millysplague

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21.06.25 ♰ perseguição. chase (pt-br + eng)

para mim, o egoísmo deixou de ser imperdoável há um tempo atrás. ao menos o meu. para que eu possa viver em um pouquinho mais de paz enquanto reclamo de boca cheia, como eles diriam.

tão complicado que é fingir não ter um coração pesando demais para uma menina aguentar, sofrendo a pressão de todas as linhas do tempo cogitáveis, o torcendo, amarrando, sufocando continuamente. não são traços asquerosos ou nojentos, não, de modo algum. a profundidade das minhas características desagradáveis, tais essas irrefletíveis no espelho, é totalmente justificável e condizente — sentir e sofrer deveriam me impermeabilizar de julgamentos.

tem uns monstrinhos nada fofos por detrás da minha arcada dentária, incomodando e coçando ao arreganhar um sorriso, tentando pular escalando os cílios quando encontram algo bonitinho demais — algo que devia ser deles —, ameaçando cuspir veneno quando falo. o problema é que, ao privá-los do mundo, eles me privam de mim. ecoam, brigam, gritam, morrem e renascem. acho que a cada lua cheia.

angélica ainda me faz querer gritar. quando me abraça e sinto cheiro de amor — quantos banhos seriam precisos para que o faro dum animal finalmente confundisse nós duas? —, as mãos macias-demais-para-serem-verdade afagam meus cabelos e volto a todas as vezes que procurei seu sorriso brilhante na multidão. tudo bem fazer isso? você é tudo. talvez eu devesse extrair algo.

sempre acontece. relações que aquecem demais, amor fraternal dos quais os parafusos precisam ser apertados quando risadas e superficialidade deixam de ser o bastante para satisfazer o apetite ansioso do demônio devorador de casos, choros e esporros. o afeto deixa de ser a água reluzente do laguinho nostálgico no último dia de verão, aquele momento asfixiante de liberdade que esvai do emaranhado de cacarecos nas mãos, e, de repente, você está tossindo todo o líquido, antes nada maldito, que limpou seu corpo.

os problemas não começam na nascente — são conceitos totipotentes, a priori —, de modo algum. como qualquer cachorro violento, apenas encontram ambiente de crescimento condizente com a realidade — alguém mascou a goma e cuspiu em seus cabelos, não por graça ou desgraça do destino, é uma das trivialidades facilmente desviadas de seu rumo de vida. o habitat e o costume destruídos levam à histeria descontrolada.

o que minhas palavras querem dizer é que a rotina de comer comida fria nunca me incomodara, economizava tempo e podia produzir mais e mais excelência à medida que ignorava tais luxos, esses que desconhecia carregarem status.

tenho a impressão de que a maior dor de cabeça da expressão são todos os momentos em que o que compreende os parênteses, ou precede o travessão do parágrafo central, supera, às vezes em tamanho também, o assunto principal — um ser incoerente e cheio de ressalvas, e não há traquejo que o conserte. nada de benditas e aparentes, pelo contrário, palavras andam brincando de esconde-esconde por aí, dentro das unhas, enroscadas nos dentes, na língua. a caneta comporta atrito demais para que umas ou outras caiam — nunca estão lá a tempo.

observe bem que rebolar em torno de fonemas e significados é mais uma das habilidades distintamente inúteis que compartilho com uma criança de no máximo 7 anos. depois disso, elas aprendem a alinhar a língua e não bater mais os dentes. vomito sopas de letrinhas desesperadamente, pois o mundo volta ao normal e alguns resquícios de horas, que não sei nem se devem ser chamados de dias, passam despercebidos como o mais delgado dos ponteiros. não por mim. estou sempre atenta, pela hora em que descobrirão que sou barata, indigna e falsa.

uma doida de pedra gritava por aí que felicidade foi inventada pelas nordestinas que andam aos montes — deve me faltar um monte. ou. uns. montes.

selfishness stopped being unforgivable some time ago. at least mine. so i could live with a little more peace while i complain with a full mouth, as they would say.

how complicated it is to pretend not to have a heart too heavy for a girl to bear, suffering the pressure of every conceivable timeline, twisting it, tying it up, suffocating it relentlessly. they’re not disgusting or revolting traits, no, not at all. the depth of my unpleasant features, those that can’t be reflected in the mirror, is entirely justifiable and consistent — feeling and suffering should waterproof me against judgment.

there are some not-so-cute little monsters behind my dental arch, itching and twitching as i bare a smile, trying to climb up my lashes when they spot something too pretty — something that should’ve been theirs — threatening to spit venom every time i speak. the problem is: by depriving them of the world, they deprive me of myself. they echo, fight, scream, die, and are reborn. i think every full moon.

angélica still makes me want to scream. when she hugs me and i smell love — how many showers would it take for an animal’s nose to finally mistake the two of us? —, those too-soft-to-be-real hands caress my hair and i return to all the times i searched for her bright smile in the crowd. is it okay to do that? you are everything. maybe i should extract something.

it always happens. relationships that heat up too much, fraternal love whose bolts must be tightened when laughter and small talk stop being enough to satisfy the anxious appetite of the demon who devours cases, sobs, and screaming fits. affection ceases to be the glimmering water of the little pond on the last summer day, that suffocating moment of freedom dripping from the tangle of knickknacks in your hands, and suddenly, you’re coughing up all the no-longer-holy water that had once cleansed your body.

