza esculpida pelos deuses.
ZEN: Hã, sim… algum problema?;;
Após alguns segundos tensos, a resposta veio:
MC: Problema? Nenhum. Eu apenas esqueci momentaneamente o motivo de eu estar aqui, e você me lembrou. Entretanto, não espere que eu te agradeça por isso.
MC deixou a sala de chat.
ZEN: …
Zen encarou atônito o celular, ainda chocado e chateado com o que acabou de acontecer. O que ele disse demais? Será que ela realmente não gostava quando ele falava bem de si mesmo? Mas esse é quem ele é! Não é possível mudar alguém assim.
Além do mais, ele é realmente um ser maravilhoso, qual é o problema com isso?
Zen saiu do chat também, chateado. Foi até a cozinha para pegar sua quarta cerveja, mas mudou de ideia ao se lembrar do teste do dia seguinte, sabendo que precisava estar na sua melhor forma para isso, ainda mais porque ele já se sentia levemente tonto só com as três que já tomou, então não seria uma boa ideia abusar mais. Com um suspiro, o albino decidiu tomar um banho, deixando que a água gelada caísse nas suas costas enquanto apoiava as mãos na parede a sua frente, cansado.
Nada do que havia dito no chat era mentira. Sua mente realmente parecia trabalhar em um turbilhão, pensamentos inquietos invadindo violentamente, fazendo com que ele se encolhesse levemente. Ainda pensando no ultimo chat que participou com MC, ele serrou os punhos, franzindo o cenho de aflição.
Zen não estava mais interessado em tentar ter algum tipo de relacionamento profundo com ela, mas o estava incomodando demais toda essa situação. Entretanto, não iria desistir. Não importava como, mostraria para ela que ele era um cara legal e de confiança, mas principalmente um bom amigo.
E, quando o astro toma uma decisão, ele jamais volta atrás.
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