reflexões quase poéticas: um diário - perdoa os erro de pt -
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Mulher #4
Minha terapeuta me disse que eu deveria escrever, relatar, botar para fora minhas opiniões e pensamentos. Diz ela que eu levo muito conteúdo relevante (não exatamente com essas palavras, mas não me lembro ao certo quais ela usou) para as nossas sessões. Então, após uma noite sem dormir eu decidi escrever sobre algo que eu tenho pensado, não sei se isso vai sair direito ou vai soar como psicodelia argumentativa.
Tenho passado muito tempo no Instagram e já havia comentado com amigas próximas incomodo com algumas tendências que tenho notado por lá. Tenho visto muitas garotas se denominando e usando nicknames, camisetas, calcinhas ou o que mais seja com palavras como "baby girl" "lolita" etc
O incomodo é que eu sou mãe. E como toda mãe, ou pelo menos boa parte, me preocupo constantemente com a cultura da pedofilia e como isso pode afetar minha filha. E além de mãe de menina sou irmã mais velha de duas garotas de 8 e 14 anos de idade. O incomodo é que as meninas que usam esses nicknames, calcinhas, adereços, camisetas etc tem a idade das minhas irmãs. O incomodo é que ninguém parece se importar. Onde estão os pais dessas meninas? Onde estão as celebridades que essas meninas idolatram para falar que elas não devem se adultilizar dessa maneira?
Eu questionava muito sobre a mensagem que as garotas mais velhas - que são famosas nesse meio e entre essas garotas - estão passando. Elas adotam exatamente a mesma performance e trejeitos de uma garota adolescente, os mesmos nicknames, camisas, calcinhas e adereços. Elas postam fotos explícitas do corpo, semi nudes, nudes, as vezes algo que remete a soft pornô ou até mais pornô que soft. E elas aderem a um discurso feminista de liberdade sexual enquanto fazem tudo isso. A verdade é: eu gosto de muitas dessas fotos - dessas garotas maiores de idade - muitas você pode enxergar com um olhar artístico, é bonito, é "tumblr". Mas a questão não é se é bonito ou não, ou se eu gosto ou deixo de gostar. É como essas fotos estão chegando para garotas mais novas, como essas fotos influenciam garotas mais novas. Então, eu conversava com uma amiga que tem proximidade com esse meio, que tem lá uma pequena grande quantidade de seguidores, e falava sobre minhas preocupações, que talvez, essas garotas estejam passando a mensagem errada, que talvez elas postem esse tipo de foto em excesso, que talvez elas devessem falar que são maiores de idade e que garotas de 13 anos não devem fazer isso em casa (nem fora dela). Chegamos, eu e ela, a conclusão de que é complicado. Essas garotas, ou melhor, mulheres não podem se responsabilizar ou serem responsabilizadas pelo seu público. A verdade é que muitas delas falam sim todas as coisas que citei. Pode ser que ainda seja irrelevante, com uma abordagem simplista, soe para tal público como um "faça o que eu digo, não o que eu faço".
Isso sem contar a regra de demanda e oferta. Digital influencer é um termo errado. Essas pessoas influenciam em nada ou quase nada a vida de seus seguidores, os seguidores é quem influenciam suas vidas. Elas devem atender a demanda do seu público ou acabar no esquecimento. Falar para garotas de 13 anos que elas deveriam largar seus celulares e ir brincar de boneca, não sair com caras mais velhos e nem sequer pensar em namorar, que elas não devem se deixar sexualizar, não devem beber, não devem fumar, devem aproveitar esse momento para serem crianças etc etc É como falar para uma parede. Uma parede que vai te vaiar de volta. É ingênuo pensar que garotas de 13 anos vão ouvir alguém, por mais que seja alguém em quem se espelham.
