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otropstories · 4 years
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Lady Rouge (2015) - Capítulo 2
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07:15 da manhã.
— Se não quiser pegar uma gripe brava, saia já desta janela e se adianta em se secar com uma toalha, menina!
A velha Elaine gritou para Serena, que estava observando o nascer do sol com admiração pela janela. — Anda! Anda! Está me ouvindo?! — Deu um leve tapa no traseiro da menina. — Onde será que eu pus a maldita da escova de cabelo da Lily... !? — murmurou desta vez para si, indo à procura da tal escova.
Ainda era bem cedo. Serena se lembrava de ter levantado às quatro da manhã, aproximadamente, e com insônia, pensando loucamente na mãe e em ir para o Lincoln mais depressa possível após receber o telegrama, e então conseguir abrir a porta do quarto, e fugir do orfanato onde dormia e trabalhava. E se agradecia fervorosamente por ter feito aquilo, agora que havia uma razão para tal.
Se não o tivesse feito, não teria "quase" alcançado o barco. Mas, se tivesse saído mais cedo para o cais...
O telegrama que recebera semana anterior sempre a perturbou profundamente. Gracie, sua companheira de beliche, que era órfã também, o entregara a ela - a menina trabalhava no correio para se sustentar, como entregadora. Mas aquela carta estava atrasada, cerca de cinco meses, e ela o recebeu à sete dias. Nele, havia uma mensagem que não saía mais da sua cabeça e lhe perturbava desde que o lera:
"Prezada(o) cidadão(a) inglês imigrante, morador da América, devemos informar que você está sendo notificado (a) a comparecer à capital-sede da Johansson Brothers Police, no condado de Finchley, Inglaterra, até o prazo de dois meses. Estaremos explicando a situação, que é de extrema urgência.
Informando-lhe que encontramos o corpo de Marbleize Floyd, enfermeira, trinta e cinco anos, morta por hipotermia ou possivelmente de afogamento. A vítima estava a bordo do RMS Titanic, afundado recentemente por colisão contra um iceberg, por volta da madrugada de 2:21 da manhã do dia 15 de Abril de 1912.
Pedimos a presença dos parentes disponíveis, o pai da vítima: Clifton Abraham Koch; o marido da vítima: Joshua Elis Floyd; ou a irmã: Clara Koch; para a assinatura dos papéis de óbito para que o corpo seja finalmente enterrado adequadamente. (restos mortais encontrados submersos);
Nós lamentamos a tragédia, e compartilhamos nosso luto pelas famílias.
Atenciosamente, Navios White Star Line, dona do RMS Titanic."
Era mentira.
Serena ainda sentia o formigamento e a presença de mãe ao seu lado. Ela estava viva, em algum lugar, aguardando-a de braços abertos. Ela não estava morta! Não podia acreditar, mas por que o telegrama mentiria? Confundiram os telegramas. Só podia pensar assim. Afinal, sua mãe prometera lhe encontrar, não era? Como faria isso morta? O papel era o mentiroso.
Ninguém na sua família estava interessado em resgatá-la. O pai de Serena estava morto há muitos anos, vítima de varíola, e por serem pobres a burocracia os havia impedido de emitir uma certidão de óbito adequado. Sua tia Clara ficou acamada e presa na Inglaterra por conta de uma pneumonia, na mesma época que a mãe a mandou para morar com ela antes de partir. Tudo o que restava era a pequena Serena e Clifton. Mas, pelo que via, seu avô não estava muito chocado com a notícia, muito menos preocupado. O velho continuava rançoso e bêbado, assim como ela se lembrava da última vez que o vira antes de abandoná-las sem nenhum tostão sequer para garantir o que comer.
Foi por isso que pulou na água a ponto de quase se afogar, atrás do primeiro navio que partiria para a Inglaterra. E este era do próprio avô. Talvez o arrastaria junto para resolver a confusão e achar sua mãe viva e sã e salva, mas não seria uma missão tão fácil. Ela ainda tinha esperança viva em seu coração.
— Achei! — gritou a velha Elaine ao voltar para a pequena cabine do barco que balançava, e com um solavanco dele, Serena voltou de seus devaneios.
A idosa a pôs sentada em uma cadeira e a despiu. Nua, Serena se olhou para o espelho sujo no canto do quarto e cobriu seu busto, com os braços cruzados nos seios.
Não podia evitar de olhar. Seu corpo ganhava cada dia mais curvas estranhas, e se sentia esquisita com a mudança tão rápida. Seu rosto era liso e tinha cabelos castanhos que iam quase até a cintura. Olhos cinzentos sem muito brilho. Lábios carnudos apesar de ser magra, e se sentia baixinha demais. Qualquer um a confundiria com uma criança de dezesseis anos. Mas ela tinha dezenove! Talvez as novas curvas e o pouco de aumento no busto, faria os rapazes a olharem diferente, ao invés de uma mera pequena.
Odiava ser olhada desse jeito. Imatura e despreocupada.
Serena voltou a se analisar pelo espelho. E via claramente cada cicatriz que ganhara e seus machucados destacados ali. Cada cicatriz feia e repugnante por todo seu corpo. Ela se sentia mesmo feia, e se aceitava assim. Mas odiava suas cicatrizes que ganhava por apanhar no orfanato. Sempre pela única razão: Fugir de lá.
Após vestir uma peça íntima de baixo nova, com rendas em suas bordas, Velha Elaine a olhou por um instante e ficou chocada. A menina estava mesmo... com curvas de moça! Precisava se adequar a roupas novas agora. Mesmo não a conhecendo muito bem, tratou de procurar algo adequado, e correu ao armário da jovem Lily, puxando um espartilho pequeno, de bom caimento, e levou para a menina.
— Levante os braços... E segure esta barriga! — anunciou ao enfiar o espartilho ao redor do tronco de Serena, que protestou. — Eu disse para segurar a barriga! Prenda bem a respiração, se quiser caber nisto daqui! — gritou de novo, empurrando a peça no corpo dela. Forçando.
— Mas... O que infernos está fazen... — A moça só parou de reclamar quando sentiu os seios doloridos e apertados um no outro e de repente, olhou de relance o espelho. Aquilo era o que chamavam de "decote"? Se sentia mais estranha. Sua barriga estava apertada com aquilo ao seu redor. Mal conseguia respirar, e gritava esperneando enquanto a velha Elaine fazia força para terminar de abotoar o espartilho.
— Ah, pare de fazer birra, criança! — disse. — E seja grata por eu roubar isto daqui da Lily para você. Você está precisando manter sua cintura, e não usava nenhum tipo de vestimenta que lhe desse curva melhor... Só não conte à Lily que nós pegamos — falou pausadamente quando finalmente fechou o espartilho.
Lambendo o lábio superior, perguntou:
— Gostou?
— Odiei — respondeu ela imediatamente, tentando realmente respirar com uma mão pousada na barriga. — Quero tirar esta coisa agora! Não preciso usar isso, sem falar que dói e me aperta em todos os lados! — explicou com muita raiva.
— São seus seios e sua barriga que estão encurralados, mas está tudo bem. Logo vai me agradecer por isso — sibilou a velha em resposta.
A velha, pelo que parecia a Katniss, era a responsável pela comida e por limpar o barco para os tripulantes, pelo avental sujo do mesmo que estava usando. Havia sido a primeira pessoa que Clifton chamou assim que tomou o dinheiro que ganhou de Ed das mãos, ordenando-a se secar e ajudá-la a limpar o barco, assim que terminasse de se trocar e secar.
Pelo que ouvira, Velha Elaine também dividia a minúscula cabine com uma jovem chamada Lily, que era responsável por lavar as roupas e limpar as linhas e redes de pesca.
— Lily é sua filha? — perguntou, enquanto, estranhamente, a velha passava em uma tábua seu vestido molhado.
— Quem dera fosse, menina... — suspirou. — Mas não. Ela era uma órfã, que encontramos quase morta de fome em um cais qualquer. Nós a resgatamos, e consegui convencer o capitão que ela seria útil a bordo... — a velha se engasgou nas palavras, revirando os olhos arrependida. — Bem útil, quero dizer. B-bem útil...
— Quantas mulheres trabalham aqui, madame Elaine? — perguntou Serena de repente. Fazia já alguns minutos que estava intrigada com isso. — Outras como você ou Lily ajudam na pesca também? — A jovem só havia visto homens desde sua chegada, até então; assustou-se.
— Várias. — Virou-se para a cadeira onde Katniss ainda estava apenas de calcinha e de espartilho. Sorrindo, voltou a passar o vestido molhado com o carvão fumegante no ferro. — Outras moças também vivem trabalhando nestes barcos pesqueiros. Muitas são viúvas e velhas acabadas como eu, outras mais jovens. Inclusive, há vários estrangeiros nestes barcos — murmurou. — Vai poder conhecê-los enquanto trabalhar na viagem.
— Gostaria muito de conhecer tudo daqui — disse Serena e, de repente, sentiu um vento congelante bater nas partes nuas de seu corpo expostas.
— Me desculpe, querida — A velha já se explicava, após mais alguns segundos de silêncio — Mas não achei roupas aqui no quarto que caiba em você. Sinto muito, mas vai ter que usar seu mesmo vestido até eu encontrar roupas emprestadas para você poder usar, tudo bem?
Ela continuou:
— Eu irei até o quarto das outras procurar algo para você, talvez de alguma adolescente que não esteja usando, mas não posso te deixar na cabine sozinha. Algum dos homens do capitão podem reclamar que você está cabulando o serviço, ou algo assim...
— Tudo bem. Já está suficientemente seco — assentiu agradecida Katniss, retribuindo com um de seus melhores sorrisos.
— Então fique aqui por alguns segundos. Vou até o corredor ver se encontro alguma comida e um pouco de uísque, para você ganhar uma corzinha e para você ir comendo até lá em cima. Não vai ter problema, pois não vou me afastar muito da porta, tudo bem?
Com o vestido envolvido ao corpo, Katniss se sentou e esperou. Comeu rapidamente e bebeu um pouco de leite com pães duros, deu um gole no líquido ardente e foi ao seu novo trabalho, onde permaneceria por um dia inteiro até atracarem no destino final da moça. Seguindo a velha Elaine e outras mulheres, voltou a subir as escadas para o convés, certificando-se de que o navio desgastado não balançava, desviando de inúmeros varais pendurados de improviso de roupas nos corredores.
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otropwrites · 4 years
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Amor X Arena - Fanfiction Completa (2013)
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Olá.
Estou aqui postando todos os capítulos de uma antiga fanfiction sobre Jogos Vorazes, chamada “Amor X Arena”. Espero que gostem!
CAPÍTULO 1 - https://cutt.ly/LjnqwSK
CAPÍTULO 2 - https://cutt.ly/Xjnqe6T
CAPÍTULO 3 - https://cutt.ly/bjnqt4o
CAPÍTULO 4 - https://cutt.ly/DjnquZx
CAPÍTULO 5 - https://cutt.ly/xjnqobK
CAPÍTULO 6 - https://cutt.ly/Ejnqdhw
CAPÍTULO 7 - https://cutt.ly/wjnqjrd
CAPÍTULO 8 - https://cutt.ly/ijnqkwe
CAPÍTULO 9 - https://cutt.ly/3jnqz1P
CAPÍTULO 10 - https://cutt.ly/cjnqvqb
Muito obrigado. Deus os abençoe.
att,
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otropstories · 4 years
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Lady Rouge (2015) - Capítulo 1
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Lincoln Harbor, Nova York; Distrito 12, 12 de Junho, 05:04 da manhã.
 — Se você acha mesmo que vou te deixar entrar e pegar carona no meu barco de graça? Você deve ser muito idiota mesmo, queridinha.
Ainda era por volta de cinco da manhã, mas, pela voz alta e como ele soluçava, Clifton Koch já estava claramente bêbado. Na verdade, ele sempre estava com algum resquício de sua embriaguez, mas raramente, Serena o tinha visto virar uma garrafa de uísque garganta abaixo logo pela manhã.
A ressaca o deixava estressado. Deixava-o raivoso. Mas também havia culpa no que acontecia ao redor, algo errado no ar para tamanha agitação das pessoas naquele cais.
Nova York não costumava ser tão fria naquela época do ano. Não pelo clima, mas pelas pessoas. O ar era cálido, mas as mãos secas de Serena tremiam entre as luvas esfarrapadas sem dedos, enquanto tentava não enrolar mais o cachecol de lã ao redor do pescoço, com medo de se sufocar. Havia muitos homens no porto Lincoln, e logo o cais estaria lotado de pescadores.
Muitos barris passavam por ela, caixotes de peixes frescos e outros estragados, com banha encrostada nas redes recém-tiradas da água salgada que fazia seu nariz torcer; mas pela fome voraz, comeria aqueles peixes de bom grado se deixassem. Violinistas de rua tocavam nas beiradas das tábuas do porto. Homens musculosos e de uniformes sujos de carvão e peixe, suados e de olhos cinzentos, a empurravam enquanto subiam a rampa do barco pesqueiro de Clifton.
Não havia mais opção para Serena, a não ser implorar. Ela sabia que isso seria delicioso para ele.
— Por favor — suplicava, enquanto os homens parrudos resmungavam ao tropeçar em seu corpo pequeno. — Preciso, urgente, chegar até Finchley. Minha mãe estava... naquele barco. Você sabe muito bem.
— Tem certeza...? — Ele fez uma careta, roendo as unhas escuras de sujeira e cuspindo logo em seguida na água. Clifton estava sentado em cima de uma das toras presas em correntes, que seria logo transportado pelo seu navio, enquanto fumava um trago — Se for verdade isso, lhe garanto que ela já está morta. — Deu de costas para a garota, dando um peteleco no cigarro, que se apagou na água também.
— Ela não está morta! — Serena gritou, batendo as botas no chão.
— O que posso fazer? Até parece que a colocariam em um dos botes salva-vidas. Tua mãe está morta, garota. Aceite isso, seja feliz e siga sua vida — disse simplesmente, com os braços cobertos de pelos e erguidos. Seus suspensórios também estavam embolados, assim como sua camisa branca, há muito tempo não lavada.
Ele então assoviou para alguns garotos que estavam carregando alguns sacos de farinha na polpa. Como se previssem a ordem, os dois rapazes desprenderam as cordas do barco, e Katniss pôde ver mais agitação do lado de fora. Todos à bordo! Ouviram o velho gritar.
A pobre jovem poderia se desesperar ali mesmo. Estava sendo rejeitada novamente, e, agora, pelo próprio avô. Precisava embarcar no navio. Precisava fugir, antes que a pegassem e a levassem para o orfanato da Mrs. Meagan novamente. Não suportaria permanecer naquele lugar de novo, enlouqueceria. Precisava de notícias da mãe para que sua própria alma ficasse paz.
A mãe de Serena, Marbleize Floyd, estava desaparecida há cerca de um ano, aproximadamente. Ninguém sabia de seu paradeiro, se estava bem, se ainda estava trabalhando como enfermeira em Londres ou algo do gênero. Nem mesmo uma carta havia recebido de sua mãe.
Nada. Mas uma coisa estava certa: ela não estava morta.
Sra. Floyd, inglesa assim como a filha, trabalhava como enfermeira. Ninguém tratava ou queria cuidar dos deficientes que vagavam as ruas. Era um trabalho sujo que alguém deveria fazer. Foi então que ela teve uma chamada de emergência em Nova York, onde soube que havia se alastrado uma epidemia grave desconhecida. Serena foi a primeira a embarcar em um navio sozinha, escondida entre as bagagens para não pagar passagem, até Nova York, no distrito próximo. Sua mãe apenas lhe dera instruções de se refugiar com uns amigos e disse que, nas semanas seguintes, embarcaria em outro navio, maior e famoso, que seria inaugurado (com uma passagem de terceira classe, é claro). Partiria assim que terminasse de arrumar as coisas na Inglaterra. E Marbleize embarcou com destino na América.
Esse navio era o tão famoso RMS Titanic.
— Me deixa subir! Me deixa subir! — Serena gritava enquanto corria na velocidade do barco pesqueiro, arfando por causa do vento cortante da manhã e esbarrando em um monte de senhoras de chapéus de plumas caras e homens de terno fino que gritavam com ela pelos tropeções — Ela sobreviveu! Tenho provas! Droga, me dê uma chance, Clifton!
— Vai sonhando, queridinha — gritou em resposta o velho lobo do mar, nem se importando com a própria neta e filha.
Ele ria com os dentes amarelados de fora e outros pescadores que estavam fumando ao seu lado no barco o seguiam, com a gargalhada divertida. O velho esmurrou a coxa. Estalou os dedos gordurosos e girou-os no ar e, em seguida, fez um sinal de positivo para uma cabine que ficava no topo do seu navio.
Um homem assentiu o ordenado e soltou a fumaça no ar, com a embarcação virando e a âncora já erguida. Era tarde demais para ela embarcar no navio do avô.
— Ela parou de correr, senhor Koch — Tom, um dos homens de esbarrara em Serena que fumava na beirava do barco, e ria dela se contorcia com as mãos na trava e girava a cabeça para ver se ainda avistava a menina correndo com o vento. — Acho que a pequena foi esmagada pela multidão.
Os homens que estavam fumando com o capitão voltavam a gargalhar com Tom, mas Clifton permanecia sério e concentrado em seu cachimbo.
— Eu não sei... — Um dos homens, alto, esbelto, negro e forte nos braços, deixou uma fumaça branca de fumo escorrer pelo nariz e pela boca enquanto murmurava. — Não sei por que vocês fizeram isso com aquela moça. Era só uma menina, e nem deveria ter mais de dezenove anos. Poderia ser útil lavando as nossas roupas enquanto pegava carona aqui no barco; a Velha Peggy sempre precisa de ajuda também. Que mal faria dar uma carona? Não gosto que fiquem zombando de menininhas. — Ele se virou de costas para os homens, e guardou o cigarro longo de volta ao bolso do paletó surrado.
— Ah, cale a boca, Ed! — um homem gordo e sem camisa berrou, socando seu braço. — Não precisamos de um sentimental chorando por menininhas órfãs. São cães. Aquela garota é um cão agora! — berrava com pouco mais alto, soluçando pela bebida forte e limpando a grossa barba castanha com as costas da mão. — Aposto que não dura uma semana nas ruas.
— Por favor, Hewitt. Seja otimista. - Um outro homem se intrometeu - A menina até que era bonita... Não iria ser desperdiçada. Aposto que vai parar em bordel agora — suspirava ruidosamente outro homem, mais magro, e ria — O que acha disso, hein?
— Acho que vou entretê-la quando voltarmos, então — murmurou em resposta o tal Hewitt, enquanto o cutucava com um sorriso nos lábios.
— Chega! — Ed protestou alto. — Vocês não têm coração? Não falem isso! — este gritou.
— Então vá para o colinho da sua amada esposinha, Ed, se gosta tanto de proteger mulheres assim. Família é para os fracos, estes homens são machos! Falamos o que quiser neste barco — defendeu-se outro homem, menor em estatura.
O pescador suspirou, e voltou a olhar para atrás, segurando o corrimão, certificando-se de que Lincoln já tivesse ficado para trás, junto com Serena ao relento. Olhou de relance para Clifton, que só fumava sem prestar a atenção de verdade na conversa.
— Conhece minha esposa, capitão? — perguntou calmamente a ele.
— Não, e tenho raiva de quem conhece — respondeu-o amargamente, tossiu e voltou a reacender o cachimbo sem olhar para ele em nenhum instante.
Ed apenas ignorou sua frieza.
— Minha esposa se chamava Aibileen. Ela era caseira. Tínhamos juntos uma filha pequena, chamada Aya — anunciou com o tom de voz claramente com louvor pela lembrança das mulheres. Ninguém respirava. Mas o capitão nem se moveu, desinteressado. — São nomes africanos, capitão. Sabe o que significa o nome da minha filha?
Os homens se entreolharam. Uns coçaram a barba, outros firmaram as mãos na cintura ou só o encararam. Ninguém sabia a resposta. O que isso tinha a ver com a menina que corria atrás do barco pedindo carona?
— O que significa o nome dela? — Hewitt perguntou em um fio de voz curioso.
Ed olhou com os olhos estreitos, como se quisesse analisá-los cuidadosamente até a alma.
— Estou desapontado — suspirou. Então continuou:
— É tão fácil! A resposta está em todo canto. Em cada corda, em cada pneu, em cada pedaço de madeira ou saco de farinha. Minha filha está em um orfanato, senhores, e trabalho com o capitão Koch desde que fui solto da cadeia por roubar comida para alimentá-la. Hoje, junto dinheiro para poder voltar para revê-la e comprar uma casa. — Puxou então um pequeno saco gordo de moedas e notas amassadas. Não deveria ter mais de cinquenta dólares ali. — Se alguém voltar este barco agora e buscar aquela menina que pedia carona para querer encontrar a mãe, ganha a metade do meu dinheiro. E para quem souber a resposta do nome Aya ganha a outra metade.
Primeiro, um susto repentino, tão grande que até Clifton se virou-se e encarou Ed, estupefato. Era o dinheiro que ele juntara e estava ali, sacrificando por uma garota que nem conhecia? Por quê? O que ele ganharia com isso? Não havia tempo para perguntar nada, os vários dos homens que estavam no convés começaram a correr. Uns xingavam, outros corriam para a cabine de comando, mas a maioria corria para todos os lados e gritava com o capitão, que permanecia calado. Um gole de cerveja. O velho estava perplexo. Era um grande ato de coragem do outro.
— Eu sei a resposta — alguém murmurou, mas a gritaria era tão forte, que a pessoa precisou subir no mastro e assoviar alto e berrar: — Eu sei a resposta! — A pequena voz anunciou mais alto que pôde.
Ninguém realmente entendeu nada. Apenas obedeceram e vislumbraram um corpo pequeno e olhos cinzentos fixos em Ed, com as roupas encharcadas e os cabelos castanhos molhados. As botas faziam um barulho irritante com água quando pisava no piso.
Era Serena bem ali. A menina que estava correndo. Ela apenas se aproximou e disse:
— Aya é uma planta medicinal muito usada para aliviar cólicas e curar rapidamente. É o nome de uma planta ornamental, que ajuda doentes, também conhecida como “esperança”, do idioma ambogere — respondeu, de braços cruzados.
Ed sorriu ao ver que era a menina do cais. Quem diria? Ela pulara na água e nadara até se agarrar no barco (que ainda não havia ligado o motor) em movimento em alto-mar. Eles não haviam se distanciado muito... e ainda havia a escada de cordas. Ela estava mesmo ensopada, mas estava ali, reconhecível, lutando à força por uma carona.
Ela sorria. Todos estavam surpresos e sem palavras para descrever o susto, a encarando como se fosse um fantasma.
— Vejo que chegou nadando. — Clifton se levantou e se aproximou da jovem, agarrando seu braço com força até doer. — Diga-me, o que te faz pensar que tem o direito de invadir minha embarcação assim?! — Sacudiu-a.
— Me solta! M-me solta! — gritou sem fôlego. Estava lutando pela respiração pesada do esforço para se manter em pé; ela estava exausta.
— Espere — Ed empurrou levemente o capitão em seu ombro, ajoelhando-se na frente da moça. — como sabe de todas estas informações, mocinha?
— Minha mãe — Serena respondeu com o nariz para cima. — Ela é enfermeira. Aprendi muito com ela sobre plantas. Ah! "Aya" é bem-conhecida por seu significado simbólico de arrependimento e foi às vezes chamado de "erva de graça" também — refletiu rapidamente. — É isso que está em "tudo" como perguntou, não é? "Graça"? — perguntou.
O pescador sorriu e assentiu. Ela estava certa, e ninguém sabia ao certo o que fazer. O velho lobo do mar apenas fincou mais os dedos na pele branca da moça, que chorou. Ela estava correta. E Ed poderia ser pescador simples, mas era de palavra juramentada.
— Aqui, pode pegar. Você merece. — Jogou a bolsa de dinheiro nas mãos da pequena, e Clifton a largou imediatamente, cravando o olhar no homem. — E mais um pouco, por ter descoberto minha charada. Agora — Ed esfregou a mão nos cabelos molhados de Serena — acho que tem dinheiro o suficiente para subornar seu avô, não acha?
Todos que estavam ali presentes riram. Então voltaram de onde saíram, ao trabalho. Clifton não tinha saída, Serena fizera por merecer. O que faria? Ele a jogaria no mar "novamente"? Não, seria mal visto pelos seus homens, e não voltaria a ser respeitado se o fizesse. Só o que poderia fazer era deixar a moça bordo e viver com a consciência o martelando que seu orgulho estava ferido agora por causa de uma menina.
— Então, que tal um quarto? — perguntou Serena provocativa enquanto girava a corda da bolsa de dinheiro nos dedos, e uns homens berram de rir.
O Capitão Koch, já raivoso, calculava com cuidado as formas de infernizar a vida da neta enquanto sua estadia permaneceria ali, puxando o saco de dinheiro de suas mãos com força.
— Se quiser ficar aqui, vai ter que trabalhar para mim. Sem reclamações, como todo mundo — disse ele, com a voz grossa e claramente mostrando raiva. Serena apenas assentiu, ainda se sentindo vitoriosa, e Haymitch se distanciou, balbuciando maldições para Ed.
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otropstories · 4 years
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Lady Rouge (2015) - Prólogo
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Sinopse:  10 de Abril de 1912, Nova York.
Marbleize Floyd é uma pobre enfermeira, que por obra do destino, é obrigada à viajar às pressas de Fincheley, Inglaterra; à bordo do tão famoso recém-inaugurado RMS Titanic, deixando sua filha mais nova, Serena. Porém, dias depois o Titanic é dado como afundado, matando sua mãe entre os outros 1.517 passageiros. 
Marion Lowe, um filho de uma família rica e soberba, descobre que sua casa recebeu altas multas e atrasos de pagamentos, e poderá perder a mansão onde vive, até mesmo ser preso. Durante sua desolação, é seduzido por uma mulher rica é engravida dele, sendo obrigado à se casar com a cobra em troca de dinheiro para salvar a mansão, sendo traído assim. Mas o que apenas um dia de 12 de Junho do ano seguinte poderia reservar? Marion precisa fugir da polícia com a mãe e a esposa mentirosa grávida até o Nova York, se encontrando com Serena, naquele mesmo barco. 
"Seu primeiro erro, foi deixá-la entrar..."
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Título Oficial: "Lady Rouge - Amor de uma Noite". © Copyright. Personagens fictícios. Fanfiction escrita por A. A Otrop; sem fins lucrativos. Publicado originalmente no Nyah! Fanfiction de acordo com a nova Ordem Ortográfica, em 2015. ♞ Conto Original. ♞ Revisão e Beta-reader: Anna L. ♞ Agradecimento Especial: Lazy Liesel (Autora da obra "Change!") ♞ Capa: Anikenkai (Photoscape) ♞ Edição/acabamento: Anikenkai --------------------------------------------------------------------------------------------------
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 — Se você pensa que vou me casar com uma mulher que eu não amo, nem ao menos conheço, está muito enganada mesmo!
A voz de Marion já tremia as paredes da casa, aquela situação já estava totalmente fora de controle.
— Ora, pelo Amor de Deus, você a engravidou! E, além disso, Ronnie é uma mulher linda, carinhosa, e sei que lhe dará muitos filhos; por favor, é a única maneira, meu querido...
Ethel ainda tentava acalmar a grande fera que despertava no coração do seu filho; negra, raivosa e rugindo de fúria. Sabia que não poderia segurar as rédeas do filho, mas ele precisava aceitar as consequências dos seus pecados.
— Única maneira de o quê, mamãe?! Tirar proveito dela? Já não nos basta o dinheiro sujo que nós temos, ainda quer roubar mais dela? — perguntava frio, aproximando-se da própria mãe e controlando-se para não cometer nenhuma loucura. — Não farei nada contra minha vontade!
— Ora, cale a boca, Marion! — ordenou ela. — Veja que bagunça fez no meu quarto! Francamente! Você não tem mais dezessete anos, Marion, já é um homem de vinte oito anos, já está ciente de que precisamos construir laços com a família dela! Sabe a confusão de nos dará por você rejeitar sua prometida? Além disso, é uma única maneira de conseguirmos nos livrar dessa nossa dívida, meu filho.
Murmurava Ethel, com uma voz desta vez calma e tão doce em seus ouvidos: — Pagaremos o que devemos ao banco americano com o dinheiro da família da Ronnie. É uma maneira fácil; eles não irão se importar com a falta de alguns míseros dois milhões. E também, os credores aparecerão amanhã mesmo para levar esta casa! E... a polícia! Por isso, ouça-me, levaremos as minhas sobrinhas daqui e sua noiva grávida para o cais e pegaremos o primeiro barco que avistarmos e que fugir para as Ilhas Escapadas. Vamos voltar para a Inglaterra. Sei que Larry pode nos abrigar até essa maré de susto acabar.
Disse, explicando-se e arrumando sua peruca loira.
— Durante esta guerra? Você deve estar louca!
Até um certo tempo, ele conhecera sua nova noiva. Era uma moça bem-vista, bonita, mas em uma noite de luxúria e loucura, acabou dormindo com ela e a engravidando.
Ethel, sua mãe, não poderia ficar mais feliz do que a situação do casal, aniquilando qualquer chance de haver amor nos dois e roubando o dinheiro dela sem que ela visse. O loiro não podia denunciar sua mãe, não suportaria vê-la presa.
Apesar de estarem com os nomes sujos por dívidas, ele não queria se aproveitar assim da jovem como Ethel fazia. Ambos já estavam assustados e, apesar de ser um adulto, Marion nunca tinha passado por uma situação como aquela. Já estavam de olhos vendados em um mar de tubarões, em meio de todos aqueles ricos em sua volta. Queria ficar ali, na América. Mas o que foi feito não podia mais ser desfeito.
Sem saída.
Marion virou-se e observou as mãos manchadas de um sangue desconhecido. Logo, notou que havia revirado todo o quarto de sua mãe, quebrando e arremessando os móveis feito um animal selvagem, cortando-se por contra própria por acidente, mas nem percebendo por estar sobre o efeito da fúria. Respirando fundo, afastou-se dela, e esta pôde suspirar aliviada por ver o filho esta voltando finalmente a si. Seus profundos olhos azuis voltavam ao normal.
Observando o pôr do sol lá de fora, Peeta fechou os olhos e encostou a testa no ombro, apoiado na janela e refletiu brevemente sua vida. Teria com uma mulher que não amava para consertar um erro! Teria que fugir da cidade, abandonar amigos e outros familiares, até um local desconhecido com uma noiva grávida para cuidar.
Um filho. Marion estava mais nervoso que qualquer outra pessoa no mundo. Além disso, nunca teria a oportunidade de se apaixonar um dia de verdade.
— Eu concordo com você. É tudo culpa minha. Arrumarei minhas coisas e buscarei Ronnie logo de madrugada e fugiremos. Não quero que se machuque também, mamãe. Venha conosco... — Respondeu ele, desconfortável. É claro, ele precisava de algum tipo de afeto naquele instante, mesmo que viesse da própria mãe aproveitadora.
Ethel não evitou de abraçá-lo e afagar seus cabelos loiros.
— Alegre-se, querido. Amanhã é o Dia dos Namorados... Talvez possamos passar em uma banca e comprar flores para ela antes de fugirmos para não assustá-la com tudo isso...
— Não — o rapaz disse. — Não há necessidade disso. Vou lidar com as consequências de meus atos, como homem. Não vou fingir que amo Ronnie, não preciso disso, nem ela.
Ele se afastou dos braços de Ethel, afastando-se para a porta para chamar a criada para limpar toda aquela destruição de longas horas de raiva e gritos ecoando pelos corredores. Algumas empregadas fitava-o incrédulas.
O loiro então saiu, e por toda casa, ouviram-se os passos pesados que deixava nos corredores frios da mansão.
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otropstories · 4 years
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 10
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                           Capítulo 10
Não importa o que aconteça. Vou me lembrar o que aconteceu antes do último apagão. Não posso me esquecer o que me aconteceu. Memórias não desaparecem assim.
– Senhoras e senhores, senhorita Katniss Everdeen.
Uma voz grossa e grave murmura a frase lentamente conforme Effie anuncia a minha presença na festa ao apresentador com rápidos estalos de dedos e apontadas disfarçadas na minha direção. Ele chama a atenção dos vários convidados no piso de baixo com algumas tosses improvisadas, e quando todos estão com olhar atento, sou empurrada por Effie até a escadaria em frente ao homem do microfone, que ergue sua mão direita para me ajudar a descer as escadas. É então que um coletivo aplauso é seguido adoravelmente para mim, como se eu fosse a debutante do lugar.
Todo o Congresso deve estar aqui, aplaudindo.
Estou sorrindo para eles. Ou pelo menos, estou me esforçando para maquiar o que sinto de verdade. Por dentro, estou com uma raiva descontrolada para matar o infeliz que me estragou. Que me faz ter apagões todos os dias. O que me abandonou naquele maldito leito de Hospital quando quase me acidentei na panificadora, enquanto deve estar por aqui, saboreando banquetes que não reconheço repetindo a mentira horrenda e suja que me ama. Maldito.
Nunca pensei que Gale chegaria ao ponto de mentir para mim. Só espero que eu não deva ter perdido alguma memória preciosa ou importante durante minha embriaguez forçada, mas hoje estou mais sóbria do que nunca. O bastante para atuar, assim dizer. E feliz, por ter a revelação reconectada para mim justamente agora.
Sinto-me como se demorasse milênios para chegar até o ultimo degrau de mármore, até finamente tocar na gravata em silêncio do homem que me anunciou e sussurrar um "obrigada" forçado, quando ele se distancia assentindo e os aplausos se seguem para mim enquanto continuo sorrindo e acenando de maneira educada e graciosamente idiota. O quê raios é isso? Sou algum tipo de celebridade americana e não me lembro? Mas com tudo que tem me ocorrido nas últimas 48 horas, sim, não duvido de mais nada.
