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#Lunão
zanicto · 5 years
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TEM QUE TER TÍTULO ESSE NEGÓCIO?
Well, well, well, here we go again. To where? I don’t know and i don’t care. 
“We demand rigidly defined areas of doubt and uncertainty.”, diriam os filósofos do Guia do Mochileiro das Galáxias, com os quais eu não discordaria uma vírgula. Mas, supondo que eu coloquei a imagem do cartaz de Luna aqui por algum motivo outro que simplesmente “ilustrar” um texto sobre absolutamente nada, falemos de Luna ou, como é mais conhecido, o grande Lunão.
Há tempos, realmente há tempos, um texto sobre Luna, este curta-metragem imortal, se fazia presente nas minhas listas de “algum dia”, “pra não esquecer”, “talvez seja interessante”, etc, etc e tals. Primeiramente porque era meu desejo discorrer sobre a produção do cartaz, como fiz aqui com outros projetos subsequentes; depois porque ao montar o making of do filme pensei que divagar sobre os agora nostálgicos momentos durante a produção cairia bem com o formato ao qual eu inevitavelmente tenho levado o troço; agora preguiçoso, porém -  como deixei bem claro no texto anterior a este - e com vontade de egocentricamente refletir sobre mim mesmo, usarei Luna apenas como ilustração de mais um texto sobre absolutamente coisa nenhuma, e de quebra já elimino um item da minha lista.
Para minha sorte - agora, na época foi só desespero - após realizarmos o filme tínhamos que produzir um dossiê do projeto, incluindo relatórios pessoais de todo o processo, com os quais eu encarecidamente encherei sua paciência agora, caro leitor, mas não se preocupe, eu irei editá-lo.
“Era sábado, os grupos estavam sendo formados. Este, especificamente, continha um produtor (Renan), um cara do som (Paulo), uma diretora de fotografia (Indrea), e um diretor (Rafael); de sobra acabaram entrando, coincidentemente, todos os (W)Victors da sala, Zanini (este que vos escreve) na assistência de direção, Villac na direção de arte e Galles na edição.
A princípio idéias pertinentes pareciam escassas, a não ser por uma que surgira portentosa como a lua cheia em uma noite de domingo (19). Genial, ela consistia em um falso documentário sobre a vida universitária de um grupo de vampiros e fora aceita com aplausos incansáveis e comemorações diversas pelos membros da equipe, que julgavam ser aquela a ideia mais brilhante que o mundo já havia presenciado. No entanto, cláusulas do regulamento da produção restringiam a confecção de obras no formato de falso documentário, obliterando por completo a tão primorosa ideia e pondo em depressão aguda todos os membros da equipe.
O novo plano de ação viria de Renan, o produtor, que em uma óbvia tentativa de assumir o controle do projeto, convenceria a todos de jogar a antiga ideia no lixo e seguir com um roteiro pronto, que este já havia redigido, muito provavelmente, meses antes, quando começara a forjar seu plano de dominação mundial.
Com o enredo basicamente estabelecido, ao menos nesta primeira versão, começou-se a decupagem das cenas, em um sábado (25/MARÇO). Houve certo lapso de compreensão mútua entre os membros da equipe, que demonstravam dificuldade de explicar e entender certos conceitos e elementos que se procurava serem inseridos no filme. Ainda no mesmo dia a equipe fora alertada, por um dos orientadores, do demasiado uso de linguagens poéticas e simbólicas.
O processo de decupagem demonstrou-se longo e tortuoso. problemas de comunicação entre a direção, fotografia e assistência, dificultavam sua confecção. Inicialmente uma decupagem bastante simplória fora redigida pelo departamento de assistência, em uma falha tentativa deste de assumir o controle narrativo do filme. À essa versão preliminar de uma pseudo decupagem foram acrescidas sugestões por parte da fotografia. A segunda versão decupagem, pode-se denominá-la também de primeira versão alternativa da decupagem, fora redigida pela direção em cima do roteiro. Revelada tardiamente apenas na data de reunião do grupo, esta versão foi rejeitada, sendo iniciada, na mesma reunião, uma nova versão da decupagem, assumindo como base as duas versões anteriores e as sugestões de toda a equipe presente. Essa, terceira, versão da decupagem já possuía a formatação correta e fora parcialmente finalizada pelo departamento de assistência posteriormente.
