Países americanos já reconhecem os direitos das pessoas não-binárias e Intersexo
No total 6 Países já reconhecem a existência e o direito das pessoas não-binárias de gênero e intersexo em algum grau (em colorido)
Desde 2015 temos acompanhado um grande aumento no debate sobre não binariedade de gênero e intersexualidade (intersexuação). E de lá pra cá a América têm dados passos significativos para o reconhecimento legal e pleno da não-binariedade de gênero e demais dissidências. O processo de reconhecimento da identidade de gênero não-binária e dos corpos intersexo também têm levantado diferentes tipos de debates, como um terceiro marcador de gênero e sexo em documentos pessoais.
Se a 20 ou 10 anos atrás, estávamos além da margem da sociedade, muitas das vezes vivendo atrás de máscaras, e quase não se falava sobre a gente, hoje podemos dizer com toda convicção de que somos resistência e nossa existência é válida. Estimando que fecharemos a década de 2010 com o maior número de conquistas para a comunidade LGBTQIAPN+, especialmente para comunidade trans, intersexo e não-binária que nos últimos anos deram saltos quantitativos na história na busca de mais direitos e dignidade.
Na América do Sul e Central a luta ainda é pequena se comparada com o hemisfério norte, onde 2 dos maiores países do mundo e do continente já reconhecem em algum grau a existência das pessoas trans, não-binária e intersexo. Mas ainda há exemplos importantes na América do Sul.
O Uruguai foi o primeiro país da América do Sul a criar uma legislação sobre identidade de gênero. E Ano passado a Câmara de Deputades do Uruguai aprovou, no dia 19 de Outubro, uma lei integral para pessoas trans. Essa Nova legislação estabelece várias medidas em combate a discriminação, a exclusão, e garantia de direitos humanos básicos para a população trans/não-binária, como reparação histórica. Medidas essas que inclui também o reconhecimento de outras identidades, fora as identidades de gênero binária. A nova lei permite que as pessoas alterem seus dados pessoais, como de gênero e sexo por via administrativa, de forma autônoma, incluindo a possibilidade de marcar um outro gênero além dos binário conforme o requerimento da pessoa, sem a necessidade de laudos e comprovação. O mesmo para acesso à saúde, cirurgias e TH. O Uruguai além de tentar reconhecer a existência das pessoas não-binárias de gênero e demais identidades, também proibiu procedimentos médico desnecessários em bebês, crianças e adolescentes intersexo sob a lei da violência com base em gênero e sexo, dando um passo importante na luta pela integridade física e autonomia corporal das crianças.
Foto: Uruguai
No Chile a questão ainda é complicada se pensarmos que em 2015, por um breve momento, o Chile se tornou o SEGUNDO PAÍS NO MUNDO a proteger crianças intersexo de intervenções médicas invasivas e desnecessárias, depois de Malta. No entanto os regulamentos foram todos substituídos no ano seguinte por uma Circular que infelizmente, rescindiu a circular anterior, citando uma declaração clínica de “consenso” de 2006. Em particular, a nova circular permite intervenções cirúrgicas para tornar os genitais infantis mais típicos, apesar da falta de evidências em apoio a tais intervenções, e muitas evidências de danos a longo prazo. A declaração clínica de 2006 permite cirurgias precoces para controlar o “sofrimento dos pais” e alegações de potencial confusão de identidade de gênero. O Chile também não oferece proteção legal à essas pessoas nem reconhece de forma plena um terceiro gênero e sexo. Ainda assim emite certidões de nascimento com marcador de sexo "indefinido" para algumas crianças intersexo. Após cinco anos de debate no Congresso, em 5 de setembro de 2018, o Senado aprovou o projeto de lei que reconhece e protege o direito à identidade de gênero por 26 votos a favor e 14 contra. Em 12 de setembro, a Câmara des Deputades fez o mesmo com 95 a favor e 46 contra. Em 25 de outubro de 2018, o Tribunal Constitucional declara a constitucionalidade da lei aprovada. Em 28 de novembro de 2018, o presidente Sebastián Piñera assina e promulgou a lei. Em 10 de dezembro de 2018, a lei é publicada no Diário Oficial .
"Sem mutilação genital intersexo" Foto: Camilo Godoy Peña que apresentou uma carta à presidente do Chile, Michelle Bachelet, sobre o Dia da Conscientização Intersex em 2015.