É então que John entra em cena, abrindo passagem entre os convidados. Ele aplaude mais euforicamente e com as suas palmas brancas, que juro ficarem roxas para tanto. Ele ergue os braços e com movimentos provocativos com os dedos como "mais, por favor!" pede e consegue aplausos ainda mais animados da multidão rica que percebo por meio segundo.
Enquanto todos assoviam para mim, homens me queimando com o olhar e as mulheres murmurando algo invejoso para as amigas dos lados e frente, John dá uma meia-volta e pula entre os sapatos sociais, segurando levemente meu cotovelo e sorrindo simbolicamente para uma câmera que surge nas mãos de um fotógrafo vestido de branco e suspensórios e meu reflexo se segue com ele. John desliza a mão para minha cintura e sorrio para uma pose automaticamente de perfil, e mais aplausos excitados são jogados para nós. Mas não estou entendendo coisa alguma. 
Parece até que ninguém se importa com o fato que acabei de acordar de um acidente.
– Senhores... – John levanta minha mão para cima e segura delicadamente meus dedos levemente os esmagando enquanto me leva em direção de uns homens velhos e barbados, com sapatos bem polidos e ternos caros enquanto riem ruborizados em uma expressão de pura surpresa para mim – Como eu disse, e vocês duvidaram, aqui está minha encantadora enteada. – Ele sorri para os homens e depois para mim, sendo os últimos a aplaudirem – Ela não é a jovem mais linda que já viram?
– Meu caro Johnny, pedimos seu perdão em desconfiar de você... – Um dos homens, mais baixo e de barba e sobrancelhas grossas e brancas, gargalha com uma taça de champanhe na mão esquerda enquanto me analisa, de cima a baixo – Ela é realmente uma jovem muito graciosa. Admirável, meu caro! – Ele dá um gole rápido e cutuca John, que gargalha com os colegas e de costas sinto Effie sorrir orgulhosa e responsável pela minha beleza instantânea.
É então que eu sinto. A mão de John percorre por acidente minhas costas quando os aplausos enfim acabam e toca minha pele exposta e nua. Meus olhos se dilatam e por quase meio segundo, meu pânico me lança em uma corrida para qualquer lugar longe dali e acabo me deparando com um gigantesco espelho oval, surgido entre as taças de champanhe empilhadas cuidadosamente na mesa de entrada.
Meu vestido. Minha aparência. Se me recordo bem, pedi para Effie esconder o máximo de mim em algo grosso e protegido, nada berrante ou característico ao termo "sexy", bem longe disso. Mas, para minha (não) surpresa e ataque de raiva e batimentos cardíacos, ela fez justamente ao contrário do que pedi, enquanto estava perdida em pensamentos no quarto.
Meus cabelos estão delicadamente mais lisos e ondulados nas pontas e soltos, meu rosto está enfeitado entre bochechas rosadas com um batom avermelhado para uma celebridade de cinema e meu vestido de cor vermelho-sangue, com uma calda que arrasta no chão, o que explica minha dificuldade de descer as escadas, com um tomara que caia curto, o que deixa parcela dos meus seios expostos e estranhamente aumentados. Minhas costas e ombros estão completamente á mostra, com um vestido totalmente ruborizado e bem colado no corpo, em complemento de saltos agulhas e cílios bem alongados.
Droga. Sinto minhas bochechas corarem quase imediatamente ao me analisar naquele maldito espelho e tenho o tempo necessário de deixar o ataque de raiva me subir para a cabeça. Eu fui burra o suficiente para esquecer quem é Effie Trinket: aquela berrante idiota mulher superficial, que é ousada o suficiente para me expor á dezenas de pessoas nesta humilhação pública. Ah! Como pude deixar ela me vestir? Ou melhor... Por que preciso fazer parte disto? Sou só uma problemática, entre um espartilho que me esmaga por baixo da fina camada do vestido. Estou testando todo meu auto controle que me resta, apenas para rezar que ninguém perceba as marcas no meu corpo. Tudo, menos isso.
– Se está assim por causa do medo de te verem arranhada e toda cortada feito uma boneca de panos, esqueça isso. Querida, como tudo que faço fica excelente, tive a liberdade que mudar um pouco você, só esta noite, ao menos. – Effie sorri um tanto séria pelo reflexo do espelho oval, mas preciso contar até três mil para não arrancar-lhe o sorriso à facadas.
Ela sabe que sou capaz de cometer o que quiser, mas não com tantas testemunhas por perto. Não posso me descontrolar, por mais que me doa ficar neste estado exposto e olhada por pervertidos. Justamente em uma festa de políticos.
– Se foi John que te mandou fazer isso comigo... ou melhor... você planejou tudo. Não foi?
– Não sei... – Effie ensaia uma expressão de confusa – Talvez... – Ela sorri.
– Vou matar você. Está consciente disso, não? – Giro e me encontro com Effie de cara. Ela apenas bufa e cruza os braços, tentando me dar um convite de simpatia que insisto em rejeitar todos os dias desde que Effie e eu fomos apresentadas.
Mas isto foi imperdoável e desumano até mesmo para ela.
– Ah, por favor, Katniss! Só você não enxerga o quanto este estilo lhe cai bem – Ela ajeita desconfortavelmente a peruca encaracolada enquanto analisa as próprias unhas longas – Deveria se acostumar com isso, afinal é meu trabalho – Ela desprende os braços do nó, e os prega na cintura, como assunto encerrado – Além do mais, você que vacilou. Poderia muito bem ter escolhido sua roupa, mas já que se entregou nas minhas mãos...
– Já chega! Eu estava entorpecida! – Grito freneticamente, tamborilando as unhas na mesa da pilha de champanhe, enquanto arquejo para não matá-la ali mesmo pela traição – E... ainda estou! Será que ninguém consegue enxergar que estou com dificuldades e sozinha? Ainda por cima tenho que me sujeitar á caprichos da minha mãe de me mostrar para esses velhos sujos corruptos! Estou cansada daquilo! E disso! – Aponto diretamente ao lustre.
Um lustre clássico, feito de diamantes lapidados em prismas brilhantes e encaixados em belíssimos pinos de cristais, foi pregado no alto na sala principal, bem propositalmente no lugar onde os raios de luz do sol se debatem nos prismas, para o lustre ficar ainda mais brilhante pelo ponto estratégico, bem em frente á pequena janelinha de ladrilhos acima da porta vitral com sua cortina, o que seria obviamente, um item caro e ousado para uma casa do nosso nível. Apesar de parecer "simples", aquele lustre representa tudo o que está ficando desencaixado para mim.
Ele representa dinheiro. Muito dinheiro, festas e banquetes. Não dá como evitar ver seu reflexo entre os prismas clareados, onde só enxergo uma família esquecida das dificuldades do real mundo que nos cerca, para uma vida protegia e deleitosa em gordura e poder. Isso chegava a ser tediosamente irritante e eu me sentia descolada. Não serviria de joguinho para John e muito menos saco de mentiras e prazeres para Gale. O que aconteceu com aquele garoto trabalhador, que dava seu sangue, suor e lágrimas para sua família apenas ter o que comer?
É incrível o que o dinheiro faz com as pessoas. Ela transforma algo bom para algo terrível e viciado. Apenas consigo enxergar pedaços de papel coloridos, com desenhos e números gravados nele, enquanto outros assim dizem verem a própria alma. Mas de uma certa forma, não consigo me entender neste ponto. Como eu não me tornei gananciosa? Será que sou diferente de Gale? Meus apagões... distúrbios... Será que na realidade, sou realmente gananciosa... mas esqueci dessa lembrança também nas últimas 48 horas? É por isso que todos estranham agora meu comportamento, na escola, na panificadora, em casa, aqui... por que não sou assim? O que estes pesadelos me revelam?
Não pertenço nesta realidade?
Outra enxaqueca constante me perfura, mas ao menos não me sinto puxar. Effie precisou de vários minutos até conseguir ler meus pensamentos para compreender o que quero dizer me referindo ao lustre e me dar as respostas que estou – implorando – para obter. Ela apenas bufa pela segunda vez, prende seu braço no meu e caminha apressadamente comigo para o salão, evitando olhares e sorrindo fracamente para os adultos políticos que nos cercam nesta coisa deplorável. Ela revira os olhos.
– Olha, querida... – Effie para de andar comigo e firma os pés se apoiando no meu ombro e aprofundando o olhar sobre mim, em uma conversa séria por vir – Foi justamente para isso que sua mãe me contratou. Estou aqui para ser sua acompanhante. 
– Eu sei – Digo. – Mas eu ainda não entendo.
– É justamente isso! Você! – Dilato os olhos, achando mesmo que ela leu realmente meus pensamentos, mas ela dá outro rumo a conversa – Estou aqui para "acompanhá-la" nesta nova vidinha importante. Sendo uma moça delicada, forte, bela e educada, principalmente. – Ela enfatiza a palavra "educada" e não deixo de revirar os olhos e cruzar os braços. – Te ensinar ser uma dama, sendo mais explícita.
– Então... está aqui para ser minha babá e professora, agora que minha mãe se casou com um Senador? – Bufo e esperneio francamente – Não obrigada, passo esse desafio de você.
– Desafio? É um prazer! – Ela cantarola – Meu trabalho simplesmente é te transformar. Mostrar-te esta nova vida incrível que está vivendo. Tirar estes pensamentos confusos de sua cabecinha de criança e lhe transformar em na mulher de negócios que será daqui a dois anos, quando atingir a maturidade, minha querida.
Não mesmo. Não vão me mudar. Não tem o direito...
– Quer dizer, me transformar em uma esnobe metida, que só pensa em dinheiro e trabalho, e pelo visto, política não é? – Libero meus pensamentos para um tom de voz real, sem me conter.
– Se você pensa desse jeito, tanto faz, querida. Mas não é de sua escolha.
– É o que veremos – Giro, me afastando cada vez mais de minha acompanhante.
Effie ajeita o tomara-que-caia dela mesma para voltar a encaixar nos seios e apenas pisca algumas vezes para mim enquanto me afasto furiosamente. Ela grita meu nome mais uma vez, sussurrando no meu ouvido quando me alcança:
– Você tem um gênio forte e agressivo, Katniss. Mas não deixe isso esconder quem você verdadeiramente é... – E se afasta das minhas costas, enquanto grita cambaleando feito uma bêbada e gargalhando alguém disposto à acompanhá-la para a pista de dança.
                                                       [...]
Com tantas informações se formulando na minha cabeça, preciso respirar. E é assim que me encontro dirigindo até a sacada do segundo andar da casa, já que não consigo aguentar os inúmeros elogios e perguntas sobre mim lá em baixo. É sufocante.
Até que não me decepciono ao ver as estrelas. Pelo menos, algo que é realmente real sobre minha cabeça, a verdadeira beleza do universo. Meus olhos estão marejados, mas consigo controlar a tristeza que me assola, pois nada mais faz sentido para mim. Nem ao menos, por causa dos meus pesadelos e apagões, não consigo separar o que é real do irreal. É como se alguém me chupasse pela cabeça e só restassem ossos em um corpo sem vida, onde podem retocar a pele, a carne, dar um novo corpo e roupas encravadas de joias, mas não á alma. Isso chega a ser assustador, até mesmo para mim. A lágrima é liberada do olho direito.
O que estou dizendo? Quero fugir, quero sumir, quero desaparecer. Quero minha liberdade, eu quero...
– Katniss, querida! – Uma voz fina e mecânica anuncia alta, e sou sobressaltada pelo susto repentino. Realmente não esperava ninguém me seguir para o terraço – Finalmente lhe encontrei! Venha, venha... precisamos lhe apresentar á um convidado especial da festa e seus assessores.
– Não... espera... – Só posso por reflexo, limpo rapidamente as lágrimas escorridas dos olhos e endireito minha postura patética. Não tenho tempo de reconhecer o rosto da mulher, ela apenas se equilibra nos saltos transparentes que revelam suas unhas dos pés bem cuidadas e me empurra para um pequeno grupo de homens que entram pela porta da grande varanda.
O grupo deixa as portas abertas, permitindo o falatório e a música clássica alta soar do lado de fora, o que me faz desejar atirar na própria cabeça em suicídio. Não suporto um barulho de música enjoativa e maquinaria. Não gosto pessoas desconhecidas. Tenho medo delas. Mas os homens caminham mais devagar até pararem na nossa frente e apertam a mão delicadamente da moça ao meu lado, um por um, a cumprimentando cordialmente de maneira educada em padrão.
– Senhores... – A mulher se curva ligeiramente – É um prazer finalmente recebê-los em nossa humilde casa para um jantar.
– O prazer é inteiramente nosso, senhora Everdeen – Um dos homens de terno e várias medalhas de honra e mérito se curva de volta e beija as costas da sua mão – Estamos inteiramente agradecidos por nos recebermos em sua festa maravilhosa.
– Ah, o que é isso... – Ela cora rindo desengonçadamente – É apenas um jantar. Não um baile de casamento da princesa Diana, meu senhor...
Todos eles riem com a piada dela. Olho fixamente de lado para ela. 
Minha mãe? O que ela está fazendo? Ela nunca me permitiu estar entre seus convidados, nunca deixou eu ser apresentada aos políticos com quem John trabalha... ela nunca gostou deles... não pelo que me lembro. Mas eu não lembro de quase nada agora, tudo está confuso. Mais uma memória resgatada: Eu era sempre protegida deste meio.
– Não iremos ter a honra de conhecer a moça? – Outro homem do pequeno grupo estende levemente a mão para me indicar, sorrindo cordialmente também em seguida. Marbleize parece ficar pressionada, mas com sua voz mecânica de volta, sorri e me anuncia para o grupo.
– Esta é minha primogênita, Katniss – Ela agarra meus ombros e posso sentir a tensão que seu aperto me transmite subliminarmente – Ela estuda medicina em uma escola técnica controlada pelo governo, vocês devem conhecer, se chama Colégio Experimental número 1984. – Ela os rodeia com o olhar e todos assentem confirmando – Ela é um prodígio, tem um QI acima de 128, sabe lutas, e é excelente em Biologia e Línguas estrangeiras...
Eu não consigo entender nada do que ela diz.
– ... Além de ser extremamente linda... – Um dos outros homens cumprimenta com a cabeça e só posso devolver o cumprimento, tentando não socá-lo com os punhos por estar me olhando.
– Minha filha é muito esperta, senhores, tenho certeza que isto não é de família – Outra risada gorgoleja das suas gargantas, mas desta vez não me apresso em acompanhar – Ela é demais para mim.
– Sabemos bem como deve ser.
– Que tipos de artes marciais já praticou, senhorita Everdeen? – O homem da direita ergue as sobrancelhas e pergunta levemente.
– Socos. Chutes. Estourar miolos... Também sou ótima para enforcar alguém até a morte – Digo inexpressiva sorrindo.
Por um segundo, o grupo do terraço fica em silêncio pelo o que disse. Marbleize olha para mim surpresa e ao mesmo tempo assustada e os outros ficam sem o que dizer: Será que o que ela disse fora uma piada? Apenas cruzo os braços e bufo, contando quantos segundos os outros permanecem em silêncio. Depois um vento vem assoprar meus cabelos, desmanchando lentamente o penteado em cachos nos meus ombros. Minha mãe tosse limpando a garganta, rindo rapidamente e dando tapinhas no meu ombro e tocando seu colar de diamantes que rapidamente percebo.
– Ora, Katniss não é uma sarcástica? Um humor negro que nós adoramos, não é Ministro? Olha que a festa já estava ficando chata! – Ela gargalha e os outros a acompanham sem fôlego pela risada.
– Concordamos com a senhora – Ele responde, dando tapas nas costas do velho de barbas curtas e brancas na minha frente que ri – Me lembre de nunca provocá-la se nos esbarrarmos pela cidade.
– Vou me lembrar disso – Sorrio com uma perfeita atuação.
A conversa do nosso grupo é cortada por um barulho intenso de movimentação do lado de dentro da festa. Uma movimentação além do normal se segue alto, ouço cumprimentos polidos e passos por todos os lados, como se estivesse atrás de mim. Endureço-me na mesma hora, engolindo em seco e permitindo meus lábios tremerem.
Uma mulher abre as portas. Ela usa um vestido tão vermelho quanto o meu, só mais vivo, com um tecido que vai até seu pescoço e deixa os ombros à mostra, com um corte decotado nos seios. Ele é justo e cai até os joelhos e me pergunto como ela consegue se movimentar. Ela usa saltos agulhas como os de Effie, mas grossos deixando sua aparência magra ser considerada esbelta, um coque no topo da cabeça sem um fio de fora do lugar, com sombra, cílios vermelhos e um batom de cor preta em sua pele escura e morena. Incrivelmente, o conjunto de maquiagem lhe cai bem e os homens lhe considerariam atraente. Com suas enormes argolas de cor prata balançando no ar no mesmo ritmo, ela toca levemente o ombro do velho assim que fecha novamente as portas. 
– Senhores... – Ela inicia e sua voz é dura e rígida, como se fosse uma soldado – O presidente acaba de chegar na residência. Ele está cumprimentando os outros convidados lá em baixo, trazendo o ex-senador Alberthany e o senador Carter com ele, se não se importarem.
– Mas é claro que não – O  tal Ministro balbucia surpreso pelo convite. Minha mãe sorri assentindo para a mulher que retribui movimentando a cabeça como entendido.
– Então ele subirá em um instante – Ela desliza o dedo indicador direito em uma tela de celular, dando ordens por mensagens e sussurra algo no comunicador de microfone preso em sua orelha conectado ao celular – Está subindo.
– Muito prazer – Me adianto, levando minha mão para cumprimentar a mulher. Ela sorri surpresa e assente com a cabeça – Sou Katniss Everdeen.
– Me chamo Paylor, sou a assessora do presidente. Prazer em conhecê-la, senhorita Katniss. 
Ela se curva e volta em direção à porta, abrindo e falando algo indescritível com um outro homem que surge do outro lado. Ela confirma algo para ele e volta na nossa direção, anunciando e sorrindo para mim:
– Estão com fome? Todos os convidados estão se retirando para a sala de jantar do andar inferior. O presidente e os senadores os aguardam em uma mesa reservada para a família Everdeen, alguns convidados e os ministros do seu partido. Se nos apressarmos, conseguiremos providenciar vinho antes de todos os outros – Ela cruza os braços e novamente cumprimenta com a cabeça, como se tivesse ensaiado várias vezes o discurso na memória, enquanto o resto de nós somos levados novamente para a barriga da festa de vaidades. Só não entendo o que o tal novo presidente quer conosco agora.
                                                          [...]
Paylor e mais dois seguranças com microfones nos ouvidos nos escoltam até o primeiro andar em menos de três minutos. Fico tensa ao ouvir o barulho do público que se arrasta até aqui, com taças de álcool e rindo com conversas inúteis, mas começo a relaxar um pouco mais quando somos levados á subir mais uma escadaria, até uma sala de jantar mais reservada e improvisadamente luxuosa, com poucas mesas.
A sala está um pouco escura, mas luzes brilhantes estratégicas em partes no chão e nas mesas, e vejo também que tem pratos de porcelana e vários garfos e facas em ordem desconhecida para mim, com várias taças - umas mais longas e outras menores e redondas - aleatórias de cristal. No meio, um vaso com várias flores e rosas vermelhas que de longe posso sentir o cheiro forte que lhe emana. Um música mais suave de violinos soa nesta parte reservada da festa, e vários empregados arrumados se movimentam levando mais champanhe aos convidados que chegam.
Desde quanto temos mais de uma sala de jantar? Eu não me lembro disso. Marbleize e os ministros do pequeno grupo parecem se entreterem com uma conversa acalorada e animada sobre debates políticos, na qual não faço muito esforço para ignorar. Eles riem e apertam as mãos de alguns assessores que se levantam de suas mesas para nos cumprimentar e continuem a ir até a nossa mesa bem no meio do pequeno salão, quanto apenas eu para do segui-los. Minha boca ligeiramente se abre surpresa ao ver os que já estão na nossa espera na mesa.
O presidente Coriolanus Snow e seus convidados. 
O novo presidente eleito dos Estados Unidos, à meio metro de distância. Sua aparência é idêntica da que vi na aerotela do bar quando passava rumo á escola no carro de Gale: uma expressão fria e ao mesmo tempo orgulhosa, velho de barba branca e pele enrugada e olhos profundos; além de sempre estar bem vestido um terno caro.
Fico sentindo a minha saliva escorrer até a garganta lentamente, quando minha mãe se vira a minha procura. Eu sumira de seu campo de vista. Com os dedos das mãos cruzados e pequenos desvios de cabeça sem perder a postura reta, ela vaga o olhar pelo salão até se virar de costas e me encontrar.
– Katniss! Venha, vamos nos sentar e conhecer estes senhores...  – Ela treme o lábio inferior, mas não muda o tom alegre da voz ao me chamar. Com um sorriso franco, espanto meus pensamentos de medo do presidente que tive no carro, e me dirijo à mesa puxando para cima meu vestido de calda para que eu não tropece e caia.
Um empregado puxa minha cadeira para que eu me sente e depois me oferece um pouco de bebida. Nego com a cabeça para ele, e fixo meu olhar no arranjo de flores até que o presidente pare de me encarar.
Ele é um Renegado. Ele é um Renegado. Ele é um Renegado. Ele é um Renegado. Não olhe nos olhos dele. Ele é um Renegado. Ele é um Renegado. Ele é um Renegado. 
– Oh, meu Deus! Senhora Everdeen, quanta honra se juntar á nós e convidar Vossa Excelência para esta festa maravilhosa!  – Um homem de terno extravagante e nariz afinado com cirurgias plásticas - além de ter o cabelo em topete manchado de um líquido de tom azulado que escorre e mancha toda sua pele rosa e roupa também - berra excitado, enquanto se levanta de supetão da cadeira  – É um prazer! É um prazer!
– Ora  – Marbleize franze as sobrancelhas  – Ora, ora, ora...?! Quantos elogios! Já disse para estes cavalheiros que apenas um jantar de negócios, Meu Deus! - Ela balbucia sorrindo  – Não tive a honra de conhecê-lo, senhor...?
– Caesar, Caesar Flickerman, senhora Everdeen. Muitíssimo prazer  – Ele se inclina na mesa, quase esbarrando em uma jarra de água e beija as costas da mão dela do outro lado da mesa.
– Me desculpe tocar nisto, mas querido... isto no seu cabelo seria...?  – Marbleize apenas inclina levemente a cabeça, com o olhar fixado no topete encharcado de Caesar enquanto ele beija sua mão.
– Oh! M-me perdoe!  – Ele se endireita, e volta a se acomodar na cadeira, esfregando os cabelos com as mãos, tentando se limpar de alguma força e apalpando todo terno  – Uma mulher sem querer esbarrou um suco de sua taça em cima de mim agora á pouco enquanto a cumprimentava, acidentalmente. Me desculpe! Me desculpe, irei me limpar! Juro que meu cabelo não é azul!
Os outros ao redor da mesa riem com um expressão divertida, pois seu topete está realmente de cor azul pelo suco.
– Tome  – Me levanto de vagar, estendendo um guardanapo de pano que um dos mordomos havia colocado sobre meu colo - e eu não sei para o que aquilo serviria em meu colo - então puxo e levo até Caesar para que ele tenha algo para se enxugar. Surpreso, ele puxa o guardanapo e agradece diversas e diversas vezes  – Não há de que.
– Que menina meiga  – Um dos senadores murmura alto o bastante para que todos na mesa ouçam, e Marbleize sorri orgulhosa.
O presidente ainda continua me observar.
– Eu sei que isso pode soar estranho...  – Minha mãe volta a falar  – Mas... o senhor não seria um dos senadores, não senhor Flickerman?!
– Ora! Não senhora  – Ele dobra ligeiramente o guardanapo de pano no bolso do terno  – Eu sou um homem de notícias. Pode assim se dizer. Sou um repórter.
– Um repórter...? – Ela se choca, mas não se sobressalta para não fazer o sentir mal  – Aqui? – Presidente. – John, que chegava na mesa, murmura quase em silêncio ao meu lado nos ouvidos de Snow.  – Pensei que esta reunião fosse privada. Trataremos se negócios do partido, não podemos ter a presença da.... - Ele limpa a garganta.
– Tenho certeza que trazer um repórter anotar as notícias será muito melhor do que ver tudo vazando. Iremos nos adiantar no contra-ataque entre nós e o  Partido Revolucionista. – Paylor se intromete, respondendo pelo presidente.  – Além do mais, não foi o senhor, senhor senador, que trouxe sua esposa e sua enteada para uma reunião privada?  – Ela sorri irônica, em postura de soldado, sem mudar o tom do voz.
John bufa, e se aproxima mais dos dois para que não escutemos.
– Foi Katniss que pediu para vir. Marbleize apenas concordou estar aqui.
Pedi?
– Não vamos falar nada de mais. Assuntos banais, sobre os outros países, as viagens que o senhor terá que fazer, Presidente.  – Paylor volta o olhar para o celular, olhando ligeiramente para o celular enquanto John se senta em uma cadeira livre da mesa, dando espaço para o gravador de Caesar e assentindo para ele como cumprimento. O ar parece tão pesado, e continuo fingindo que não estive ouvindo nada. – Vinho, senhorita Everdeen?
– Não.
– Tem certeza? É de uma safra...
– Não, obrigada.  – Suspiro, tentando não parecer rude, enquanto Effie aparece também na mesa, e eu bufo.  – Olá Effie.
– Amor! Experimente este vinho!  – Effie dá um gole rápido em um copo que vê primeiro na mesa, se abanando com as mãos desesperadamente  – É fan... - Ela dá outro gole desesperado –  Hummm.... tástico!
– Não bebo bebidas alcoólicas.
– Então não sabe o que de maravilhoso está perdendo, queridinha. 
 Uma voz. Meu coração dispara. Um homem com uma voz rouca grita finamente enquanto para atrás de mim. Eu fico congelada no lugar, tentando ranger os dentes de raiva por ter que conhecer outro político. Outro que quer fazer minha vida um inferno. Todos da mesa giram surpresos, se levantando para cumprimentá-lo.
O Presidente continua a me observar.
– Ex-Senador Albertany, finalmente se dispôs vir para um jantar conosco!  – John menciona, apertando sua mão e dando tapinhas nas suas costas.
– Eu não poderia faltar.  – O homem se mantém longe do meu alcance de vista, soluçando como se estivesse prestes a vomitar e rindo. – Soube que esta mesa vai ser a primeira a receber o vinho da casa. – Todos riem com sua fala.
Fecho os olhos. Conto até dez. 
O presidente me observa até respirar, e eu tento maquiar minhas expressões novamente, ensaiando uma conversa calorosa para mostrar que eu estou bem e sou educada. Sem vergonha, eu não posso ter outro apagão, não no meio desta festa. Minha cabeça volta a latejar, e eu faço uma careta de dor.
Sinto Effie beliscar minha mão e eu volto a abrir os olhos, com o maior sorriso que posso, quando sou surpreendida com o convidado de Alberthany se sentar na mesa ao lado de Caesar. É impossível. Meu sorriso de desfaz rapidamente.
– Já conhecem Peeta, meu ajudante da fazenda?  – Ele aponta para Peeta, bem arrumado e sorri assentindo a cabeça para todos na mesa, e enxergo Marbleize corar  – Soube que ele acaba de salvar sua filha a uns dois dias, Marbleize. E ela nem o agradeceu por isso.
Parece que todos ao redor do salão param de comer e conversar para me olhar. Estou sentindo um frio maior do que o normal, meu sangue não corre direito em minhas veias. 
O que minha mãe irá pensar? Que eu fui acudida por um desconhecido da escola? Não fora Gale? O que aconteceu realmente...?
Gale me observa na porta do salão com uma expressão triste. Ele me seguiu. E agora, ele sabe que estou fazendo parte deste meio novo. Eu pedi para John me trazer até aqui? Não me lembro. 
Não me lembro.
– É um prazer te conhecer novamente, Senhorita Everdeen  – Peeta se levanta da cadeira novamente, e beija as costas da minha mão. Fico séria e tento ignorá-lo, mas Effie volta a beliscar minha outra mão.
– O prazer é todo meu  – E então, me lembro que nos tocamos no Hospital. Prendo a respiração. Ele apenas sorri para todos na mesa.
O presidente continua a me observar.
                                                           (...)
Partindo deste ponto, não voltei à escrever a fanfiction “Amor X Arena”, sendo excluída em 2013. Obrigado todos por lerem!
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 09
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                          Capítulo 9
O Belo matou a Fera.
Antes que meu coração tivesse a oportunidade de bombear o sangue do meu corpo, um raio negro me agarra e me puxa para baixo, na tentativa de me afundar com toda sua força insaciável, uma fome de que eu não sei de onde vem. Mas meu costume diário me revela, e sei o que isso significa. Pesadelos.
Ouço o pote de vidro se estilhaçar no chão. O ato faz os detentos voluntários que se agitam na panificadora correm desesperados para esta cozinha. Peeta precisa me puxar pela cintura e agarrar minhas costas para que eu não bata a cabeça no fogão atrás de mim e caia em cima dos cacos de vidro. Ele tenta me sacudir e grita o nome que acabara de decorar, diversas e diversas vezes, até que eu possa retornar á realidade, mas não respiro. Não dou sinais de vida. Apenas tento respirar com muito esforço.
O pânico geral causa um tumulto, e sou retirada às pressas da escola para a Enfermaria, carregada no colo do rapaz.
Isso não deveria ter acontecido.
Fiz de tudo para evitar ele. Tentei fugir para que eu não escutasse esse nome, nunca na minha vida. Era só um pesadelo. Ele não existe. Peeta não passa de um sonho turvo que tive noite passada, onde ele foi morto por minha culpa. Ele... não pode existir.
Irreal.
                                                   [...]
Sinto conjuntos de mãos apalparem todo meu corpo. Mesmo desacordada e pálida, suando até a morte, sinto uma picada incômoda no meu braço. O perfuramento é angustiante, e a dor me faz gemer e grunhir, tentando me debater e me libertar das vozes e mãos que me apertam e me sufocam. Sei o que os enfermeiros estão tentando me domar. Mas é impossível, ainda mais comigo sob o rarefeito dos pesadelos vorazes.
Soco alguma coisa. Um rosto. Ouço a pessoa tentar agarrar o primeiro móvel que vê pela frente para não cair no chão, e então a dor da picada se torna mais torturante, como se estivessem enfiando um prego na minha veia e a vendo escorrer sangue. Minhas pernas voam pelos rostos dos enfermeiros, e tentam prender-me na maca com os cintos, mas minhas unhas ainda estão livres.
Uma besta. Cravo as unhas das mãos no rosto de uma das enfermeiras que tenta me conter, de cabelos prateados, justamente na que envia soro pelo tubo da veia esquerda, e ela desaba no meu colo, apertando com máxima força meu braço – já esmagado pela sua força – e deixando pingar algumas gotas - do seu próprio rosto rasgado por mim - na maca.
Estou verdadeiramente chorando agora. Eu só consigo berrar de raiva. De dor. E de ter que dormir novamente, e ser atormentada psicologicamente pelos pesadelos. Por que isso? Porque agora? Grito e choro porque não consigo fugir daquele lugar. Minhas mãos e pernas, braços e cintura estão sendo esmagados pela força dos dezenas de enfermeiros que tentam conter minha brutalidade. Arranhões e sangue escorrem do seus rostos, e me vejo em uma sala quase completamente destruída. Quero sair daquele lugar.
Hospital não. Eu odeio Hospital. Tudo que tenha a ver com Cirurgias, sangue jorrando de pessoas ludibriadas, papéis de óbito em cada sala, desespero de enfermos. Agulhas, pus, dor... Quero morrer. Quero escapar deste lugar.
Quero ir para a Floresta.
A mulher de cabelos prateados rosna e se movimenta em busca de algo. Meus olhos ainda estão lacrados pela escuridão, e não consigo nem ao menos, ver o que ela vai fazer comigo, antes de mais nada, outra picada me acerta pelo braço, me fazendo capotar na maca feito uma pedra. A oportunidade perfeita para os enfermeiros me amarrarem nos ganchos dela.
– Não vão me fazer dormir! Não suportarei outro pesadelo!
Tento usar a força, e minha raiva só faz toda a violência se repetir novamente, acrescentando somente eu chutar o maxilar de um dos enfermeiros que segurava minha perna direita, e o enfermeiro acaba caindo no chão desmaiado, com a boca sangrando. Um gemido é liberado do corredor. Reconheço sua voz.
Ele tenta gritar com os enfermeiros que lhe distanciam da minha sala para fora, mas sua persuasão é mais forte e entra correndo em minha direção driblando os enfermeiros, se jogando na minha maca e me segurando pelos ombros. Sinto suas mãos grandes e quentes me agarrarem, tentando conter o fogo violento que me consome, que na verdade é minha única forma de não cair e desmaiar, sonhando com minha morte da forma mais brutal possível. E daqueles que eu amo. Prim. Não vou suportar ter essa visão dela morrendo novamente.
Sua mão quente se entrelaça na minha gélida e tremida. Tento socá-lo, chutá-lo, unhá-lo, mas por mais eu faça força para feri-lo, ele não se desprende de mim, tentando me acalmar. Mesmo sem poder ver, minhas lágrimas rolam novamente pela face e choro sem controle, sabendo que mesmo por este simples ato de segurar minha mão me transmitindo paz, vai me fazer descansar e dormir.