Não muito tempo atrás, eu era uma garota de 13 anos. E eu era exatamente como essas garotas. Estava a frente do meu tempo, como várias outras garotas que passaram por essa sexualização precoce. Comecei a namorar com 13 anos de idade, um garoto 2 ou 3 anos mais velho que eu. Não porque eu me focava em garotos mais velhos, os garotos da minha idade é quem não focavam em mim. Não foi um namoro longo (apenas em comparação com a maioria dos meus namoros até o momento) e foi bastante conturbado. Nós, eu e creio que ele também, estávamos aprendendo tudo. E nossos pais também, essa coisa de primeiro namoro é uma descoberta também para os pais, eles não nascem prontos para lidar com essas questões em relação aos filhos, tanto quanto não nascemos prontos para lidar com essas questões em relação a nós mesmos. Depois dele eu tive uma série de namorados, casos, ficantes. Em suma maioria mais velhos que eu. A verdade é que diversas vezes me falaram sobre tomar cuidado, meus pais tentaram, muitas vezes nas entrelinhas - mas sem jeito e sem sucesso - me alertar. Eu não ouvia ninguém. Acredito que nem mesmo se algum famoso que tinha certa idolatria na época falasse comigo diretamente eu teria escutado. Lembro de que, com meus 13-14 anos, fiquei com um cara de 18 e contei para minhas primas mais velhas sobre ele, elas questionaram sobre o que um rapaz de 18 anos iria querer com uma menina de 13 e minha única resposta foi "Ele é bem infantil". Ele não era. Ele fingia ser. É uma forma de atrair sua presa. Assim como "você é madura para as meninas da sua idade" e "isso é errado, mas eu gosto muito de você". Acho que já devo ter ouvido todos esses clichês de uma porção de caras diferentes. Quando eu tinha cerca de 15-16 anos eu me relacionava com um homem de 30. Ele me apresentou o livro Lolita. E eu passei pela minha fase "baby girl".
Se for parar para pensar eu não sei bem quantas vezes eu fui abusada. A verdade é que você tem que aprender a falar não. E eu não aprendi. Eu comecei a aprender bem mais tarde, mas até hoje acho que não sei direito. Lembro desse homem de 30 anos me dizendo que eu poderia recusar fazer sexo caso eu não quisesse. Isso aconteceu depois de uma "transa" mal sucedida, onde eu não queria transar - porque estava sentindo dor, porque tinha mais pessoas presentes, porque não - e só fui conseguir comunicar isso com clareza depois de uma penetração que fez a dor (que era na barriga) ficar mais forte. 4 ou 5 anos depois do início da minha vida sexual-amorosa eu estava começando a ser inserida no conceito de recusa. De que você pode dizer não, de que está tudo bem não querer transar, de que você não precisa agradar sempre seu parceiro e de que as pessoas não vão te deixar ou odiar por isso. Anos depois eu aprendi que se elas te deixarem ou odiarem por isso, então elas não valem a pena.
Contabilizo que fui estuprada 3 vezes. Não sei se psicologicamente conseguiria contabilizar mais do que isso. Ainda não consigo lembrar ou descrever com detalhes sem um desespero tomar conta de mim. Eu me sinto impotente e me pergunto como passei por isso, deixei isso acontecer, logo eu?
Eu que me considerava tão liberta sexualmente aos 13. Eu que me considerava tão feminista aos 15. Eu que era tão forte e corajosa aos 18.
Eu sou uma vítima, de uma cultura que não só sexualiza cedo nossas garotas, como não da tempo para que elas aprendam sobre sexualidade com segurança, sobre dizer sim e sobre dizer não.
Eu tive que ser uma vítima diversas vezes para começar a caminhar rumo a uma sexualidade adulta saudável. E tive que ver minhas amigas serem vítimas tantas outras vezes para aprender sobre respeito e consentimento.
É por TUDO isso que eu me sinto incomodada. Eu temo por essas garotas jovens e sinto não poder fazer absolutamente nada sobre isso, sinto que ninguém pode. Elas vão ter que aprender sozinhas e muitas vezes vão ter de ser vítimas para aprender.
