Tumgik
#obrdrop: invasão na rádio
luvdeathrobots · 10 months
Text
OBRDROP: invasão na rádio.
*t.w.: agressão. Clique aqui para ler a versão no Google Docs.
Tumblr media
   A rádio caiu às oito e meia por todo o castelo ao que um grito se espalhou em Ouroboros. O artífice Ren Yamamoto havia acabado de escapar da enfermaria para entender o que se passava ao redor do Salão Principal. Apesar do receio de sua namorada perante aquilo, ele não via problema algum em se esbarrar com a guarda, tirar suas dúvidas (a partir da observação) e então voltar para sua visita a Flora. Coisas simples, imaginava, que talvez respondessem metade das perguntas em sua cabeça. 
   Um rapaz loiro se aproximou com um sorriso orgulhoso, olhos bem atentos e o espaçamento perfeito entre as mãos para um aplauso. Assim como o artífice, aquela carapuça amarela e feia, como Yamamoto mesmo julgava, havia descido quase toda longa escadaria e se atentava à multidão, àquele aperto, àquela censura tão literal. Seus olhos brilhavam em admiração pelo feito do Império, de orgulho, realização ou qualquer outro sinônimo facilmente julgado como nojento. 
— Não é bonita? — Começou o loiro. Ren ignorou. — A purificação do sangue.
   A verdade era que se cada um presente no Salão Principal prestasse atenção nos detalhes, nos mínimos  possíveis, poderia sentir o cheiro incômodo, ver o vermelho atípico nos uniformes e narrar o volume coberto acima de tantas cabeças padronizadas e fardadas. Não era um desmaio ou um socorro de um corpo; era a morte presente com destino às estradas do Império, àquele cemitério tão cheio de números, mas tão vazio de almas. Pelo menos era assim que Ren pensava, via ou se sentia ao realizar o que tinha na sua frente, mesmo que longe assim em questão de tato — Nighe estava morto. Ponto final. 
   Acontece que qualquer sentimento que tivesse ali seria pequeno demais se Yamamoto pensasse nos últimos momentos de Nighe. Conhecia o desespero e a adrenalina da quase morte, mas da certeza dela, e aquilo sim o causava arrepios. Tinha a incerteza de considerar aquele ato coragem, idiotice ou libertação; acontece que no fim, independentemente do julgamento daquele oriental, nada mudaria a sentença final daqueles considerados rebeldes — seja isso considerado  injusto ou não. 
   Um riso incomodou os ouvidos de Yamamoto. De repente, a inquietude do loiro ao seu lado havia sido trocada das palmas aos risos. O artífice levou seus olhos até o julgado intrometido ao seu lado — e mal ele imaginaria que essa atenção irrelevante o daria tanta dor de cabeça para aquela noite. 
— Graças a aquele cara ali — Como se não bastasse a ousadia do aplauso, da admiração ou do riso, o “insuportável moleque” apontou para o corpo carregado na frente dos dois logo ao extremo do salão. — ... a recompensa pelos rebeldes vai ser bem maior.
   Ren suspirou. Seus olhos alcançaram o topo e ele pressionou os dedos em seus braços cruzados.
— A caça, o fogo, a guerra, tudo voltará a ocorrer. E vai ser melhor, vai ser maior... — Retomou o loiro. Seu riso aumentava. A empolgação daquela figura parecia incomparável aos demais presentes no momento. Era criminosa a forma em que pouco respeitava o acontecido. — ... Vai ser grandioso! 
   Outra vez, afastou-se. Não queria se estressar mais, mesmo que aquilo já estivesse feito. O rapaz em seu lado parecia um idiota com aquela feição, com aquela tentativa de aproximação. E quanto mais ele falava, mais ele aplaudia, mais a mente de Ren explodia. 
  — É, é isso! — Certamente era “o arrombado”, como Ren pensava. — A purificação pela prata! 