E isso é a última coisa que eu quero. Tento lutar para não me reder aos seus braços. Ele tenta se aproximar do meu rosto, e como último movimento, tento com o fio de força que me resta empurrá-lo para trás, mas o máximo que consigo é agarrar o seu colarinho da sua camisa suja de farinha.
– Katniss! Katniss! Me escuta! Olha para mim! – Faço negativamente com a cabeça sem parar de chorar, como uma deficiente metal – Por favor, precisa confiar em mim. Eles só vão te botar para dormir, tudo bem? Vai acabar tudo certo, eu te juro!
Ele me abraça com muita força que quase não respiro como estava, que nem os enfermeiros conseguem me libertar dele. Você não sabe. Não posso dormir.
Seu calor é tão gostoso. Quero gritar para ameaçá-lo que não o quero perto de mim para não machucá-lo mais – o que me faz sofrer – quando ele segura meu rosto tremido e encharcado com as duas mãos, deixando o calor de ambas irradiarem por toda minha face.
Era um dia qualquer... aí você apareceu. Como que queria ter a autorização de erguer os olhos e ver seu rosto, e com minha última barra de energia, tento clamar em um fio de voz:
– Por favor... – Abro meus olhos devagar, já não me contorcendo ou movimentando mais – Não me deixe sozinha...
– Katniss... – Há uma ponta de dúvida em sua voz. Eu mal o conheço, e já estou agarrada em seus braços, berrando para que ele me puxe de volta para a superfície. Alguém para suportar a mesma dor que eu.
Mas Gale não está aqui.
Seu abraço se afrouxa, e ele, disperso nos pensamentos, se afasta lentamente de mim, mas não larga minha mão. Ouço que a mulher ferida agradece á ele por ter me distraído, tempo o bastante para terminar de enviar a anestesia sonífera dentro da minha veia. Nenhuma dor. Apenas lágrimas. Enfim, aceito meu destino.
– Fica comigo. – Sussurro soluçando, prestes a ter tudo escurecido em volta.
– Sempre. – Vejo pelo canto dos olhos ele erguer um sorriso lindo e pacífico, como se me transmitisse paz em um momento de desespero e violência cruel.
Estou rendida.
Este é um dia ensolarado e limpo, sem uma nuvem no céu. Decido então, trazer pela primeira vez meus filhos para o Santuário de Prim. Para conhecerem a linda tia que tinham. Sei que vão amar conhece-la.
Happier estava subindo as árvores e viu um tordo. Eu estava recostada á árvore ao lado, cuidando do irmãozinho dela. A garotinha começou a cantar varias musicas e eu ouvia orgulhosa, com júbilo. Essa foi uma das formas que criei para poder me livrar dos pesadelos: Ouvir meus filhos cantar. Os obriguei aprenderem a tocar instrumentos, Aaron com um violino. Happier, com seu piano. Sempre que tenho meus fleches de pesadelos, os ponho para tocar e cantar músicas do vale para mim, e adormeço no colo de minha filha. Isso ajudou Peeta também.
As vozes de nossos filhos são milagrosas. Anjos.
Assim que terminou de cantar a música do meu pai, Happier cantou a as quatro notas que eu nunca tinha cantado ou ouvido depois da guerra. A quatro notas que representava o final do trabalho no distrito 11, as notas que diziam que estava tudo bem. Eu mandei a filha descer. Assustada, a garota desceu enquanto descia ela perguntou:
– "O que houve mãe? Por que mandou eu descer?"
Eu acabo perguntando:
– "Onde você aprendeu aquela quatro notas?"
– "É que uma vez, eu sonhei com uma garota cantando essas notas. Ela pediu para eu cantar elas perto de você para mostrar que ela estava..." – Minha filha diz com toda a inocência, sorrindo coma lembrança da nova amiguinha...
Mas não deixo ela terminar.
– "Para dizer que ela estava bem."  – Ela se assusta.
– "Como você sabia?"
Mas eu nem a ouviu, uma lagrima caiu do seu rosto e falei:
– "Rue".
Aaron agarra minha camiseta, se enroscando no meu pescoço, e limpando a lágrima dali. Ele me fita com seus grandes e lindos olhinhos, passando as mãozinhas trêmulas com carinho no meu rosto, enquanto encosta a nuca no meu ombro, me abraçando com toda sua pequena força. Por reflexo, acabo o abraçando também, como se minha vida dependesse daquilo. Tenho muito medo perdê-los, mas não posso os esconder deste segredo para sempre. Preciso contar á verdade aos meus filhos.
– “Mãe...” – Aaron se levanta bruscamente e assim percebo que estou ainda vazando e o encharcando – “O que foi?”
– “Você está bem? Quer que cantemos para você?” – Happier se ajoelha na minha frente, com um tom tímido na voz, como se eu fosse perder minha insanidade á qualquer momento. Mas minha filha é esperta, ela sabe a minha única cura de momentos dos pesadelos. Suas vozes. Amor.
– “Vou buscar o seu violino, Aaron! Posso apenas cantar, não é, mamãe?” – Continua a falar Happier, com o assunto interrupto.
Assinto com a cabeça, já limpando o rosto e respirando com toda calma que consigo, contando até dez, para tentar me controlar até minha filha voltar com o instrumento. Quero rugir com toda minha força, e espantar meu filho dali para flechar algo. Happier chega esbaforida e arquejando, estendendo o violino arranhado para Aaron, que se solta de mim, e se posiciona na minha frente, um passo ao lado da irmã, que tenta relaxar para cantar no timbre perfeito, e me satisfazer. Mas sinto que hoje, isso não adiantará muito.
– “Que música quer que a gente cante para você, mamãe? Geralmente, é o papai que escolhe já que a senhora não tem paciência para escolher rapidamente...” – A frase da menina fica ao ar, me deixando uma indireta que só percebo minutos depois. Dou uma bufada prolongada, assinto, e me levando de cima das folhas de outono, dou umas batidinhas no meu vestido para retirar as folhas ali coladas, e respondo:
– “Vou contar para vocês toda a verdade.” – Digo um tanto fria do que não queria soar – “Tudo o que passamos para que você nascesse em um lugar bom. Sem Jogos ou revoltas... Apenas...“ – Começo a soluçar, me engasgando com as próprias letras ditas – Paz.
– “Jogos?” – Aaron, mas inocente, responde antes mesmo que eu perceba. Mantenho-me na calma. Preciso respirar mais uma vez. Eles já ouviram falar dos Jogos alguma vez, claro. É inevitável. Mas só queria deixar esse assunto para outra ocasião. Mas só verdadeiramente agora percebo que se não contar agora sobre meu passado, isso irá me assombrar, e é pouco provável, que não tranque meus filhos no quarto para viverem longe desta sociedade terrível. E da Capital.
– “ Pensei que só nos contaria sobre determinados assuntos, apenas junto do papai, e apenas quando fossemos mais velhos e maduros para entender certas coisas.” – Happier parece ser muito mais velha do que aparenta ao dizer a frase de uma maneira gélida. Seus olhos estão nublados, e sei o que significa. Ela já sabe á dois anos, mas nunca lhe provaram de nada. Apenas evitamos contar qualquer coisa.
– “ Acho que vocês dois já estão velhos e maduros o suficiente para entender agora.” – Digo sorrindo, e isso descongela Happier do lugar.
Os olhos de Aaron começam a brilhar. Com a mão no violino, o guarda nas costas por um cinto, e agarra a minha mão esquerda com muita força, tanta que chega a doer. Parece que este é outro adjetivo que meu filho herdou do pai, força física. Afrouxo seu aperto com um grunhido, mas ainda mantendo o sorriso para não assustá-lo, e me abaixo para a linha de seus olhos. Esfrego a cabeleira loira e um pouco rebelde de Aaron com rapidez, e isso lhe arranca uma gargalhada. Tento localizar minha filha com a visão, e a enxergo-a com uma ruga na testa, tentando compreender o que vai acontecer a partir de agora. Eles saberão agora que na verdade, a mãe deles é uma assassina.
– “Venham... – digo um pouco rouca, depois do último pensamento transbordar na minha mente – “ Preciso levar vocês para um lugar, para que entendam melhor...”
Digo já segurando a mãozinha de Aaron, com um sorriso de orelha á orelha, e por fim ele retribui rindo. Happier alarga um sorriso também, e caminhamos de mãos dadas, cada um de um lado da mamãe, para fora da floresta, para o cercado, e para a Costura.
                                                        [...]
Depois de alguns analgésicos para dor de cabeça, minha dor insana na nuca, onde ficam responsáveis pelos sonhos, começa a doer e a latejar muito, como se tivessem sido socado contra uma parede diversas vezes. Ah, é, aconteceu isso mesmo. Tento buscar força até para grunhir de dor, mas tudo que consigo é desabar novamente na cama, tentando tatear alguma luz que me dê forças para pelo menos correr daquela sala.
Meus olhos, depois de horas, se abrem. Uma camada de raios iluminados atingem meus olhos, e tento me esquivar como se eu fosse uma vampira, mas não consigo nem respirar direito, quanto menos sair dali correndo dos meus monstros. Alguns momentos de silêncio passam. Só então percebo que estou sozinha dentro de uma sala enorme branca em um Hospital.
– Não... n... não... Hospital não... – Gemo para mim mesma com dor em cada letra, me contorcendo e lacrimejando para implorar por um teletransporte, até pegar no sono novamente.
Isso me faz retornar ao sonho anterior, vendo por mim mesma o que ele irá me revelar desta vez. Sendo Real ou não. Não há nenhuma morte ate agora. Já faz doze anos desde a última.
Durmo novamente, e o pesadelo - que parece estar programado para voltar à tocar onde parei - é novamente transmitido em minha frágil mente descontrolada e recém-acordada...
                                                     [...]
Em passos longos e barulhentos propositalmente, vamos caminhando pelo trajeto em terra abatida e empoeirada das ruas até o centro da cidade, em frente ao Prédio da Justiça do Distrito 12. Alguns antigos moradores do centro, sendo apenas na maioria adolescentes que sobreviveram na segunda Rebelião, agora adultos como eu, me reconhecem e acenam com surpresa, sorrindo e tentando não deixar que as lembranças de ver seus antigos pais mortos por minha causa transparecem em suas faces ao me ver.
De uma forma ou de outra, eu os salvei, mesmo que o sacrifício tenha sido grande, mas ver Katniss Everdeen sair de casa para a cidade é muito raro. Eu mesma jurei para Peeta que nunca mais iria querer vir para o centro novamente depois de ajudar na minha parte da reconstrução, não só para ter as lembranças terríveis involuntárias daquele massacre e de tudo que me arrancaram, mas de ter que passar por ali, e ver aquela estátua horrível. Imortalizaram-me em uma estátua. Presa, bem em frente ao Prédio da Justiça. Venho poucas vezes á padaria para ajudar meu marido, que – infelizmente – fica próximo do centro, mas um pouco mais afastado, perto da Aldeia dos Vitoriosos, para não dificultar a locomoção para casa. Finalmente Peeta reconstruiu a padaria dos seus pais, e pôde seguir com a vida novamente tranquila e nostalgicamente monótona, apesar de ainda termos o gordo dinheiro que recebemos da Primeira Arena. Ele nunca acaba de chegar. Eu já estou ficando cansada disso.
Por sorte, Johanna aceita bem nosso dinheiro com todo deleite. O que ela faz o ele, pouco me importa, mas parece estar se dando muito bem, agora no 7. A enviamos grande parcela depois que explicamos que podemos viver do dinheiro que Peeta recebe da Padaria, e eu das minhas caças, assim posso me sentir normal de novo, já que tenho como bônus um grupo de crianças dispostos a aprender a caçar comigo para ajudar os pais na Costura.
Não que a caça tenha se tornado legal oficialmente, mas ninguém me impede. Não depois de tudo o que passei. Eu mereço pelo menos essa liberdade. Já meus filhos, são totalmente o contrário de mim. Aaron, pelo menos é. Loiro, de olhos escuros e acinzentados, parece uma miniatura meiga e linda de Peeta; como se o próprio não fosse. Os outros residentes – já lotando novamente o Distrito 12 com novas famílias estrangeiras de outros Distritos corajosos para tentar algo novo por esta banda desconhecida – conhecem bem meus filhos, e sabem o quanto são doces e alegres.
Sempre os oferece algum tipo de lanche, ou cuidam deles quando estou caçando e não preciso da ajuda deles, e acabaram se enturmando e ficando famosos pela Panem pela vossa graça e inocência. Ele se tornaram os centro das atenções e cuidados da Capital desde que nasceram.
Droga. Não consegui os proteger disso.
Muitos chamam minha filha de o “Tordo Branco”, por ser a minha miniatura, e por ser totalmente pura e alegre. Não me ofendo com isso, embora seja uma indireta para mim. Apenas tento proteger minha família de quaisquer outros planos da Capital tenha em usá-los para algum mal, e me deixar finalmente livre deste título de guerra sangrento que é o Tordo.
Mas meu contrato ainda não foi vencido. O Tordo verdadeiro está ficando velho.
Eles irão querer um novo, se algo der errado novamente.
E isso, eu nunca irei permitir. Não meus filhos, pelo menos.
– “ Estamos indo ver o papai no trabalho novamente?” – Sussurra Happier para mim, ao reparar que nos aproximamos da padaria onde fomos bem mais cedo para acompanhar Peeta e evitar qualquer mal olhado, mas minha mente martela, me lembrando que este não é o nosso destino no momento.
– “Não querida... é perto da padaria do papai. Estamos chegando, e logo ali...” – Falo um tanto fina apontando já tremendo pela brisa para o Edifício da Justiça, não muitos metros daqui.
– “Tudo bem.” – Ela menciona, enquanto agarra com mais força o mão do irmãozinho.
– “Podemos ir vê-lo? Não iremos demorar, já estou com muita fome e saudades...” – Aaron fala ao meu lado puxando minha saia em direção para a padaria, mas me sinto na obrigação de puxá-lo para o colo e impedi-lo disso.
Assinto propositalmente ele, do outro lado na grande janela, de desnude quase toda a padaria a revelando quase todo seu interior. As vitrines de bolos novamente, depois de dez anos, estão novamente cheias de doces e pães-de-ló, o que faz os olhos dos meus filhos brilharem de ternura e desejo, se sentindo orgulhosos por poderem comer isso quase sempre que quiserem. Isso me faz rir ao me lembrar do passado, vendo Prim desejando estes mesmos bolos idênticos, mas nunca tínhamos condições para dá-la, o que me faz fechar o rosto novamente em silêncio.
Peeta aparece nas janelas, de avental e cabelos dourados pouco desgrenhados, mais ainda sim, lindo, carregando uns cestos de pães recém-saídos do forno, dando algumas ordens para uns empregados da padaria enquanto limpa a mesa na sua frente sugada pela farinha que carregara para a despensa á alguns minutos. Ele demonstra cansaço, mas mesmo assim alegria, abrindo um sorriso de vez em quanto ao ver um cliente novo passar pela porta da frente, soando o pequeno sino, e se dirigindo apressadamente com os músculos doloridos para atendê-lo com satisfação.
Apesar de todo este esforço, isso distrai Peeta dos Fleches. Com a cabeça e corpo ao mesmo tempo ocupados, já faz dois meses que Peeta não tenta me enforcar pensando que sou uma Bestante em chamas, feita para queimá-lo como fiz com sua família.
Me lembro da última vez. Eu estava estirada na mesada cozinha, tossindo e sem ar, com diversas marcas no pescoço que nenhum creme que os estilistas da Capital me tratem, vão retirá-las do meu corpo. Mas gosto delas. As cicatrizes me lembram quem eu sou de verdade. Peeta estava em cima de mim, com as pernas entreabertas na minha cintura, apertando devagar meu pescoço, enquanto rugia e trincava os dentes grunhindo frases que não conseguia descrever, enfiando os seus dedões no meu pescoço para me perfurar. Não tinha como evitar. Eu gritei de dor. Tentava afastá-lo dali, o empurrando, mas ele era mais forte e eu perdera a forma de semanas atrás. Debatia com a cabeça na mesa, até sentir o sangue trasbordar na boca, com seu gosto metálico e azedo, seguido de culpa.
Foi então que Happier nos viu. Ela e Aaron foram acordados pelos murmúrios e gemidos de dor seguidos de ataques. Toda a casa estava apagada e mergulhada em uma escuridão profunda, apenas a luz acesa vinha da cozinha, onde eu lutava para sobreviver e libertar Peeta. Seu gesto foi automático, como de qualquer outro ser humano. Ela gritou, e afastou Aaron para o corredor, berrando para que ele fugisse para um dos quartos e se trancasse, enquanto corria para a pia da cozinha, e puxava uma faca, apontando para o próprio pai.
– “Larga ela.” – Happier gritava com toda a tranquilidade e coragem que consegue.
– “Você não vê, minha filha? Ela é uma monstro. Uma assassina, uma besta! Deixá-la viva, só vai nos trazer mais sofrimento para nossa família!” – Gritava um Peeta que não reconhecia, de olhos totalmente negros, e profunda raiva para mim.
Eu já estava chorando. Eu deveria ter me acostumado, mas as palavras de Peeta ainda sim me machucam. De ferem como se derramassem aguardente branca sobre a ferida exposta apenas para aumentar meu sofrimento e ardência. Mas isso, não deixa de ser verdade. Tento tomar o controle e aproveitar a distração de Peeta para derrubá-lo, mas Happier suspirou longamente, e apenas diz:
– “Eu sei. Mas precisa soltá-la agora, tudo bem? Depois nos vingamos dela. Agora não é o momento...”
Ela dizia e aparenta ter mil anos, para minha surpresa, enquanto aproxima mais a faca do rosto de Peeta, que convencido por suas palavras e medo, desmaia no chão ainda arquejando violentamente, até seus olhos voltarem ao azul límpido normal.
Uma vaga memória.
Percebo que Peeta já saiu da Cozinha da Padaria, e está no balcão, quando me agacho para Happier, e digo ainda trêmula pelo deja-vu:
– “Você tem raiva da mamãe?”
– “Muitos amigos meus da escola tem raiva de você. Eu não sei por que, mas eu não tenho.”
O que eu esperava da resposta da minha filha? ‘Claro que não, mamãe!’, mas não foi isso. E isso uma das coisas que amo nela. Sua sinceridade e ir direto a ponto da conversa que desejo.
– “O que você disse para o papai, quando estava fora de si naquela noite assustadora... é verdade?” – Tento parecer tranquila, mas não dá certo.
Depois de fazer uma expressão de pensativa, tentando se lembrar vagamente do que estou me referindo, Happier sussurra:
– “Não. Eu nunca faria algo ruim com você mamãe...” – Happier enrosca os braços no meu pescoço, e o aperta com todo carinho que consegue. Por um minuto, sou irradiada por uma emoção grande e perfeita, me fazendo esquecer de tudo á minha volta, apenas sentir o prazer de carinho da minha filha tão inocente, e trêmula – “... só espero que você também nunca faça nada de ruim comigo também.”
Minha cabeça bate um sino com toda sua força. Eu nunca faria isso. Prefiro morrer de ter que machucar meus filhos. Nunca deixaria a insanidade chegar á este ponto, jamais os deixaria sentir qualquer tipo de dor que estivesse ao meu alcance.
– “Eu nunca!” – Digo já gritando, e abraço meus filhos em conjunto, os transmitindo todas as palavras desesperadoras que quero dizer pra protegê-los. A Capital percorre á minha mente. Irei queimá-la de novo, se eles tentarem algo com eles.
Olho vagamente para a padaria novamente. Dou um suspiro, e seguro as mãos dos meus filhos, seguindo sorridente para a verdade que estou prestes á lhes revelar, com muita dor, mas isso terá que ser dito. Peeta se enfurecerá quando souber que lhes contei sobre dos Jogos Vorazes sem a permissão dele, mas não estou dando a mínima para isso no momento. Não dou a mínima para minha própria segurança a anos.
Depois de mais alguns poucos minutos de caminhada pelas ruas sem asfalto do Distrito 12, enfim, chegamos na praça. Uma rápida olhada ao redor, e vejo que nem os anos de trabalho dos voluntários conseguiram esconder a destruição causada delas bombas neste exato local. O Edifício da Justiça foi reerguido, desta fez blindado e mais reforçado pelo material do D13, pois nenhum de nós ainda confia totalmente na Capital depois de tudo ter acontecido. Eu mesma não confio no governo de Paylor mais. Não depois de ter exigido que todos os Vitoriosos sobreviventes para terem filhos.
Bem em frente ao edifício, onde deveria ter um jardim completamente queimado e ceifado, uma gloriosa estátua, da mesma altura de uma pessoa, está exposta para o Distrito. Vários corpos representados em forma petrificada, com desenhos de roupas esculpidos, rostos e placas aos seus pés, com seus nomes e datas de nascimento e morte em homenagem, carregando as armas que lhe representavam e símbolos dos seus distritos, todos, erguendo os três dedos médios para cima, cada um em uma direção. A minha estátua e á maior e bem na frente. Meu braço está erguido para frente, mas sem uma direção exata, diferente dos outros imortalizados, e estendem para a direção de seus Distritos a partir deste local. Estou vestindo meu traje de Tordo, com a trança que cai na minha frente, e com a franja um pouco nos olhos, séria, com a flecha segurada apenas por dois dedos pela mão direita, e o outro braço levantado, olhando para cima, em pose de líder.
Peeta e Gale também estão esculpidos aqui. Peeta á minha direta, vestido pelo traje da Primeira Arena, com suas duas pernas sadias também esculpidas, de um punho fechado, e dos os três dedos médios levantados em direção á sua padaria; centímetros da minha direção que é em frente. Gale está com o uniforme de Soldado do 13, carregando uma arma e algumas flechas, sério e apontando em direção á floresta atrás do Edifício; centímetros do meu lado também, sendo a única diferença dos dois, e Peeta do lado direito, e Gale do Esquerdo. Perto de mim.
Outros estão aqui também. Finnick, de costas para mim, com seu tridente e apontando em direção ao Distrito 4. Boggs, Beetee, Johanna, Plutarch, Leegs 1 e 2, Paylor e até Haymitch estão aqui, em um conjunto de treze estátuas, com os Treze mais importantes na revolução da Nova Panem.
Mas o que não me faz querer destruir esta porcaria de Estátua que nos dá glória sangrenta e falsa, é a décima terceira estátua. Bem no meio do grupo em um círculo, pequena, usando um vestidinho entalhado de rendinhas e segurando um pequeno buquê de margarinas e usando uma coroa de flores no topo da nuca, a única estátua sorrindo, e a única realmente, estendendo o bracinho com a homenagem de Rue nos dedos para o céu.
É impossível chegar até a estátua, por eu ser muito grande para entrar nas frestas do círculo de estátuas, apenas observar seu lindo rostinho entalhando com máximo cuidado, e as bochechas saliente no rosto. Prim. Ela foi imortalizada pelo seu sacrifício pelas crianças naquele dia.
Aaron deixa seus olhos brilharem ao ver a visão do monumento. Ele tateia as estátuas como se fossem reais, entrando escondido pelas frestas apertadas com cuidado, e correndo pelo círculo delas para admirar seu interior. Happier apenas ergue as sobrancelhas em dúvida do porque os trouxe aqui. Minha filha já deve ter visto estas estátuas alguma vez, já que passeia muito pelo Distrito para explorá-lo, é quase impossível não enxergar o monumento se estiver no centro.
Eu apenas me aproximo na minha própria estátua, com o rosto aproximando no da estátua, observando a seriedade gélida da maneira que fui imortalizada. Talvez eu sempre deva ter passado essa expressão. Em seguida, passo o olhar para a cópia idêntica e bem detalhada do meu broche do Tordo no peito da minha estátua, com pequenas labaredas entalhadas saindo de seu aro, passo o dedo indicador para sentir seus pequenos buracos e espaços para até a ponta do bico, suspiro, e me aproximo novamente de minha filha.
– “Você já nos viu aqui?” – Digo um pouco óbvia e gelada pela falta de reação diferente de Aaron, dela.
– “Já dei umas passadas de olho".
Ela se contorce para enxergar melhor o meu rosto esculpido atrás de mim mesma, espremendo os olhos como se não estivesse entendendo algo.
–  “Na escola, aprendemos que ouve os famosos Dias Escuros, que iniciaram pela cadeia de rebelião fracassada e quase destruiu totalmente o nosso Distrito vizinho, o 13, e que... como punição ouve lutas entre meninos e meninas até a morte... e que com muita coragem própria, a senhora foi participar das lutas com o Papai e ganharam mais de duas vezes... e então se tornou uma líder que levou outras pessoas á morte, mas que também salvou muitas, derrubando um governo terrível e que hoje está tudo bem... e as pessoas mais importantes deste avanço foram imortalizadas aqui para as próximas gerações não esquecerem do sacrifício que foi feito... eu acho.” – Diz Happier, já sentada no chão com a mão na cabeça confusa.
Sou irradiada por um forte choque. Isso não é verdade. Pelo menos, não a maioria. O que estão ensinando para as novas crianças nas escolas? Estão escondendo o que passou a gerações atrás? Isso é impossível. Mas a Capital talvez queria evitar que os pais contem de verdade o que aconteceu – as mortes, violência e guerras – apenas mostrando que agora está tudo tranquilo e os Distritos em sempre a suposta paz eu foi. Qualquer um pode ir e vir, viver e morrer onde quiser sem estarmos presos á ditadura rígida e sangrenta de Snow. Ou pelo menos, isso é o que achávamos.
Happier não mencionou os Jogos Vorazes. Ela não sabe. Não de verdade, pelo menos.
Chamo por Aaron e um único grito para que ele pare de brincar entre as estátuas e venha ouvir. Sem que ele me responda, me viro para procurá-lo e o vejo acariciando o rosto da estátua de Prim, imitando seu mesmo sorriso como se fossem amigos, observando seu rosto delicado por bastante tempo como se focasse apenas naquilo. Tento segurar as lágrimas para não chorar e gritar com ele, apenas o chamo pela segunda vez - já suplicando - quando ele beija a testa de Prim, e volta saltitando com cuidado para não cair, segurando meu braço para um colo. Sorrio para ele.
– “Ela é muito bonita.” – Diz encantado meu filho, e apenas posso arquejar, e aceno com a cabeça concordando, mas acabo suspirando um tanto surpresa.
– “Aquela é...?” – Happier deixa a frase no ar para que eu possa termina-la e lhe dar a resposta. Sei que ela já deve ter visto alguma foto ou pintura de Prim pela casa, há várias. Tento fugir, puxando Aaron a segurar mais forte meu corpo.
Ela ainda está com o rostinho pálido pela falta de informação, e logo escurecerá. Preciso ser breve e direta. Mas como farei isso? Um assunto tão delicado, que precisa mover com máximo de cuidado para não trincar os corações dos meus filhos de medo. A verdade sobre mim. Que não conheci o pai deles por acaso, e que na verdade, deveria estar junto com outro, que neste momento está seguindo com a vida no D2. Agacho para me sentar no chão com eles, e não nos importamos se as pessoas que ali passam nos verem. Encaro por mais alguns instantes meus filhos, e finalmente, suspiro e começo algo que poderia mudar o destino deles para sempre:
– “Preciso contar um segredo para vocês.” – Falo meio tonta com a situação – “Um segredo muito grande, por isso não podem contar pra ninguém.”
– “Prometo não contar pra ninguém, mamãe! Happier também não vai contar, não é, Happier?! – Aaron vira-se em direção da irmã, que se contorce e confirma com a cabeça suas palavras.
– “Só... tenho medo que sejam novos demais para compreender...” – Menciono com o volume bem baixo e fino, tentando piscar na mente a idade de meus filhos para escolher as palavras certas para explicar meu passado.
– “Se achar que é a hora de nos contar, sei que iremos entender. Nos prometemos.” – Minha filha segura com força meu punho cerrado, tentando me transmitir a segurança que perdi durante a Arena, brilhando seus grandes olhos Azuis, e logo me lembro de Peeta. Sei que ele está aqui, me dando segurança de prosseguir em frente.
Uma dor da cabeça. Vou ser puxada.
– “Eu... não fui para aquelas lutas por acaso. Me voluntariei no lugar da minha irmã que tinha sido sorteada para um Jogo muito ruim... fui no lugar dela para que ela não sofresse...” – Sussurro já com os olhos marejados, me obrigando a não deixar as lembranças virem a tona e rever as cenas terríveis da Arena.
– “O quê? Porquê?!” – Happier se aproxima do meu corpo, segurando com força seu irmão não conseguindo compreender nada das informações que acabei dando, e nem eu mesma compreendo muito bem. Apenas tento imaginar o porquê se sacrifiquei... o que tivesse me acontecido se não tivesse ido no lugar de Prim naquele dia.
– “Por que eu a amava. – Suspiro, sentindo mais agravante uma picada eu se espalha pela minha cabeça  – Eu não queria que... os Jogos...”
– “Mãe...?”
Ouço uma voz pura me chamar. Mas não escuto. Uma grande imensidão negra me apaga por completo, e deixo a minha visão se escurecer junto com o rosto dos meus filhos com muro terror e susto que desaparecem durante minha corrente póstuma e negra.
Um fio de luz me atinge, me puxando agora para minha verdadeira realidade, onde Guerras existem ainda, onde filhos sequestram e matam seus pais, onde crianças se prostituem só por um prato de comida, e onde eu realmente me vejo pertencer. Não pelas coisas ruins. Mas por eu saber que isso é real. Real.
Eu amo tantos meus filhos. Queria... que... fossem... reais... Peeta. Você só me trouxe felicidade e amor para um futuro de paz e carinho para mim.
E Eu te odeio por isso.
Meus olhos se abrem por puro reflexo.
É aquela mesma sensação de quando você sonha que está caindo ou escorregando, e cai sobressaltado na cama, e do mesmo efeito, me levanto bruscamente e respirando sem controle, agarrando com força a camisa curta de seda enquanto tento me acalmar e acordar do meu pesadelo. Ainda estou viva. Este é o mundo Real. Eles não existem. Só depois de mais alguns segundos arquejando e rondando os olhos em busca de algo familiar, percebo que estou no meu quarto, e na minha casa. Levanto meus olhos bruscamente até a janela, e vejo que está de noite e ventando, e por ter nada para fazer melhor, arremesso o cobertor quente do meu corpo, já grudando nele e percebo o quanto estou suando e com calor. Devo ter dormindo demais desta vez. Rolo os olhos em direção á escrivaninha do lado da minha cama, e faço um esforço horrível apenas para erguer os braços e ligar a pequena iluminaria dali. Tento procurar algum calendário de papel, e quando enfim o alcanço, puxo para mim e o ergo para cima, tentando contar quantos dias eu deva ter apagado desta vez novamente.
Dois dias e meio se passaram.
Ao pisar no piso do meu quarto pela primeira vez depois de muito tempo, um calafrio percorre meu corpo e sinto-o o quanto está gelado lá fora, caminho com dificuldades até a janela e permito que a brisa congelante que sobe de suas fresta me refresque por completo, me dando tempo para parar e pensar.
– Meu nome é Katniss Everdeen, e tenho dezessete anos. Onde estive esse tempo todo? Como vim parar no meu quarto, com as roupas trocadas e limpas, toda lavada e alimentada... – Apalpo minha barriga lisa e reta, sentindo-me como se tivesse acabado de comer – Eu não entendo. A última coisa que me lembro... – Minha cabeça se ergue da janela, e tento me lembrar das minhas últimas 48 horas antes de apagar.
Meu rosto sobre uma tigela de café-da-manhã. Não me lembrar de nada dos meus últimos dezesseis anos. Prim, morta ainda bebê. Eu pobre, e minha família sem dinheiro algum. Meu pai sendo arrancado de mim, e eu ser obrigada a aceitar John como novo pai. Gale... escola... esfrego a cabeça, me forçando a lembrar, enquanto ando para lá e cá no chão do quarto, grunhindo pelo esforço para as lembranças virem á tona e obter respostas
– Madge...
A vontade de comer algo bom e caro que nunca pude experimentar. Me lembro das supertrufas. Giro com a cabeça, tentando tatear o quarto em busca das minhas calças na escuridão profunda do meu quarto apenas iluminado pela lua da janela. Esbarro em uma escrivaninha de cabeceira e uma cadeira e preciso morder minha língua para não soltar os mais absurdos palavrões contra mim mesma. Meu Deus. Eu agredi vários enfermeiros também naquele Hospital. Depois de apalpar os bolsos laterais da calça, alcanço o doce no boço de trás, ainda enrolado em seu embrulho azul-metalizado, amassado e derretido, mas não consigo come-lo, apenas olhá-lo. O que isso me lembra. A pessoa que me salvou quando apaguei. Isso me faz ter uma divida com ele, que não posso esquecer.
É então que minha razão transborda à tona novamente. Ele que foi o culpado de eu ter dormido. Se eu não tivesse ouvido aquele nome dos meus pesadelos novamente, da visão dele sendo morto carbonizado e flechado pelos aerodeslizadores dos meus pesadelos... se ele não tivesse me acalmado naquele leito de hospital, me alisando e me abraçado... me irradiado aquela ternura e paz que nunca havia sentido antes... aqueles toques sobre meu corpo, mesmo terem sido breves... aquele calor bom...
Levo os dedos indicadores aos meus lábios devagar. O que é isso que estou sentindo? Nunca me senti embrulhada assim, nem mesmo com Gale. É uma sensação diferente... um gosto doce sobre mim. Como se todos os meus problemas desaparecessem pela paz irradiada, como se eu pudesse confiar nela. Ela jamais me machucaria. Não paro de pensar naquele rosto. No que senti com seus toques em breves momentos.
Um sorriso começa a crescer no meu rosto. Não consigo negar o desejo que sobre dentro de mim. Quero sentir isso mais uma vez.
