Tumgik
#mdeeccr
sieghartarkaos-blog · 6 years
Text
Meu delírio é experiência com coisas reais
POV - Cinco de janeiro de 2018
Havia sido um dia difícil, como muitos outros eram, o quinto dia do ano que começava. Não parecia  ser nada de muito diferente do que Sieghart já estava acostumado: acordava com um nó na garganta e um peso inexplicável no peito, uma tristeza absurda. A depressão crua que, vez em quando, decidia incomodar.
Dessa vez, decidiu nem tentar sair de casa. Ficar quieto, deitado, imóvel era  o melhor que fazia. Mesmo que não fosse, nenhuma outra coisa lhe despertava qualquer sentimento senão um desânimo de defunto. Nem mesmo saiu da cama naquela manhã cinzenta. Ficou alternando entre dormir um pouco mais, acordar sobressaltado de sonhos coloridos em vermelho e cinza e sentir-se péssimo até o meio-dia. Chorou mais de uma vez, lágrimas pesadas e inexplicáveis que, dessa vez, ele conseguiu abafar com os cobertores e os travesseiros.
Os sonhos lhe amargavam a boca. Que gosto estranho ele sentia. Gosto de boca, só boca, de fome. Era como se não comesse nada a muito tempo. Como se não quisesse comer. Levantou-se somente no início da tarde, o estômago revirado pelos borrões e pelos gritos com os quais sonhara. Eles todos vinham de longe, de muito longe. Não vinham da casa mas, de alguma forma, ainda que distantes pareciam ecoar no peito do rapaz.
Só conseguiu chegar até o sofá, onde sentou-se com pesar, levando as duas mãos ao rosto molhado e cobrindo-o. Que dor que sentia lá dentro. Era como se estivesse sendo devorado vivo, de dentro pra fora. Todos os dias, noite após noite. Mas não teve tempo de chafurdar em seu marasmo depressivo antes que a tempestade o desmanchasse em imagens de sangue e de horror. Foi de repente. Sua tristeza cotidiana deu lugar a mais borrões vermelhos e a gritos mais altos, como o dos sonhos, mas enquanto o lobo estava acordado.
Tudo estava morto quando a alucinação terminou. Mas teve que ver tudo morrer primeiro. E viu. Quase sentiu o cheiro também, enquanto as lágrimas caíam sem pudor e molhavam o assoalho velho. Tinha ficado umas boas horas sentado, chorando no sofá, e já não sabia distinguir o que estava realmente lá do que o seu cérebro inventara. Ocasionalmente, o delírio dava tréguas que Sieghart não sabia se eram ou não longas, mas que enchiam seus olhos de água e embaçavam a vista que, quando recobrada, dava lugar para novas visões.
Quando as vozes calaram, o sangue estancou e os terrores cessaram, o dia pareceu se despir duma angústia insistente para toda a cidade. Não para Sieg, entretanto. Tinha certeza absoluta que tinha enlouquecido, e encarava a parede assustado, chorando interruptamente. A esquizofrenia era um agravamento comum da depressão. O desespero tomou conta de si. E, com a certeza do diagnóstico, chorou copiosamente até adormecer.
Mas o sono também não foi tranquilo. Sete minutos, apenas, foi o que conseguiu dormir. Dormir, mas sem descansar. O novo sonho lhe mostrara tudo outra vez. Quando acordou, acometido por uma certeza ainda maior de sua própria loucura, a última coisa que se lembrava de ter visto antes do despertar eram dois olhos verdes e enormes e assustados, que Sieghart reconheceria em qualquer lugar. Não conseguiu dormir depois disso.
2 notes · View notes