Em virtude da exigência de cortes e comprimento de prazos, alterações desorganizadas foram feitas a esta (4ª?) decupagem, gerando conflitos com o roteiro e com o storyboard, que havia começado seu processo de confecção.
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Os storyboards começaram a ser desenhados em uma sexta-feira (31/MARÇO) por um especialista em arte esdrúxula, conivente com a escola italiana de orientação barroco-tenebrista de Reggio Emilia. As peças, portadoras de tamanha vistosidade, foram aplaudidas incessantemente por todos aqueles que as observavam, como que uma vasta coleção de Monas Lisas sendo admiradas por um enorme bando de de turistas leigos decepcionados pelo diminuto tamanho da obra, ou algo semelhante.
Em paralelo ao processo de confecção dos storyboards a produção e, principalmente, a direção de arte buscavam por uma locação ideal às necessidades do projeto. Era requerido um escritório de grande porte, alta circulação de pessoal e baixo nível social, em suma um belo Call Center (Central de Atendimento). Em meio a essa troca constante de possibilidades e tentativas de locação, os storyboards eram alterados e redesenhados para se adequarem às mudanças, da mesma maneira eram as plantas baixas, que acabaram por suscitar novas sugestões de enquadramento e eventualmente uma nova decupagem (5ª???).
Sem um avanço nas negociações para arranjo de uma locação, optou-se pelo adiamento das gravações, e devido igualmente a outros problemas mais um adiamento sucedeu o primeiro. A produção começara a apresentar seus problemas drásticos.
Quando assistimos ao material captado, foi constatado, para o nosso desespero, que era pouco para o mínimo proposto para a disciplina. Tivemos de nos forçar a criação de novo material para preencher as lacunas de improviso.
Na segunda diária de gravação, muitas das cenas foram inventadas na hora, não só pois não tínhamos as planejado anteriormente, como o fato de estarmos confortáveis para trabalhar uns com os outros fez com a gravação fluísse com o dobro da velocidade e metade do estresse. A esse ponto eu e Renan já tínhamos assumido a direção do filme, não somente por estarmos mais inseridos no projeto criativa e fisicamente, mas principalmente porque nosso incompetente diretor havia debandado.
É assertivo afirmar que um dos maiores problemas fora relativo ao som e tudo o que o circunda. O projeto já havia perdido seu responsável de som preliminar (Paulo), contudo esse já tendia a ser substituído pela equipe de som veterana, uma espécie de terceirização da coisa. E eventualmente as capitações em set foram feitas pelo recém agregado ao grupo, Lucas. A equipe terceirizada, pode-se afirmar, apenas piorou o as coisas e em algum grau não foi responsável por mais do que a gravação das narrações da protagonista.
Na pós-produção me juntei a Renan para montamos um guia para nossos editores, e após inúmeras sessões cansativas na casa de Wictor e Renan, finalizamos o projeto."
Na correria de entregar um filme, um dossiê com mais de cem páginas e todo uma infinidade de coisas das quais eu nem sequer lembro, produzi o cartaz. Resumindo o cartaz, portanto, temos uma fotografia da atriz como base, um meteoro, uma lua, a ideia do nome do filme estar escrito na areia da praia, uma edição de cores bem hipster e uma experimentação com brushes estranhos no photoshop.
Resumindo Luna, por sua vez, temos nosso primeiro filme ou ao menos o primeiro relevante pra maioria de nós. Como é de se esperar, creio, de todos os primeiros filmes, tivemos problemas. Perdemos um diretor e um responsável de som - aparentemente, confesso que não faço a menor ideia de que seja Paulo - faltou-nos material para completar o filme e tivemos de improvisar de última hora; os responsáveis “terceirizados” pelo som simplesmente cagaram em cima do que já existia, não era necessariamente bonito antes, mas também não era um cocô; e no mais, fizemos um filme cheio de buracos e solavancos, resultado tanto na nossa inexperiência quanto dos já mencionados problemas de produção. 