– Katniss! – Uma voz um pouco estridente clama por mim do nada, e sou sobressaltada no mesmo instante, arquejando um pouco e procurando um lugar para fingir que ainda estou profundamente dormindo, mas desisto da ideia quando ela abre a porta devagar, e mal tenho tempo de esconder o embrulho novamente, apenas esconder nas costas no máximo possível. Tento afastar tais pensamentos da minha cabeça e me mantenho rígida na cama, tentando demonstrar que acordei, e estou melhor do que nunca.
Effie. Ela estala ainda mais os saltos-agulhas para minha direção, enquanto se abana com as próprias mãos e me abraça desesperadamente quando enfim me alcança. A ouço murmurar e choramingar, me apertando ainda mais contra seu corpo, e percorrendo a região do meu estado, tentando achar sequelas ou algum ferimento. Gargalho levemente pelo seu desespero ao me ver acordada, como se fosse novidade eu apagar do nada e só voltar á mim dias mais tarde. Effie nunca muda, não importa o que aconteça, Effie será sempre Effie.
– Estou bem. Minha mente me “obrigou” a dormir mais um pouquinho... nada sério desta vez, ao menos... – Digo sorrindo debochada em direção há Effie, sorrindo maliciosamente internamente apenas para levar ela á uma provocação e deixar ela zangada em sua expressão entorpecida em seu rosto coberto de pó de arroz horrível.
Me lembro das outras diversas vezes que apaguei e acordei brigando e esmurrando a cara de alguém. Sempre foi muito divertido provocar Effie, ela sempre soube que fui uma pestinha com ela. Mas minha curta gargalhada é cortada, quando Effie me sacode, e me levanta bruscamente em direção ao espelho do meu quarto.
– Oh, meu Deus! Como assim raios você está bem?! Já se viu no espelho por acaso? Já viu como ficou estado do seu lindo corpinho juvenil depois de seu último apagão?
Effie me deixa parada em frente ao espelho, tateando o interruptor de luz do quarto e quando o encontra, a luz embranquecida atinge por inteiro cômodo, iluminando meu rosto sobre o espelho na minha frente e percebo realmente meu estado depois desta brincadeira toda.
Parcela do meu corpo está totalmente arranhado e marcado com vermelhidões e ferimentos seguidos de cortes com marcas de unhas e rasgões, que a curta camisola de seda que protege partes específicas do meu corpo não escondem. Um corte enorme, que vai do meu umbigo até o início do meu pescoço, e outro parecido na coxa. Um braço direito com camadas de marcas de cortes ainda cicatrizando em uma nova pele finíssima e branca que nasce ali. Mais corte na superfície da minha barriga, e um arranhão enorme no meu rosto, que segue de trás da orelha esquerda até a bochecha. Não sei realmente o que aconteceu. Eu já tinha alguns destes cortes antes do apagão, causados pela briga com os enfermeiros, mas não me lembro destas marcas de unhadas.
Será que eu mesma me puni de alguma forma enquanto dormia? Meu corpo marcado já não era o bastante? Porque eu teria me machucado? Pânico?
– Eu...
– Eu sei querida. Está horrível. Mas nada que eu não possa ajeitar em você com muita maquiagem e muita sorte... – Effie menciona sem um pingo de preocupação além a minha aparência física, e puxa sua bolsa na procura de sua palheta de tons de pele.
– O que? Agora?
– Sim! Subi para apenas ver como você estava, mas já que acordou totalmente arrasa por sinal, vou ajeitar você para descer. Estão todos lá em baixo para o jantar, sua mãe convidou várias pessoas para comemorar o aumento do seu padrasto, e o novo chofer da família. – Effie cantarola de uma maneira irritante, e preciso me segurar em seu vestido rosa choque e extremamente curto com um tomara-que-caia com babados – E adivinha? – Ela agarra meus ombros sorrindo pelo reflexo do espelho.
– O que aconteceu?
– Um dos políticos novos vem para a festa lá em baixo! Estou tão animada! – Ela sai em disparada para meu closet, procurando algo que me sirva bem, enquanto me ordena a me despir e a me indicar onde fica minha maquiagem com pequenos sussurros.
– O que?! – Grito com todo susto que tenho – Quem é?
– Não sei. Mas virá de surpresa, acho que é o Ex-Presidente tentando cumprimentar os seus empregados do Partido da Capital.
– Como conseguiu convidá-lo?
– Tenho minhas influências. Sou um máximo, não sou?
Tenho que gritar. Não sei o que fazer. Por um lado, se eu descer, minha mãe me verá com as cicatrizes e explodirá de preocupação comigo, e preciso implorar para que Effie tente esconder no máximo possível minhas marcas e me escolha para vestir algo que cubra bem eu corpo, de preferência. Nunca gostei mesmo de me expor por sinal. O fato de ter acordado de mais um apagão, e precisar aparecer em público novamente me dá raiva, mas tanto Effie, quanto eu, sabemos que não tenho como questionar.
Preciso passar uma imagem boa, mesmo que minha família seja rica só por causa de John, não posso vacilar.
Não interessa que eu esteja em coma. Se estou de pé, posso muito bem fazer meu trabalho: Atuar. As curtas lembranças das duas crianças diante á minha estátua me dá giros pelo estômago, e despenco na cama, permitindo que Effie limpe e me vista e me maquie por contra própria, e nem tenho paciência nem para ver o que estou vestindo.
O garoto também está aqui, e preciso afastá-lo da memória enquanto Effie anuncia que estou pronta e sem vontade nenhuma de me olhar no espelho e admirar seu trabalho de poucas uma hora e meia, e me dirijo por conta própria contra a porta do quarto. Effie me segue, estalando nos seus saltos-agulha contra o piso delicado, e seu arranhado contra ela me irrita completamente, mas sei que preciso aturar. Apenas fecho os olhos, e deixo tudo transbordar novamente, já digitando uma desculpa para Gale por ter faltado a aulas pelo meu apagão, e ter recusado sua companhia.
É então que me lembro que ele me levou para beber noite atrás em uma boate, e por ter escorregado em uma pia de banheiro, bati a cabeça e perdi várias lembranças.
Só então me lembro que já conhecia Peeta antes do caso das supertrufas. Ele salvou minha vida uma vez. Os pães na chuva.
Realmente, não estou acostumada com esse tipo de coisa. Só preciso ser firme, e gritar para mim mesma que os sonhos não são reais como todos os dias faço quando estou consciente.
Esqueça Peeta. Isso já faz muito tempo.
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otropstories · 4 years
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 08
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                           Capítulo 8
Ainda estou em estado de choque. Como se nada fizesse sentido. O que está acontecendo comigo?
O rosto pálido daquele homem velho e enrugado aos poucos vai sumindo da minha mente, conforme o carro de Gale vai chegando aos muros da escola. Mesmo assim, a sua silhueta continua grudada na minha cabeça, com seu nome na aerotela piscando ao seu lado, como se me alertasse de algum perigo eminente.
Eu estava sendo avisada. Eu podia sentir isso. Como se o aviso fosse um presságio.
Estava me lembrando. Outra memória.
Políticos corruptos não era novidade para mim. Não era novidade para ninguém neste mundo, havia uma baciada de homens e mulheres bem vestidos com seus ternos brancos ou cinzentos, cabelos em coque alto e barbas bem feitas, e olhos penetrantes. Eu os mesma os via por aí... pessoas comuns como eu, com famílias e amigos, felizes até a Dívida nos afetar de maneira global. Muitos perderam suas casas. A maioria acabou como eu, vivendo de sobras e lutando por sobrevivência, até a manhã seguinte. Alguns mais corajosos dente nós, não aceitaram a cobrança desumana da Dívida, e fizeram protestos e rebeliões contra os partidos que quiseram nos por nas linhas. Eles acabaram se tornando Renegados com as rebeliões. 
Marbleize disse que isso tudo aconteceu por início, muito antes de eu nascer. Até então, até que alguns Renegados mais velhos tiveram uma ajuda secreta interna da parte do Governo que também sofria com a Dívida. Sim. Não eram todos os poderosos que estavam se beneficiando com aquilo. Apenas um pequeno grupo político em especial, que comandava por trás dos panos. Tudo precisava ser perfeito aos seus olhos. Eleições, promessas de melhoria e redução de custos para a população, casa, alimento e segurança era o que os dois Partidos de onde vivíamos, prometiam por meios de suas lábias mentirosas.
Era como se os outros continentes do Planeta não existissem mais, apenas o nosso "novo e melhorado" país.
Estranhamente, os aeroportos do país estavam sendo fechados, todas as viagens para outros países e continentes, este ano esta sendo proibido. Eu não entendia. Com o passar dos anos, os Renegados deixaram de existir. Ou melhor, os covardes se esconderam quando não podiam mais contar com a Força exterior das influências dos outros países do nosso planeta.
O que estava acontecendo com a América do Norte?
Todos acreditavam na vitória de Snow nas Eleições deste ano. Ele e aquela mulher concorriam a mais de um mês nas Eleições. Havia boatos que Snow era um antigo Renegado, mas nenhuma prova vou apresentada contra ele nas acusações. Ele apenas sorria, e prometia melhorias, como um bom político. A mulher agora perdera. Ele concorria à reeleição após uma indicação de nosso Ex-Presidente, Barack Obama. Os dois tremiam diante da tela, mas com a postura de educados, apertando as mãos do novo Presidente dos Estados Unidos e o colocando agora de bom grado. Os partidos do Capital e Distrito Evolucionista estavam acirrados.
Não sabíamos no que Snow iria fazer agora. Mal o conhecíamos. Apareceu na política do nada, o que fortificavam as suspeitas de que ele era um Renegado disfarçado. Mas agora estava feito, o poder estava nas mãos dele por longos anos. O que mais me preocupava, era as promessas estranhas dele que recapitulavam as duas semanas atrás antes das Eleições finais:
"Prometo Paz. Prometo um mundo onde não viveremos mais em Guerras, conflitos ou Fome. Principalmente Fome, lutarei contra os desperdícios desnecessários, mesmo que eu terei que me tornar o vilão da história..." e depois gargalhava de leve, com as mão na boca, pronto para tossir.
Os pesadelos. O novo Presidente dos Estados Unidos ter surgido do nada. Eu ter acordado do na cozinha, bêbada. Eu falar de um Peeta. Do nada, achar que minha família sempre foi pobre, e acordar e ver que na verdade, somos ricos.
Isso me dava medo...
                                                           [...]
– Está tudo bem Katniss...? – A Voz de Gale me trás de volta para a realidade por um pisar de olhos, e então percebo que estou rígida, com olheiras e observando o acento da frente do carro, como se aquilo fosse a coisa mais atraente do mundo; mas na verdade, estava perdida nos devaneios, relembrando os últimos acontecimentos do Mundo nas cindo últimas décadas.
– ... K-Katniss....? Katniss... Ei...  – Gale balança a mão na minha frente, pra frente e para trás para me acordar. Sem resultado, ele estala os dedos fortemente próximo do meu ouvido esquerdo, que me sobressalta de imediato, me puxando e eu acabo gritando de susto.
Eu pulo para o chão. Gale tenta me levantar, e percebo que estou suada e pálida, além de estar tremendo. Os olhos de Gale tentam reconhecer a garota que está caída do seu carro, mas não reconhece. Não sou eu. Este não é o meu normal.
– Calma! Katniss...  – Ele me levanta mais uma vez para o estofamento do Camaro, e limpa meu suor do rosto com a sua camisa, levando em seguida as costa da sua mão na minha testa para medir a minha febre.  – Meu Deus! Pare de tremer, o que aconteceu com você de uma hora pra outra?
– E-eu... não sei...  – Preciso usar todas as minhas forças para falar e respirar ao mesmo tempo, e sinto uma dor no peito como se fosse um tumor - Eu... estava... eu... tive outro pesadelo esta noite... estou muito confusa, sinceramente.   – Abaixo a cabeça, realmente envergonhada.
– Ah, isso de novo!? Já é sei lá... o septuagésimo esse ano. De boa, Katniss, você devia relaxar mais antes de dormir.  – Gale diz já me puxando para fora do carro, buscando nossas mochilas do outro lado enquanto o tranca o carro silenciosamente.
– Septuagésimo?
– É. Pois é, cara...  – Ele dá um grunhido de leve ao fazer força para fechar o capô, e joga minha mochila na minha direção, e acabo caminhado com ele automaticamente, e ele me puxa pela cintura enquanto passamos pelos outros alunos.  – Você tem pesadelos desde que te conheci, quando tinha catorze anos, não se lembra? Estávamos na Floresta do Parque Nacional, e estava tentando montar armadilhas para tentar pegar um esquilo com minha rede...  – Gale sorri com a lembrança  – Estava na moita, e estava prestes a conseguir um, quando você chegou, e pegou o meu coelho para si, e tentou fugir tranquilamente.
– Mas você entrou na minha frente me dando um susto, dizendo que roubo tinha pena de morte. – Sorrio para ele de volta, também não me esquecendo da memória.  – Na verdade, acho que eu deveria ter uns doze anos, quando nos conhecemos.
– Katniss... – Sua voz já fica em um tom mais grave e séria  – O que anda acontecendo com você...? Já faz duas semanas que você não vem para a escola, como se evitasse alguém... eu acho que esse alguém era eu...
– Não! De jeito nenhum! Eu...  – Eu tinha certeza de que não era Gale. Realmente, estava evitando de encontrar alguém que nem sabia quem era na Escola, mas tinha a certeza de que não era Gale. Tinha medo de que o destino dos meus pesadelos se tornassem realidade, então do nada eles surgem na minha cabeça, todos os setenta.
– Vou te dar um tempo então. Você anda com a cabeça cheia, desde que sua mãe se casou novamente.
– É. Pois é. Deve ser isso.  – Confirmo sem certeza.  – Gale...
Gale e eu paramos de andar. Ficamos bem em frente à escada de mármore para a porta do colégio, por detrás do canto ao lado do sino, escondidos dos outros. Gale ergue as sobrancelhas para mim, sem entender. Mas eu sei. Conheço Gale. Sua conversa de mudar de assunto não irá funcionar comigo, não agora. Eu sei que ele não deixaria impune o que aconteceu no carro, ele irá atrás do garoto. Fico gélida com o que Gale seria capaz de fazer por ciúmes.
– Você me faria um favor...? 
– É claro, Catnip. Você sabe que sim. 
– Será que... poderia esquecer? Digo... do que aconteceu no carro? 
Gale me vira pelas costas, e me olha profundamente, sério. Tento revidar, mas estou muda feito uma palhaça, a silhueta maligna daquele velho não sai da memória da aerotela. Gale apenas, me abraça e sussurra:
– Tudo bem. Já passou. Eu realmente ando preocupado com você. Você sabe que você é tudo pra mim, Katniss.
Gale tenta me beijar novamente, mas eu desvio mais uma vez. Um rosto de desaprovação. Sinto que quero sair correndo dali, e fugir. Ele volta a olhar nos meus olhos, que voltam e sibilar ódio. Mais uma vez, eu o cortei. O descartei, por mais simples que um beijo represente. O sino do nosso lado insiste em bater em alto e bom som. Vários alunos correm para dentro do prédio, puxando seus pertences e amigos até as salas e aula vazias. Gale não me larga. Apenas olha os outros caminharem para porta principal e olhar para mim. Ele percebe o aperto que me prendeu, e então me larga devagar, permitindo que meus músculos respirem. Tento falar alguma coisa pra ele, mas ele me puxa para caminhar para a sala de aula, e diz:
– Não se preocupe, Catnip. Eu vou resolver esse problema.  – Com um sorriso malicioso, beija o topo da minha testa, e volta a caminhar. Não consigo segui-lo. Não imaginando no que poderia acontecer.
                                                      [...]
O sinal é tocado pela segunda vez. Sabemos o que isso significa: horário do almoço. Penso em procurar Gale com Bristel e Thom, seus respectivos amigos da Academia. Durante o caminho para o almoço, outra memória me ocorre.
A família de Thom era Renegada, mas nem Gale, nem eu parecíamos nos importar com o seu passado agora. Eu, inclusive não tenho muitos amigos. Poucos vezes converso dos outros alunos ou pessoas das Montanhas Apalaches, ou me integro na sociedade. Prefiro ficar isolada, e sozinha com minha paz. Tenho uma conhecida, Madge, com quem eu troco poucas palavras, e sendo tão solitária quanto eu, sempre almoçamos juntas na cantina escolar. Hoje, comia com ela, como sempre fazia.
Eu ainda estava um pouco cansada e pálida dos pesadelos, e ainda por cima, a aula foi uma droga. Fico saboreando minha - inesperada - barra de granola vermelhas oferecidas por Madge, ao reparar que eu não tinha trazido nada para comer. Precisava me alimentar, embora eu confirmasse mentalmente para Madge que vomitaria tudo para fora por causa da minha ressaca.
– Tentei falar com você ontem, mas você não atendia o telefone.  – Inicia Madge do nada, quebrando o silêncio de nós duas. Ela não olha para mim, e apenas degusta sua supertrufa com um pouco de pão fresco.
– Eu tinha saído.  – Respondo no mesmo fio fraco de voz, comparando minha barra de granola com sua supertrufa pelo olhar.
– O dia todo? Comecei a ficar preocupada... quero dizer... pensei na possibilidade de ter fugido para a Floresta do Parque Nacional, e passado a noite lá... eu não sei.
– Acha mesmo que eu teria fugido para a floresta?  – Tento sorrir meio irônica, mas Madge ainda não levanta seu olhar para mim tímida, e apenas confirma suas palavras com a cabeça.
– Ainda tem dúvidas, Katniss?  – Ela molha um pouco do chocolate derretido da supertrufa no seu pão, e o enfia boca a dentro degustando com prazer.  – Todos sabemos que seria provável que fugiria para o Parque. Todo mundo sabe.
Então me vem mais uma memória. Sim, Madge tem razão. Quando eu era criança, meu pai quando tinha tempo livre, nos levava para a Campina e o santuário secreto de árvores com galhos entrelaçados como um teto com suas frestas de luz iluminando o lago...
Jo havia criado uma trilha segura entre a floresta para a Campina. O seguia para o Lago onde passávamos das horas distraídos, pescando, nadando, colhendo flores e caçando. Meu Pai me ensinara a caçar, pois acreditava que um dia poderia ser útil para mim, mas olhando para minha situação agora, foi em vão. Observava eu pai manuseando sua lança e um arco e flecha que havia enterrado no tronco oco de uma árvore morta lá dentro, mas eu nunca o desenterrei por até hoje nunca precisar. Podia ver as horas passando, com meu pai colhendo flores e plantas estranhas, cheirando e observando de perto, até esfregando as folhas no pulso.
O pulso de meu pai ficara inchado depois de esfregar uma planta de raízes amareladas e folhas verde escuras mais escurecidas do que as plantas normais. Eu era pequena, e havia me assustado ao ver seu pulso roxo e gigantesco e conforme as expressões da face de Jo, ardia e latejava muito. Tentei correr até o lago e pegar água para suavizar, mas quando voltei com o avental encharcado até a borda de água, meu pai já soltava grunhidos de alívio ao refrescar o local inchado com um pouco de Amoras-Cadeado.
“Essas amoras são perigosas e venenosas, minha filha. Sempre se lembre de nunca, nunca mesmo come-las, ou poderá morrer em poucos segundos pelo veneno da fruta.” Ele olhava para mim, como se me desse uma lição.
Afirmava que entendi com a cabeça, e ele se levantava, ainda sentindo um pouco de incômodo no local infectado.
“Isso é incrível...” Continuava ele. “Mesmo assim, sua polpa é ácida, mas medicinal e refrescante. Não sei como ela causa isso. Esse é mais uns dos milagres de Deus, que não pode passar sem ser registrado.” Ele apontava para sua jaqueta extra de couro. “Katniss, traga minha outra jaqueta de couro ao seu lado.”
Puxei a jaqueta, e estendo para meu pai, que apenas corta duas parcelas retangulares da área mais sólida do tecido, e o entrelaça com várias dezenas de folhas limpas do meu caderno da escola. Ele cola as folhas cuidadosamente e com paciência cada uma, com seiva da casca de uma árvore de borracha, e o fecha com um suporte duro com as costas quadradas da sua bota também de couro arrancada, e seu cinto, formando um lacre. Ele olha para o caderno "novo" meio orgulhoso, e molha um pouco de nanquim na ponta de ferro da flecha e me pede para escrever com a melhor caligrafia possível. Meu pai não sabia escrever e ler. 
“Este livro vai nos ajudar agora a ordenar as plantas das comestíveis, das medicinais e até das perigosas, assim não corremos risco de novo.”
Meu pai então começa a ditar todas as informações da experiência da planta de caule amarelo e olhas verde escuras como a noite, além de descrever os benefícios e perigo da Amora-Cadeado. Em seguida ele pausa, e tento desenhar as plantas o máximo que consigo, para não esquecermos da sua aparência novamente.
– Katniss...  – Madge cutuca meu braço, e eu apenas pisco várias vezes, como se estivesse sonhando. Minha cabeça agora lateja, e preciso de alguns segundos para minha mente me informar, que não era uma lembrança verdadeira minha.
Meu pai nunca me levou para a Floresta. Foi um outro sonho idiota...
– Se... sexagésimo primeiro....  – Logo um pouco devagar demais, em um fio de voz quase sussurrando.
– O quê...?
– Sexagésimo primeiro. Meu pesadelo sexagésimo primeiro. Tive ele dois anos atrás.  – Digo como se minha mente se iluminasse de repente.
– Você... ainda não se libertou disso, não é?  – Sussurra Madge.
Ela era umas das poucas pessoas que conheciam meus pesadelos que tinha desde que conheci Gale.
– Não.
– Olhe Katniss... desculpa ter tocado em um assunto que provavelmente, te daria lembranças... não tão boas...  – Ela suspira em seguida, abrindo outro envelope de supertrufa e enfiando-o na boca.
– Não. São lembranças lindas. Pena que não são reais. Só isso que me desconforta. – Fico meio cabisbaixa, tentando observar o longe além. – Alguns pesadelos não são bem pesadelos. Alguns raramente que tenho, são realmente sonhos.
Madge para de comer, me observando. Ela parece notar minha infelicidade ao saber que fora apenas pura imaginação desenfreada - segundo ela - e volta a degustar seu doce em silêncio. Mais alguns segundos eternos se entende pela cafeteria, e sinto que irei explodir.
– Onde conseguiu isso?  – Pergunto para ela do nada, observando atentamente o doce em sua boca, ignorando a minha barra de granola já salivando. Eu quero é chocolate, por algum motivo que desconheço.
– Uma supertrufa? – Ela se assusta com meu pedido, já me encarando com uma careta. Lembrança. Eu só comia coisas saudáveis e isso a espanta imediatamente. – Se quiser, pode pegar esta aqui, mas ela já está toda mordida...
– Não... tudo bem.  – Me esquivo da supertrufa salivada de Madge fazendo uma careta de nojo. Madge começa uma gargalhada com minha reação envergonhada, e aponta para uma bancada atrás de mim enquanto ri.
– Ali  – Ela firma o dedo indicador para bancada com um sorriso.  – Tem uma panificadora pequena no fim do refeitório, com uma pequena prateleira de doces ao lado das cestas de pães recém-saídos. Comer chocolate aqui é proibido, e as supertrufas são caríssimas, mas alguns voluntários da detenção de hoje estão ajudando na cantina. Um deles, meu amigo me deu um "desconto" para conseguir essas duas aqui. – Ela aponta para o seu doce e um outro papel de vazio. – Talvez se falar com ele, ele te ajude também, se está com desejo.
– Acho que vou mesmo. – Digo puxando algumas notas misteriosas de dinheiro vivo da calça. – Nem sei quanto que é.
– Vai lá. Olharei suas coisas. – Confirma Madge, e dando coragem.
– Obrigada. – Digo, me levantando e seguindo para os fundos, esbarrando em alguns alunos e desviando de umas mesas como um carro.
Chego na pequena panificadora do colégio, e me debruço na bancada, observando ao redor do estreito corredor onde passam alguns ajudantes de avental e um pouco sujos de farinha, resmungando enquanto atende os pedidos dos alunos na bancada principal. O espaço é limpo, e perfeitamente perfumado de pães fresquinhos saídos do forno. Não demora muito para eu sentir o aroma dos cookies e outros biscoitos amanteigados com doce de leite, com seu frescor que inala das frestas dos fornos bem na minha frente. Fico na ponta dos pés, na tentativa de alcançar aqueles biscoitos mesmo, já que minha visão não acha as supertrufas, decido pegar por conta própria. Mas meu braço não é longo o suficiente para alcançá-los. Tento chamar alguém para me atender, mas as poucos ajudantes (obrigados estar ali trabalhando) estão todos ocupados e desatentos, entrando e saindo da cozinha.
Decido pular da bancada e me agacho para me esconder dos outros alunos, e sigo para a porta do outro lado, onde o cheio doce parece maior. Parece que estou no paraíso. Dezenas de fileiras de fogões, um pouco engraxados de óleo e completamente sujos de farinha de trigo, recentemente usados, um bandejas de doces, pães e algumas tortas nas bordas ainda quentes pelo que sinto, ao passar a mão por cima e sentir a fumacinha quente atravessá-la. Olho aos redores para ser se á alguém neste outra cozinha, mas estão fora,o que me faz girar os calcanhares e ir em direção na procura das supertrufas.
Sem sucesso, decido procurar nas prateleiras do chão dos longos armários cor de creme. Não demora muito, e enfim acho um pote secreto, com vários doces Pocket e algumas trufas normais de frutas, e por trás, as bombas de chocolate em forma de supertrufa. Solto um pequeno gemido de felicidade abafado, e então puxo o pote ainda gelado, e tento abri-lo com força, até perceber que ele está trancado com um cadeado.
– Parece que você encontrou meu tesouro secreto, mocinha.
Ouço uma voz masculina sussurrar no meu ouvido, e me sobressalto soltando imediatamente o pote no chão. Meu coração dispara do susto, e tento me levantar, mas estou arquejando tanto que não faço movimento nenhum. Ponho a mão o peito, e percebo que ele está realmente disparando agora, com uma bufada me levanto e me apoio na pia tateando ela para respirar tranquila.
– Droga. Que susto você e deu!
Tento abafar um pouco da risada que quero dar, mas me mantenho séria e arquejando. O rapaz, de calças brancas e de camiseta da mesma cor, com sapatos polidos e um avental um pouco sujo de massa vem na minha direção, e recupera o pote, o colocando na minha frente, tentando se desculpar.
– Oh, me desculpe. Não quis assustar você. – Ele retira uma mecha de cabelo do meu rosto, e a esconde por detrás da minha orelha. – Mas confesso que não esperava encontrar alguém aqui no meu esconderijo, ainda mais querendo roubar as supertrufas que eu faço.
– Me desculpe. Não quis roubar, eu iria encontrar alguém para pagar, eu juro! É que estava com tanto desejo de experimentá-las, que...  – Me viro, e olho pela primeira vez o rosto do rapaz.
Loiro, de cabelos dourados e um pouco bagunçados e sujos de farinha, com olhos azul-céu perfeitamente lapidados como diamantes de tão brilhantes que são ao me ver. Seu rosto é perfeitamente moldado em uma simetria belíssima, nada do seu rosto parece fora do lugar, ao não ser um pequeno arranhão perto do olho esquerdo, mas mesmo assim ele é bonito de perto. Noto também os músculos fartos dos seus dois braços expostos, não tão grandes, mas mesmo assim parece ser bastante forte.
Fico concentrada olhando para ele por alguns segundos, e parece que o mundo desaparece. Sinto-me um lixo perto da sua aparência atraente suja de farinha, que acabo me curvando e caminhando para trás.
– Ah, tudo bem. Você só me assusto um pouco. Acredito em você. – Ele sorri iluminada, mas me desvio friamente para o lado, rejeitando seu aperto de mãos estranho. – Eu te assustei? 
– Foi você que me assustou! Quem você pensa que é, indo sorrateiramente por trás de mim e sussurrar no meu ouvido? Era só ter gritado comigo, e puxado o pote de volta. 
– Gritar? Eu nunca faria isso. Ainda mais com uma menina bonita como você. 
Um sorriso se forma nos meus lábios, e fico meio lisonjeada com o elogio, embora eu mesma saiba que não é bem verdade. Sou normal. Com a mesma aparência das pessoas daqui, muito diferente da combinação dele. Ajeito minha camiseta ainda um pouco corada, e ele se redireciona na minha direção, abrindo pote com sua chave de pescoço, e entregando duas barras de supertrufas nas minhas mãos abertas.
– Tome. Pode ficar. – Ele empurra o doce na minha mão, mas fecho eu punho negativamente e desviando.
– Não! Não precisa fazer isso.
– Eu insisto.  – Ele sorri mais uma vez, cruzando olhares comigo.  – É o mínimo que posso fazer por ter lhe assustado. 
Eu acabo cedendo para ele ao notar ele abrir a embalagem, e o estender para mim enquanto enfio o doce na boca. Bom. Muito bom. O gosto delicado e meio amargo da supertrufa penetra meus sentidos da língua, que dançam e flutua sobre as bolhas de leite condensado derretido com pequenas nozes. Percebo o gosto de pedacinhos diminutos de morango ao chocolate branco-meio amargo na sua cobertura crocante com mel. Doce e enjoativo. Eu amei.
Dividimos os doces, e ficamos degustando em silêncio, com o rapaz dizendo que precisará voltar ao trabalho, e não poderá me cobrir quando sair da cozinha. Acabo apressando minha mastigação e o termino finalmente, sentindo então um gosto estranho de licor.
– O que é isso?  – Digo lambendo as poucas cascas da supertrufa que caiu na minha camisa, enquanto ele percebe que cheguei ao fim do doce.
– Viu? Coloquei um pouco de licor em cada supertrufa para fazer as pessoas sentirem vontade de comer mais. Ou seja, comprarem mais.  – Ele se levanta da pia, e fecha o pote novamente.  – Gostou?
– Meu Deus, isso é uma delícia!  – Digo realmente verdadeira. Ele sorri de felicidade, e puxa a outra e estende para mim, mas me recuso dizendo que vou engorda, e ele apenas gargalha e o enfia no bolço da minha calça.
– Este é o lance... ele também não engorda.  – Ele sorri ainda meio radiante.
– Como não? É tão cheio de açúcar que poderia fazer o coração de qualquer um explodir!  – Faço uma careta e levanto os braços para enfatizar o que dissera. Nós dois rimos juntos, e ele guarda novamente o pote indo na minha direção novamente.
– Acredite. Isso é um segredo só meu. Não posso contar para ninguém como eu o preparo.  
– E... para mim? Você contaria?
– Depende. Se eu ao menos soubesse o seu nome, e confiasse realmente em você.  – Ele gargalha, se sentando em um banquinho esperando minha resposta, enquanto limpa a pia mais próxima um pano umedecido olhando para o relógio de parece.
Dou um sorriso fraco, e me direciono para a porta para não mais incomodá-lo. Digo normalmente para que ele ouvisse, segurando com força minha trança por trás das costas.
– Katniss. Katniss Everdeen. E você?
O rapaz para de limpar, e observa as frestas da luz alaranjada que entram na cozinha pouco iluminada apenas pelas janelas. Eu mal o conheço e já lhe imploro para confiar em mim. Parece besteira, mas sinto que tem algo nele maior. Como se eu já tivesse o visto. O tocado. Como se seu tivesse uma grande dívida de vida com ele. Mas o que e uma besteira, só estou aqui por simples doces.
As luzes do pôr-do-sol de um quadro próximo na cozinha o distrai por um momento o deixando encantado, e e seguida, estende mais uma vez a mão direita para mim. Com um pouco de desconfiança e vergonha na face, agarro sua mão e a balançamos para cima e para frente, como sinal de respeito e amizade. Antes que eu pudesse acrescentar mais alguma coisa, ele enfim me responde:
– Peeta. Peeta Mellark. É um prazer te rever, Katniss. 
Minha respiração é cortada ao me lembrar dos pesadelos.
                                                          [...]
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otropstories · 4 years
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 07
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                           Capítulo 7
Demoro alguns minutos para perceber que estou caída entre o meu prato coberto de frutas e molho de maçã com pães. Abro os olhos brutalmente ao ouvir a risada e gritos seguidos pelo meu nome, me chamando a atenção para que eu me levantasse logo da mesa, com o rosto encolhido.
– Katniss?! Acorda! Você está bem? – Prim gargalha um pouco, enquanto passa um pouco de requeijão em um pão mais crocante, bem devagar com a sua faca mergulhado do líquido cremoso e amarelado, levando-o, o mesmo para boca, dando liberdade para minha mãe ter a vez de me acordar. – Katniss. Acorde, Katniss! – Ela me balança pelos ombros, e me ergo tentando enxergar alguma coisa com minha visão distorcida e sonolenta. Dou um longo bocejo, o que provoca Prim para mais uma risada abafada, e lhe entrego um sorriso e troca.
Ao perceber enfim, ela ali, na minha frente bem e viva, sem estar sendo queimada ou torturada até a morte, minha mente toma conta dos meus movimentos dos pés, e quando me dou por mim, estou correndo em direção do outro lado da mesa onde Prim está sentada degustando o seu pão, a agarrando-a para o meu corpo, a apertando com força como se fosse a última coisa que iria fazer na vida. As duas me fitam com dúvida, ao meu estranho  comportamento repentino, e do nada, fico mais afetiva com as duas.
– Hã... Está tudo bem, Katniss? – Ela consegue escapar do abraço, e surge com o rosto entre meus braços. Percebo o quanto ela está bonita, com seus cabelos soltos e um pouco rebeldes, mas mesmo assim dando uma leve impressão que foram mal penteados. Sem fitinhas. Sem laços.