Em novembro de 2018, na província de Mendoza, que fica cerca de mil quilômetros de distância da capital Buenos Aires, aconteceu a primeira emissão de certidão de nascimento sem gênero da história da Argentina. Uma pessoa não-binária teve por meio do acesso à Lei de Identidade de Gênero 26.743 (sancionada na Argentina em 2012), a vitória em um processo para o reconhecimento de sua identidade como uma pessoa não-binária. Foi Gerónimo Carolina González Devesa, de 32 anos, médique e agênero que possibilitou esse momento histórico para nós.
Foto de Gero Caro em entrevista a La Nación na sua casa “na encantadora e tranquila cidade de Chacras de Coria”
Gero Caro consultou Eleonora Lamm que é subdiretora de Direitos Humanos da Suprema Corte de Justiça de Mendoza. Lamm deu-lhe a chave para começar com um processo burocrático que estabeleceria um precedente histórico: legalmente, não poderia ser identificado como nem um e nem outro. São três pilares que atravessam a argumentação do reconhecimento da sua identidade de gênero: o livre desenvolvimento da pessoa conforme sua identidade de gênero, o direito de ser tratade de acordo com sua identidade de gênero e, em particular, ser identificade desse modo nos instrumentos que creditam sua identidade. “Primeiro fomos ao registro civil para preencher o formulário. O registro civil põe os nomes que a pessoa elege como primeiro nome e, onde diz sexo, diz que não quer consignar nenhum, como está autorizado pela Lei de Identidade de Gênero, no art. 2”, disse Geronimo ao LATFEM. Lamm, a partir daí, como vice-diretora de Direitos Humanos da Corte de Mendoza, elaborou uma opinião explicando como a Lei de Identidade de Gênero não apoia uma concepção binária de identidade, permitindo a aprovação de um para outro, mas que possibilita a experiência individual interna de gênero de cada pessoa. Isto é, permite tantos gêneros quanto identidades, e identidades como pessoas. “Com essa opinião, todo um processo começou dentro do Código Civil, onde o interrogatório, as reuniões, as negociações começaram e isso foi para o governador, que tomou a decisão”, disse a autoridade ao LATFEM
“Muitas pessoas se perguntam com que idade eu vou me aposentar e esses tipos de coisas. Daqui pra frente teremos que colocar uma única idade de aposentadoria ou repensar a questão das cotas para finalizar essas questões. O binarismo marca uma diferença, que uma coisa é oposta da outra; quando a realidade é que somos todes iguais” diz éle a Los Andes.
Foto: Gerónimo Carolina González Devesa feliz com seu novo documento
Outro marco histórico na Argentina se deu no inicio deste ano. Lara María Bertolini, de 48 anos, também entrou na Justiça pedindo que respeitassem sua verdadeira identidade de gênero em sua certidão de nascimento e sua DNI: feminilidade travesti. A juíza Myriam Cataldi considerou que a Lei de Identidade de Gênero aplicava-se ao caso de Bertolini, citando uma das definições de identidade de gênero. Em uma decisão inédita na cidade de Buenos Aires, a juiza disse que "no campo reservado para o sexo, deve ser consignado 'feminilidade travesti', em vez de 'feminino'". Além disso, o Registro Civil foi ordenado a resolver esses casos por via administrativa, colocando uma multiplicidade de marcadores como opções de gênero.
“Muitos dos conceitos relacionados ao gênero que são usados nas culturas ocidentais são baseados em uma concepção binária do sexo, que considera que existem dois pólos opostos: homem e mulher, masculino e feminino, fêmea e macho. Não há dois gêneros que correspondam a dois sexos, existem tantos gêneros quanto identidades e, portanto, tantas identidades de gênero quanto pessoas ", disse a juíza Myriam Cataldi na decisão
Foto: Lara Bertolini discursando em um protesto. Ela é uma ativista travesti e participa do Coletivo Lohana Berkins
Já o tribunal constitucional da Colômbia. restringiu a capacidade de médiques e parentes permitir cirurgias cosméticas não consensuais em crianças intersexo. Em quatro decisões separadas, os tribunais determinaram que os procedimentos de “normalização” de sexo não podem ocorrer sem o consentimento informado da própria criança. Na Colômbia também , o referido decreto de 2015, 1227, permite mudar o marcador de gênero apenas com uma exigência administrativa e sem requisitos médicos específicos. Este procedimento pode ser feito duas vezes na vida, com 10 anos de diferença. Inclusive menores de idade podem solicitar a ação porém sem muita autonomia.