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Sábado de mãe
Eu acordei hoje com minha filha me cutucando e chamando "mamãe"
Acordei e vi que a fralda tinha vazado, vazou xixi e fez uma poça do lado dela da cama. Ela dormiu e acordou na poça de xixi. Então levantei e troquei a fralda. Coloquei a última calça da minha filha - pois minha mãe disse que iria lavar as roupas essa semana e só lavou as dela e da minha irmã (uma semana todinha) - e coloquei a penúltima blusa de manga comprida. Minha filha acordou em cima de uma poça de xixi, com a calça molhada, usando regata e sem meia - porque o pai dela trocou a blusa de manga por regata durante a noite (mas não trocou a fralda, óbvio) e ajudou ela a tirar a meia - não sei como está o clima para vocês, mas por aqui tá friozinho e chuvoso, suficiente para pegar uma gripe numa dessas noites que a fralda vaza.
Por fim eu levantei, fui fumar (a primeira coisa que faço quando acordo) e deixei ela com o pai - que nesse momento, eu já não me importava nem um pouco de acordar aos socos (mas acordei colocando ela do lado p chamar "papai" e cutucar). Então quando dei por mim, já era meio-dia. A feira de sábado tava quase acabando e eu tinha combinado com a minha mãe de ir na feira levando minha filha. Então vou arrumando, eu, minha filha e chamando minha mãe. Nisso a chuva afina - o suficiente p gente sair com criança - e a gente saí. Nem 2 minutos, a feira é realmente na minha rua. Minha filha, de mochila, 2 casacos e touca, foi a sensação da feira e se divertiu. Compramos frutas, legumes etc e voltamos para casa, daí arrumar a geladeira, guardar as coisas que compramos, pensar no almoço: dar atenção p criança ao mesmo tempo, isso é de praxe p qualquer mãe, eu acho. Minha mãe lava a louça. Coloco minha filha para dormir. Ajudo minha mãe a tirar as roupas do varal. Coloco as roupas da minha filha para bater. Faço o almoço - para 4 adultos e uma criança - e só não lavo a louça de depois do almoço porque não tem onde colocar p secar, mas lavo os talheres. Então meu pai me liga, chama para ir ver minha vó. Eu falo que sim, mas já que ele vem buscar a gente, pergunto se pode fazer umas coisinhas antes de irmos, ele concorda. Aviso todo mundo - minha filha ainda dorme. Meu pai chega, começo a falar o que é para ele fazer: colocar quadro, estante, tudo que precisa de furadeira já que minha mira é péssima e meu furo saí torto. Ele faz, eu auxilio. Minha filha acorda. Minha mãe assume a dianteira nisso. Continuo a auxiliar meu pai. Coloca um, dois, três.... Enquanto auxilio arrumo a bagunça que ele deixa para trás a cada quadro que prega. E vou agilizando para sairmos, falando para minha irmã se vestir, meu marido e escolhendo a roupa que a minha filha vai usar. Terminado, todos prontos, seguimos rumo minha avó. Passamos na padaria para comprar um lanche e seguimos. Chegamos lá, divido com meu marido um come enquanto o outro olha a cria. Passamos a tarde e então voltamos. Vou para esteira - antes que fique mais tarde - e minha mãe e meu marido se dividem quanto a quem olha minha filha. No meio do processo o gato que tá preso do lado de lá, passa para o lado de cá. E eu grito porque os gato de cá não pode encontrar com o de lá se não da briga. Tiram o gato, mas nisso minha filha me nota, quer vir para o colo.... só dois minutinhos e mamãe te pega no colo. Ela se distraí, passa dois minutos, vou para o banho. Saio do banho. Coloco roupa de malhar para bater na máquina. Vou para minha filha. Ela dorme mamando. Me chama para mamar e eu vou, ela dorme. Então vou para cozinha - já passou 3 horas e preciso comer - vou chamar meu marido para ver o que ele quer de jantar, sinto um cheiro no caminho, os gato de cá miando: Sem ração, com a caixinha imunda. Falo para meu marido trocar a areia: ele diz que não, porque a diarista vem segunda. Tá fedendo, eles tão fazendo fora de tão sujo que tá, mas ele não se importa. Falo para meu marido colocar ração: ele diz que já vai - tudo dele é para depois - e nisso os gato de cá miando. Vou lá e faço eu mesma. Coloco ração, lavo as caixas de areia, porque só trocar a areia estava impraticável, corto meu dedo com água sanitária, lavo o banheiro (onde fica as caixas de areia) quase acabando e minha filha chora e chama mamãe, eu toda suja, no final do processo, sem chance. Chamo o pai dela: mando ir lá, já que estou fazendo o trabalho dele, ele faça o meu. Ele demora uns minutos, mas vai. Não adianta, ela continua chamando mamãe - as vezes, só mamãe resolve. Termino tudo correndo, me limpo e vou. Pego no colo, dou de mamar, ela dorme de novo. Eu vou comer, já passou da hora.