Esta é mesmo Prim? Só então percebo que estou, na verdade, abraçando minha mãe, um uma expressão de dúvida, enquanto a verdadeira Prim está sentada ao lado onde estava largando o seu pão com cuidado de volta ao prato.
– Ah... – Não consigo esconder minha decepção por não conseguir distinguir as duas pessoas – Eu não... Não é nada... Eu só... – Liberto minha mãe, e volto para cadeira, ainda não acreditando que estavam as duas vivas bem na minha frente – Eu... Eu só...
– Calma Katniss. Pode falar com toda calma. – Prim aperta mina mão direita e sorri para mim. Não êxito em sorrir de volta, e sugiro mais para mim mesma, do que para elas:
– Eu tive um pesadelo. Nada demais... – Abaixo a cabeça, encarando o molho de maçã amassado pelo meu rosto.
– Quantos teve? – Minha mãe pergunta – Escutei uns gritos e gemidos lá de cima esta noite quando chegou de madrugada. Parecia que estava sendo atacada por algo.
– Uns dois. Eu acho. Mas tudo bem... estou vendo que não era nada real... – Sorrio mais uma vez para Prim, que me abraça inesperadamente. Sacudo a cabeça para afastar os pesadelos, e mergulho minha garganta seca em um grosso como de chocolate quente.
Só então percebo que não consigo nem largar o copo sem tremer. Minha cabeça dói, dói furiosamente, tanto que largo Prim e começo a esfregá-la, procurando aqueles pontos no topo da nuca, mas não o encontro. Apenas uma vontade enorme de voltar para o quarto e me afundar naquela garrafa novamente.
Garrafa?
– Olhos inchados, dores fortes de cabeça, tontura... Sinais de ressaca... – Minha mãe retorna ao diálogo inacabado, pondo as mangas na mesa, me fitando como uma bronca – Katniss... Você bebeu?
Sou levada por um grande susto.
– Não. – Respondo quase imediatamente.
Será que bebi? Não me lembro de nada de ontem à noite, apenas das visões dos meus pesadelos.
– Oh, que susto. Tome isso – Ela estende um analgésico de dores de cabeça que acabara de retirar da bolsa – Beba com um pouco de água, não rápido demais, e vai ajudar com a dor. – Minha mãe sorri ainda um pouco desconfiada, e parte para a cozinha com o restante da louça da mesa de jantar, resmungando alguma de nós duas estarmos atrasadas para a escola.
Ao notar eu prato ser o único cheio e restante na mesa, me lembro de que não comi praticamente nada além do chocolate quente, e enfio todo o molho de maçã e pães crocantes com frutas goela abaixo. Percebo Prim me assistir degustar a comida com excitação do sabor maravilhoso que sinto, e gira os calcanhares para a porta, viajando em destino para escola. Mas antes que eu permita que ela parta, e atiro em frente dela na porta, e lhe puxo para o canto da sala, infelizmente perto da cozinha. Ela me olha um pouco mais confusa, e com os olhos meio marejados, eu estou tentando separar o real do irreal, lhe pergunto tudo de uma vez, repentinamente:
– Prim, você já teve leucemia alguma vez? – Falo de maneira não séria, o que lhe faz não conseguir engolir parcela do que eu disse. – Quero dizer... Você já... Teve... Câncer...?
Prim quase desmaia entre meus braços em meio ao sobressalto ao me ouvir tocar no assunto. Um leve grito, seguido de pergunta de dúvida “O que?!” e a lhe tampo a boca na mesma hora, por puro reflexo lhe obrigando a falar baixo. Depois de ser um susto de mal gosto - segundo ela - minha mãe sai da cozinha em direção ao corredor onde estamos, com a toalha no ombro limpando as palmas das mãos dos dois lados no avental, os cruzando logo em seguida. Largo Prim, e ela me olham meio atravessado, me achando de “maluca”, seguido de “vira essa boca pra lá!”, e sai apressada para a porta, o fechando com um barulho.
Eu e Marbleize ficamos nos olhando. Ela menciona algo de qual motivo que eu ainda não saí para escola... que estou atrasada... e não ficar brincando com Prim.
Mas não consigo esquecer daquele pesadelo... como aquilo aconteceu? Afinal... como fui parar na Sala de Jantar, mesmo?
Está tudo tão entalado na minha garganta... Então eu...
– Mãe! – Grito mais uma vez para que ela se vire para me encarar – Mãe! Espera... – Seguro seu avental pelas costas, e ela se vira automaticamente. 
Meus olhos marejam ao me lembrar da cena em que tenho Prim tão pequenininha no colo tentando parar de fazê-la chorar. Sinto uma mão me acariciar na bochecha, e ela tenta ainda dizer confusa:
– O que houve, Katniss? 
– É-e... é Prim... 
Sinto que estou chorando verdadeiramente agora. E se fosse real? Foi tão real? Será que esqueci dessa lembrança? E se tivesse acontecido? O quê... Se foi real, então como Prim está viva? Como ela cresceu?
– O que tem sua irmã, querida?
– Ela.. ela... – Não consigo dizer...
– Pode ficar a vontade, amor... mas precisa perguntar agora, Gale já deve vir aqui te buscar preocupado...
– Prim já tevelLeucemia? Como ela está viva? Me diga! – Grito cuspindo tudo de uma vez. 
Não sou de gritar com minha mãe, nunca fui. Ela sempre foi frágil demais quando meu pai morreu. 
Uma memória. Ela se recuperou um pouco quando se casou com John, um Psicólogo formado, que mora conosco, e eu ainda não aceitei a ideia e odeio o fato dela querer substituir meu Pai. Não importa o tamanho do sofrimento dela, ela não tira o direito de colocar um homem desconhecido e nos obrigar a chamá-lo de pai. Mesmo ainda um pouco assustada, a fito em busca da minha resposta, e ela apenas me puxa de volta para a Sala de Jantar, puxa duas cadeiras e dá uns tapinhas com os dedos como se indicasse para que eu me sentasse ali ao seu lado, pois todas essas lembranças desabam sob a minha cabeça ao mesmo tempo.
Largo a mochila no chão do corredor e entro devagar, me sentando ainda pálida. Marbleize apenas dá um suspiro prolongado, e diz:
– Katniss, querida... – Ela retira uns fios castanhos dos meus olhos, e as ajeita para detrás da minha orelha – O que aconteceu... já aconteceu. Isso já faz a muitos anos, nem sei porque tocou no assunto...
– Então isso é um “sim”? – Ressalto já com um tom alto demais para mim.
– Sim. Sua irmã já foi indicada com essa doença a algum tempo atrás, quando nossa situação não era como temos hoje... – Ela ergue a cabeça duvidosa, e se reencontra com meu olhar sínico – Mas isso já faz tantos anos! Prim ainda era uma bebê quando soube, e eu nem tive coragem de contar para vocês... você deveria ter uns nove... dez anos... não sei.
– Como assim não me contou? – Tento reviver as lembranças daquela noite, que ouvi meus pais falarem por trás da porta – Eu entrei no quarto, e meu pai confessou tudo na sua frente. Você estava até chorando e desesperada! Meu pai até me fez nunca me sentir culpada por Prim, se ela viesse morrer...
– O Quê? – Ela se esquiva para trás, quase rindo da confusão – Do que está falando?! Eu nunca contei isso para vocês. Nem chorei por nada, pois uns dias depois, um dos candidatos à Presidência se ofereceu pagar os tratamentos de filhos com doenças de modo geral, não se lembra das manchetes?
– Candidatos à Presidência? – Engulo o seco, já não entendendo mais nada – Como assim? Ela se curou?
– Sim... claro que sim. Ela nem sentiu nada, e nem precisamos contar para sua irmã. Ela cresceu limpa, totalmente saudável.
– M-mas... E aquela noite em que tropecei nas botas de caça... Prim chorava no nosso quarto, e bati a cabeça... Você e eu pai discutiam...
– Botas? – Ela realmente começa a rir agora – Como assim? Você é caçadora agora? Você e Prim sempre tiveram quarto separado, não se lembra? Quando ela nasceu você mandou avisar que não queria ouvir berros de neném te acordando... Não e lembro de ter se machucado nesse nível quando criança, Katniss. Que cabeça!
– Quartos separados?! Eu era tão arrogante assim?
– Não querida... – Minha mãe dá um rápido beijo no topo da minha cabeça – Você só... Não queria dividir o quarto. Você sempre foi tão isolada... É raro você ter esses pesadelos, ainda assim tão estranhos. Sempre te demos tudo do bom e do melhor.
– Como assim “tudo do bom e do melhor”? – Não acreditava nisso. Não de acordo com o que vi no sonho. Éramos tão pobres...
– Sim, Katniss! Temos uma vida tão boa gora que me casei com John! Não passamos nenhuma necessidade agora. 
Fico muda. Gélida, como se aquela realidade não e pertencesse.
Eu não deveria estar ali. O que estava aconteceu? Onde estava?
Quem é Happier? Quem é Aaron? Quem é Garret? Quem é Jo? Quem é Peeta? O que era aquela música? Aquela cozinha... aquela jaqueta... como se eu... sentisse...
– Katniss. Vai se atrasar para escola.
Três minutos se passam. Um conversível Camaro para em frente da nossa frente de casa, e ouvimos o motor ser desligado e a buzina soar inúmeras vezes. Me viro em direção da janela, sorrindo sem nem mesmo precisar ser que é, e volto o olhar para Marbleize. Corro para o corredor, puxando a mochila, e me despedido por mais um dia de minha mãe.
– É Gale. Preciso ir.
– Tenha um ótimo dia, Katniss. – Ela me abraça – Volte com Gale hoje à tarde. Vou preparar um jantar fabuloso, e iremos conhecer o novo chofer da casa, sim?
– Sim. Tudo bem. – Faço aquela expressão de realmente se sentir incomodada com aquilo.
– Então vá. Mande um abraço para Hazelle se vir ela na sua enfermaria hoje, tudo bem?
– Tudo bem. – Em seguida, aceno para ela que corresponde, e fecho a porta de vitral com cortinas de renda por dentro. Pulo as escadinhas da varanda, e corro em direção do carro, esperando ser liberada para me acomodar.
O vidro totalmente negro do lado do Motorista se abaixa de repente, e Gale aparece com óculos escuros e com suas roupas despojadas e modernas. Preciso me conter no riso para não causar um ataque, e apenas fico ajeitando a mina trança enquanto ela libera a porta traseira.
– O que tá fazendo, Katniss? – Gale faz um típico olhar de decepção ao me ver sentar longe dele – Não vai ficar aqui na frente?
– Prefiro ficar o mais longe possível de você, senhor Hawthorne. Conheço suas intenções... – Eu sorrio com deboche, e ele me observa rindo pelo espelho da frente.
– Que sorriso lindo. – Ele fica em estado de observação, sorrindo um pouco também.
– Pare! – Jogo minha mochila na sua direção, que apenas cai no outro acento da frente. – Anda logo! Vamos pra escola.
– Ainda não... – Ele desliga a chave do carro, e começa a fingir que o carro morreu. Ele dá umas batidinhas no volante, e a xingar inofensivamente, esfregando a cabeça. Admito que ele é ótimo ator. Ele se via para mim, e comunica:
– Que droga. Droga, Katniss!
– O que houve? – Começo a rir.
– Parece que... o Carro morreu. Não quer pegar mais! Droga... como não tenho mais combustível, ele vai precisar de um outro combustível...
– De que tipo? – Ponho os cotovelos nos joelhos, e fico enroscando a trança nos dedos, com uma face sensual. Ele sorri com minha posição, e se aproxima do meu rosto, e me encara por uns segundos eternos. Ele não me puxa, e apenas diz:
– Beijos – E toca meus lábios até como se fosse devorá-los, famintamente. 
Ficamos lá, tocando beijos até precisamos recuperar o fôlego, mas não queremos parar. Gale larga o volante, e começa a me agarrar, começando pela cintura e indo para o meu rosto.
Estamos no auge de preliminares vorazes, quando sinto um gosto amargo. Ele sibila ódio, fogo e fúria. Rebelião. Raiva. Me desprendo de Gale, e começo a tossir, como se sua boca fosse veneno para mim. Sinto vontade de vomitar todo seu resquício de meus lábios, quando ela acaricia meu rosto, e não evito em olhar para ela. Olhos cinzentos que mostram Vaidade. Raiva. Ódio. Amor pelo dinheiro. E isso é tudo o que mais Não quero para mim. Para minha vida... os sonhos... Ele...
– O que foi, Katniss? Não gostou dos beijos? – Ele ri maliciosamente, e tenta se aproximar mais uma vez, mas me desvio e seus lábios se encontram com meu pescoço acidentalmente, o que tanto faz, já que ele se mostra igualmente satisfeito mesmo assim. Sinto como se uma víbora me sugasse pelo pescoço, e seu venenoso escorresse por ele.
Ele. Seus lábios são desconhecidos para mim, por isso. É por causa dele que fiquei tão triste. Ele...
– Katniss...? – Ele tenta se aproximar pela terceira vez.
– Você não é Peeta.
Gale para se se aproximar no mesmo instante, e me fita amargurado. Fico em estado de paralisa, sem acreditar no que disse, ou no que ele deve ter interpretado.
Peeta.
Quem é? Nem eu sei, e estou aqui, recusando-me beijar Gale, o único que ainda pode continuar salvando minha família da pobreza com seu dinheiro, e falando de um desconhecido, com um tom que, de certa forma, pode ser interpretado como se “ele” fosse melhor que Gale. Que eu estivesse o traindo. Mas não estou. Gale se afasta do meu corpo, e percebo a posição que estávamos, deitados nos bancos com as roupas totalmente amassadas, tentando segurar a primeira coisa pela frente para se controlar, e não deixar os desejos tomarem conta de nós. Sento em uma posição reta, como se eu estivesse sendo levada para a prisão. Silêncio. Gale religa o carro, e o começa a dirigir, dobrando na esquina. Olho seu rosto pelo espelho... “decepção”, “medo”, “raiva” defini seu olhar vazio. 
O que eu fiz? 
– Estamos atrasados. – Ele finalmente diz com um sorriso meio torto, e segue ainda com um certo tom de fúrias nas palavras. 
Oh. Só espero que ele não saia pela escola com seus colegas em busca de um “Peeta” na escola e lhe dar uma surra até sangrar pelo nariz. Será um caso perdido. Aquele rapaz só vi apenas em um sonho.
E mais uma latente dor atinge minha cabeça, e começo à repetir as memórias que eu sei, de olhos bem fechados, respirando calmamente:
Meu Nome é Katniss Everdeen. Tenho 16 anos. Minha família estranhamente ficou rica, mas podia jurar que éramos pobres. Não faço ideia de quem seja Peeta. Ainda estou escalando a árvore para pegar o ninho de passarinho para Prim. Sei que ela vai gostar de um filhotinho. Anda mais de pássaros que sabem cantar.
Vejo rapidamente uma televisão ligada em um Bar enquanto o semáforo está ligado. Uma notícia de ultima hora sobre as eleições de ontem, reprisando o ganhador da Presidência do País, por apenas dois pontos de diferença com o concorrente, uma mulher de cabelos brancos e coque, que não transparece raiva ao perder, mas sim respeito pelo ganhador e disciplina, mas mesmo assim, um pouco de desespero no olhar. Eu até respeito isso, de certa forma. A tela se escurece e mostra com um close o rosto do vencedor: Um homem de cabelos e barba um pouco desgrenhados e brancos, mostrando um pouco da velhice. Um rosto meio enrugado, de lábios carnudos, e de luvas brancas, usando um terno totalmente preto sem um fio fora do lugar, e estranhamente, uma rosa avermelhada no seu bolso.
Antes que Gale saia com o carro, o seu nome é mostrado piscando várias vezes ao lado da foto, com seu percentual de vitória; logo estranho seu nome, como se algo fosse acontecer:
CORIOLANUS SNOW.
                                                         (...)
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otropstories · 4 years
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 06
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                           Capítulo 6
Uma vez quando eu era criança, eu havia subido em um carvalho. Bem alto, só para poder pegar o ninho de passarinho. Havia um lá no topo. Me lembro de ter escalado até o último galho. Estava toda arranhada por causa dos espinhos e das folhas. Mas estava determinada a tocar no ninho.
Era chuvoso, e era noite. Gale gritava até ficar sem voz. Inúmeras vezes o meu nome para que eu descesse. E saísse da floresta. Mas eu não queria. Não queria voltar.
Prim havia me pedido um dos lindos filhotes daquele passarinho negro que repetia nossas notas. E eu havia prometido que pegaria um para ela. Prim não podia esperar. Ela estava com Leucemia. Estava morrendo.
Assim que eu relaxei novamente, adormeci. Para minha infelicidade, tive outro feche que me apagara a memória.
Eu era apenas uma criança, por volta dos oito anos, quando aconteceu. Minha mãe havia dado à luz a pouco tempo á uma menina, e eu ficava por detrás das pernas do meu pai, olhando de longe o bebê de cabelinhos loiros reluzentes e de fraudas, que engatinhava com receio de cair aos braços dele. Eu já a amava. Não sei como, mas sentia que precisava protegê-la do mundo fora do nosso quarto. Mesmo criança, eu já sabia o que acontecia no mundo, através dos jornais que meu pai trazia para casa, e pela nossa miúda Televisão.
 A violência se apoderava com a corrupção no Planeta: guerras por petróleo, confrontos de ditadores, fome e morte na África, doenças não-tratadas, jovens sendo estupradas no caminho da escola, pessoas bêbadas no voante, tirando a vida de inocentes nas ruas, adolescentes ateando Fogo em bandeiras comunistas de países em Guerra ao Terror, desastres naturais, e dentre outras coisas mais, que nem consigo enumerar. Eu só podia sentar na sala, ao colo do meu pai, e observar calada o trauma que me consumia. Eu não podia deixar que Prim passasse pelas coisas, então fiz de tudo, para que ela não se machucasse com nada. Me tornei sua guardiã Legal. Sua protetora.
Em uma noite, Prim começou a chorar no berço – na calada da noite, de surpresa – e a se contorcer incessantemente. Seus gritos em meio ao choro me acordaram na mesma hora, assustando-me; como dormíamos no mesmo quarto, minha cama arranhada e velha com seu bercinho doado por uma vizinha nossa, fiquei com medo de ir até lá, e fazer alguma coisa, mas de qualquer forma precisava aquietá-la. Meu pai acordava todos os dias logo de madrugada, - praticamente – e saía para trabalhar. Não podia acordá-lo. Logo então me levantei da cama, arrastei o cobertor de lã grosso do meu pequeno corpo; e como não havia mais nada para calçar no quarto – completamente escuro – pus minhas botas de caça que ficavam á beirada do colchão, perto da parede, e me dirigi ao berço da bebê que não parava de chorar. Seu rosto pálido e enfraquecido por necessidade de comida, já estava altamente corado de tanto espernear em meio ás lágrimas, e eu não fazia ideia do que fazer.
Puxei seu pequenino corpinho, com aquele cheirinho gostosinho de bebê para os meus braços, a pus no meu colo e comecei a embalá-la para que voltasse a dormir, mas de nada adiantava. Ela continuava a berrar e a se debater, em meio ao meu ombro com sua cabecinha, e eu, balançando de um lado para outro, clamando para que ela parasse de chorar logo:
– Ssshhhiii... calma... calma... vai ficar tudo bem... não há motivos para chorar... – Dizia com a voz mais calma e doce que conseguia. Depois de alguns minutos embalando ela, Prim se acalma um pouco. Seus lindos olhinhos de diamante lapidado se abrem, e seu olhar me hipnotiza um pouco, até eu parar de movimentá-la.
A bebê Prim me fita em busca de algo. O que posso fazer? O que vou dar para ela? Acalmar Prim... Papai. Prim. Sã e Salva...
Do nada, começo a cantar. Uma simples canção de três estrofes e um coro, de ritmo calmo e aconchegante, que havia decorado; depois de ouvir meu pai cantar durante as obras da construção do novo Prédio da Receita, quando fui levar o almoço para ele e os outros trabalhadores. Lembro-me do meu pai ter me dito que ele próprio havia composto a canção, pouco tempo depois de ter nos mudado para cá, e nós tínhamos muito medo. Eu respiro fundo, e com um pouco de cuidado, a coloco em outra posição do colo, e permito as letras de cada estrofes surgir repentinamente na minha cabeça, seguidas de um fundo de pássaros negros seguindo com suas vozes harmônicas, em silêncio me ouvindo cantar:
"Eu me lembro das lágrimas escorrendo pelo seu rosto Quando eu disse "nunca te deixarei ir embora"... Quando todas as sombras quase acabaram com a sua luz Eu me lembro que você disse ‘não me deixe aqui sozinho’ Mas nesta noite tudo está morto, acabado e já passou..."
Prim me olha com visão de desconhecida, não dando um pio sequer.
"Somente feche seus olhos O sol está se pondo Você ficará bem Ninguém pode te machucar agora Ao chegar a luz da manhã Nós ficaremos sãos e salvos..."
Seus olhos ficam maiores a medida de aumento a voz. Tento ser mais suave.
"Não se atreva a olhar pela janela Querido, tudo está em Chamas. A guerra do lado de fora da nossa porta continua devastando Agarre-se a essa canção de ninar Mesmo quando a música tiver acabado Acabado..."
A Letra me atinge verdadeiramente agora. Agora lembro por que não acreditava mais nesta canção, mas continuo.
"Somente feche seus olhos O sol está se pondo Você ficará bem Ninguém pode te machucar agora Ao chegar a luz da manhã Nós ficaremos sãos e salvos."
A bebê começa a se ajeitar no meu colo em busca de uma posição confortável. Ela fecha os olhos, anunciando o sono.
"Somente feche seus olhos... Você ficará bem Ao chegar a luz da manhã Nós ficaremos sãos e salvos... São e Salvos."
Assim que Prim começa a dormir confortavelmente. Um leve ronquinho emana dos seus pequenos pulmões, eu a colocaria com cuidado de volta para o berço, mas meu corpo e minha mente estão inteiramente gélidos e rígidos. Não consigo piscar nem me mexer, apenas sentir o calor gostosinho do corpinho de Prim entre meus braços, e a cãibra que me coroe pelos pés.
O que foi isso? Por que eu cantei isso? Nunca acreditei nesta letra, nunca me senti segura com a luz da manhã.
Apenas quando ouvia a canção da tão bela voz de meu pai, não consegui responder o que realmente achava da sua tradução; o que não me importava mais, pois queria ouvir sua voz. Os pássaros negros em luto, brigando comigo espaço para ouvi-lo. Apenas quando ela terminava de cantar, e olhava para mim erguendo as sobrancelhas em busca de opinião, apenas arquejava e balançava a cabeça para cima e para baixo rapidamente, sorrindo para amenizar minha dor. Eu não entendia aquela letra. Ou melhor, não acreditava. Tudo era cruel, como se sentiria segura? Protegida? Apenas podia fazer o que meu pai fazia: Falar asneiras por meio de músicas que ficaria tudo bem para as pessoas que mas amava. Eu. Prim.
Sacudo a cabeça rapidamente. O sono me contrai incessantemente para voltar para a cama, e dormir profundamente, e parar de pensar na música. Quando penso e levar Prim de volta para o berço, minha mãe entra de supetão e quase desesperada no quarto, abrindo a porta com força e iluminando o quarto com uma grande fresta de luz vinda das velas do nosso corredor. Ela me olha que eu jurava que tinha corrido pelo modo que arqueja e tosse, talvez tenha ouvido tarde de mais os gritos da filhinha menor. Em seguida pousa o olhar para a bebê adormecida nos meus braços, e vem com toda raiva e força que lhes restam para arrancá-la de mim.
Me desvio da minha mãe. Ela puxa meu fino braço com um beliscão potente o bastante para me arremessar do outro lado do quarto, mas não solto Prim ou entrego para ela. Minha mãe já começa a deixar a sua fúria lhe descontrolar, e então me empurra com força para o parapeito da janela de ferro fundido do nosso quarto, e ocorre o acidente:
Bato a cabeça com tanta força no parapeito, que desabo no chão com a bebê, berrando quase tentando evitar, o barulho de dor animalesco ao sentir a ardência descomunal que se segue na nuca quase no mesmo instante. Um fio grosso de sangue. Ele pinga para o chão, passando pelo meu rosto. Respingando nas roupinhas de Prim.
Minha mãe não sabe o que fazer. Ela tenta me levantar e gritar que sente muito, mas não consigo me mover. Não com aquela dor impregnada na minha cabeça. Prim volta a acordar, e desta vez chora e berra dez vezes mais, se debatendo e me chutando que até me machucar. Minha mãe enfim a toma para seu colo, balançando de um lado para o outro a bebê desesperada, tentando amenizar toda aquela cena, tentando acabara com os pesadelos negros. E eu sangrando. Covarde para não recuperar Prim das garras da minha mãe.
Meu Pai entra no quarto rapidamente, surpreendido com os gritos da bebê e da própria mulher. Ele entra quase voando em minha direção, me puxando pelo colo, e carregando-me para o corredor escada abaixo. Posso dizer que eu desmaio, pois não me lembro de mais nada anterior á isso, apenas minha mãe dizer do quarto apenas para ela mesma...
“Ela ainda não está respirando direito....”, e adormeço, no colo silencioso do meu pai, sendo puxada pelo imensidão e teimosia misturada a necessidade de repousar e descansar finalmente, onde a dor é uma coisa que não sinto mais.
                                                             [...]
Uma espécie de pasta gelada com ervas ardentes congelantes, me acorda quase sobressaltada ao senti-las pinicando na parte de trás da minha nuca. Eu abro meus olhos com força, me obrigando chutar por quanto tempo eu me permitir dormir, talvez por três ou cinco horas no máximo, pelo amanhecer que vejo pela janela.
Percebo que estou deitada na grande mesa da cozinha, cercada de faixas, panos umedecidos – a maioria manchada de vermelho – talvez usadas para estancar meu sangue, uma pequena mesinha móvel de alumínio, com uma toalha perolada, e uma bandeja transparente portando um bisturi, alguns analgésicos, pomadas e alívio de dores, uma agulha e um rolo de linha hospitalar esterilizada. Uma pequena picada de dor me atinge no local do impacto ao pensar na coisa, então me levanto da mesa, e esfrego com a mão direita no lugar onde mais dói, sentindo as camadas dos pontos.
Dou mais uma rápida olhada na cozinha. Não tem ninguém. Um leve murmúrio se segue para cima, mais precisamente no teto. O segundo andar. O quarto dos meus pais é bem embaixo da cozinha, o que facilita e deixar ouvir sobre o que murmuram, mas não o suficiente para entendê-los. A curiosidade infantil me domina neste momento, e mordo o lábio inferior curiosa para saber o que se trata. Eu? Eu sou o motivo? Talvez porquê eu recusei dar Prim para minha mãe, e sinceramente não sei por que fiz isso. Afinal, ela é a mãe dela, não é? Era sua obrigação botá-la para dormir; mas por algum motivo, não confinei em seus braços.
Nunca confiei na minha mãe, jurava que apenas enxergava uma Besta com garras e lâminas nas unhas vir querer arrancar e matar Prim na minha frente, mas então a memória me surge, revelando-me que na verdade, tropecei nas próprias botas na escuridão ao me assustar com a figura de minha mãe entrar desesperada no quarto, me atingindo por conta própria na cabeça. Seu desespero me fez acidentar. Talvez seja esse o motivo da discussão, o que me faz me socar por contra própria eu ser a razão da briga dos meus pais, agora. Eu quero morrer. Por que não morri na batida? Sim, aquilo não foi forte o suficiente, mas teria sido melhor que eu tivesse morrido. Assim, não teria que ouvir a briga que lhes causei.
Sou sádica. Sou masoquista. Isso vem de família.
Não consigo me conter mais. Subo ligeiramente nas escadas velhas de madeira – agora apenas de meias – em direção ao segundo anda. O murmúrio acaba se tornando em alguns berros e conversa alto conforme me aproximo, não altos o suficientes para serem considerados escândalos, mas ainda sim altos. Prim. A voz minimiza ao se lembrar da criança que precisa dormir. A única que realmente precisa de amor e proteção agora.
Piso no chão de madeira. O quarto deles é bem no final deste corredor, mas ainda dos primeiros degraus, consigo enxergar a porta entre aberta, com vultos passando de lá e cá a todo o momento. Uma agitação se apodera no quarto, até eu conseguir apertar o passo e desabar – por sorte, silenciosamente – perto da porta. Recupero-me, e tento abri-la mais um pouco para enxergar o quarto por dentro. Os vejo desesperados, com as mãos nas cinturas, e rostos franzidos de preocupação, sentando na cama, se levantando, girando uns pros outros e falando de problemas. Tento escutar mais a situação, desta vez, com o ouvido recostado na porta.
– Não tem mais jeito, Jo... – Minha mãe exclama em lágrimas para meu pai – Eu verifiquei cada parte do corpo dela. Todos os sintomas que ela apresenta só provam o que o médico me disse... – Ela desaba entre as mãos, choramingando.
– Acalme-se. O que Brunner falou para você sobre ela? – Sinto a ponta de angustia na voz de meu pai, como se não aceitasse uma notícia.
– Que os poucos exames que fizeram nela estão corretos. Veja os sintomas dela, Jo! Ela não respira direito! Vive esfregando os músculos por sentir-se sempre fraquinha! Tem inchaço no pescoço, e sua pele está mais frágil do que o normal... ela está muito pálida... ainda por cima, se recusa mamar! – Ela continua, quase desistindo da vida que lhe resta, berrando.
– Preste a atenção Marbleize... – A voz de meu pai se torna mais firme – Isso não é verdade. Os exames... podem estar errados ou trocados. Você mesma mencionou que esse tipo de erro acontece muito no trabalho. 
– Eu sei o que disse, mas... v-veja! Olha o que minha bonequinha está passando! É ainda tão pequena, e já é vítima da maldita leucemia.
– Brunner confirmou que é leucemia?
– Câncer infantil. Sim. Mas acho que um tipo mais agravante, Jo. Talvez seja síndrome anêmica pela irritabilidade da pequena na hora de dormir. – Sua voz desaparece – Jo. Ela só tem alguns anos... não quero perde-la.
– Nós não vamos perdê-la! Olhe pra mim, Marbleize, eu não vou perder minha filha para uma doença! – Desta vez, meu pai sai de controle de si, e agarra minha mãe pelos ombros, ligeiramente sacudindo-a – Vamos pagar o tratamento. É o único jeito para ela viver com o tempo, talvez se recupere...
– Jo, você se esqueceu de o quanto estamos endividados? Não temos dinheiro para comprar comida para nossas filhas, quanto menos um tratamento de câncer!
– Vendemos a casa, se for necessário. Mas não vamos perder ela, eu lhe juro que não. Não irei abandoná-las.
– Você jura?
– Eu Juro. Por nós quatro.
Meus pais enfim se abraçam e rapidamente permitem trocar um encontro de lábios. Um beijo rápido e desesperado, usado muitas vezes para suportar dores, mas em seguida minha mãe desaba em choro, molhando completamente a jaqueta do meu pai, que a consola entre um abraço forte.
E eu. Sem conseguir engolir o que acabara de ouvir.
Eles não estavam se referindo à mim. “Bonequinha”, “Pequena”. Era dela que estavam se referindo, e não de Katniss.
Uma doença... Leucemia... Incurável sem tratamento apropriado e caro, matando crianças por todo lado que eu vejo muitos conhecidos meus, amigos de brincadeiras contraídos desta rara doença, e morrendo sem nem sequer ter a chance de dar o primeiro beijo, ou escalar uma árvore na vida. Sem infância. Tendo a chance de viver arrancada dos seus corpos fracos. Agora percebo que estou tremendo e meu corpo se debate violentamente, sem falas ou reações, apenas permitindo as lágrimas esvaindo e me encharcando. Para completar, a dor dolorosa volta a me pinicar na cabeça, mas isso não é o importante. Ela. Prim. Era dela que falavam.
Prim tem Leucemia. Prim vai morrer.
Prim vai morrer.
Morrer.
Eu falhei como protetora...
Minha razão e controle não existem mais neste momento de susto eterno. Debato-me por trás da porta, até meu pai ouvir os pequenos barulhos, se separar da esposa inconsolável e abrir a porta velha, comigo – é claro – despencando com o rosto no chão. Ergo-me por susto, levantando-me e ajeitando as roupas como posso, e o sinto me fitar pelos olhos. Estou tremendo. Estou encharcada. Estou com medo. Meu pai ao me ver no estado de choque, me levanta e me sacode pela cabeça com as mãos mornas. Ouço meu nome ser anunciado várias vezes em alto e bom som, mas não tenho sentido de nada agora. Apenas só consigo chorar como minha mãe, pensando no que vai ser da nossa vida sem Prim. Mas nasceu e conhecemos, e já vai ser arrancada de nós assim.
Jo, meu pai se ajoelha diante de mim, limpando minhas lágrimas e o rubor de choro do meu rosto já pálido. Ele me abraça com potência, esfregando a mão nas minhas costas, e se voltando e olhando nos meus olhos:
– Filha... sei que você pode ser nova demais para entender isso agora... mas preciso que prometa para mim – Ele aperta minhas mãos com força, me forçando olhar nos seus olhos e me ver em reflexo – Prometa-me que nunca vai se sentir culpada pelo estado de Primrose, me ouviu bem!
– E-ela... vai mesmo morrer...? – Fico tremendo, sentindo-me como se tivesse sido esfaqueada, e meu corpo perde todo o calor. Sinto minha alma fica gelada. Eu falhei.
– Não sabemos. Sei que você ama muito sua irmã, mas prometa para mim; na frente da sua mãe! Você nunca vai se sentir culpada pelo que vier acontecer!
