GUIA PARA CRIAÇÃO DE PERSONAGENS AUTISTAS (parte 1).
depois de tantos imprevistos, enfim trago a primeira parte do guia sobre personagens autistas. venho salientar que sou uma pessoa autista, mais especificamente encaixando atualmente no nível 1 do espectro e diagnosticado tardiamente na vida adulta. mesmo vivendo com o transtorno durante minha vida inteira, não sou uma biblioteca de autismo ambulante, então tudo escrito aqui é com base nas minhas vivências, estudos sobre o assunto, explicações e orientações psiquiátricas / neuropsicológicas que recebi e sites dedicados a saúde. erros podem ocorrer e estou mais que aberto a correções vindo de pessoas da área da saúde e depoimentos de outros autistas. com isso em mente, vamos ao guia.
se for útil para você, peço que deixe um coração ou um reblog (🧡).
O QUE É O TEA?
Primeiro, precisamos entender do que se trata o transtorno conhecido popularmente como autismo.
"O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por desenvolvimento atípico, manifestações comportamentais, déficits na comunicação e na interação social, padrões de comportamentos repetitivos e estereotipados, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades." (fonte: ministério da saúde)
Apesar da definição estar muito resumida, em palavras mais simples é um transtorno que mexe com o desenvolvimento neurológico (área do sistema nervoso, casa dos famosos neurônios) do indivíduo, afetando suas habilidades:
psicomotoras: capacidade de sincronizar os movimentos usando cérebro, músculos e articulações.
cognitivas: processo de construção de conhecimento, sendo necessárias capacidades mentais como memória, atenção, linguagem, criatividade e planejamento.
psicossociais: socialização, cultivar relações e o convívio com a sociedade.
Com todos esses fatores, alguns podem achar erroneamente que o autismo é uma doença, no entanto, não é o caso. O autismo é um transtorno e não tem cura. Doenças e transtornos apesar de estarem ligadas a saúde não tem o mesmo significado.
doenças são caracterizadas pela falta de saúde e adoecimento do corpo, geralmente é um problema de saúde catalogado, com sintomas claros e origens conhecidas. EXEMPLOS: diabetes, pressão alta, asma e rinite.
transtorno é um termo geralmente usado na área da psicologia e psiquiatria, usado para se referir a distúrbios, alterações e incômodos ligados a saúde mental ou região cerebral. EXEMPLOS: transtorno obsessivo compulsivo (TOC), transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno bipolar e transtorno de personalidade borderline (TPB).
O tratamento do TEA muitas vezes pode exigir uma equipe de profissionais como:
psicólogo: geralmente responsável por orientar e ajudar em desenvoltura social, manutenção de hábitos, autonomia e bem estar psicológico do autista.
fonoaudiólogo: resolver problemas de fala, confiança na comunicação e ajudar o autista a se expressar melhor e transmitir seus sentimentos e opiniões com mais eficiência.
neurologista: responsável pela questão clínica e técnica, um dos mais indicados para tratamento do autismo).
neuropsicólogo: podendo exercer a mesma função que um psicólogo, mas geralmente entra em cena para diagnosticar o paciente com base em uma série de testes cognitivos e psicológicos).
SINTOMAS.
desenvolvimento atípico: problemas na fala, atraso para começar a andar, atraso na fala, falta de comunicação verbal (somente aponta para objetos), isolamento (não interage com outras crianças e prefere ficar sozinho), dificuldade na escola (muitas vezes tratada como preguiça ou desinteresse); tendência a fazer atividades sozinho e se distanciar dos colegas; ser chamado pelo nome, mas não atender; mutismo; linguagem não-verbal, aponta para as coisas para se comunicar, mas não fala; não conseguir manter contato visual / fingir fazer contato visual (olhar um ponto na testa, por exemplo); dificuldades na escola; facilidade na escola; seletividade alimentar; dificuldade para ler expressões faciais; sensibilidade na audição; sensibilidade no olfato; sensibilidade no paladar; sensibilidade a texturas e toques;
no social, pode incluir: dificuldade em socializar, entender normas sociais (etiqueta social) e de se encaixar em grupos (geralmente causando isolamento); incapacidade de perceber as intenções de outras pessoas; dificuldade de entender expressões faciais e tons de voz; dificuldade em entender figuras de linguagem; dificuldade em interpretar situações e agir de acordo; dificuldade de se expressar e comunicar suas ideias claramente (gerando estresse, desentendimentos e o hábito de guardar tudo para si); sinceridade ou falta de tato na hora de se comunicar.
comportamentos repetitivos: pela dificuldade de se comunicar, autistas tendem a imitar e se espelhar em pessoas ao seu redor ou mídias que consomem, geralmente imitando tons de voz e gestos. assim, caracterizando uma gesticulação, comunicação e tonalidade não natural, estereotipada e repetitiva. normalmente quem convive com o autista não percebe, mas para um profissional preparado os sinais são fáceis de identificar. outro ponto, são os stimmings, ações repetitivas que o autista faz para regular o próprio corpo e equilibrar a mente (como: bater o pé o chão, tremer a perna, balançar o corpo, bater a mão na coxa, roer as unhas, puxar a própria orelha).
interesses restritos: autistas encontram conforto na rotina e na monotonia de acontecimentos e atividades. como vestir as mesmas peças de roupa, mesmo tendo diversas opções, e ter hiperfocos / interesses especiais (será abordado mais à frente). mudanças, principalmente se bruscas, causam muito estresse ao nosso cérebro. diferente de pessoas neurotípicas que possuem mais facilidade na hora de se adaptar e reagir a situações inesperadas, nosso cérebro sendo neurodivergente reage mais devagar e leva mais tempo para processar acontecimentos, exigindo muito de nós uma habilidade que vários não tem: lidar com o imprevisível (não sendo incomum acabar causando meltdowns e breakdowns no autista, mas isso será abordado mais para frente); resistência a mudanças;
NÍVEIS DE SUPORTE.