   E dali Ren Yamamoto não se aguentou: voz irritante, nariz enxerido e falas sem cabimento — seus critérios para o estresse. Tão de repente quanto a aparição daquele garoto, tão de repente era a forma que o corpo leve era arremessado contra a parede daquela escada. Se uma vez os braços de Ren se cruzavam em análise, agora se separavam para segurar tanto o rosto trêmulo em sua frente quanto a camiseta rica e engomada, cujo pingente de ouro reluzia no tecido em seu sobrenome de carreira podre: Clifford. 
— Cala a boca, porra. Não é hora de ficar vomitando besteiras, vagabundo. — Firme, a palma de Ren dobrava o vento no estalo de um tapa ao rosto pálido em sua frente. Não tinha medo de flagras, de guardas ou nada do gênero. Estava estressado não só aquela noite, mas toda a semana - e aquilo era mais que o suficiente para fazê-lo explodir. — Você não entende, imbecil? Ele pode ter sido um idiota, a porra de um sacrifício público, mas ainda era um de nós. Era gente.
   Ren puxou o loiro ao chão, aos degraus que os sustentavam, e ali manchou a calça branca com a sola de seu sapato. Era um chute, um aperto, tudo que sua raiva conseguia externalizar. Ele cuspiu ao lado no chão limpo, da mão cheia de jóias do rapaz. Os olhos do “pilantra mal fodido”, apelido aquele que Ren o dava agora, arregalavam-se no misto de surpresa e medo. Ele até tentou revidar, tentou se segurar no torso do artífice e fugir, mas nada adiantaria. Os braços de Yamamoto mantinham força suficiente para não deixá-lo sair. Era raiva, era a cabeça acumulada, era a palavra da injustiça tomando significado renovado em sua cabeça. Não havia nada no mundo que mudasse a natureza agressiva daqueles olhos, daqueles punhos, daquele peito cheio.
— Que porra é essa, cara?! — Clifford olhava para Ren incrédulo, sem muito entender; afinal, da bolha que ele vivia, poucas eram as pessoas que abriam a boca e contestavam nomes caros. — Seu filho da puta, eu não menti! Você está com eles?! Não é possível! — Tentava escapar de novo e de novo, mas em desespero escorregou a própria mão no chão. Ren, pelo contrário, não tirava os olhos dele. — O que você quer de mim?! Eu posso comprar tua família, saia de mim! 
— E eu a porra de um subsolo pra te enterrar. — O artífice refutou em tom firme, forte e alto. Yamamoto também era um sobrenome caro, por igualdade de discussão. — Quero que cale a boca. Pare de falar merda. Um cara morreu na tua frente, seu vagabundo, e o único esforço que tu faz depois de ouvir tudo é aplaudir. — Soltou-o outra vez contra as escadas, levantando-se à procura de manter superioridade. — Vê se aprende, animal imundo. Vá na porra da enfermaria. Vá para aquela porta logo ali — Apontou para os guardas que a pouco sumiam na saída. — … e entenda, seu vagabundo. Estaríamos melhor sem um imbecil como você. 
   Outro chute, outro olhar de desprezo, outro suspiro; foi assim que Ren censurou totalmente todo grunhido, grito ou pedido de socorro do outro rapaz enquanto o artífice se dirigia para caminho qualquer que não fosse seu anterior, que não tivessem mais rostos imprestáveis quanto o daquele loiro. “Saia daqui, fodido”, ele ordenou. 
   Pensando em seu mundo, em seu universo nada perfeito, talvez não fosse mais tão Yamamoto quanto sua mãe gostaria que fosse; aquele pensamento de vingança, de ódio e de desprezo imperial, tudo aquilo contrariava totalmente os ideais de sua casa. E ele não ligava. Não ligava de, aos poucos, se tornar um rebelde.  
   O quão pouco valiam as almas rebeldes, afinal, se por quase nenhum tempo respiravam ao redor daquela guarda? Quão insignificantes eram suas vidas?
O quão insignificante ele era?
0 notes
poisonhxart · 9 months
Text
#obrdrop 11: invasão à rádio.
04 de dezembro, aproximadamente 20h35.