– Mas... eu... – Tento negá-lo.
– Prometa-me!
Balanço a cabeça em uma resposta de afirmativo. Mais uma vez, estou mergulhada nos meus dilemas. Por algum motivo, não quero soltar meu pai. Não quero deixa-lo trabalhar hoje, como se ele nunca mais fosse voltar para casa, e eu nunca mais iria voltar á vê-lo.
Estamos todos chorando neste momento. O que viesse acontecer com a nossa família, com nossas dívidas, nossa casa, nossos estômago, nossa saúde, nossas vidas, precisaríamos ser fortes. Confiar em Deus, era o que meu Pai sempre dizia para mim, deixá-lo escrever o nosso futuro, e dar as mãos, nos dizendo entre abraços que vai ficar tudo bem, e que nunca passaríamos fome. Eu não sei o que seria de mim sem meu Pai, como se ele fosse, uma parte da minha alma fosse junto, e que nenhum outro homem poderia preenchê-lo com sua companhia. Prim era a outra metade. E se ela também fosse embora? E se os dois me deixassem aqui, sem Alma para habitar este corpo? Com certeza, me sentiria destruía internamente. Por que todos que conheço e amo estão predestinados a morrer? Por que sou obrigada a fica sozinha? Por que tudo é tão difícil e em Chamas? Por que sei que no fundo, nunca mais teria uma vida normal novamente. Eu teria que assumir a chefia da família, já que minha mãe seria imprestável demais.
Teria que envelhecer mais rápido em mente do que os adultos normais e me preparar para o pior. Segurar a mão de Prim. Vê-la crescer e amadurecer. Sem mortes pela televisão. Sem guerras e fome pelo mundo. Apenas eu a minha família, livres da garra da sombra de um Tordo.
Um Tordo negro. Pegando fogo em rebeldia. Uma flecha.
Paraquedas.
Ela morreu.
Outro Fleche.
Um Aerodeslizador com insígnia da Capital materializa-se sobre a barricada das crianças. Dezenas de para quedas prateados chovem sobre elas. Mesmo nesse caso, as crianças sabem o que existe dentro dos para quedas prateados. Comida. Remédios. Dádivas. Eles os abrem ansiosamente, os dedos congelados lutando com as cordas. O Aerodeslizador desaparece, cinco minutos se passam e então mais ou menos vinte para quedas explodem simultaneamente.
Um ganido pode ser ouvido em meio à multidão. A neve está vermelha e repleta de diminutos corpos despedaçados. Muitas das crianças morrem imediatamente, mas outras estão deitadas no chão na mais completa agonia. Algumas cambaleiam em silêncio, mirando os para quedas que sobram nas mãos, como se eles ainda contivessem algo precioso. Posso afirmar que os Pacificadores não sabiam que isso iria acontecer pela maneira como estão arrancando as barricadas, abrindo caminho até as crianças. Um outro grupo de uniformes brancos passa pela abertura. Mas esses não são Pacificadores. São médicos. Médicos rebeldes. Eu reconheceria aqueles uniformes em qualquer lugar. Eles metem em meio às crianças como um enxame de abelhas, brandindo kits médicos.
Primeiro vislumbro a trança loira nas costas dela. Em seguida, assim que ela arranca o casaco para cobrir uma criança que não para de chorar, reparo na fralda da camisa para fora da calça. Tenho a mesma reação que tive no dia em que Effie Trinket chamou o nome dela na colheita.
Pelo menos, devo ter perdido os sentidos, porque me encontro na base do pau da bandeira, incapaz de compreender o que aconteceu nos últimos segundos. Então continuo avançando em meio à multidão, exatamente como fiz antes. Tentando gritar o nome dela com uma intensidade que consiga superar o barulho reinante. Estou quase lá, quase na barricada, quando penso que ela está me ouvindo. Porque por um segundo apenas ela me avista, seus lábios formando meu nome.
E é então que os para quedas restantes explodem.
O corpo de Prim fica em chamas. Ela a consomem viva até parar de se debater. Meu corpo estirado no chão, também em chamas, mas afogados, limpos e cuidados, como eu fosse mais importante para se salvar, do que ela. Lembro-me então que meu pai realmente morreu.
Que minha mãe fosse uma louca e que me tivesse abandonado novamente. Que meus amigos mais chegados que irmãos, fossem também levados por apenas me conhecerem. Por apenas fazerem parte da minha vida. Talvez essa novela nunca acabe, como se eu ainda não tivesse entendido o recado que isso todo acarretaria um dia. A Esperança. Que ela vinha apenas depois das tribulações.
Ainda estou em dúvida de quem seria Peeta.
O que ele significava para mim. Em um pesadelo anterior, depois de analisá-lo bem, percebo que ele seria meu marido. Um companheiro. Alguém para preencher o lugar do meu Pai. Mas e a outra parcela? Me lembro agora da Menina e do Menino. Meus filhos. Crianças inocentes. Tomando conta do lugar que era de Prim. Mas agora tudo o que sei, e que não vou deixar isso acontecer novamente. Não com minha nova família.
Não vou deixar.
Morrer.
                                                           [...]
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otropstories · 4 years
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 05
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                            Capítulo 5
ALGUNS ANOS ATRÁS
  Outono. Dia 12 de 2012
Até parece que estou tendo uns daqueles pesadelos novamente.
Me movimento em busca de algo para agarrar, mas tudo que tenho, são dois travesseiros macios e pouco usados por mim na cama. Minha boca se abre e fecha constantemente, com uma tentativa de soltar um grunhido ameaçador de dor contínuo, mas, minha garganta só dá passagem para respirações distorcidas e mordidas involuntários nos lábios, e já sinto a potência das mordidas machucando minha boca, a retalhando, conforme me contorço na cama. Meus braços ficam suspensos no ar, tentando puxar com a força que me resta, ela. A enxergo correr na minha frente, mas meus braços não esticam o bastante. As bombas a acertam antes que mesmo que eu a alcance.
Ela está bem ali. 
Sentada na colina, cercada até a cintura de flores e mato. Ela permanece concentrada no que seria "arrancar" as pétalas das flores que acabara de colher entediada, enquanto o mais novo corre quase alcançando voo entre as perninhas gorduchas, carregando consigo um aro de metal finíssima, que mal se pode enxergar na corrida do menino, que solta bolhas coloridas e felizes conforme o vento se esticam no sabão com água diluída, contida no aro. Sinto uma mão quente passar livremente na minha cintura. Ele permanece parado, me fitando com os olhos azulados dos céus, com uma cara sorridente de orelha á orelha, ao poder assistir o espetáculo que é ver seu filho loiro, de olhos acinzentados poder correr com as borboletas, e suas bolhas coloridas, sorrindo e gritando para que eu assista ele correr também, além o espetáculo das suas bolhas no ar.
Entendo o motivo. Peeta mal pode correr como uma pessoa normal poderia, por causa da sua perna arrancada do corpo, substituída por uma prótese capitalista. Apesar de ser bem útil, confortável, e que faz Peeta não reclamar mais dela, e nem senti-la como parte do corpo agora.
Poder ver Aaron correr e saltitar, agora mais perto da irmã, dando estrelas em cima das suas flores só para implicá-la, o deixa alegre. Nossos filhos. Cheios de saúde, Paz e Carinho, com qual sempre tivemos receio de nunca dá-los. Eu pensava assim. Meus dedos se caracolam, e fazem pequenas voltinhas no conjunto de cabelos negros da cabeça dele. A criança está deitada no meu colo agora, com os olhos marejados de sono e aprofundados com peso, mostrando que não iria se levantar do meu colo tão cedo.
Sinto uma cãibra nas costas por ficar ereta demais, ao lhe dar conforto nas minhas pernas em uma posição esticada. Me aproximo do corpo quente de Peeta, que me agarra, e me dá apoio para descansar as costas; me abraçando pelas costas. 
Sinto o perfume de pão fresquinho de Peeta.
Sinto o cheio das orquídeas de Happier.
Sinto o cheiro de sabão e tinta acrílica e aquarela de Aaron.
Sinto o cheiro de frutas e lama de Garret.
Sinto o cheio da paz. Da tranquilidade.
Do amor. 
Mas, principalmente, da esperança.
– Acho que enfim, você foi recompensada. – Inicia Peeta em um diálogo, ainda rindo de Aaron cambalhotar saltos que nunca me imaginaria ter coragem de fazer.
– Hã...? – Digo meio ríspida e devaneada, puxando mais o corpo de um Garret adormecido no meu colo, que se contorce com a gritaria das crianças.
– Quero dizer... – Ele faz uma pausa, e em seguida começa a gargalhar rapidamente se deliciando. – Tudo o que já nos aconteceu. O que nos aconteceu. O que passamos... o que perdemos... está tudo sendo recompensado neste instante. – Ele aponta para os seu filho risonho e sua filha furiosa, carregando um buquê de flores aleatórias pisoteadas.
Me esquivo para pensar.
O que eu passei... o que eu sofri. Algo que cicatrizes nunca se fecham totalmente. Elas permanecem em marcas na parte do corpo, onde você sentiu a dor. Mas sei que um dia, elas irão desaparecer. E sei, que este dia será hoje mesmo. Um sorriso explode no meu rosto. Vejo Peeta sorrir involuntariamente por puro reflexo para mim de volta. Será mesmo? Todas as vidas perdidas, mortes que poderiam ter sido evitadas, e crueldade capitalista foram, enfim, recompensadas? Não... o preço foi alto demais. Por mais que meus olhos marejem de felicidade por ter tido concebido filhos para Peeta, nunca os pesadelos dos Jogos irão sair. Eles estarão ali. Me martelando que eu fui fraca, traidora, assassina durante um Massacre. Que aquelas vidas inocentemente puras, foram perdidas. Outras nem podem ter o privilégio que agora tenho na vida, as melhores coisas dela, que são de graça.
Mesmo que de uma forma ou outra, eu não mereça isso tudo. 
Não eu. Eu nunca mereci. Minha forma de bastante transparece, berrando aos céus que eu deveria ter morrido logo naquela Arena. Na primeira. Assim, Prim estaria viva. Cuidaria da mamãe por mim, e seria uma ótima mãe um dia. Sempre sonhei em ver meus sobrinhos correndo aqui na colina perto do lago. Eu os ensinaria à caçar. Provavelmente, estaria casada com Gale, se nossos nomes não teriam sidos lidos naquela Colheita.
Estou dispersa. Lágrimas rolam até meu queixo e cair devagar no rosto pálido de Garret, que se contorce acordando.
Dou um leve gemido de susto, "Ah!", e me levanto, me libertando dos braços de Peeta. Ponho cuidadosamente Garret no colo, que se ajeita entre meus braços, puxando para si minha camiseta, a agarrando-a. Dou um leve beijo em seus cabelos castanhos bagunçados, e me viro para Peeta:
– É melhor voltarmos para casa. Tenho que devolver este aqui para o pai, já capotou de sono, de tanto brincar. – Lanço um sorriso para Peeta, olhando de volta para o rosto moreno de Garret. Peeta concorda, e se levanta também, alisando meus braços, e enfim, dando um leve e rápido encontro de lábios com os meus, fitando os meus olhos.
Ele corre em direção de Happier, que recolhe as pétalas caídas, que caminha com calma para a trilha de volta para casa, sem precisar da minha ajuda, acostumada com a floresta. Deixo minha filha voltar sozinha.
Peeta tenta convencer um bravo Aaron, que reclama que quer ficar para brincar mais, e que nem nadou no lago anda. Peeta se o agarra para o colo, que se debate entre seus ombros com os braços e pernas, berrando. Ele o joga para cima, e o empurrando contra o ar, e descendo, usando o corpo de Aaron como um avião, fazendo barulho de motor e nave decolando.
Ele e Aaron sorriem maliciosamente para um o outro, que combinam mentalmente que assustar Happier sozinha - eu adivinho por ambos olhares - e quando enfim a achamos, Peeta a agarra nos seus braços também, que os deixa os dois suspensos no ar, se debatendo e rindo sem controle.
Momentos assim são únicos da vida. Não é como respirar, comer, dormir ou dar um sorriso forçado para alguém. Mas é com dar seu peso das costas para Deus, e viver o que resta da vida. E a minha estava esfolada. Até eles nascerem, e me iluminarem como anjos. Meu marido me iluminou também. Nunca poderei agradecer à Peeta o suficiente por se voluntariar em tomar contar pelo resto da sua miserável vida de mim. Nunca poderei pagar este "favor". Minha dívida com o garoto do pão nunca estará, de fato, quitada, então me esforço para retribuir no máximo que posso: Lutar contra meus demônios, e reviver mais uma vez.
Nada pode estragar nossas vidas novamente.
Começo a gargalhar. Sinto então uma luz forte e surpreendente disparar em meus olhos. Ela é forte e iluminada. Penso em ser o pôr-do-sol, e começo a sorrir. Mas minha felicidade dura pouco, ao perceber que não é o pôr-do-sol. É o farol de um Aerodeslizador que voa em nossa direção.
Todos param de gargalhar para ver o Aerodeslizador raspando em nossas cabeças. 
O vendaval causada pelos motores dele, faz que as árvores se contorcem e as folhas subam. Happier pensa em disparar um grito, mas tampo sua boca para que o ruído não saia, em silêncio. A puxo para detrás de um arbusto, me separando de Peeta e Aaron, com o amigo dele, Garret ainda agarrado em minha camiseta. O barulho estrondoso o acorda de imediato, e ficamos agonizados com as naves em cima de nós, substituída pelos ventos que, eu juro, estão fazendo soprar nossos corpos dali. 
Fico imóvel atrás do arbusto, rígida, contendo o grito de Happier que já esta com o pálido rosto de tanto berrar pela cabeça, se contorcendo e chorando de medo. Vejo a expressão de Peeta do outro lado da trilha, fitando o céu. Ele tenta acalmar um melancólico e sensível Aaron, decolando seu corpo para cima e para baixo, como o mesmo avião que acabara de brincar, mas e em vão. Tanto Happier quanto Aaron, ficam assustados com o Aerodeslizador que está em cima de nós.
Meus filhos nunca viram Aerodeslizadores. Nunca precisaram. E Agora, se assustam.
Percebo por um instante, que estou apertando o rosto de Happier com tanta força, que não sinto ela respirar por alguns segundos. Retiro com cuidado minhas mãos do seu rosto suave, e ela parece estar tonta e sem fôlego de tanto gritar. Ela está doentiamente pálida. Retiro uma das madeixas para trás das suas orelhas, e a aperto contra o meu corpo, a obrigando abraçar Garret junto, sussurrando que e só um avião gigante que está parado; enquanto observo meu marido embalar Aaron com os braços, se aquietando por uns instantes, do outro lado da trilha.
“Queria estar ali, com Aaron no colo...” Penso comigo mesma, mas só o calor de Garret, e os braços finos e magricelos de Happier se agarrando á minha saia, já e o suficiente.
Falo com Peeta, através dos movimentos dos lábios algumas letras, mas ele franze a testa, não conseguido entender. Só havia outro atalho de volta para casa, que por sorte, não passava pelo alcance do Aerodeslizador. Tento mais uma vez descrever a palavra com os lábios devagar, mas o Aerodeslizador vai se abaixando, em nossa direção.
“PRIM”. 
Me esforço para lançar as duas últimas letras para a língua, e aponto para o fim da colina, onde um riacho de Primroses Noturnas se segue ao uma espécie de santuário de flores. Peeta, enfim, entende. Ele movimenta a cabeça para frente e pra trás, em concordância, e giro o corpo, libertando finalmente Happier do rosto de Garret, o ponho nos braços da menina, e berro para ela, já que o vento não nos deixa ouvir nada:
– Leve Garret e seu irmão para o túmulo de sua tia! Lá é seguro, iremos te alcançar, assim que os Aerodeslizadores passarem para o outro lado! – Grito, quase sem água ao redor da boca.
– HÃ? M-mãe! Mãe! O Qu... – Ele não ouve o que gritei, e eles ficam cada vez mais próximos de nós. Empurro Happier em direção de Peeta com Aaron no colo, pronto para entregá-lo, apontando para as Primroses:
– Corram para o túmulo de Primroses Noturnas! Já alcançamos vocês!
Empurro-a com força desta vez, e ainda não intende coisa alguma, mas percebe eu apontar para as flores, então ela puxa Aaron de Peeta com rapidez, e corre agachada com toda velocidade em direção ao fim da colina, guiada pelo rastro de flores. A assisto se distanciar, até não acha-la no meu campo de visão distorcida. Penso em correr para o lado oposto, mas Peeta me impede, agarrando meu braço, me jogando para o chão, me protegendo de algo. Aquilo cai como trovão, e nem percebo por um instante, o sangue escorre os meus ouvidos.
Uma bomba. Os Aerodeslizadores estão lançando bombas novamente em minha cabeça.
Vários troncos de árvores caem em dominó com o impacto. Foram necessários quantos metros para aquilo nos atingir? Se aquilo chegasse mais três quilômetros perto de nós, com certeza viraríamos pedaços de carne ensanguentados por entre a floresta e os copos-de-leite esmagados.
Tento me levantar, e só agora percebo que Peeta está desmaiado e ainda em cima de mim. Dou alguns grunhidos e gemidos animalescos de dor para sair, e percebo que torci a perna.
Tento arrastar Peeta para longe, enquanto o fogo consome vivo as árvores com puro deleite. Começo a gritar por ajuda, mas ninguém vem para a campina, ao não ser, eu ou Happier, sozinhas. Bato no peito de Peeta, para que ele acorde com a dor que estou provocando, e percebo uma flecha encrava nas suas costas. Ele ergue os olhos, demostrando dores angustiantes, que provavelmente está sentindo pela recente impacto da bomba. Grito diversas vezes a voz de Peeta para que ele acorde, mas seus sinais vitais começam a decair e seu corpo não se movimenta mais, ficando gelado por um instante. 
Entro em pânico. Minha voz sai áspera e absurdamente alta como de um animal selvagem, berrando, unhando e chutando ele como última tentativa para que ele acorde, mas ele não responde de forma alguma, sem mesmo por respiração. Começo a chorar desesperadamente, ainda clamando por Peeta, quando uma onda de choque sísmico atinge meu corpo por trás. A ondulação faz com que meu pescoço se dobre para o chão carregando o peso do meu corpo, quase se quebrando. Meu corpo novamente é retorcido no chão, e um calor em chamas novamente chega até mim, mas desta vez distante, mas sinto as bombas serem disparadas. 
Olho para trás. Uma densa camada de poeira e fuligem com troncos queimados, e faíscas recém-lançadas são lançadas em minha direção. Como estamos atrás de uma árvore gigantesca; onde até conseguir arrastar Peeta, não fomos por pouco novamente atingidos, apenas arranhões, luxações, contusões, uma perna quebrada e... Peeta. Provavelmente, morto por ser atingindo ao me proteger.
Meu corpo se levanta por obrigação, apesar de eu fazer um esforço horrível para isto. Tento mais uma vez arrastar ele para conseguir ajuda, mas apenas sinto suas mãos machucadas e sangrando pelas agressões que lhe causei, passar pelo meu braço mais forte. Paro de arrastá-lo no mesmo instante. Me ajoelho em um determinado ponto seguro dos ataques sem sentido dos Aerodeslizadores, puxando Peeta para mais perto de mim, enquanto ele respira tão intensamente, que parece que vai sangrar até morrer em poucos instantes. Pressiono sua cabeça na minha, chorando e clamando para que ele lute para se manter vivo até eu conseguir ajuda, e que os Aerodeslizadores achem de que eu já estou morta, ou qualquer outro motivo para que eles atacassem a campina assim, do nada. Sinto seus olhos azuis, marejados, transmitires magoa e dor. 
Muita dor. Ele desliza sua mão, antes morna e confortável, agora gélida e dura, e acaricia meu rosto, tremendo com a perda de sangue, e não faço nada para estancar o ferimento. 
Ele agarra um pedaço de tronco diminuto do chão, e se esforça para escrever algo no chão em brasas, e quando enfim termina, sacode as mãos tremidas e me beija. Sinto o fogo me consumir em grande prazer, e ali mesmo fico em ansiosa de mais e mais ao sentir o esforço que ele faz para que sua língua dure na minha. Tento aprofundar o beijo, mas ele não responde. Seus lábios não se movimentam, e só no fim, percebo os olhos fechados de Peeta anunciando que eu deveria ter estancado os ferimentos ensanguentados de Peeta.
Seu corpo está gelado. Peeta, o garoto do Pão, o único que não tinha medo de se queimar, está morto.
Começo a berrar verdadeiramente agora ao perceber. Meu corpo não se movimenta do pescoço aos olhos, e fico desesperada. Choramingando, agarrada ao tronco definido de Peeta. Começo a embalo ao meio do choro, mas não há esperanças. Recosto se corpo no chão. Só agora então eu vejo. 
Na areia misturada á brasas estão borradas, mas as letras se mantêm impecáveis, o bastante para entender em meio segundo. Pressiono os dedos nos lábios, para entender o que realmente Peeta queria que eu me preocupasse.
“HAPPIER”. 
O nome de minha filha está escrito na terra.
Ele estava querendo que eu percebesse aquilo mais cedo, e não que o salvasse. Mas como não? Ele era carne da minha carne agora, abandoná-lo seriam arrancar uma parte minha e entregá-la aos Aerodeslizadores. Mas meus filhos são um bem muito maior. Foram gerados através de mim. Sinto meu coração acelerar conforme o suor tinge meu rosto rapidamente. O Que eu acabei de fazer? Eu abandonei minha filha com outras duas crianças entre outra guerra.
As abandonei. E As mandei para onde os Aerodeslizadores e movem agora. Com suas bombas, prestes a cair na cabeça deles.
Ali mesmo, respiro profundamente e me ergo do chão, levanto diversos ataques de dores aleatórias exatamente no lugar da contusão, mas as ignoro completamente. Minha mente está focada. Esbarro-me nas árvores carbonizadas, e começo a correr, gemendo com a dor, e o sangue do ferimento rolando entre minha perna. Dou algumas esquivadas, e sinto a fumaça grossa e negra me cobrir totalmente. Dou uma última olhada para trás. Vejo o corpo do padeiro arremessado em uma posição de cadáver, e ele esta prestes a ser soterrado; não há como voltar. As lagrimas rolam em minha face, e levo meus três dedos médios para os lábios, e erguendo-os para cima, na intenção de homenageá-lo.
– Eu te amo. Real. – É a segunda vez que eu digo que o amo, de verdade. 
Começo a me lembrar do dia em que ele me possuiu, e fleches da vida com o padeiro brilham negro na minha mente. Fecho os olhos, e me retiro correndo, chorando sem poder ter feito mais alguma coisa. É tudo culpa minha.
Como isto está acontecendo? Como de fato, do nada, Aerodeslizadores surgiram e começas a atacar a campina novamente? 
As pessoas da Costura! Devem estar todas sendo bombardeadas neste momento. Novamente, tendo a carne de seus ossos arrancados, e assistirem toda a carnificina de suas vidas e bens sendo destruídos bem lentamente. Qual e o motivo para isto?
Snow. É Snow, não é? Ele está vivo. Neste momento, tenho certeza, planejando como ira me quebrar e fazer com que cada caquinho do meu ser, seja exposto publicamente poder ver que, liberdade foi toda em vão. Ele ficou vivo todos estes anos. Paylor era mancomunada. Coin também.
Todos querem acabar com o Tordo. Ninguém pode lhes tirar este prazer arrebatador, e ter uma nação, cujo gloria está em suas mãos. O como isto pode lhes parecer deliciosamente grandioso. Matar sem sentir culpa. Bom... Isso ate eu dar aquelas amoras para Peeta, e lhe jurar amor em lugar onde só existe uma regra: Matar. E isso, os quebrou. Não foi? 
Não é?
Snow tem medo de mim. Ninguém poderia ter lhe feito isso. Enquanto ele sangrava pela boca, eu cuspia em seu prato. Recebia aplauso a e mensuras de respeito, enquanto uma rebelião se iniciava contra ele. O que fazer neste momento? Mandar matá-los? Os torturar? Não, não seria o bastante... Conhecem o ditado. Se não pode vencê-los... junte-se à eles. Chego ao fim da trilha de Primroses, ainda intacta. Os Aerodeslizadores estão se agitando em cima de mim, e começo a me desesperar. Grito com todas as forças que me resta de raiva, loucura e tristeza, ou qualquer droga de sentimento estranho que está me consumindo com violência que sinto, os nomes dos desaparecidos.
Berro por Happier, Aaron e Garret, mas eles não respondem. Tropeço em alguns troncos, e me forço a ter que pular uma cerca de lenha em chamas, mas acabo me queimando. Tropeço facilmente e caio com todas as forças esvaindo no chão, e começo a rolar na grama em brasa de dor. Grunhidos de besta saem da minha boca, mas ao invés de berros comuns, os nomes dos meus filhos sem inteiramente junto á eles, com todas as letras. Fico no chão, esperando ser explodida para acabar com o meu sofrimento de uma vez, pondo na cabeça que Happier e os outros sobreviveram e fugiram para o 13.
O sol bate nas minhas pupilas, e sinto as chamas se aproximarem. Não ouso me mover, apenas o esperado chegar. Estou completamente desarmada. Estou prestes a morrer, quando a loucura me sobe totalmente à cabeça neste momento. Ouço uma voz embaçada entre os disparos, me acertarem meio roucos e mostram desespero. Ainda não me movo, mas a voz parece me alcançar de modo indiscutível.
A voz áspera é substituída por uma calma e com sotaque de bebê, uma menina, clamando meu nome de solteira sem parar. Fico sobressaltada ao perceber que é ela. Minha filha está viva, mas não por muito tempo. Preciso tirá-la daqui, antes que um terceiro bombardeiro começa, e nos acabe de uma vez. Agora, toda a dor, toda tristeza por Peeta, e todo ódio são substituídos cruelmente por uma intensa camada de força de vontade em todo o meu ser. Meus pés cambaleiam com o esforço sem energia, mas me mantenho firme para a corrida. Mas desta vez, é diferente. Não vão queimar meus filhos. Já me queimaram o bastante. Em todos os sentidos.
Paro de andar. Chego um uma área iluminada. Os raios de sol saem por frestas de árvores contorcionistas que se entrelaçam sobre si. Uma vasta área em um pequeno espaço, na campina, coberta ate a cintura de flores de todos os tipos; medicinais ou comuns. Um lago, antes limpo e transparente repleto de peixes, estão sujo e coberto de poeira até a sua borda. Um aroma perfumadíssimo do local, onde vários pássaros e insetos estão se refugiando, próximos à lapide de mármore com um caixão de pedra em forma de um rosto infantil e seu corpo, esculpidos com cuidado na pedra, em uma pose deitada de repleta de flores e Primroses até os olhos da estátua. Este e o santuário de Prim. Sua lápide.
Nela o menino e olha confuso, agarrado na barra de vestido da irmã, banhada de sangue anônimo e com os cabelos chamuscados; vejo que dois estão feridos, mas não vejo a um aranhão no loiro. Os olhos dela me penetram como agulhas, que me sangram e vejo sua raiva, a me ver ter os abandonado, se bem que este não é um bom lugar de fazer as pazes, mas fico feliz ao vê-los vivos.
Já vi aquele olhar antes. Fitei minha mãe da mesma forma. Quando ela me abandonou.
Tento caminhar em direção dela. Mas ela recua para trás, puxando os meninos para o colo, movimentando com a cabeça em um sentido de “não se aproxime”, e de repente, lágrimas invade seu rosto. Meu rosto neste momento se torna vítima das lágrimas também, mas não abaixo os braços. Fico a me perguntar o que vou fazer agora. Falo por meus olhos. Sobre Peeta. Ela me olha mais intensamente, e mais tarde se assustando, reconhecendo desesperadamente, e ajoelhando ao lado da lápide, agarrada ao seu irmão, gritando um "Não! Não!", enquanto Garret a palpa no coro cabeludo.
– Seu pai está morto. – Digo com a voz para confirmar.  – Eu amo muito vocês. Eu peço perdão... por tudo que lhes fiz e o que vou lhe fazer passar... – Digo, me derramando para Happier, que nem sequer olha para meus olhos, me ignorando por completo, fechando-se para si mesma e para o irmão mais novo.
Como ela sempre fez assim. Não tenho tempo para ver os rostos de meus filhos revoltando para mim. De repente, um Aerodeslizador branco surge entre as persianas dos galhos iluminados. Uma pequena bomba é disparada, que arranca e despedaça inteiramente os galhos entrelaçados do “teto” do santuário. 
Os destroços caem quase completamente em cima de mim, mas esquivo, escorregando e minha perna dianteira fica pesa completamente, fatigando dor entre meu desespero para ir em direção dos meus filhos. Assisto minha filha empurrar para detrás da lápide Aaron e Garret, que nem parece respirarem de medo e susto gigante. O Aerodeslizador se aproxima de Happier devagar. Me contorço feito animal, berrado, berrando, berrando para que eles saiam correndo dali, mas Happier não parece me ouvir.
Sinto que estou para morrer. Meu broche de Tordo começa a pegar fogo. As chamas consomem minha pele, e me deixa em carne viva até eu para de me debater. Meus olhos comidos dão um último olhar para minha filha. Ela está sendo vestida com um casaco preto com listras laranjadas, e calças de couro, portando um arco e flecha igual ao meu, mais muito mais mortífero. Não e o mesmo rostinho que Happier de dez anos que vejo agora. Ela esta mais jovem, de cabelos longos, com no mínimo, dezessete, presa ao um elevador esperando a contagem regressiva terminar, olhando o tempo todo sem se desgrudar de seu irmão, agora musculoso e belo, com os cabelos tão longos quantos de Peeta, predador, e disposto a matar alguém.
O que aconteceu com a inocência deles? O que é isso?
Vejo Snow. Seu rosto está completamente diferente, mais jovem e saudável quanto qualquer adolescente. Ele sorri maliciosamente, e redireciona seu olhar para mim, sendo queimada, e apenas rir. Ele ergue sua mão direita, pronta para dar um comando, e grita:
– Que o Septuagésimo Sexto dos Jogos Vorazes, a seleção para o Primeiro Jogos Vorazes Global... Inicie!
Meu pior pesadelo. Ele se realizou. Era tudo, uma premonição.
Vejo meus filhos matando. Pagando uma minha antiga dívida de sangue posta por mim. Meus olhos carregados estão se fechando, e a última coisa que vejo, é minha filha, Happier, levando uma flechada... bem em seu coração. Mas ela não sente a dor. Eu sinto.
Berro sentindo como se fosse uma lâmina atravessando meu peito, e em seguida, tusso sangue sem parar. Era a mim que mataram.
E Fim.
Acordo sobressaltada, lançando os travesseiros em direção ao armário entreaberto, fazendo um pequeno barulho. Minha fadiga só aumenta, e aperto a camiseta, bem no local do meu coração, respirando sem controle até me acalmar. Por algum motivo, começo a chorar. Retiro a camisola e fico apenas com as roupas íntimas, me cobrindo com o edredom macio, chorando e mordendo um dos travesseiros, agora realmente, sinto dor no coração.
Assim que me acalmo, vou tentando recuperar a consciência; insistindo a mim mesma, que foi tudo um pesadelo horrível, e não uma premonição:
– Meu nome é Katniss Everdeen. Tenho dezesseis anos. Meu lar é a Costura, nas Montanhas Apalaches, onde estou. Minha irmã mais nova, Prim, está viva. Não tenho filhos. Meu namorado é Gale Hawthorne, com quem pretendo passar o resto da vida.  – Continuo.  – Tive um pesadelo. Não faço a mínima idéia do que ela quis dizer, e das pessoas que estavam envolvidas... – Dou uma pausa tentando compreender o sonho. Eu... eu.. eu não sei onde realmente estou...
"Onde estou?"
– Minha casa. Eu estou em casa. Na minha cama, e em meu quarto. Não estou no Hospital.
Me lembro então, da primeira morte. Ele estava respirando com dificuldade, e estava em seus braços, lembro-me de ele ter um corpo bem morno e seguro. Eu chorava por ele, e não me lembro do seu rosto, apenas de seus olhos azuis penetrantes e graciosos. Mas ele foi morto, vítima de estilhaços grossos em seu tronco. Tento me lembrar do seu nome, o nome por quem eu gritava, e quando enfim reconheço apenas uma pergunta me percorre pela cabeça:
– Quem é Peeta?
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otropstories · 4 years
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 4
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                             Capítulo 4
Sinto meu tubinho de oxigênio me sufocar, enquanto as palavras da boca de Haymitch saem, me socando cada uma. Parece que vou morrer com a revelações que ele está me contando. Não reconheço a maioria das pessoas que Haymitch inclui nas frases que está me dizendo, mas sinto um tremendo choque ao ouvi-las na conversa, por algum motivo que desconheço...
Ele finalmente, depois de vinte minutos prolongados, termina de falar.
O encaro, como se nada tivesse acontecido, sem expressão nenhuma de surpresa. Permaneço de punho fechado, fazendo Haymitch conversar mais um pouco comigo, mas sinceramente, não estou mais afim de ouvir nem sentir o bafo de bebida que sai de suas palavras contra mim. Sinto que quero socá-lo ainda, ao me lembrar que estou em um hospital depois de dois meses em coma. Depois de um longo silêncio de Haymitch em busca da minha surpresa ao ouvir tudo, ele se cansa de esperar a minha resposta (e eu também), e então calça novamente as suas botas de couro molhados, se levanta, dá mais um gole na garrafa e se retira. 