Basicamente não sabíamos o que estávamos fazendo, mas nos divertimos horrores e até hoje, no que diz respeito a se fazer filmes, o processo é sempre mais interessante, prazeroso e enriquecedor do que acaba sendo o resultado. Ao menos pra mim.
Ter toda essa inexperiência que acarretou tantos problemas e dificuldades fora, no final das contas, um dos pontos mais interessantes da produção, uma vez que, sem bases referenciais propriamente estabelecidas, éramos livres e carentes de medo de ousar com o que bem nos vinha a cabeça. Estava em prática o clássico dizer do cinema que eu adoro inverter: tínhamos “uma ideia na mão e uma câmera na cabeça.” E assim se produziu Luna, um filme que, por mais incrível que ainda pareça pra mim, ganhou a tão disputada premiação interna do curso, mas também foi só isso. O que talvez diga muito sobre os filmes produzidos naquele ano, quiçá talvez em todos.
A proposta temática que foi nos dada para criação do filme, se bem me lembro, era intolerância. Luna é, por sua vez, em um grau ou outro, sobre relações interpessoais, uma relação de assédio, uma relação abuso, algo que vem da infância, algo que é do momento, todos os elementos estão ali inseridos, intérprete a linha narrativa como lhe cai melhor. Ironicamente, dentre as muitas coisas absorvidas durante a produção a que creio ter mais ecoado entre os membros da equipe, ou alguns ao menos, foi justamente a construção de relações interpessoais, não ruins como expressas no filme, mas boas, verdadeiras e duradouras, ainda que tenham existido relações de ódio em meio a estas, confesso. 
Sendo bem clichê: conheci pessoas maravilhosas, fiz amigos pra vida... e todo aquele papo sentimental com qual a maioria dos meus colegas vai concordar como o motivo de não se arrependerem de ter escolhido estudar esta bela merda, entre muitas outras coisas, que é o cinema.
Pobre Luna, coitada, só cultivou relações dolorosas, mas no final conseguiu libertar-se dos espectros que carregava ao gritar essa dor e não guardar pra si mesma. Ou ao menos essa era a ideia, eu acho. Tomar uma atitude ao invés de aceitar o mundo ao seu redor e esperar ele girar por você.
Tá virando auto-ajuda? Talvez esteja, mas grandes obras também têm sua mensagem de auto-ajuda, afinal, Lunão está aí para me provar correto. Bem, talvez uma obra um pouco maior… Neon Genesis Evangelion (Shin Seiki Evangerion, 1995-1996), por exemplo, a obra prima de Hideaki Anno. Sim, Evangelion tem camadas e camadas, mas se explicitamente personagens tentam ajudar outros personagens, expondo suas falhas e sugerindo concertos, ao ponto de fazerem um episódio inteiro sobre isso, não contaria como auto-ajuda?
Evangelion também é sobre relações interpessoais… bem, mas até aí a vida também é… enfim, o que eu estou querendo fazer aqui é criar, fracassadamente, uma ponte entre os assuntos para parar logo de falar de Luna e começar a falar de Evangelion e do que eu mais quero falar, de mim. Os norte americanos chamam isso de “segue”, pronunciando sé-gu-e, no entanto a palavra vem do italiano “segue”, que apesar da pronúncia distinta é mesma coisa que o nosso “segue”. Ou seja, é mais fácil eu simplesmente seguir pro próximo assunto.
Shinji, o protagonista perturbado de Evangelion, tem esse mesmo problema, fazer tudo ao seu redor ser sobre ele mesmo, porém é ingênuo demais pra perceber sem perceber. Numa ambição por afirmar a si próprio, ele acaba afastando o outro, ainda que anseie por aprovação e carinho. Seu equívoco, e isso é constantemente reafirmado na série pelas personagens de Misato e Asuka, é não ter iniciativa, nenhuma iniciativa, nem sequer para afirmar a si próprio e muito menos para engajar-se nas relações interpessoais que tanto almeja e tanto teme. Shinji, diferente de Luna, espera que as coisas venham até ele, prefere receber ordens do que tomar suas próprias decisões, afinal é mais fácil viver uma vida cujo peso não cai sobre suas costas.