Arianrhod é uma hipócrita, e mesmo que isso não seja um segredo entre nós, caro leitor, é um traço de sua personalidade que, no dia-a-dia, ela se importa muito em esconder; também pudera, havia sido criada dentro de um molde do qual nunca poderia escapar, então seu principal artifício era a mentira. O compilado de microexpressões, sorrisos falsos e perfeitamente calculados, até mesmo mesuras e falas que depois de tanto tempo chegam a ser praticamente automáticas, nada mais são além do que álibis. Álibis para seus desvios de comportamento, álibis para seus desvios morais. Causar uma boa impressão sempre era essencial para entrar e sair de todos os lugares dos quais precisava, especialmente na Academia, e é aqui que entra seu ardil. Usando dos artifícios acumulados por anos para conseguir entrar e sair dos lugares, ela estava fazendo naquele momento exatamente o contrário do que tinha dito para seu namorado e amigos fazerem: ela estava investigando.
Aria não era ingênua. Desde a viagem para Sulcana a terrarium sabia que algo estava errado, muito errado. Uma viagem daquele porte não era simplesmente um ato de bondade do Imperador, porque ele não era bom, e as consequências apareceram logo no primeiro dia em que estavam de volta ao castelo. Se os ventos estivessem certos, o que ela acreditava estarem, tudo o que estava por vir era destruição e naquela noite, algo tinha colaborado para isso. Era claro que Nighe era um homem morto – se não imediatamente, pelos próximos dias –, mas ela precisava de provas. Provas que não foram difíceis de conseguir ao andar pelo lado escuro dos corredores que ligavam a Enfermaria à Sala da Rádio.
Um suspiro silencioso escapou por entre os lábios dela na primeira mancha de sangue que apareceu em seu caminho. Ainda estava fresco, tudo tinha acontecido rápido demais e há minutos de menos e não duvidava da possibilidade de trombar com um guarda ali. Agradecia muito os poderes que tinha para sempre conseguir prever uma aproximação quando essa vinha por solo, por identificar passadas e nunca ser pega de surpresa, mas ainda era uma possibilidade e havia algum preço a se pagar por desejar ver as coisas com os próprios olhos, coisas como a trilha de sangue que, conforme avançava pelos corredores, ficava mais frequente.
Milhares de pensamentos passavam pela mente da garota e desde a notícia da segunda-feira anterior, ela tivera a certeza de que Ouroboros não era mais território confiável. Do mesmo jeito que ela ouvia as paredes, outras pessoas ouviam e da mesma forma que ela sabia sobre as coisas da Ordem e da rebelião como um todo, outras pessoas, do outro lado, também sabiam. Isso era perigoso, perigoso demais. Havia um cerco se fechando ao redor de pessoas como ela, pessoas que afiliadas ou não à Ordem das Sombras, participavam de maneira direta ou indireta de ações contra o Império. Yanvis IV não era um líder caprichoso qualquer, ele era um ditador e Aria sabia que uma mera crítica às suas atitudes era motivo para conhecer o mesmo caminho que Nighe havia trilhado naquela noite, assim como muitos outros antes dele.   
Puxando o ar profundamente, ela desejou acreditar um pouco mais nos deuses mortos que um dia conhecera, somente para que esses pudessem interceder por seus mártires que a cada dia eram mais numerosos. Infelizmente, não acreditava, e por não acreditar a única coisa que tinha em mãos para fazer sobre aqueles que morriam era vinga-los da mesma forma que procurava fazer por sua mãe.  Ali, naquele caso, não seria tão difícil. Por mais que não reconhecesse todas as passadas, ela reconhecia uma. Uma que a causava mais repulsa que as outras e fazia a cicatriz desaparecida em sua bochecha arder da mesma forma que tinha doído quando o dedal perfurou a pele, meses antes; uma que a irritava trombar pelo castelo, que ameaçava a estabilidade da terrarium e que a fazia lembrar especialmente de uma das leis mais antigas do continente, uma das quais nunca se esqueceria e que brilhava em letras garrafais em sua mente um belo olho por olho, dente por dente.
0 notes