Dia 11/11/2017. É sábado. Eu deveria descansar.
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Mulher #3
Eu tenho uma filha.
Tenho irmãs.
Tenho mãe.
Tenho amigas.
Tenho conhecidas.
Tenho mulheres no meu cotidiano.
Tenho mulheres na minha vida.
Mulheres que eu amo com todas as minhas forças e um pouco mais.
E além disso; eu sou mulher.
O quão devastador é a notícia de uma mulher estuprada?
Não era eu. Não era minha filha. Não era minha mãe. Não eram minhas irmãs, amigas ou conhecidas. Não era alguém que eu conheça, nem sequer que eu já tenha visto alguma vez na vida.
Não era da mesma cidade, nem do mesmo estado.
Não tinha NADA em comum comigo; exceto ser mulher.
E mesmo assim eu sinto a dor.
Como se fosse eu, minha filha, minha mãe, minhas irmãs, amigas e conhecidas.
A dor dela.
A minha dor.
A dor de ser mulher.
Não foi azar dela e sorte minha
Foi azar de todas nós, mulheres.
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Mulher #2
Ser mulher
É ser incerto
E em alguns momentos
certo
das dores
De ser mulher
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Mulher #1
Um fato interessante sobre ser mulher é que a gente aguenta. A gente aguenta a imposição de gênero. A gente aguenta os assédios. A gente aguenta a pressão estética. A gente aguenta relações abusivas e de poder. A gente aguenta violência psicológica. A gente aguenta violência verbal. A gente aguenta violência física. A gente aguenta abuso. A gente aguenta estupro. A gente aguenta o abandono. A gente aguenta o aborto. A gente aguenta o parto. A gente aguenta a maternidade. E aguenta a maternidade solo também. A gente aguenta as dores. A gente aguenta ser mulher. A gente não deveria ter que aguentar. Mas a gente aguenta. Faz séculos que a gente aguenta. Eu aguento. Minha mãe aguentou antes de mim. E minha avó antes dela. A gente não precisa aguentar. Nossas filhas não precisam aguentar. Não mais e não sozinhas.
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Sem nome #1
Sabe como dizem que o ódio é ensinado? Pois é. O auto-ódio também funciona assim. Você se odeia porque aprendeu a se odiar. Você passou a vida aprendendo que cada parte do seu corpo é errada e feia. Você passou a vida aprendendo que sua personalidade é uma droga. Você passou a vida aprendendo que não era inteligente. Você passou a vida aprendendo que era doente. E as pessoas passaram a vida te ensinando isso. Uma lição constante de que você não deveria viver em sociedade. Você não deveria existir. Não é aceitável você estar ali. Não é aceitável você respirar o mesmo ar que eles. Chega um ponto que você acredita. Que você aprende. Que a lição fica na sua cabeça. É impossível de esquecer. Você não quer mais sair de casa. Você tem medo dos olhares. Tem medo das pessoas. Você se esconde. Você deixa de viver porque te ensinaram que você nem deveria estar vivo. Mas Você é tão inútil que nem consegue se matar. Em certo ponto eu comecei a pensar que o melhor seria me jogarem em um hospital psiquiátrico e me deixarem lá. Eu não tinha mais corpo Não tinha mais vida Não tinha mais sanidade Eu não tinha nada para perder. Sentia meu corpo como uma carcaça Vazio por dentro Pesado por fora A única coisa que restou foi o ódio O ódio e o medo. O ódio de mim. O medo dos outros. E Eu vago até hoje Com ódio de mim. Com medo dos outros.
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