“someone who hates themselves, will project that hate, and will then be unable to trust others.”
O ambiente que Shinji habita é certamente drástico, e as relações, senão estranhas, certamente incomuns que os demais personagens tem uns com os outros e com eles mesmos, igualmente não facilitam a situação, mas é bastante óbvio que Shinji é um personagem perturbado, um escroto de marca maior, que sim, tem seus traumas, mas que não justificam o quanto um merda, sendo bem claro, ele é. E esse é um dos fatores que o tornam um personagem tão interessante e que, justamente a outros elementos de mesma natureza, engrandecem Evangelion. 
Personagens falhos, consequentemente mais humanos, são sempre mais interessantes que personagens infalivelmente plásticos, o ponto fora da curva ou mais fora da curva ainda no protagonismo de Shinji, é o fato de que ele é puramente falho. Não há um sequer acerto em todo o arco do personagem, nem na série clássica nem nos longas-metragem sequenciais Rebuild of Evangelion (2007, 2009, 2012). Shinji é um personagem apático do início ao fim, não que ele careca de momento empáticos, mas carece de momentos simpáticos, e se Hideaki Anno não conseguiu convencer o espectador disso durante todo o decorrer de vinte e seis episódios, ele certamente conseguiu com a masturbação perturbadora do início de The End of Evangelion (1997).
“The terror that i’ll disappear. But i feel like i’ll be fine if i disappear. Why is that? 'Cause no one wants me, i'm one unwanted human being. I knew it, i’m an unwanted child. I don't matter to any one and i never have! You’re running away because you think nothing matters, aren't you? You’re afraid of screw it up, aren't you? You terrified of having people hate you, aren't you? You scared to look the weakness inside you, aren't you. Yeah, but you're no different that i am, Misato. That's right, we all share this thoughts and feelings. That's something in ours hearts that's missing, and we are terrified of it, we are anxious, and that is why we are trying to melt in to one. We are trying to fill in each other's gaps.”
Tal qual Evangelion, Luna também teve suas versões alternativas, mais uma das várias semelhanças que as duas obras não possuem. Renan Rigon, nosso excelente produtor e co-diretor de Luna, resolveu remontar o filme em uma versão de um minuto, o que em suma resultou em outro filme ao invés de uma versão resumida do mesmo, mas acho que a intenção era de fato essa, naquele ponto só queríamos esquecer que Luna, o filme, existia. Grandes, ou Cage internacionalmente, não ganhou nenhum prêmio até o momento, mas já foi exibido até mesmo no Paquistão, veja só você.
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Daqui pra frente eu poderia continuar apenas com citações. Tenho percebido que gosto de me expressar por meio delas. Tanto pra reforçar minhas verdades, quanto para expor as verdades, minhas ou do mundo, que tenho medo de expressar. Talvez eu prefira que o outro fale por mim, nesse aspecto não posso negar minhas semelhanças a Shinji, mas garanto que em grande parte gosto de usar citações porque fica pomposo e soa pretensioso, assim como é uma maneira de expor o conteúdo que tenho consumido, o que, se bem me lembro, era o propósito principal deste troço, principalmente na época em que ainda não era um memoir, ou seria uma epístola? Me deparei com esse questionamento quando uma amiga sugeriu ser interessante desenvolvermos uma relação epistolar. O termo me era familiar mas precisei pesquisar seu total significado para entender o que se estava sendo proposto. Um autor que usa muitas epístolas e muitas citações - e escreve memoirs como ninguém - é Stephen Fry, principalmente como recurso narrativo em The Hippopotamus, romance de 1994 que recebeu uma boa adaptação cinematográfica, ainda que carente da profundidade e certamente dos temperos que tem a versão textual, em 2017. Se isto que vos escrevo pode ser considerado uma epístola, um memoir, ou quiçá um artigo, eu não sei e eu não ligo.