No Brasil não há nenhum tipo de reconhecimento e só recentemente, e com muita dificuldade ainda, pessoas trans-binárias puderam garantir o direto de retificarem seus documentos sem laudos e outros tipos comprovações abusivas, através de uma decisão histórica do STF (Supremo Tribunal Federal) em Março de 2018. O máximo que se chegou perto foi o projeto de Lei de Identidade de Gênero João W. Nery ( PL 5002/2013 de autoria des Dep. Jean Wyllys e Érika Kokay), e mais recentemente no estado de Minas Gerais um projeto de lei (PL 136/2019 de autoria do Dep. Alencar da Silveira Jr.do PDT) que autoriza os cartórios competentes a emitir certidão de nascimento com a inserção do gênero X, bem como a alterar o gênero na certidão de nascimento a pedido de declarantes, sem a necessidade de laudo médico. Texto Original
Foto: A militante travesti Anny Lima, que alterou seus documentos somente aos 60 anos, segurando a bandeira do orgulho trans.
O Canadá, apesar de sua fama de país progressista pelo mundo a fora - e com razão - ainda não reconhece por todo território a não-binariedade de gênero em documentos oficiais. Mas, a não-binariedade ainda sim é reconhecida no país. Isso porque o sistema político do Canadá funciona de uma forma muito diferente do que costumamos a pensar: as províncias possuem muita autonomia sobre leis. Em resumo, Ontário, Terra Nova e Labrador e os Territórios do Noroeste são uma das principais referências no reconhecimento ou pelo menos discussão do assunto. Em 2016 o governo, de uma das dez províncias do Canadá, Ontário, anunciou mudanças na forma como o sexo e gênero seria exibido nas carteiras de saúde e motorista. E em Junho do mesmo ano, Ontário excluiu qualquer tipo de designação "sexual" das carteiras de saúde. No início de 2017 motoristas de Ontário passaram a ter a opção de marcar um "X" como um identificador de gênero em suas carteiras. Em Julho de 2017 os Territórios do Noroeste passaram a emitir certidões de nascimento com uma opção não-binária no marcador de gênero, o "X" também . Já na província de Newfoundland and Labrador a reviravolta foi o seguinte: Gemma Hickey, que é um ativista e advogade não-binárie de gênero, em junho de 2017 entrou na justiça solicitando uma nova certidão de nascimento pois Hickey se recusou a marcar as caixinhas M e F como definidores de seu gênero. Pegou uma caneta fez um rascunho na identidade e mostrou como queria que fosse feita. Hickey fez isso por meio da Lei Canadense de Direitos Humanos e a Carta Canadense de Direitos e Liberdades. E não é que o governo da província aceitou sem problema nenhum? Sim. A missão de Hickey era desafiar a lei de estatísticas vitais de Newfoundland. Mas como informa a CBC News, a província emendou a Lei de Estatísticas Vitais para adicionar uma opção de gênero adicional ao pedido de certidão de nascimento. A caixa vêm com o popular “X” e uma seção para especificar qual gênero/sexo. E em Dezembro do mesmo ano Hickey se apresentou aos estabelecimentos requeridos e recebeu sua nova certidão de nascimento se tornando a primeira pessoa do Canadá a ter uma certidão de nascimento não-binária na história.
O Canadá em geral também permite o marcador de gênero "X" para passaportes, e recentemente foi noticiado que o país deve incluir um terceiro gênero em censos oficiais que já estão sendo testados. Ainda, infelizmente, peca muito em relação as pessoas intersexo como outros países, mas o país foi o primeiro a registrar uma criança, Searyl Atli Doty, com marcador de gênero/sexo “U” (aparentemente de neutralidade) em sua carteira de saúde, na Colúmbia Britânica. O pai, Kori Doty, que é uma pessoa não-binária, queria dar à criança a oportunidade de descobrir sua própria identidade de gênero . A província recusou-se a emitir uma certidão de nascimento à criança sem especificar feminino ou masculino; Kori entrou com um desafio legal. Kori Doty e outras sete pessoas trans e intersexo entraram com uma ação de direitos humanos contra a província.