Permaneço olhando pro nada, esperando o momento dele sair de uma vez do meu quarto para que eu possa berrar, gemer e gritar de raiva sozinha, quando ele dá uma bufada prolongado antes de fechar a porta, coça a barba grisalha e se volta para mim:
– Olha... eu pensei que você sabia do que estava fazendo. Não que eu queira me intrometer na sua vida. – Ele dá outro gole na garrafa de líquido espumante e ardente, balança a cabeça de tontura do líquido e dá outro suspiro.  – ...mas você sabe que eu quero, sim, não é docinho? 
Permaneço como uma estátua petrificada, se segurando para não arremessar nele, o primeiro bisturi na mesinha de remédios na minha frente. Trinco os dentes, já lacrimejando, mas ele não sai do quarto por nada.
– Veja bem, Katniss... – Ele inicia mais uma vez, mas o corto com fúria animalesca.
– Chega! Chega, Haymitch! cansei de você, e suas mentiras imundas! – Berro, sem me importar que os outros pacientes ouçam.
– Katniss, cala a boca! Vão escutar você...
– Ah, é? Pois não estou nem aí! Não vou acreditar em nenhuma mentira que você teve, o descaramento de porcaria que você jogou na minha cara! Suma!
– Mas, eu...
– Suma! E tomara que você pegue prisão perpétua, por me deixar neste estado! Morta! – Grito com todas as energias que me restam, e sinto minha pressão abaixar.
Água. Preciso de água agora, e de sair deste lugar. Estou neste momento, chorando com lágrimas que escoam pela minha face. Mantenho meus olhos penetrantes nos de Haymitch, para que ele sinta o fogo que e consome e me queima em carne viva. Ele joga a garrafa ainda cheia no pote de lixo do corredor ao lado da minha porta.
Ele volta para os meus olhos, que sibilam sangue e ódio por tudo, e finalmente, estica os braços para puxar a maçaneta. Antes que eu ouça o trinco da porta sendo fechada, e engole o seco, e sussurra: 
– Você mesma se matou, docinho. Eu apenas sou, e sempre serei seu mentor na vida... – E ele a fecha. 
No mesmo instante que a porta é fechada, chuto com todas as forças a mesinha na minha frente, que rola com as rodinhas para outro lado do quarto, e cai ao ser pressionada com força na parece, caindo bem em cima de onde deveria estar os cacos de vidro do copo de Effie. Começo a me afogar em lágrimas gemo, berro, berro, berro mais e grito para o céu, soltando vestígios que vou me transformar em um bastante. Estou me contorcendo na cama, jogando tudo que vejo pela frente no vidro da janela, incluindo minha máquina de batimento cardíaco, que tanto me irrita. Tento arrancar de mim as máquinas, tubos interligados nas minhas veias que me espetam e machucam, mas não tenho força para fazer nada mais, apenas chorar. Chorar. E chorar. 
Chorar...
Sinto algo apertar meu punho direito, que o mantenho imóvel. Seus dedos suados se retiram dos meus, devagar, me fazendo no mesmo instante parar de gritar. Meus olhos arregalam, ao perceber que acabei de acordar a criatura loura, e aparentemente, cansada, resultado de provavelmente, dias sem dormir. Peeta. Ele se manteve ali, do meu lado, mesmo eu estando prestes a arrancar os cabelos enfurecida. Mas não tenho culpa, ele não sabe das coisas, que agora eu sei. Fico o observando, agora em silencio, se contorcer na cadeira e arrumar os fios dourados da nuca. Seus olhos azul-céu, ainda sonolentos se encontram com os meus cinzentos. Fico muda, pensando em um milhão de coisas para dizer á ele, quando ele apenas esfregas os olhos em reprovação, dizendo:
– Pelo Amor de Deus, será que um cara, não pode dormir um pouco depois de ficar semanas tomando conta de uma desajeitada, em paz? – Ele boceja de modo provocante, me fazendo enfim, rir.
Fico sem graça, por saber que no fundo, é verdade. Ele se levanta da cadeira, e se senta na minha cama, apertando minhas mãos com força, e limpando meus olhos com sua camiseta, já perto do meu rosto. Sinto o impulso de abraçá-lo, e nunca mais largá-lo, mas é Peeta que faz isso comigo, se deitando comigo na cama, e me entrelaçando em seu corpo definido, beijando inúmeras vezes meu pescoço, fazendo o calor retornar ao meu corpo, que antes estava gélido. Meu rosto é banhado por uma felicidade extraordinária ao sentir que estou entre seus abraços e lábios novamente, e começo a chorar novamente, não de tristeza pelas revelações, ou de raiva de Haymitch, mas de alegria por ficar novamente com Peeta.
Ele me perdoou.
Peeta é o único que me faz me sentir assim: quente, segura e protegida, além de Deus. Não ouso largá-lo e nem ele o faz, apenas os mantemos enroscados um no outro, em um silêncio que resume tudo que poderíamos pensar em dizer um para o outro. Ele pausa o abraço apertado, e suspira, lançando um hálito refrescante na minha direção, me fazendo inspirar rapidamente, em busca de mais do aroma delicioso, também de pão quente e fresco das suas roupas, resmungando algo, enquanto pausa, redirecionando sua fala para mim:
– Katniss. – Ele diz, mas o interrompo por impulso, ao perceber a enorme cicatriz em sua testa. Era por isso que ele está esfregando tanto a cabeça, ou melhor, a testa.
Levo minha palma esquerda para ela, passando meu dedão nele para o lado e para o outro, na bandagem que envolve sua cabeça. Fico gélida ao pensar que aquele ferimento, seria por culpa minha. Nunca vou ter perdoar por ter machucado o Peeta, Katniss. Nunca vou lhe perdoar por ter sido responsável por isso, Katniss... Grito na cabeça para mim mesma.
– Você está ferido... – Digo com uma ponta de medo. Não uma ponta, mas ela completamente.
– Ah... isso. Não é nada de mais... – Ele dá uma pausa, me fazendo ficar nervosa. Ele volta os olhos para mim, percebendo o nervosismo que me causou, e para me aliviar, diz : – Foi só... uma briguinha que rolou entre mim e um outro qualquer que falou mal de você... nada que eu... – Ele não finaliza, me pressionando com mais força contra seu corpo.
Fico muda por um momento, pensando no que houve. Peeta nunca foi de se meter em brigas. Ele sempre foi calmo, pacífico e tranquilo desde criança. Nunca se metia e conflitos com os colegas... pelo contrário... as pessoas sempre gostavam dele pelo seu jeito amável, e por isso até defendiam ele. Ninguém vem na minha mente, que poderia ter feito algum tipo de escândalo com Peeta, e o ter lhe agredido.
Antes que ele enfim me solte para respirar, algo passa pela minha cabeça, que ele possa ter arranjado briga por minha causa. Uma palavra tão simples, e tão boba, mas que me revela por um instante o nome do suposto culpado. Sinto também meu nome se envolver, e assim que nos separamos, sussurro:
– Foi Gale... não foi?
Ele fica mudo. Eu também fico. Acho que foi audácia minha dizer o nome de Gale. Como não? Sei que Gale não é tão "limpo" quanto eu, mas não consigo pensar em outra pessoa que possa ter machucado Peeta assim.
"Claro. Primeiro vou terminar com Katniss, e deixar ela chorando sem ninguém. Depois a envolvo com Snow. Vou fazer ela ficar confusa, e assinar um testamento de sangue. Depois, ela vai ter que pagar uma dívida com ele, enquanto eu ganho suborno. Depois, eu me arrependo, e para livrá-la, eu vou sabotar a limousine de Haymitch para que Katniss morra em um acidente. Simples assim. E matarei qualquer um que se intrometer, inclusive Peeta." - Ainda ouço a voz de Haymitch revelando, o que sabia depois de ter ouvido informações vazarem no Banco de Corpos.
Um lampejo na minha cabeça. Um tontura. Uma respiração. Agarro com força a camiseta de Peeta enquanto a escuridão me cega novamente, e minha força se esvai. Tento permanecer forte para não ir além, mas sou puxada.
– Katniss! – Ouço Peeta tentar falar, mas não ouço direito. Está tudo escuro agora. Só então percebo, que novamente seria castigada pelos meus terríveis pesadelos novamente, que me assombra noite após noite.
Como eu queria recomeçar, e descobrir como acabei me tornando uma assassina.
                                                   (...)
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otropstories · 4 years
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Amor x Arena (2013) - Capítulo 03
WThis post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                               Capítulo 3
– ... !!! – Arquejo.
Desta vez, sou acordada pelo canto suave dos pássaros, que voam de ninho em ninho das árvores, perto da janela do meu quarto. Estou assustada, quase que sobressaltada da cama, e começo a respirar sem controle, escutando bipes de batimentos cardíacos que tocam rápido.
Permito mais uma vez meus músculos relaxarem, e conforme volto a respirar devagar, os bipes incessantes param de bater violentamente e ficam tranquilos. Pelo menos sei, que evitei por conta própria outra parada cardíaca de susto. Pelo menos pela primeira vez, fui útil para mim mesma.
O fio de luz atinge justamente meus olhos irritados e inchados. Talvez eu tenha tido chorado bastante, enquanto dormia, pois neste momento, não sinto motivos para chorar. Mas sinto raiva. Raiva por não ter morrido e tudo ter acabado de uma vez. Meus reflexos ao sentir a luz quente nos olhos, me faz pressionar as mãos, e lembro do casal de mãos que apertam ainda meu punho direito. Me debato na cama, e faço um esforço ridículo para me sentar, e observo pela primeira vez os fios de cabelos dourados que brilham com a luz do sol. Minha cabeça dói neste instante com violência descomunal, e dou um gemido fino, enquanto esfrego a nuca na tentativa de me livrar da tortura.
Percebo então a mulher parada em frente da cortina da janela do meu lado esquerdo. Ela parece se perder nos pensamentos, e enfim, se curva em minha direção ao me ver pressionar com força minhas bandagem e a me contorcer de dor na cama, assim que acordo. Pressiono os lábios, me mexendo como uma deficiente mental, quando ela dá passos rápidos em direção da maca, ajeitando a peruca, e a cantarolar com seu sotaque irritante, mas que me acalma por ser familiar.
– Ah... a dorminhoca finalmente acordou, não é?  – Ela bate com a palma das mãos na minha barriga, o que só me faz tossir, e arrependida, ela se levanta para buscar um copo de água para mim.
Effie está com a maquiagem, principalmente a sombra dos olhos, borrados e escorridos, resultado de horas e horas de noites em claro sem dormir, e chorando. Não entendo o porque ela estaria chorando por mim. Ela é apenas uma conhecida. Não entendo mais nada. O que aconteceu, Afinal? Onde estou? 
– Aqui está!  – Ela estende o braço, me empurrando um copo de água gelada, enquanto limpa o borro das sobras com a mão livre. Levanto meus braços com dificuldade, e enfim alcanço o copo. Dou breves goles, que me refrescam por completo, e nem sinto o remédio garganta ir à dentro.
– Qual é a minha situação?  – Digo, limpando a boca na camiseta. Ela murmura algo, e cruza os braços, como se aquilo fosse uma burrice de se perguntar. E é mesmo.
– Ah, vejamos: Seu crânio foi perfurado por uma barra pontiaguda de ferro da limusine do Haymitch, que neste momento está sendo indiciado e processado pela sua mãe, e provavelmente ele perderá a Costura.  – Ela me encara, sabendo de meu susto pela informação surpresa.  – Se você morresse, ele seria preso por "morte culposo" ; quando não há intenção me matar. Você esteve dormindo por dois meses. Katniss! Sabe o que significa dois meses?! Todos da cidade oram pela sua situação, muitos dos seus colegas da escola estão fazendo homenagens para você. Praticamente, todos da cidade vieram te ver, mas ao verem você em coma..  – Ela termina exagerada, piscando os olhos rapidamente.
– Eu sei que estou, praticamente, morta, Effie. Não precisa jogar na cara.  – A corto. Ela parece se enfurecer com a minha resposta, e se levanta imediatamente.
Ele pressiona minha bochecha e começa a gritar o mais baixo possível:
– Você sempre é assim, né? Nunca deu valor à vida! Não se importa com o fato, que ficou em estirada no chão por horas, enquanto sangrava até a morte! 
Eu retiro suas mãos da minha face, e a olho séria nos olhos. Quero que ela preste a atenção no ruídos que irá sair dos meus lábios:
– Não. Não mesmo, eu não me importo. Sou apenas uma, dentre milhares de pessoas muito piores do que eu mesma no mundo. Não tenho importância Effie. Sou igual como qualquer um, então para mim, tanto faz!. – Minha voz aumenta, conforme ranjo os dentes, e a raiva me possui. – Se eu tivesse levado um tiro, pra mim, dane-se esta merda! 
Berro o a mais alto que pude, jogando o copo de vibro contra a parede do outro lado do quarto. Observamos o corpo que quebrar por inteiro, e Effie vira de volta para mim. Seus olhos anunciam que irá derramar lágrimas novamente, e então ela puxa sua bolsa, e vai em direção para porta, levando um lencinho aos olhos inchados, dando vários soluços. Eu não ouso olhar para ela, e então, ela movimenta a fechadura, e entre lágrimas sussurra:
– Você não é igual á todo mundo. Você é diferente. É um anjo de Deus para esta família. T-todos nós te amamos... eu não sei como...  – Ela chora sem controle, e começa a fechar a porta lentamente - Me desculpe, Katniss... – E ouço a porta se fechar.
Estou enfurecida. Com tudo.
Era para ser a minha noite. A noite de Peeta. Era para ser tudo perfeito, seguindo as regras à risca, minhas dívidas seriam pagas. Era só preciso pisar na pista de dança. Mas não... eu inovei. Sangrei nela. Como será que meu credor está lidando com a minha situação agora? Está planejando me prender? Me matar...?
Não. Só sei que devo pagar pelo que acontecer, pois tempo não é problema. Ele deixará isso bem claro na minha mente quando eu me recuperar. Ou até mesmo antes disso.
                                                   (...)
Ouço a porta bater. Ele entra, sem se separar da garrada de cerveja que iniciou tudo isso, dando passos longos com as botas, que pelo que vejo estão molhadas com algo.
Ele enfim olha para mim. Leva seu olhar gorduroso para minha esquerda, onde sinto meu punho se fechar. Ele solta um sorriso sinistro, e se esparrama no sofá do quarto, tirando as botas, e as acomodando com os pés em cima na mesinha de remédios na minha frente. A ânsia de vômito me percorre ao ver seus pés sujos, e preciso organizar todo meu alto controle para não sair da cama, e pular no seu corpo para socá-lo, unhando-o com até a morte. Nós dois damos um suspiro, e ele se concentra no olhar ao meu lado.
– A quanto tempo ele está aqui, hein? – Ele pergunta, dando goles na garrafa com satisfação.
– Hã?
Percebo então a mão dele se retirar na minha. Meus olhos se contraem, ao ver o loiro dormindo na cadeira com um leve ronco, sem se separar de mim.
– Peeta! – A voz de minha mente me anuncia sem pensar. Um sorriso se forma em mim, e de alguma forma, meus músculos do rosto relaxam de alívio ao vê-lo.
Ele está vivo do acidente. Sinto que quero abraçá-lo com todas as forças, e pedir perdão pelas todas as coisas, que provavelmente eu o fiz passar. Mas não posso acordá-lo assim. Não posso agarrá-lo, ainda mais com Haymitch, me observando como um falcão, dos pés, á cabeça.
Não tenho certeza do que fazer, ao não ser observar seus pés embolorados de Haymitch, que fedem. Tento me virar para sair correndo do mal cheiro, quando ele para de beber, e se vira a atenção para mim novamente:
– É um prazer de rever docinho... sentiu saudades? 
– Pra ser sincera, não. – Tento ser a mais fria possível. – Para ser sincera também, até fiquei feliz ao ver alguém parecido com você no meu pesadelo. Parecia um velho bêbado, sem sua preciosa fazenda e morrendo de velhice bem lentamente sem companhia e amor. Seria você, Haymitch? – Pressiono os lábios, na tentativa de ofendê-lo.
Ele retira os pés da mesinha, e coloca a garrafa no chão, parando de beber, o que me assusta. Ele demonstra seriedade, como se estivesse de brincadeiras, tanto quanto eu.  Toquei em velhas feridas dele, ao ressaltar a palavra "amor". Meus lábios frisados formam uma leve curva de ironia, me sentindo vitoriosa por conseguir o machucar com minhas próprias palavras. Haymitch apenas balança a cabeça, suspirando, e gargalhando rapidamente com a cabeça baixa e os dedos entrelaçados.
– Vim aqui apenas pelo obrigatório. Meu advogado achou que seria bom eu vir lhe visitar, por eu alegar inocência. Ele quer que você deponha em meu favor quando se recuperar, sabe... vou ser preso amanhã pelo que lhe fiz. – Ele volta bufar, encostando as costas na cadeira e girando a garrafa na mãos. – Estou arrependido, sim, mas não posso voltar atrás agora... 
– Vai me pedir desculpas? – Digo, furiosa.
– Não. Vim lhe esclarecer o que houve. Veja bem Katniss, eu estava, sim, bêbado. Mas você sabe tanto quanto eu, que odeio encrenca, e que iria moderar. – Ele suspira e dá uma longa pausa. – Foi feito uma investigação na perícia da limusine no dia do acidente... em que você foi levada pela doutora Chiller para o hospital, e algo me surpreendeu bastante. Fiquei bem chocado, docinho. Mas vou avisando que e confidencial... – Ele ri, mas permaneço concentrada e assustada em suas palavras.
– O que aconteceu? Você não bateu o carro?
– Não, princesinha. Eu bati mesmo. Acontece que meu freio não funcionou normalmente, e que foram achados muitos cortes e rasgos estranhos feito por mãos humanas na fiação do carro. – Ele explica.
– Haymitch... – Inicio nervosa, pronta para berrar. Mas sou cortada imediatamente com a resposta dele:
– Katniss... o carro foi sabotado, por ele.
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 02
This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
                                          CAPÍTULO 2
Haymitch volta para o acento do motorista, puxando o telefone celular para pedir uma ambulância. Peeta grita, berra sem controle, sem se soltar do meu corpo sem vida, misturado ás lágrimas, manchando todo seu terno de sangue.
Ele se choca com a cena que presenciou ao abrir a porta do carro. Em um curto espaço de tempo, tudo acabou. Em um momento, estou agarrada á Peeta, trocando beijos vorazes e preliminares ardentes, e no outro sangrando até a morte. Como isso foi acontecer.
Não sabíamos, mas Haymitch continuava a beber seu vinho sem a cerveja quente da minha casa enquanto dirigia. Mas mesmo assim, por motivos que desconheço, seus reflexos continuavam impecáveis, bons o bastante para não levar o carro em direção á uma árvore. Mas casos desesperados, levam medidas desesperadas, e Haymitch sabia disso. Ele me devia um favor, e o convenci nos levar. Ele sabia de tudo: Do meu plano, da aposta, e também dos meus pesadelos. Mas para Haymitch, os sonhos da tal arena não era ficção. Era sim, real. Ele também tinha aqueles pesadelos. Só nos três.
Haymitch havia freado com tanta força, porque já havia se aproximado do portão principal do baile, e não percebera a velocidade descomunal que acelerava o carro ao dar goles. Ao avistar os jovens bem vestidos caminhando na faixa de pedestres sem o sinal de aviso, ele largara a garrafa, derramando em todo estofamento, e freando com tanta força que podia, machucando a testa levemente no volante com o impulso do freio, deixando escorrer levemente um fio de sangue da testa.
Ele levantou o olhar ainda tonto, observando a expressão da adolescente que quase atropelou - de vestido curto inteiramente branco e cabelos avermelhados penetrando seus olhares. É Flinch.
Ela corre da frente do carro quando recupera dos sentidos, clamando para o acompanhante lhe ajudar e chamar a polícia. Polícia... Haymitch percebe a encrenca que vai chegar ao dirigir bêbado e se envolver neste acidente. Será seu terceiro débito para a sociedade só este mês. Ele recupera a consciência e dor. Muita dor. Ardência e sangue na testa.
Ele não havia ouvido o meu grito. Ele foi anunciado alto e animalesco com a batida do carro, abafando minha voz com o barulho do ferro sendo esmagado da frente da limusine no poste. Haymitch começa a escutar Peeta berrando meu nome milhares de vezes, já sem voz, e enfim, sai do carro para ver se alguém realmente se machucou nos acentos de trás. Se machucou. Se machucou sim.
“E a culpa é sua, Haymitch...” Penso em meus segundos de vida, e tento não dormir eternamente.
Haymitch leva as duas mão ao ver a cena do meu corpo banhado de sangue e meu crânio perfurado, com Peeta agarrado a ele, chorando e berrando completamente sujo do meu sangue. A ação leva a garrafa cair no chão e se quebrar inteiramente em vários cacos, caindo de joelhos e Peeta clamando por ajuda. Peeta clama desesperado para a rua, atraindo a atenção dos que estão ali. Mas eu não poderia ter morrido em lugar pior: Bem em frente ao baile.
Dezenas de adolescente, bem-arrumados, de vestidos luxuosos, Saltos altos, jóias, maquiagem cuidadosamente moldados nos rostos femininos, ternos e sapatos bem engraxados, com o aroma fedido de perfume barato, se deparam com a cena de terror bem antes da festa do ano começar. Todos se aproximam e choram, ligando para os pais, desesperados e chamando as ambulâncias para socorrer o local. Professores e pessoas na própria rua chegam para nos ajudar, sem entender nada, apenas espantados. A música para de tocar no centro do baile, e o DJ corre para fora para ver a movimentação estranha, e todos os presentes o seguem dando murmúrios altos, e a berrar de susto, agarrando as meninas seus parceiro com medo, que as afasta da limusine. Apenas um deles tem coragem. Ele empurra os convidados, que lhe dão a passagem forçada, sem se desprender da sua parceira que corre se equilibrando dos saltos de bico fino, deparando-se com a cena assustadora. Seu rosto fica gélido, e seu rosto moreno e olhos acinzentados ficam pálidos ao meu ver.
Ele se desprende da moça, e corre para dentro do carro, erguendo Peeta de pé, e coordenando arrastar meu corpo para fora do veículo. Os dois me carregam, e me estendem na calçada, tentando conter o sangue que sai agora não só pela cabeça, mas pelo nariz e pelos cortes super profundos na várias partes aleatórias no meu corpo e nas coxas, causados ao tentar remover o aço.
Ouço todos chorar. Eu não respiro. Nenhuma dor.
Várias viaturas da polícia, e ambulância chegam ao local onde está um grande poça de sangue morno e onde deveria está meu corpo morto.
Eles correm, e me empurram para a maca, rasgando parte do meu vestido, enfiando um tubo de oxigênio e panos e ataduras, removendo os cacos de ferro do meu corpo, enquanto um dos médicos faz um movimento de apertar meu peito para fazer meu coração não parar de bater, imediatamente, estancando meu sangue em primeiro lugar. O jovem que me ajudou segura minha mão com toda força, e até posso sentir. Ele clama meu nome e implora para que eu não morra, enquanto Peeta e Haymitch ficam como estátuas petrificadas em pé ao meu lado, sem conseguir ajudar em nada.
O rapaz não se desgruda de mim, fazendo Peeta o olhar sério. Ele não tem espaço para segurar minha mão também, não lhe dando alternativa, se não me observar de longe, barrado pelos enfermeiros, obrigando a todos não se aproximarem.
A cirurgia ocorre ali mesmo por falta de opção e tempo.
"Você vem, você vem, para árvore-forca..." Rio mergulhada em meu sonho, me lembrando de Rue cantando com uma careta a letra quando estávamos no píer do lago... mas... que estranho... minha cabeça dói... continue cantando...
Eles afastam agora o rapaz de olhos cinzentos e moreno de mim, e meus reflexos apagados apertam meus dedos á procura dele. A procura da fonte de aquecedores mornas em forma de mãos que eu tanto amo segurar. Mas eu não esta á procura do rapaz.
"É aqui, que eu sempre te amarei..." Ouço Peeta cantar em meus ouvidos, quando dançávamos como dois apaixonados no estábulo da fazenda, com a vitrola em música lenta. A música do Vale... continue cantando...
Peeta.
Queria que ele estivesse ali me segurando enquanto morresse na calçada cercada por médicos, mas ele não faz nada. Apenas se mantém imóvel bem longe de mim. Até Haymitch está mais perto e atento de mim, berrando ao celular desesperado, com um voz feminina irritante que grita ao meio de choro de desespero, que até de longe eu aqui, consigo ouvir. Effie. Eu encaro os jovem que me olham com pânico entre o canto dos olhos. Todos bem tratados, belos, fortes e atraentes tanto quanto eu. Me pergunto como acabei como eles. Sendo enfeitada pela equipe de preparação e por Cinna. Agora pago pelos meus pecados. Por tudo que fiz Peeta passar. E enfim, meus olhos se fecham totalmente.
"Você vem, você vem... voc....... V-v... E-em-m... " Não pare, Rue! Não... continue... continue cantando... não quero parar de ouvir... não quero... morrer.... não quero morrer!
Não Q-qu... O-o-...
Mo-err...
Todos se agitam neste instante, e Peeta enfim se desespera, e dribla os enfermeiros que não consegue impedi-lo. Policiais, o agarram, e o jogam no chão, e Peeta berra na minha direção, enquanto os policiais prendem algemas em suas mãos para o conter. Ele derrama lágrimas quentes, por não poder me tocar, sendo que a pouco tempo, ele esta me tocando não livremente, que eu era só sua. Esta separação imediata o perfura o coração, o que só lhe dá opção de me assistir morrer. E praticamente, ele também. Um último caco de ferro é removido da minha nuca. A dor da remoção me faz respirar novamente, agora sem controle, e tenho outra parada cardíaca. São duas.
Uma médica de cabelos prateados, com pontas flamejantes puxa um aparelho da caixa de primeiros socorro, liga á um registro elétrico, e pede todos se afastarem, levantando as placas eletrificadas ao meus seios, próximo ao coração. Meu corpo salta, mas não tenho reação ao choque.
– Aumente a intensidade, Byron!  — A médica grita para o enfermeiro do lado, que empurra devagar a intensidade do aparelho no registro.
– Chiller... não acho que é uma boa idéia! Já se passaram vários minutos da parada, a menina já está mort...  — Ele é cortado imediatamente pela médica, pondo em posição novamente as placas eletrificadas.
– Cala boca, e só faça o que eu mandar. Aumente a intensidade, Byron!  — Ela fala de um jeito cortante, espantando Byron que lhe obedece de imediato.
– Q–Que seja feita a vontade de Deus... – Sussurra Chiller, enquanto estende as placas novamente eletrificadas, esperando a contagem do assistente. 1, 2... 3...!
A placa e puxada novamente, que sobressalta meu corpo pela segunda vez. Meus olhos se abrem violentamente, e abro a boca desesperadamente por ar. Bipes de batimento cardíaco voltam a tocar no aparelho conectado ao meu pulso, e todos que estavam assistindo o procedimento começam a aplaudir emocionados com meu retorno.
"Árv-vore... forc... a-a...".
                                                          (...)
Chiller limpa meu rosto, e me cobre com lençóis, me empurrando a permanecer deitada para ser levada ao hospital, enquanto faz as ataduras em velocidade da luz, sempre balbuciando algo para ver se reajo seus chamados, abrindo meus olhos bruscamente com os dedos, enquanto aponta uma lanterna em minha córnea, testando minha visão. Posso ver as luzes trocando de cor dos faróis dos carros da polícia. Azul, vermelho, azul, vermelho...
As coisas se acalmam, e ela retira meus fios de cabelos marrons soltos da trança encharcada de sangue e suor do meu rosto, e limpa meu rosto com uma toalha gelada, enquanto os outros enfermeiros andam ao redor do meu corpo pra lá e para cá, trazem a maca maior e as ataduras. Ela me encara bem fria, mas depois me troca um olhar carinhoso, segurando minha mão que treme. Na verdade, todo o meu corpo está tremendo de frio com a perda de sangue. Meus dentes se debatem, e minha boca fica inteiramente roxa e quebradiça.
– Senhorita. Everdeen! Senhorita Everdeen!  — Ela grita perto dos meus ouvidos assim que termina de abrir meus olhos com a lanterna, afagando meus cabelos com suas mãos, e vejo outros enfermeiros de aproximarem.  — Eu sou a Dra. Chiller, e sou daqui, das montanhas Apalaches. Em vinte dois anos de carreira médica, nunca deixei perder uma vida nas minhas mãos, e você quase me assustou esta noite. Nunca mais faça isso, mocinha!
A movimentação é gigante. Pessoas de vários quarteirões se chegam mais perto, com câmeras e filmadoras da imprensa de telejornais. Tenho medo de dormir novamente, e ter de volta os pesadelos da tal arena futurística com relógios girando e marcando a minha morte, quando uma voz masculina e rígida berra meu nome, e agarra de novo minha mão. Ele então me beija profundamente, e eu cedo, pela tontura e dor descomunal na cabeça, acho que é obviamente o rapaz loiro, e atraente de olhos azulados. Mas não sinto que é ele. O calor do seu corpo não é quente o suficiente que estou acostumada com ele, e o gosto dos seus lábios não são doces como os dele. Abro os olhos na mesma hora ao perceber a diferença, e arregalo ao realmente agora enxergar quem era aquele rapaz.
– Oi, Catnip.
                                                        (...)
Tente imaginar-se estirada em um sólido bloco de gelo, com vários estranhos com máscaras vestidos de branco contendo seu sangue, já gelado, e uma cratera infectada na sua cabeça.  Mas isso não é o importante. O que importa, são as pessoas que você envolveu neste jogo. No que você se tornou, e no que os enfiou para te proteger. Seria melhor e eu tivesse morrido. Seria melhor se voltasse para a Arena dos meus pesadelos...
Meus olhos se permitem se abrir novamente.
Minhas pálpebras estão pesadíssimas, e mal consigo erguê-las; deve ser de madrugada, pelo silêncio frio. Movimento meu pescoço para meu lado direito, e sinto uma mão quente segurar meu punho fechado com força, mas não consigo nem forças para ver quem é. Mas, percebo as faixas enroscadas na minha nuca, e não sinto meus cabelos. Enxergo de longe também um tubo longo e grosso grudado no meu pulso, conectado a uma bolsa de sangue ainda cheio, sobre seu suporte. Espremo meus olhos ainda entre abertos que quase se fecham, e observo com cuidado as letras marcadas na etiqueta da bolsa de sangue, antes do meu organismo me obrigar a adormecer novamente. "0-". Esse era meu tipo de sangue. Como é raro entre hospitais pobres como dos desta cidade, era muito difícil encontrar doadores. Busco na minha memória alguém que me devia algum tipo de favor, ou que seria bondoso o suficiente para querer extrair seu próprio sangue saudável, para doar para alguém como eu. Desisto da idéia, pois ninguém passa pela cabeça, que por sinal, dói muito. O desejo de adormecer vem chegando para me levar, e antes que eu seja puxada, lembro de um nome.
A única pessoa de sangue "0-" saudável da região, que eu observei doar para um homem pálido, prestes a morrer, na campanha de Enfermagem da escola. Era ele. Seus olhos azuis eram marca registrada de seu coração, e de quem ele era. Não havia alguém com tanto sangue quente assim para dar para pessoas que ele nem conhecia, mas queria ajudar a salvar. Ele. Peeta Mellark. Aquele pesadelo se segue novamente:
Aqui estou eu, imóvel em uma cama. Estou completamente suada, e começo a tossir sem controle, me deparando com a figura feminina que está sentada do meu lado, roubando o meu prazer do liquido dos morfinácios, que nos leva para longe dos problemas atuais. Ela me interroga com os olhos.
– Estou viva.
– Com toda certeza, sua desmiolada.
Ela finaliza, jogando no meu peito, um broche coberto de sangue, com aquele animal de asas que me assombra todas as noites. Começo a berrar, e pulo da cama, mas acabo tropeçando, e afundando mais.
Quando acordo novamente, estou coberta de preto, em uma roupa colante com lâminas negras nas pontas do que parece ser asas nas minhas costas. Estou com um arco e um aljava de fechas nas mãos, e então sinto algo arder e queimar na minha roupa, próximo do pescoço. É aquele broche. Ele está pegando fogo.
Sinto a chama me consumir viva. Deito e rolo no chão, pressionando as palmas das mãos nos ouvidos. Sinto agora dezenas de vozes na cabeça, berrando, chorando, e implorando por ajuda. Elas gritam o meu nome. Sinto a dor e angústia de suas vozes enquanto gritam e me debato no chão: "Porque matou meu irmão?!", "Você não salvou ela!", "Assassina!", "Assassina!", "O sangue daqueles inocentes, aquelas crianças está nas suas mãos, assassina!". Me levanto, e começo a correr, procurando pela saída. Consigo alcançar uma porta, eu não sei como, mas consigo abri-la, e a tranco por dentro. As chamas se apagaram, e as vozes sumiram. Estou a salvo nesta sala.
Luzes de holofotes se acendem na sala, uma por uma devagar. Giro por reflexo, e me deparo em que tipo de sala eu estou. Não é um sala escura qualquer. Tem corpos deitados em macas de ferro gelados, cobertos apenas por um lençol branco.
Corpos gelados. Isto é um necrotério.
Começo a me desesperar. Tento abrir a porta novamente com força, mas ela está trancada por dentro para sempre. Começo a bater e a berrar desesperada na porta, para que alguém me ajudar, o sangue dos arranhões nos meus punhos sujam o vidro da janela da porta, mas ninguém me ouve pelo lado de fora depois de horas. Horas gritando... horas sem ninguém vir me salvar de dentro do necrotério... sozinha. Me prenderam aqui.