Uma das minhas características que bastante me agrada, apesar de causar ojeriza nos demais - e talvez seja esse o motivo d'eu gostar desta - é a certeza de não ter certeza de absolutamente nada. Me permito ficar indeciso e dizer “não sei” sem titubear, na necessidade de sempre pensar mais, por vezes demasiado mais, profundamente sobre qualquer que seja a coisa. Mas talvez eu esteja apenas fugindo da responsabilidade de decisão. 
“Sometimes people use thought to not participate in life”, diria Chbosky. Não, nenhum filósofo russo, mas sim Stephen Chbosky, o autor de The Perks of Being a Wallflower e diretor de um dos meus filmes favoritos. Mas eu já falei disso em outro texto neste compilado de epístolas… memoir?... troço.
Enfim, eu sei, Charlie sabe, Chbosky sabe, Shinji sabe, Anno sabe, Luna sabe, você, caro leitor, sabe que relações interpessoais são complicadas, possua-se elas ou não, tendo-se medo de que elas deem errado ou jogando-se nelas pra ver no que vai dar, participando-se ou não, relações interpessoais são complicadas. Como diria a maravilhosa Carrie Fisher:
“...with these human beings you never know. They might not want to hurt you. They might even like you, and that would be the worst possible thing that could happen. Because what can you do with people that like you, except, of course, inevitably disappoint them? It’s very dangerous to have someone like you, because one day he’ll find that you are not the person he thought you were. He’ll end up someday having only one thing in common with you and that’ll be a shared sense of contempt and disgust for you. Of course you knew all along how foolish and worthless you were, you just hoped that if you crouched down behind yourself enough he wouldn’t see it. But one day when your guard is off-duty you see him see. You both catch you at yourself. Catch you behaving. And then you’re lost. No. You were lost all along."
Perdão, eu falei, “como diria a maravilhosa Carrie Fisher” quando na verdade deveria ter falado “como escreveria a maravilhosa Carrie Fisher e como leria maravilhosamente sua filha Billie Lourd”, que narra de maneira estupenda os trechos de poemas e epístolas do diário que Carrie escreveu durante as filmagens do primeiro Star Wars, incluso, creio que em partes, em seu último memoir, The Princess Diarist (2016).
Enfim, é complicado, é bem complicado… Mas no final das contas não seria a vida se não fosse, não é mesmo? Como diria Marvin: “loathe it or ignore it, you can't like it."
CARRIE FISHER BÔNUS
Don’t offer me love
I seek disinterest and denial
Tenderness makes my skin crawl
Understanding is vile
When you offer me happiness
You offer too much
My ideal is a long-lasting longing
For someone whom I cannot quite touch
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zanicto · 5 years
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SÓ GRAVAREI EM LOCAÇÃO E VOU PRA LÁ DE BICICLETA
Eu nem sei pra que vou escrever esse texto, não tem nada relevante nele pra ser exposto. Aliás, eu podia muito deixar isso apenas como um registro do meu diário, mas ia faltar poética, e eu tenho que publicar algo nesse troço sobre essa imagem, eu acho. Eu não sei, acho que só quero escrever sobre umas conversas que eu tive, sei lá.
Enfim, passei olhando para o retrovisor durante os pouco mais de vinte quilômetros até Caldas da Imperatriz, na esperança de não testemunhar minha bicicleta despencando do hack velho e mal posicionado sobre a tampa do portamalas. Felizmente chegamos a Caldas sem nenhum desastre e minha bicicleta, Brunhilda, pode protagonizar o filme, junto a minha cara de pau e falta de bom senso, tranquilamente.
Protagonizar o filme era apenas uma da minhas funções no projeto, já que eu  - como escrevi no meu relatório quando discorrendo sobre as funções de cada membro da equipe - “[...] que sofro de um gravíssimo caso de desvio de função, acabei primeiramente sendo designado como roteirista”. Essa minha disfunção sempre se apresentou em todos os filmes que fiz, mas até então eu tinha como justificativa a máxima de que o primeiro filme, Lunão, era o primeiro filme, e tudo subsequente a isso foram projetos individuais ou muito pequenos, sendo quase impossível que um membro da equipe não cruzasse com a função de um outro. Contudo, na atual conjuntura das coisas, depois de feito esse filme e ter trabalhado e outros dois que nada tem a ver comigo, fica bem claro que se eu estiver em um set, acabarão tendo que me creditar como assistente geral ao invés de uma função específica para a qual eu tenha sido chamado.