problems don’t start at the source — they’re totipotent concepts, a priori —, not at all. like any violent dog, they only find fertile ground under real conditions — someone chewed the gum and spat it in your hair, not by the grace or disgrace of fate, just one of those trivialities easily diverted from its life's course. destroyed habitat and habit lead to uncontrolled hysteria.

what my words are trying to say is that the routine of eating cold food never bothered me; it saved time and allowed me to produce more and more excellence as i ignored such luxuries, those i hadn’t realized carried status.

i get the impression that the biggest headache in expression lies in every moment where what’s within parentheses, or precedes the em dash of the central paragraph, outweighs — sometimes in size, too — the main subject: an incoherent being full of caveats, and there’s no grace or skill to fix that. nothing blessed or apparent, on the contrary, words have been playing hide and seek out there, beneath my nails, tangled in my teeth, on the tongue. the pen carries too much friction for any of them to fall — they’re never there in time.

notice how dancing around phonemes and meanings is one of the distinctly useless skills i share with a child of no more than 7. after that, they learn to align the tongue and stop clacking their teeth. i vomit alphabet soup desperately, because the world resets and some remnants of hours — which i’m not even sure deserve to be called days — slip by unnoticed like the thinnest hand of the clock. not by me. i’m always alert, waiting for the moment they discover i’m cheap, unworthy, and fake.

some madwoman out there once shouted that happiness was invented by northeastern girls who walk in droves — i must be missing a whole lot. or. a. whole. damn. lot.

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18.05.25 ♰ angélica (pt-br + eng)

angélica tem um coração, e a pior parte é saber que ele pulsa igualzinho ao meu, ainda que bombear vida para uma borboleta de asas inutilizadas numa prisão fumê é diferente de transportar oxigênio aos bem-aventurados que sorvem o vento bagunçando os cabelos.

angélica não é uma sensação juvenil confinada.

angélica caminhou por toda a extensão da rua, estourando minha retina com os lapis lazuli cinttilantes nos dedos e pescoço, estourando minha retina com a intensidade de algo que não me pertence — enquanto permaneço com medo de que esbanjar minhas saltantes veias azuis seja tentar ursupar tudo para mim.

angéçica tem um nome que não a dá vergonha.

angélica permanece com joelhos bem cuidados, sem necessidade alguma de ajoelhar para um deus que sequer acredita. o amor de sua vida vez ou outra os banha em beijos leves de ternura, o golpe surdo no peito que rebobina o filme de uns anos atrás, quando nutri a esperança de que talvez esses pudessem ser os meus. triste descoberta fora a que ele havia aprendido a pronunciar seu nome, não tão depois de conseguir digerir a feiúra do meu.

eu, a menina que tentou por repetidas vinte e quatro horas convencer a si mesma que, ser garota-estrela supera todo o gritar sonífero duma alma que arde em desejo de desejar, chora em sonho de sonhar, percebo que, de que adianta ter grandeza se qualquer pedaço de chocolate é mais cativante que qualquer um desses trocentos troféus?

ainda sim, nossas moléculas dançam e se encontram na frequência dos poucos sopros de vida que consigo capturar com mãos nuas. beber, brincar, chorar, gritar. é tudo com angélica e a amizade que não consigo viver sem. meus dentes rangem. violência que não se apazigua, incômodo que pulsa na mandíbula e lembra que mamãe me construiu de ânsia, carne, inveja e repulsa.

ao passo que a dificuldade de respirar aumenta, alguém há de permanecer intocada. que o mundo continue girando na batuta do seu sorriso, deve ser a única que merece.

angélica has a heart, and the worst part is knowing it beats just like mine, though pumping life into a butterfly with crippled wings in a smoked glass prison differs profoundly from carrying oxygen to the blessed ones who drink the wind as it tangles their hair.

angélica is not a confined youthful sensation.

angélica walked the whole stretch of the street, bursting my retina with the lapis lazuli glimmering on her fingers and neck — a violent brilliance of something that never belonged to me. i stay rooted, terrified that flaunting my leaping blue veins might feel like an audacious attempt to steal it all for myself.

angélica bears a name that carries no shame.

angélica keeps her knees well cared for, never needing to bend them to a god she doesn’t even believe in. the love of her life now and then bathes them in soft kisses of tenderness — a muted blow to my chest, rewinding the film to those years ago when i nursed the hope that maybe those could be mine. bitter was the discovery that he had learned to pronounce her name not long after managing to stomach the ugliness of mine.

i, the girl who spent twenty-four relentless hours convincing herself that being a star-girl outweighed the sleep-laden scream of a soul that burns in the desire to desire, cries in the dream of dreaming, now realize — what use is greatness when any piece of chocolate is more captivating than all these countless trophies?

and still, our molecules dance and collide in the frequency of those few breaths of life i manage to catch with bare hands. drink, play, cry, scream. it’s always with angélica, and the friendship i can't live without. my teeth grind. violence that refuses to ease, discomfort pulsing in my jaw, reminding me that mother built me out of yearning, flesh, envy, and repulsion.

as the struggle to breathe intensifies, someone is bound to remain untouched. let the world keep spinning to the rhythm of her smile — she must be the only one who deserves it.