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Restos de Eva
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EVAs.f. Sigla de Etileno-Vinil-Acetato. Material sintético, macio, leve e flexível, amplamente utilizado em atividades escolares, artesanais e industriais. Evas.f. Nome próprio. Do hebraico Hawwāh, "a que dá vida", "mãe dos viventes".
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restosdeeva · 26 days ago
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Pedi demissão de uma das escolas em que trabalhava por não suportar mais o descaso com o corpo docente — e por sentir essa desvalorização na pele.
Ontem, sentei diante da responsável pelo RH para ouvir que meu pedido de redução de carga horária havia sido negado, pois “não estava de comum acordo com a instituição”. A verdade é que me designaram um número de aulas muito maior do que o previsto no meu contrato, justificando que os professores que assumiriam essas turmas haviam desistido. Ainda assim, um colega se prontificou a assumir duas das minhas turmas matutinas, o que me permitiria focar melhor nas turmas da tarde — mais exigentes em tempo e planejamento.
Solicitei oficialmente essa mudança à direção, justificando minha instabilidade emocional e mental, além do meu desejo sincero de entregar excelência no que me comprometi a fazer desde o início do ano. A resposta foi negativa.
E isso não foi um caso isolado. Desde o momento em que me pediram para “dar aula para os pais”, como forma de acalmá-los e justificar minha metodologia, venho nutrindo uma profunda insatisfação com a gestão. Mediação com pais é responsabilidade da coordenação e da direção. Como poderia eu, professora, entrar numa sala cheia de pais hostis, prontos para me criticar, e me explicar, como se fosse necessário provar minha competência?
Ontem à noite, após tomar um banho e respirar fundo, redigi o e-mail formalizando meu desligamento da instituição.
Foi nesse momento que entendi, com clareza, que não devo permanecer onde me diminuem e não valorizam meu potencial. Onde a educação é tratada como mercadoria e a escola como empresa. Isso nunca foi o verdadeiro objetivo da escola — por que, então, deveria ser aceitável no ensino privado?
Permanecer ali também me gerava o desconforto ético de estar alimentando um sistema que perpetua o status quo, no qual apenas os já privilegiados têm acesso às melhores oportunidades. Esse nunca foi o meu ideal enquanto professora — e tampouco seria por "merrecas" que eu o deixaria de lado.
Se eu pudesse deixar um conselho aos colegas que ainda permanecem lá — e que talvez estejam sofrendo como eu sofri — seria: não se permitam ocupar esse lugar de pequenez. É justamente nesse espaço que gestores e empresários se aproveitam para explorar.
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restosdeeva · 1 month ago
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"A educação é um ato político."
"Não há educação neutra. Ela ou é libertadora ou é domesticadora.” (Pedagogia do Oprimido)
A rede privada de ensino se tornou uma grande empresa, e a mercantilização da educação será a ruína da sociedade moderna.
Lecionar em uma escola particular tem me provocado inúmeros embates políticos e éticos. Quanto mais me aprofundo nesse sistema, mais acredito que ele precisa acabar. Equipes pedagógicas inteiras voltadas para a “boa experiência do usuário” — vulgo cliente, vulgo pais — negligenciam o bem-estar e a integridade de seus funcionários — vulgo professores. Somos relegados a cargas horárias mal remuneradas, sem qualquer tipo de auxílio — leia-se: sem direitos e sem o cumprimento do piso salarial da categoria — e sem sequer hora-atividade remunerada. Trabalhamos dez horas semanais a mais do que o contrato estipula, sem pagamento, esmagados pela pressão de horários irreais e por burocracias desnecessárias.
Outro lado dessa angústia reside na manutenção do status quo social. Dentro dessas salas equipadas, lotadas de alunos provenientes da elite burguesa, vislumbro o futuro da nossa nação: sujeitos ansiosos, desconectados de suas próprias realidades, preocupados em gerar mais fortunas ou, ao menos, manter as que vão herdar. Pesa-me, então, a consciência de saber que estou, de certa forma, colaborando com esse cenário. Quando, na verdade, minha intenção como educadora sempre foi fazer a diferença. Como aprendi com Freire — e como certamente não posso colocar em prática dentro de uma empresa que afirma formar sujeitos sociais, mas opera como um negócio.
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restosdeeva · 2 months ago
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Restos de Eva
Estava sentada, exausta, na sala dos professores, tomando meu café de quinta, amargo como a vida. Suspirava relembrando as aulas do dia, quando, em cima do armário dos professores, uma caixa me chama atenção. Na lateral escrito à caneta azul: restos de e.v.a; sorri porque li restos de Eva e me questionei se Eva não era uma professora exausta, e naquela caixa continha o que dela havia sobrado: retalhos de uma professora. Achei que seria um bom nome para um blog de vivências docentes e aqui estamos, alguns meses depois:
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restosdeeva · 2 months ago
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Porra!
04 de maio de 2025
São trinta alunos numa sala, janelas grandes deixam um pouco do sol vespertino entrar. Muita conversa, as crianças estão muito agitadas. É a aula depois da educação física. Rostos vermelhos e cheiro de suor infantil. Estou menstruada, e tudo que eu consigo pensar é: "pelo amor de deus, que esse dia termine logo".
A conversa sai de controle, vira bagunça. Atendo um aluno com dificuldade, enquanto outros dez levantam-se e jogam bolinhas de papel um no outro.
"Para com essa palhaçada, porra!"
Perco a paciência, a dor lateja, meu útero grita. Um palavrão no meio do quarto ano... Peço que se sentem. Todos aqueles, antes envolvidos na bagunça, agora se espantam com "porra" sendo dito pela professora.
Não consigo dar o conteúdo, os alunos não compreendem ainda a necessidade imposta de prestar atenção na aula pouco dinâmica, justamente por causa conversa paralela.
Meu útero dói.
Dia seguinte, a coordenadora me aborda: "houve uma reclamação de um pai... parece que você falou um palavrão em sala".
"Sim". suspiro. "Sim, falei".
Um pouco depois de ter tomado a advertência, volto a trabalhar. Ouço um aluno comentar com o coleguinha: "ontem meus pais brigaram por minha causa! Papai arrombou a porta do quarto que mamãe estava trancada... Eu só queria ver o filme até o final, mas mamãe queria que eu dormisse; papai me defendeu."
E o problema é, entretanto, o porra em sala de aula.
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