Mas enfim, em Sanguíneo, título que eu não escolhi para o filme cujo cartaz ilustra este texto, eu além de ter sido roteirista, protagonista e, obviamente, ter feito o cartaz, também contribuí na concepção fotográfica, arranjei boa parte dos objetos de cena, montei o filme, fiz o desenho de som e qualquer outra coisas a qual minha atenção fosse necessária. Tempos depois eu também montaria o que considero uma das duas obras primas oriundas desse projeto, o Making Of. 
Não me interprete mal, caro leitor, não é minha intenção gabar-me da quantidade de funções que assumi, bem pelo contrário, é bastante besta da minha parte assumir tantas funções, mas do meu ponto de vista é apenas óbvio que sinto prazer em fazer filmes, independente da função ou funções, aliás, quanto mais eu poder participar melhor. Acho que comecei a ver sentido nesse negócio no qual me meti. Esperança, acho que costumam chamar.
Gravamos o filme, e quando digo “gravamos” quero dizer eu, meu habitual parceiro de crimes Renan Rigon, a semideusa Débora Espit, o ícone incomparável Ariane Derner, a musa inspiradora parceira de melancolias Luiza Medeiros, e Dionathan, o cara com os equipamentos e o carro pra levar todo mundo, incluindo Brunhilda e Liada, que enfim, estavam lá em Caldas com a gente, onde o filme foi majoritariamente gravado. Mas especificamente em um hotel abandonado, o infame Hotel do Chinês, onde aparentemente costumavam acontecer raves, eventos de motocross, e mortes.
Dificuldades no transporte de bicicletas, cachorros quentes, peidos e mosquitos, foi isso que compôs a divertidíssima experiência de se gravar Sanguíneo, como a collage-art que Ariane fez, a outra obra prima oriunda desse projeto, resume bem.
Re-afirmei e descobri certas coisas com a produção desse filme. Algumas coisas relativas a fazer cinema, algumas coisas que dizem respeito as minhas capacidades, algumas coisas que são muito importantes pra mim, mas pelo ritmo em que anda esse texto e parafraseado Patti Smith em Just Kids, “If he discovered anything on his own, he kept it to himself”.
O que eu não iria descobrir nesse filme, mas sim no próximo em trabalharia e o fato de que, independente do meu envolvimento ou não na criação de um filme, meu desvio de função é real e ele tende a atacar assim que eu entro em set.
“Eu não vou trabalhar em nenhum TCC esse ano, quero me focar nos meus projetos pessoais”, todos me ouviram dizer. Não dá muito e Renão pede encarecidamente que eu, como bom coveiro que sou, tape um buraco no TCC em que ele está trabalhando. Não dá muito tempo e além desse buraco outras duas covas são reportadas necessitando de reparos. Quando eu chego no cemitério, acabo tapando uma outra cova que até então eu nem sabia da existência, também dou um reparo nas lápides, troco as flores, aparo o gramado e faço figuração em alguns velórios. Meu cargo no cemitério? Assistente geral. Fora os momentos em que, acordando as oito da manhã e indo dormir as quatro da madrugada, assumi, junto ao demais membros da equipe em set, o cargo de morto-vivo de plantão. “They're coming to get you Barbara”, e by “they” I mean o sono, que acabava levando ao desfalecimento qualquer um que recostar-se em qualquer que fosse o canto do set. 
E duas semanas depois dessa miríade de funções eu estava novamente sem cargo específico em um outro TCC, no qual caí tão por acaso quanto. Mas enfim, creio que o ponto já esteja bem explanado, então não vou me estender muito sobre esse set de mortos-vivos em específico, pois basicamente eu estava lá, fazendo o que eu tivesse que fazer, do catering a logagem, logagem essa que evoluiu de uma prancheta na cintura, pra uma fita crepe no meu braço, pra uma tabela no meu telefone, e assim manteve-se do primeiro para o segundo TCC. Veja só você, não é que esse negócio de tecnologia presta pra algo.