Nos Estados Unidos já se somam 11 estados com jurisdições e legislações em pró da população trans, não binária e intersexo. Legislações que vai de carteira de motorista à um reconhecimento legal e amplo de 1 marcador de gênero unificado ou variados para pessoas não-binárias e ademais. Entre esses Estados estão os estados de Arkansas, Califórnia, Colorado, Washington, Maine, Minnesota, Nova York, Ohio, Oregon e Utah. São 11 de 50 estados. E no momento pode parecer muito pouco mas devemos considerar que esses números surgiram muito recentemente, de 2016 pra cá, o que mostra a rapidez com que isso vêm acontecendo e como os números podem crescer mais e mais daqui pra frente, mesmo com uma administração conservadora com a população trans, não-binária e intersexo de Donald Trump. Entre esses Estados vale destacar a Califórnia, que em Setembro de 2017 aprovou uma legislação reconhecendo a não-binariedade de gênero, com um terceiro marcador de gênero nas certidões de nascimento, carteiras de motorista e carteiras de identidade em geral. O projeto de lei, SB 179, também acabou com os requisitos de laudo médico e audiências obrigatórias para o requerimento de mudança de gênero para pessoas trans. Quase como a lei integral do Uruguai.
Foto: Toni Atkins (San Diego) e Scott Wiener (São Francisco) senadorés autores da lei SB 179, que o governador Jerry Brown assinou em outubro. No Escritório do Estado Senador Toni Atkins.
Em agosto de 2018, no estado da Califórnia, o SCR-110 solicitou a criação de uma política clara que incentivasse o atraso dos procedimentos estéticos até que a pessoa intersexo tivesse idade suficiente para tomar uma decisão consensual. o SCR-110, se tratta de uma resolução aprovada pelo estado da Califórnia em agosto de 2018, foi a primeira legislação na história dos EUA a identificar os danos das intervenções médicas não consensuais em pessoas intersexuais. A resolução não vinculante, de autoria do interACT, Equality California , e do Senador do Estado da Califórnia, Scott Wiener , conclama a profissão médica a seguir as diretrizes internacionais de direitos humanos e adiar procedimentos não consensuais que afetariam a função sexual futura de uma pessoa - como vaginoplastias, orquiectomias, e reduções clitoridianas - até que ela possa participar da decisão. Representa um primeiro passo histórico em direção a políticas que centralizam os direitos e vozes dos intersexuais. Outros estados em reconhecimento e proteção legal das pessoas intersexo estão Washington D.C., New York, Ohio, Oregon, Utah, Washington State, New Jersey e Colorado.
O ‘X’ da questão
Muitas dessas aplicações são questionáveis, e muitas nem se quer estão de acordo com nossas identidades e corpos, como o uso do X que indica uma nulidade. Por isso a importância da atenção e o diálogo das autoridades e profissionais com a nossa comunidade. Em 2018 tivemos mais casos do que anos anteriores. Se seguirmos no mesmo ritmo, em 9 ou 8 anos, mais da metade do território estadunidense terão reconhecido legalmente a não-binariedade em algum grau. E na América em geral serão 18 países aproximadamente de 35 países que compõe as Américas. E em 2031? Ou 2050? Será se estaremos olhando para esse passado, como quem olha uma má relíquia?
Texto por Dani Camel
Publicação para Mídia Queer
(@rexistencianaobinaria)
23 notes
·
View notes
SHAHMARAN from Paul Kadir Özgür, NSC on Vimeo.
Produced by COMPULSORY, Handsome, Halal Pictures
Producers: Chris Toumazou, Melodie Saba
Executive Producers: Chris Toumazou, Melodie Saba, Sam Fontaine, Gijs Determeijer
Directed by Emmanuel Adjei
Written by Marleen Özgür, Emmanuel Adjei
Director of Photography: Paul Özgür
Visual Effects Services: Mathematic
VFX coordinator: Guillaume Marien
VFX supervisor: Yann Aldabe
Flame Artist: Fred Brandon
Colourist: Vincent Heine
Production Services: Paranoiia Productions
Producer: Andrea Sastoque, Ariel Navarrete Spahn
Prod. Coordinator: Fabien Colas
Editing Services: Trim
Editor: Emmanuel Adjei, Leila Sarraf, Marleen Özgür
Sound-designer: Sharkee
1st AD: Jesse Hays
PA: Nick Weir, Camilo Godoy, Ann Kocarek
Prod. Designer: Miranda Lorenz
Art Department: Rudy Grazziani
Steadicam Operator: Parker Brooks, Chris Loh
Drone Operator: Josh Yeo
1st AC: Ai Dang
2nd AC: Harper Thomas
Gaffer: Scott Ray
Key Grip: Ryan Lozano
Costume Designer: Creepy Yeeha
Wardrobe: Inez Naomi
Stylist: Kristin Kathol
Hair Stylist: Devin Bianchini
Make Up Artist: Carla Rosso
0 notes