Os níveis de suporte definem o nível de ajuda e auxílio que o autista precisa, comumente sendo classificado do nível 1 até o nível 3.
Tenha em mente, que eles não podem ser usados para definir a "gravidade" ou a "leveza" do autismo. Muitas pessoas ao lerem autismo leve (nível 1), termo que inclusive não gosto, banalizam as dificuldades da pessoa em questão por não ter a mesma "gravidade" que uma pessoa do nível 3. A diferença entre os três é o nível de ajuda necessário e a severidade dos sintomas.
nível 1 — quando o indivíduo precisa de pouco suporte, anteriormente nomeado como síndrome de asperger e popularmente conhecido como "autismo leve".
nível 2 — o nível "autismo moderado", cujo grau de suporte necessário é razoável.
nível 3 — conhecido como "autismo severo", quando o indivíduo necessita de muito suporte.
No entanto, isso não é algo imutável, um autista pode mudar de nível mais de uma vez durante a sua vida, principalmente com a falta de um tratamento, progresso no tratamento, ambientes estressantes e desgastantes ou vida consideravelmente equilibrada. Tudo depende de como autismo está o afetando naquele momento e de novo, o nível de suporte que ele precisa. Um dos motivos para o autismo agora ser referenciado como transtorno do espectro autista é justamente por que ele não tem níveis, o autismo não funciona dessa maneira:
(descrição: imagem mostrando uma barra longa e retangular em tom degradê, pintada de amarelo claro na ponta esquerda, escrito “não autista” acima dela e pintada de rosa na ponta direita, escrito “muito autista” acima dela.)
Mas, algo similar a esse gráfico:
(descrição: círculo com cores similares a um arco íris, amarelo, laranja, vermelho, rosa, lilás, roxo, azul escuro, azul água, verde e verde amarelado. vibrante na beirada mas perdendo cor em direção ao centro. em cinco pontas diferentes estão escritas as palavras: comunicação, habilidade motora, percepção, funções cognitivas e sensorial.)
Dependendo da severidade nessas áreas, você é classificado entre os três níveis de suporte. Ainda sim tenha em mente que as dificuldades variam de autista para autista, aqui vou dar como exemplo:
No gráfico, a maior dificuldade é com funções cognitivas e a menor, agora, são crises sensoriais. Com outro autista pode ser completamente diferente.
NÍVEL 1 & SINDROME DE ASPERGER.
aviso de gatilhos: capacitismo, nazismo, abuso médico.
A síndrome de asperger foi nomeada após as descobertas do psiquiatra nazista, Hans Asperger, se tornarem populares. Ele foi responsável por analisar e executar diversos estudos durante a segunda guerra mundial, além de causar a morte de diversas crianças que não se aliavam aos ideais nazistas ou foram consideradas anormais, incluindo autistas. Por muitos anos, foi retratada como herói da causa e uma das figuras mais importantes nos estudos sobre o autismo pela falta de informação sobre seus ideais, até o momento que diversas anotações e escritos vieram à tona e revelaram sua (quase) aliança com o partido nazista e relatórios cruéis sobre alguns pacientes, especialmente autistas. O que ele notou seria classificado hoje como nível 1.
Com a redefinição de diversos termos, a síndrome de asperger e outros entraram na nova definição do autismo, agora conhecida como Transtorno do Espectro Autista. No entanto, não é incomum ver pessoas usando o termo ainda (geralmente se referindo ao passado), principalmente pessoas diagnosticadas. Os motivos variam e o diagnóstico é um ponto muito importante para a vida do autista, por isso peço que respeite caso a pessoa ainda escolha usar o termo.
por enquanto, é isso! algumas coisas já foram abordadas antes no meu mini guia, mas ainda sim, é bom trazer o conteúdo por completo. espero não demorar para finalizar a próxima parte, mas o tema é complexo e sempre acabo precisando revisar e revisitar algumas pesquisas.
em caso de dúvidas, minha inbox está aberta para perguntas e você pode me chamar no chat do meu blog main (@maphiaclue).
fontes / conteúdos interessantes:
understanding the spectrum.
diferença entre doenças, síndromes e transtornos.
hans asperger, médico que deu nome à sindrome, cooperou com nazistas.
por que algumas pessoas defendem que o termo 'asperger' seja abandonado?
o que é neurônio?
entenda as áreas psicomotoras e como estimular cada uma delas na aprendizagem.
psicomotricidade.
habilidades cognitivas.
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