O que foi de fato relevante na minha experiência de set nesses dois TCCs, e que já era muito claro quando gravamos Sanguíneo na primeira metade do ano, foram as interações com os espaços e as pessoas ali presentes.
O primeiro TCC foi gravado em Jurerê Internacional e todas as idas à praia, que ficava duas quadras de distância da casa, foram marcantes, senão peculiares. No primeiro dia éramos eu e Renão, feito duas crianças ansiosas indo na praia e dando umas voltas no bairro no meio de uma chuva, e obviamente não tínhamos guarda-chuva. Depois teve a ida reflexiva e melancólica no meio da madrugada com parte da equipe, e então teve a ida na finaleira antes de irmos embora, também de madrugada. Ela foi precedida por uma pseudo festa/balada com muita, mais muita fumaça em um dos quartos, ideia de Kamila, oficialmente a fotógrafa de fumaça, posta em ação por Greg, um verdadeiro amante de redes e do nada fazer, e foi encerrada com a descoberta e o avistar de uma das luas mais bizarramente lindas que já tive o prazer de testemunhar. É uma pena que você não estava lá pra ver, caro leitor.
A locação do segundo TCC foi melhor ainda. Uma casa literalmente na beira da Lagoa da Conceição, com direito a trapiche e muito lagartear na rede. Greg que o diga. O que foi, na verdade, o motivo pra eu ter participado do TCC. Eu havia visitado a locação pra ajudar com o fotoboard e o videoboard, fiquei maravilhado e prontamente me dispus a chegar uns dias antes do resto da equipe e limpar tudo. Ou seja, tive aquele lugar mágico só pra mim, e pra nada fazer. Por um dia inteiro vivi a vida de rico aposentado com a qual tanto anseio. 
Nessa estadia estendida tive a oportunidade de descobrir várias coisas na casa, incluído bizarrices como o montinho de areia aleatório em cima de um móvel, um abajur com a lâmpada verde, um cancerzinho no chuveiro principal, um armário com tanta bebida alcoólica que o grau etílico só do cheiro daquele troço já era mais alto que muito vinho vagabundo, entre outras coisas. 
Como averiguei e organizei todos os colchões, colchonetes, travesseiros e outros aparatos de dormir da casa, acabei ajudando a organizar quem dormiria onde e com quem. O que soa irônico uma vez que eu dormi no sofá e tive que me contentar com uma almofada como travesseiro, porém, diferente de muitas pessoas, eu dormi sozinho na única coisa naquela casa que não estava mofada, assim como a almofada que utilizei, mais limpa que qualquer um dos travesseiros fedorentos disponíveis.
Não tivemos nenhuma lua mágica naquele lugar e tão pouco tivemos coragem de molhar nossos pés na Lagoa como fizemos na praia, na ocasião em que a areia estava tão gelada que ficar com os pés dentro d'água era melhor do que pisar na areia. Mas em qualquer que fosse a oportunidade estávamos na frente da casa. No trapiche, na rede, onde fosse, passávamos apreciando a vista e a brisa frente a lagoa.
O que reflete bem o ritmo do set, bem diferente da gravação em Jurerê. Enquanto lá acordávamos às oito e só íamos dormir às quatro sem conseguir gravar todos os planos do dia. Na lagoa acordávamos às oito pra ir dormir às quatro, não porque ainda estávamos gravando, isso já tinha sido encerrado muitas e muitas horas antes, mas sim porque queríamos bater papo e passar frio até altas horas da madrugada. Em específico eu Greg e Luiza, os três apertados na rede debaixo das cobertas. Não era a primeira vez que fazíamos isso e certamente não será a última, pois, e na verdade este texto é sobre isso, se perder em conversas sem rumo com pessoas maravilhosas é uma das melhores coisas desse mundo. Se divertir é uma das melhores coisas desse mundo.
“I've opted for fun in this lifetime” (de acordo com a internet, Jerry disse isso, e eu vou concordar com os dois)
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