Deixo minha cabeça encostada no vidro da pequena janela, e deixo meu corpo cair devagar enquanto começo a chorar descontrolada. Meu rosto está banhando de lágrimas. Só quero sair daquela sala arrepiante, gelada e morta. Não consigo ver corpos mortos. Não tenho estômago para ver isso. Não consigo mais a controlar os movimentos dos meus membros, que agora tremem e se debatem. Estou prestes a ter um colapso mental, quando escuto alguém chorar. Ergo minha cabeça no mesmo instante, e todo meu tremor se esvai por completo. Me levanto, e começo a procurar a dona daquela voz. Fina, trêmula e inocente, com pontas de tristeza e desespero. Saio correndo pelo corredor, com fileiras e fileiras de corpos, procurando alguém que não faço ideia, mas que por instinto preciso encontrar. Um grito engasgado.
Paro de correr quando me deparo com uma menina negra, estirada no chão e coberta de sangue, com uma lança encravada na sua barriga. Seus olhos são dilatados, e sem vida. Sua boca aberta jorra sangue também. Me assusto por completo, e tento virar na direção oposta, quando tropeço na maca de um dos corpos, que esta cai em cima de mim. Me esforço para o retirar, começo a gritar me arrastando para fora, quando enfim, reparo no rosto do corpo. Loiro, de olhos negros e vermelhos, com suas pupilas antes azuladas agora escurecidas, morto.
É o corpo de Peeta.
Não.
Não. Não. Por favor não. Não!
Não! N-não! Nããão! 
Não!
Me levanto para correr novamente em direção á porta, para arremessar meu corpo nela e quebrá-lo, quando e paro para olhar os outros corpos melhor ainda sem fôlego e deteriorada: Um rapaz de cabelos ruivos, belo, atlético e de olhos cor de oceano. Finnick. Uma mulher de cabelos loiros e belos, com um rosto de simetria perfeita e de lábios vermelhos. Glimmer. Cato, Clove, York, Jackson, Messala, Cressilda, Beetee, Byron, Chiller, Leeg 1 e 2, Flinch, Pollux, Lavinia, Leevy, Effie, Haymitch, Annie, Boggs, Gale... todos os seus corpos estão enfileirados ao meu redor. Todos, em suas placas das macas, dizendo que foram mortos... por mim. Meu nome está em negrito em cada placa.
A sala parece girar, e não tenho o que fazer, apenas me ajoelhar e a chorar, gritar, gritar e gritar. Me deparo com um último corpo, na fileira mais distante bem na pontinha, uma garota morta de cabelos dourados, de vestido branco e rendas, segurando um pequeno buquê de rosas avermelhadas bem artificiais e de cheiro de sangue, com um gato que dorme ao seu lado. Minhas pupilas se dilatam ao perceber ela.
Prim. O Seu sangue está escorrendo. Pelas minhas mãos...
                                                       (...)
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otropstories · 4 years
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Amor X Arena (2013) - Capítulo 01
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This post is an version of “Amor X Arena”, my fanfiction released in 2013. For the english version, coming soon.
Título: “Amor X Arena”
Escrito por: A. A Otrop.
Data de lançamento: 2013
Tema: Jogos Vorazes
Plot: ***
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                                Capítulo 01
Saio do box ainda enrolada ao roupão macio. Sinto meu corpo tremer com o frio do ar após do mundo de jatos quentes do chuveiro, que me faz girar os calcanhares e mergulhar novamente na água morna. Minha mãe está batendo na porta sem parar. Com toda a certeza, armada até os dentes com câmeras e filmadoras para gravar uma noite histórica, para toda vida de uma festa de colegial que neste exato momento, sinceramente, estou com a mínima vontade de ir.
Digo para ela ir embora diversas vezes, e ela enfim, se cansa de bater, devo ter lhe feito desistir da idéia de bater minha foto no quarto, e para filmar eu e um longo, esquisito e cintilante vestido que Cinna tinha preparado sob encomenda para mim, deslizando devagar sobre as escadas. Posso ouvir o berrar da minha mãe de loucuras e gemidos finos de excitação de Portia, Vênia, Octavia e Flavius, do orgulho da menininha deles. Belíssima. E Boba. E Cintilante.
Removo o roupão e deslizo o vestido grosso e vermelho com cuidado no corpo. Penteio meus cabelos com cuidado, e os entrelaço e uma trança embutida única, que cai sobre minhas costas e enrosco-as em uma fita azul-celeste sobre o seu meio, seguindo o contorno da trança, até o restante da fita flutuar sobre o final dela. Ponho os longos saltos-agulhas sobre os pés, embora ainda não tenha tempo de praticar a andar sobre eles.
"Droga, Effie! Como é que você aguenta esta tortura de se equilibrar o tempo todo?! Que porcaria... AI! AI!... " Penso comigo mesma.
Meu rosto esta bem enfeitado também. Bochechas avermelhadas com toques de tom de pele e meus olhos cobertos com uma sombra de camadas fortes bem escuras, e dão um brilho meio que azulado no meio e nas pontas, e completadas por uma grossa camada de delineador líquido no início da sombra, e cílios postiços que faz o efeito de faíscas avermelhados-azulados quando pisco, criadas orgulhosamente por Octavia - antes de a expulsar para a sala como todos. Mergulho meus lábios em um espesso batom vermelho-sangue. Olho fixamente para criatura e pé, diante de mim no espelho da escrivaninha com cuidado.
– Essa não sou eu...  — Digo para o espelho, suspirando.
Meus cabelos despenteados na trança sempre suja de lama ou de fermento da padaria, e um rosto livre de qualquer pó ou efeito de transformação, com uma camiseta branca justa simples e jeans dobrados e amassados, que me deixa à vontade, foram brutalmente mutilados e substituídos por uma dama de cílios brilhantes e cabelos presos e limpos. Eu aqui. Presa. Lutando para conseguir respirar debaixo do vestido. Penso em tirá-lo e desistir da idéia de bancar a idiota que não sabe dançar e segurar na mão de um rapaz direito, quando desta vez, é Cinna que bate na porta falando com firmeza:
– Você está pronta, querida?  — Dizia por detrás da porta.
A firmeza de Cinna em sua linda, rouca e tranquila tom de voz me assusta um pouco, mas me deixa sob controle, me fazendo lembrar que estou fazendo isso, para início, por motivos pessoais. Por algo mais importante que eu mesma. Deslizo meus dedos na fechadura, e recoloco os saltos-agulhas enquanto me equilibro me sustentando na porta. Dou um suspiro sem graça. Abro devagar a porta, enquanto começo a caminhar cuidadosamente sobre o corredor de camurça bem devagarzinho, torcendo mentalmente para que não houvesse tanta gente na sala de estar, com seus olhos penetrantes, me olhando se cima a baixo. E fotos. E fotos. E mais fotos. E beijinhos e abraços. E elogios, como "Você está tão bonita!", ou "todos os rapazes desta festa vão ficar louquinhos por você! Olhe que gata!", mas sinceramente, não dou a mínima nenhuma. Mas preciso aguentar, pelo bem de todos. Até meus familiares acabarem, vou ter que e contentar com o fato que a festa já vai ter acabado, o que não seria tão ruim assim.
– Lá vem ela! Lá vem ela! Filma, querida!  — Ouço minha mãe berrar para minha irmã pequena, com a câmera pronta para me metralhar de fleches de amor.
Começo a descer a escada que leva para a sala onde estão todos, mas levo uma pequena surpresa. Não há quase ninguém me esperando. Não tantas quanto eu esperava, provavelmente. Apenas minha mãe, minha irmã mais nova Prim agarrada com o sarnento do seu gato favorito, dentre os milhares que ela tem, Buttercup. Então, meu olhar fixa diretamente no rapaz de terno bem polido, loiro, de aparência esmagadoramente atraente, curvado no sofá com as mãos entrelaçadas olhando para baixo. É meu par. Peeta.
Sei que ele quer acabar logo com isso tanto quanto eu. E apenas uma noite. Quando acabar, nem precisaremos trocar uma só palavra novamente, ou sequer olhar para cara um do outro. Ele estará livre de mim, e eu, aliviada.
– Katniss! Katniss! Olha só para você! Que moça linda você está! Olhem só esse vestido! Isso é um vestido! Muito melhor que aqueles trapos horrorosos que você usa todos os dias, aliás...  — Menciona Effie, amiga da minha mãe que acaba de beber alguns copos de vinho pelo hálito contra meu rosto coberto de pó, surgindo ali de repente e falando alto, enquanto fica agarrada nos meus ombros me girando para me ver rodopiar feito uma princesinha.
– Effie...  — Arfo, e ergo as sobrancelhas - — ... de onde você surgiu, em... ? —  Me curvo olhando para trás dela, na tentativa de encontrar a "passagem secreta" que ela usou para se tele transportar de um minuto para o outro na minha frente.
– Ah, acabei de chegar. Eu estava ali... hã... ali...  — Ela faz uma expressão que parece ter dificuldades de lembrar de onde havia aparecido.  — Er... hã... H...H–Haymitch! Q-qual é o nome daquele cômodo onde a gente prepara a comida mesmo?  — Diz ela ajeitando a peruca desta vez lilás.
Ouvimos a geladeira bater. Um homem adulto, de barba grisalha, cabelos loiros, lisos e um pouco cumpridos que cai sobre os seus olhos com o terno - que deveria estar novo - sujo, aparece, segurando uma garrafa de cerveja quente na mão esquerda e ajeitando a calça que cai.
– Cozinha, Effie. É... cozinha...  — Ele caminha devagar na minha direção, me fazendo recuar e enroscar meu corpo na parede para fugir do seu hálito gorduroso, enquanto ele levanta seus dedos e pousa sobre meu queixo o levantando na mesma hora .  — Nada mal, docinho... nada mal mesmo...  — Ele encrava um olhar sobre o meu, em seguida abaixa o olhar para examinar meu corpo  — Ah... se eu ao menos fosse mais jovem...
– H–Haymitch! Toma vergonha nessa cara! A família de Katniss está te vendo e ouvindo muito bem!  — Pronuncia Effie como de ela tivesse lendo meus pensamentos.  — Tenha educação com sua aluna, por favor!
Haymitch lança um olhar feroz sobre Effie, e a corresponde da mesma forma; e os dois se mantem assim por alguns segundos eternos. Ele então se retira de perto de mim, e se esparrama sobre o sofá, quase acertando a cabeça de Peeta com a garrafa de cerveja.
– Ha ha ha!... relaaaxa Senhora Everdeen. Relaxe também querida Effie. Fiz para provocá-la um pouquinho.  — Ele se vira do sofá, e se dirige a mim e alto e bom som: – Não sou eu que está afim da princesinha aqui, e sim esse principezão aqui...  — Ele levanta o braço de Peeta em uma pose de vendedor, mas Peeta nem parece ligar.  — Esse aqui! Ele é o cara. Derrotou o musculoso moreno do Gale, e dentre todos os bando de inúteis pervertidos rapazes dessa cidade só para sair com ela... Incrível!  — Haymitch finaliza abraçando Peeta que não esboça nenhuma reação.
Fico muda. Meus estilistas e minha mãe se entreolham, e Prim lança um olhar malicioso na minha direção, e Buttercup parece fazer o mesmo.
Derrotou? Derrotou Gale, meu ex-namorado, aquele me traiu e me deixou a sofrer sozinha? Outros rapazes, como assim? Penso comigo mesma.
Gale está morto para mim.
O que ele fez comigo não tem perdão... para que tocar nesse assunto agora? Fico completamente perdida nos pensamentos trêmula, quando dou por mim que todos estão rindo, pois só agora todos sacaram que a intenção de Haymitch era fazer uma piada. Permaneço séria, e olho com raiva para Haymitch que me encara, e não tenho nada para lhe responder, até que meus pensamentos são liberados se minha permissão para a boca:
– Hã? Como assim? Eu não amo o Peeta ou qualquer coisa assim... não! A-Amar não... e-eu quis dizer que não gosto dele desse jeito... a-amar não... de onde você tirou essa idéia, Haymitch?...  — Digo gaguejando, já me fuzilando mentalmente.
Um rubor - forçado - bem vermelho toma conta de mim, enchendo meu rosto por completo. Esquivo para o lado e percebo que Peeta e eu cruzamos olhar. Aqueles lindos olhos azuis, me faz ter um sobressalto no vestido. De qualquer maneira, isto é verdade.
Começo a tremer de seriedade. Peeta começa a rir, e soltar uma gargalhada deliciosamente linda, enquanto se levanta e caminha a passos lentos em minha direção. Desta vez é ele quem me prende na parece, imitando Haymitch com os dedos. Ele brinca com a minha trança das costas e em seguida, estica a mão direita no paletó e puxa uma caixinha de plástico com uma rosa limpa e perfeitamente perfumada. Peeta encaixa a rosa no meu peito e o prende com o meu broche do Tordo, encaixado a rosa pálida, e leva sua mesma mão para a minha, a entrelaçando em um morno aconchego quente de seus dedos. Nos olhamos. Ele parece agora congelar de medo de repente.
Apenas uma noite, Peeta. Só uma noite... vai acabar rápido... Apenas esta noite ficaremos juntos... depois, poderá seguir com sua vida em paz...
Não consigo mais me controlar. Ele me olha mais uma vez, e sorri fracamente novamente. Fico imóvel me controlando para não vacilar mais uma vez com todos, quando ele quebra o silêncio da plateia que o tempo todo, os observava em silêncio do sofá.
– Sei. Haymitch tem razão. Você não me ama. Real ou não Real?  — Ele sorri maliciosamente, me fazendo corar idiotamente. Volto a seriedade da fúria que chega pelo modo que ele me provoca, e respondo quase rispidamente:
– Real. Totalmente Real, Garoto do Pão...  — Giro para o lado, sem ousar me desprender das mãos dele que me aquece, e respiro fundo.
– Vamos então?  — Corta Haymitch.
– Sim... vamos...  — Responde Peeta. Minha mãe se lembra da câmera nas suas mãos, e corre para nos tirar uma última foto.
Peeta desliza sua mão direita na minha cintura me puxando mais para seu corpo, e segura minha mão de lado, enquanto agarro suas costas por trás para não cair do alto, me equilibrando. Sorrimos o mais felizes e mentirosamente românticos que podemos. O flash é liberado em um barulho abafado, e a luz rápida me deixa sem visão. Permaneço no sorriso, quando enfim, Peeta sussurra no meu ouvido:
– Você está pronta, Katniss?
Várias coisas passa pela minha cabeça. Não consigo pensar em mais nada da realidade; as coisas estão em jogo. Apenas assinto com a cabeça em confirmação, e ele diz algo como "que bom... Haymitch vai dirigir a limousine, certo?", o que desagrada meu humor completamente. Haymitch dirigindo um carro com a gente dentro? É a mesma coisa que deixar um bebê segurando um fósforo cercado de roupas e panos e gasolina ao redor. Estaríamos entregando nossa confiança e vidas a um chofer bêbado que berra consigo mesmo. Ah... dane-se. Não estou nem aí para o Haymitch e suas maravilhosas habilidades em dirigir bêbado. Enquanto Peeta estiver segurando minhas mãos, sei que não irei cair de uma atuação fria. Nem da realidade. Isso é algo que nunca vão tirar de mim. Peeta. Ele é meu. Mas sou muito estúpida para confessar isso é claro, porquê de uma forma ou de outra, ele nunca iria escolher uma desleixada, raivosa e fria Katniss.
Só esta noite. Eu juro que só esta noite ficaremos juntos, eu nunca mais irei pedir nada novamente á ele, sumirei de tudo se for preciso. Só quero que me ajude a escapar do simulador, a fugir dos jogos. Preciso salvar Prim, mas quero viver. Só se apaixone por mim mais uma noite, e eu lhe deixarei livre.
Peeta e eu. Isso é algo impossível de se realizar, apenas em meus sonhos mais profundos. Ou melhor, pesadelos da Arena. O amor está confrontando a arena. Mas à jogos muito piores que este.
                                                      (...)
Quatro minutos depois.
Haymitch dá algumas giradas em torno de si e uma cambalhota até conseguir chegar á porta da limusine.
Ele bate com as palmas das mãos nos bolsos do terno, na tentativa de encontrar algo - as chaves do carro, talvez - mas em uma tentativa em vão. Ele chuta a porta do carro e começa a berrar de raiva, esbarrando a garrafa de cerveja no capô fazendo um ruído de arranhado horrível, que é substituído pelo som de cerveja derramando sobre o estofamento da limusine e pingando no chão. Isso só dá para concluir uma única coisa. Haymitch está bêbado até os ossos. Peeta e eu o observamos arrombar o próprio carro, quando ele enfim resolve soltar minhas mãos e as envia nos bolsos do paletó. Meu reflexos se movem sem minha permissão, tentando recuperar minhas fontes de aquecedores macias em vão, quando Peeta quebra o silêncio entre nós:
– Será que a Polícia vai o ver dirigir e nos prender?  — Pergunta ele. Minhas opções de respostas são óbvias, mas não quero lhe plantar medo logo nesta noite.
Hoje precisa ser tudo perfeito entre mim e Peeta para que eu ganhe. Mesmo que seja preciso botar um bêbado Haymitch no volante...
– Isso é mesmo uma droga...  — Continua Peeta.   — Ele jurou pela cerveja dele, que ele tentaria ficar sóbrio o bastante para nos levar ao baile... mas pelo visto, não posso nem confiar naquela garrafa ali.
Fico meio séria por uns momentos, e em seguida começo a soltar uma pequena gargalhada ao perceber a piada sem graça dele. Puxo a mão eternamente morna do seu bolso, e a entrelaço na minha, puxando seu corpo também mais para o meu, na tentativa que seja uma mensagem de que, estamos bem e unidos.
– É... tem razão... mas cuidado...  — Solto outra risada.  — Você tem mais de dezoito anos, já pode ficar em cana, loirinho.  — Estou tão próxima do rosto dele, que assopro seus cabelos caídos nos olhos azulados, e me esquivo de novo lembrando que não posso ficar tão à vontade com Peeta assim.
– É mesmo? E você Everdeen? Também pode virar uma delinquente juvenil, espertinha...  — Ele diz, beijando minha cabeça no topo.
Damos breves risadas de distração, quando Haymitch grita nossos nomes para nos trazer ao mundo real, buzinando com força e sem dó para nos acordar.
– Andem! Mexam-se, seus pirralhos! Não tenho a noite toda, não!
Começamos a gargalhar do estado de Haymitch, molhado, fedido e com as pernas abertas na nossa frente, quando é Effie que abre a porta atrás de da gente, esbarrando na nossa frente outra garrafa de cerveja, nos fazendo automaticamente largar as mãos um do outro.
– Haymitch! Cala a boca deste carro! Os vizinhos da Senhora Everdeen vão ficar incomodados! Tenha santa paciência!  — Grita ela bufando, enquanto anda de volta para a sala devagar. Peeta e eu nos olhamos, confirmando mentalmente o que está acontecendo agora.
– Nunca a vi bêbada assim...  — Digo olhando para a porta trancada.  — Quero dizer... ela sempre diz que evitar consumir álcool, e ela sempre confirma isso quando vem para as festas aqui em casa... mas algo deve lhe ter feito mudar de idéia.
– Katniss... você precisa urgente cortar o álcool desta casa.  — Diz ele rindo. Não posso evitar de sorrir e concordar com ele com a cabeça - Afinal, conviver com Haymitch é o mesmo que se contaminar com ele.
Droga! Não ria! Não ria. Prossiga, e o conquiste...
– Acho que tem razão. Mas agora a gente...  — Puxo seu braço para a escadinha, o descendo no mesmo instante. Peeta capta a mensagem, e desce no mesmo fluxo que eu.
– Tem razão. Precisamos ir, ou chegaremos atrasados.
Suas mãos tocam minhas bochechas vermelhas , e um outro rubor toma conta do rosto, me alisando. Sinto um tremelique ao sentir sua outra mão passar por minha cintura, e antes que eu perceba, estamos tão grudados um no outro, tão próximos, que um simples movimentar de lábios para falar, já seria beijá-lo. Não dá para resistir de novo. Ele está perto demais, e sua mão me puxa para si. Nossos olhos são fechados, e sinto o iniciar dos lábios dele me tocando, quando Haymitch nos corta por completo, buzinando mais intensamente desta vez para que entremos no carro imediatamente.
– Andem logo! Entrem logo nesta porcaria, ou vou vomitar em vocês dois!  — Berra mais uma vez ele, batendo o punho novamente no capô.
Tento afrouxar meus braços, quando a frase de Haymitch percorre na minha cabeça como uma flecha: Vou vomitar em vocês. Nojo. É a reação que sinto neste momento. Nojo completo. Me desvio do rosto de Peeta, que esboça decepção com o fim rápido do beijo. Sinto arrependimento, e ponho na cabeça que vou socar Haymitch assim que chegarmos na festa. Isso que a gente conseguir chegar lá ainda vivos.
Ainda estamos com os rostos colados. Peeta solta um sorriso enquanto esfrega o nariz no meu pescoço até a orelha e mordo o lábio com a ação. Ele abaixa o olhar para mim, até me abraçar novamente, ignorando o chamado de Haymitch.
– É tão bom enxergar uma vida pela frente e saber que você quer estar ao meu lado. – Peeta gargalha de leve, mas meu coração se endurece imediatamente com sua confissão inesperada.
Só não... caia você também, Katniss. É uma encenação.
– É. Também... acho que sim.  — Sussurro quase ríspida, tentando não cortar a tensão que se acumula no meu peito. Arfo levemente, quando assisto a expressão de Peeta mudar, ao sentir seus músculos do rosto descontraírem no meu pescoço, e levemente, ele se afasta.
O que eu fiz. Deveria soar mais natural ao concordar com ele? Por que preciso iludi-lo deste jeito? O que sentia por Peeta não é o fogo mais arder dentro de mim... Mas... não posso cometer erros. E este foi um chute na trave. Sem dizer mais nada, caminho apressadamente para a limousine, e Peeta segue atrás de mim, quando minha mãe abre a porta da frente quase desesperada para nos desejar boa sorte de longe. Peeta acena para minha mãe e sorri disfarçadamente, embora parecesse muito real. Em seguida entra primeiro atrás, e o sigo, lançando um olhar mortal e raivoso sobre Haymitch o máximo que consigo, e ele me corresponde mentalmente: "É o máximo que consegue fazer? Já vi olhar mais assustador na Effie." E entro no carro.
Ele fecha a porta com um barulho alto, e segue para a frente do carro entrando também e lhe dando partida um o barulho do engate. Haymitch se contorce para trás, na tentativa de conseguir dar ré e manobrar a limusine. Ele tem sucesso quase assustadoramente, e segue com o carro. Vemos minha mãe pela janela de trás acenando com Effie, Portia, Octavia, Flavius e Prim para nós, e aceno com a mão para eles de volta, sorrindo gentilmente, quando na verdade, estou em puro terror com que nos vai acontecer nesta festa.
Quando viramos a esquina, minha mente volta a si de volta, me fazendo perceber algo em quase meio segundo. Existe uma "parede" separando Haymitch e a gente bem no fundo da limusine. Eu e Peeta. Sozinhos em uma limusine enorme escura.
– Aproveite.  — Ouço Snow me dizer pelo microfone na presa na minha orelha.
                                                          (...)
Peeta aperta o botão esquerdo da porta do carro, fechando o vidro do meu lado completamente. O silêncio parece mortal...
Permaneço séria e controlada o suficiente para não falar coisa alguma. Os únicos ruídos que saem de mim, são a da respiração e batimentos cardíacos, que não pode parecer muito, mas falam por si só, o que eu tenho vontade de pronunciar. Percebo minhas juntas doloridas do estiramento prolongado de uma posição gélida, e então permito meu corpo pousar sobre o macio acolchoamento do banco de couro da limusine. A sensação que sinto neste momento, é de alívio e prazer, solto um suspiro bufante, e percebo o grosso ar gelado que sai da minha boca, acompanhados da respiração fraca que me transparece. Olho para a esquerda, sem ignorar a presença dele. Se eu fosse capaz disso, não o teria escolhido para o Jogo. Eu não pude evitar... minha mente esvaiu, e acabei falando quase literalmente tudo sem pensar. O desejo que querer ter estado bêbada com Haymitch naquela hora, toma conta do meu ser, embora meu subconsciente, avise martelando de que não é inteiramente verdade.
Mas agora não é hora de voltar atrás como uma estúpida. Minhas escolhas acarretaram em futuras consequências terríveis, com Peeta metido nisso tudo. Não quis envolvê-lo nisto... mas acho que mais ninguém iria comigo para este baile maldito. Ao não ser Gale. Mas ele está morto ao meus olhos. Só com a possibilidade de assistir Gale nas mãos de outra e envolvido no corpo dançarino de outra mulher no baile, me faz querer fuzilar tudo, e todo mundo naquele lugar. Mas não seria maluca o suficiente. Ou corajosa. Tudo que me passa pela cabeça agora, é que tenho que fazer Peeta arder de paixão por mim, mais uma vez. Mas isto, não será uma simples tarefa sozinha. Confiança. É o que ele provavelmente espera de mim novamente na oportunidade deste baile. Mas eu ainda não entendo o conteúdo desta palavra ainda. Não do jeito que quero transparecer.
Observo Peeta ainda pressionar o botão da porta do carro que fecha as janelas escurecidas. Ele a mantêm apertado com rigidez, como se fosse uma tentativa absurda de me chamar a atenção.
Ele está com o olhar vazio, observando com firmeza o nada. Movo meu corpo para o seu "território" da limusine, e retiro com delicadeza seu dedo do botão, apalpando sua mão esquerda na minha direita. Ele, enfim, ousa e olhar novamente, e permaneço calada, erguendo as sobrancelhas confusa para ele, na tentativa de tentar esclarecer tudo o que está acontecendo aqui. Ele parece imóvel. Calado, e friamente sério, observando o além. Seu silêncio me perturba psicologicamente, me fazendo pousar minha cabeça no seu ombro esquerdo, ajeitando meus braços, se encaixando do outro lado dos seus. Imito a forma de Peeta observar o longe, quando me passa pela cabeça, o que ele poderia ter descoberto do meu calabouço.
– Te dei um beijo indireto. — Ele inicia sem vontade.
– O quê?
– Foi reflexo. Desculpe por aquilo.  — Ele termina sem muita certeza, e volta a ficar sério e rígido.
Por acaso ele está se referindo com o que aconteceu na varanda? Ele não se mexe. Até parece que foi telesequestrado.
Ha ha ha...
"Telesequestrado...".
A palavra percorre na minha frente, me fazendo dilatar as pupilas. O que isso significa? O que essa palavra significa?
Eu e Peeta andamos tendo uns sonhos estranhos. Eu e ele trocamos conversas durante as aulas, íntimas o bastante para falarmos do nosso modo de agir, sem esconder isso pra ninguém. Eu por exemplo, ando tendo pesadelos. Segundo Peeta, ele também, mas não tantos quantos os meus. Piores.
Estes são meus seguintes pesadelos: Florestas de brisa selvagem, cercas elétricas sem ligamento, pães, pessoas morrendo de fome e crianças desnutridas cavando na terra algo para satisfazer a fome, armas mortíferas, relógios cobertos de algo musgoso e vermelho, que parece ser sangue, tridentes, arco e flechas ensanguentadas, Música, holos, pérolas, pessoas vestidas como palhaços cobertas de pisca-picas incandescidas de purpurina, explosões, sopa vindo do céu, para quedas, tatuagens no meu braço, vestidos engolidos por fogo, mortes, bestas correndo atrás de mim, e Peeta e eu. Eu, segurando duas mãos pequenininhas de bebês. Uma de uma menina, e outro de um rapaz. E uma Quarta Guerra Mundial.
E Fim. Acordo berrando para o meu computador morno em cima do meu colo despencando no chão. Eu não sei o que esses pesadelos significam. Eu acho que ando assistindo filmes, ou desenhos demais, mas eles surgiram assim, do nada, durante a época da festa de políticos no qual conheci Haymitch quando acordei de verdade. E estão cada vez mais fortes, desde que eu conheci Peeta na escola. Como se fosse tudo isso acontecer. E que iria sofrer. Mas que tudo fosse levado pela maré da praia do meu sonho, e percebo um broche dourado, com um pássaro, que parece ser uma espécie menor de garça e rouxinol, segurando a flecha ensanguentada no peito da mulher de cabelos brancos, e roupas de política do meu sonho.
E então, acordo novamente.
Começo a gemer da dor de cabeça. Coloco as duas mãos na testa que começa a esquentar, esfregando os olhos doídos da irritação de maquiagem, borrando por completo o trabalho desesperado de Octavia. Minha mente novamente se esvai, e fico totalmente desesperada para ser abraçada. Por um curto momento, minha cabeça para de doer, e imediatamente, procuro por uma vítima disposta a me abraçar e me livrar dos sonhos mortíferos idiotas. Logo lembro de Peeta ao meu lado. Não sei o que fazer. Meu objetivo aqui e ser fria com ele, mas eu estou tão desesperada para chorar pela menininha de tranças que é morta no meu sonho - que me lembra muito a Prim, por mais estranho que seja e loucura. Mas eu estou louca o bastante para tirar da cabeça a formalidade e prendo que a partir de agora, vou improvisar.
Me levanto na limusine ainda em movimento, e me lembro de Haymitch. Ele parece estar conduzindo bem o carro, me fazendo suspirar de alivio por não passar nenhuma viatura da polícia neste exato momento. Volto a caminhar no tapete de camurça que cobre completamente o chão do carro, e fico bem em pé na frente de Peeta, que continua silencioso e sem me olhar.
Começo a ficar furiosa com a falta de reação sem motivo de Peeta, e começo a - forçar bastante - chorar feito uma patética bem na sua frente. As lágrimas misturadas á sombra espessa do delineador líquido negro, rolam nas minhas bochechas cor-de-rosa, fazendo um caminho manchado de preto, tirando sua beleza rosada.
Faço uma careta para ele, e ele nem ao menos percebe que estou chorando sem motivos aparente, o que me faz berrar uma única palavra que me veio das lembranças dos pesadelos:
– Real! Peeta, real! Que droga, real!  — Grito com todas as forças para ele, em um som descomunal, e estremece as paredes do carro.
Silêncio.
Peeta olha para mim. Trocamos olhares desesperados, e Peeta parece demonstrar felicidade. Fico sem reação, tentando explicar mentalmente para mim mesma, o porque eu gritei isso.
Estou prestes a voltar a sentar no estofamento, quando Haymitch freia com força o carro em um quebra-molas, fazendo o corpo de Peeta cair em cima do meu, em meio ao tapete. Ficamos deitados, um em cima do outro sem reação, apenas sentindo dor, quando Peeta leva suas mãos para a minha bochecha, limpando a negra cachoeira dos meus olhos inchados. Ele sorri, sem que eu entendesse nada, quando ele diz nos meus ouvidos:
– Obrigado. Agora sei que você gosta de mim. Que é real. Eu estava calado porque queria ver sua reação. Você... não tinha me confirmado a pergunta na fazenda...  — Seus olhos nublam. — Mas vejo que é muito mais real do que eu esperava.
Ele segura meu braço para mais perto do seu corpo, e fico sem reação ao meio do choro. Vou voltar a fazer aquilo, de falar sem pensar. Preciso me segurar, por mais que ele me faça me sentir assim.
Me perdoe Peeta. Me perdoe por não ser sincera de coração o suficiente para lhe iludir com isto, mas ela corre risco de vida. Me perdoe... me perdoe...
Fico deitada agora na barriga de Peeta, e digo o máximo de sinceridade que consigo isto:
– Peeta. Eu te amo.
Ele não tem nenhuma reação nos primeiros segundos. Então, o observo sorrir para mim, e me abraçar no chão do carro mais ainda com amor. Fico muda e com o medo do que ele vai me dizer, e enfim, ele diz:
– Eu também te amo. — Ele se afasta do meu rosto.
– Por quê continua se afastando?  — Retruco sem terminar, com medo dele. Ele sorri fortemente então com uma aparência de satisfeito, e fala:
– Tudo bem.  — E me beija.
Seu toque é suave e gracioso, e algo em sua timidez me faz me sentir linda. Depois, arfamos em uma separação e nos enxergamos cegos pelo desejo. Fico surpresa, mas cedo a troca de carinhos, que se tornam preliminares. Enquanto eu arranhava os ombros de Peeta que agora puxavam minha cintura para cima. Sem saber o que fazer com isso, levei minhas pernas a sua cintura puxando-o ainda mais para mim quando o mesmo puxava meu vestido com força para cima.
– Katn...  — Arfa Peeta, mas não evito em impedi-lo de falar algo.
– A vida é curta demais para esperar, Peeta...  — Sussurro de volta como resposta.
Suas mãos eram grandes e fortes, puxavam minha cintura para si e eu tentava respirar toda a vez que ele largava meus lábios queimando para migrar ao pescoço dando leves mordidas. Pensei que ele reclamaria por isso, mas ao contrário, ele gemeu e puxou meus cabelos com um pouco de força exagerada para me beijar desesperadamente, mas eu estava tão inebriada que ele poderia me esfolar viva ali que eu não sentiria dor alguma, além daquele fogo que parecia me consumir.
Nos levantamos juntos, e retiro meus sapatos para nos recostarmos no estofamento, quando Haymitch novamente freia o carro.
Desta fez foi violento. O freio me faz cair dos braços de Peeta. Ele tenta me puxar, mas seu seus reflexos não são bons o bastante. Quando dou por mim, minha cabeça penetra com força no ferro grudado na parede da limousine de Haymitch, me fazendo desmaiar e sangrar pelos ouvidos e por todo crânio.
Peeta grita desesperadamente meu nome, e a me sacudir, quando é Haymitch que abre a porta em velocidade desesperado, se deparando com a cena do meu corpo estirado no chão e sangrando sem controle.
Eu estou morta.
                                                           (...)
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